Júlia Rodrigues

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Em nome da Transparência

Na política, a transparência é uma responsabilidade e uma obrigação de todos os eleitos. A boa gestão dos dinheiros públicos, a prossecução do interesse público e o respeito pelos impostos pagos por todos os cidadãos, muitos deles com muito esforço financeiro, mais do que conceitos, devem ser princípios inquestionáveis.
A utilização de dinheiros públicos na gestão autárquica é um tema que deve merecer relevância e muita reflexão por parte dos munícipes. Em Mirandela, o Senhor Presidente de Câmara anunciou e aprovou a aquisição das instalações do Instituto Piaget pelo valor de 1,4 milhões de euros. Este montante, a que ninguém consegue ser indiferente, pressupõe que ficou de fora o terreno, uma vez que reverteu a favor do Município. Situação que se veio juntar ao aumento da participação variável do IMI cobrado pelo Presidente da Câmara a todos os Mirandelenses, à situação financeira desastrosa, aos empréstimos contraídos no âmbito do Plano de Saneamento Financeiro, no valor de 7,4 milhões de euros, ao atraso prolongado e sistemático de pagamento de dívidas aos fornecedores, para além da suposta engenharia na emissão de faturas a pedido, em tempos diferentes do fornecimento. Demasiado em que refletir, de facto. É indispensável uma atitude negocial rigorosa e transparente dos investimentos com dinheiros públicos.
A imperiosa, e indiscutível, necessidade de acolher investimentos privados, é contrariada em Mirandela, pela incapacidade e fraca visão política do seu Presidente da Câmara para desencadear os mecanismos necessários à atração de empresas e investidores, sem perder de vista a prudência e acautelando sempre o cumprimento das contrapartidas negociadas, sobretudo quando se trata da cedência, por exemplo, de terrenos públicos a um investidor privado.
Na negociação do contrato com uma clinica privada, foi cedido o terreno, sem nunca terem sido construídas as contrapartidas para todos, Município e munícipes. Neste caso, tratava-se da beneficiação do parque de campismo de Mirandela, com a construção de 12 bungalows que nunca chegaram a ser erguidos, não podendo, por isso, ser disponibilizados para o nosso turismo, garantindo receitas pela sua ocupação ao próprio Município e consequentemente aos Mirandelenses. Há que referir também a ausência de soluções para a derrocada de terrenos de moradias junto ao LIDL, em Mirandela. Anos depois, com custos pessoais óbvios, mantém-se tudo igual. Somos afinal todos iguais no acesso à justiça, equidade e a alguns privilégios negociais?
Assistimos à mesma situação aquando aa contratualização da Estação Ferroviária de Mirandela às Infraestruturas de Portugal, em processo de alienação à empresa Comboios de Portugal. Deveria ter sido uma prioridade política do atual presidente, na mesma proporção em que constitui uma preocupação para os Mirandelenses, face ao avançado estado de degradação do imóvel.
Em Mirandela, ambicionamos a transparência processual, o acesso generalizado à informação, a divulgação da documentação negocial e avaliações independentes de imóveis, bem como a celeridade na análise de processos de licenciamento camarário, que se espera desprendida de interesses, e de investimentos que, apesar de menor valor, também criam postos de trabalho e merecem, como todos, o devido acolhimento e a mesma agilização. Na gestão interna, importa também meditar nas injustificadas decisões políticas de integração de trabalhadores municipais em funções nada apropriadas à respetiva formação e competências, equação que alastra ao acesso a lugares de chefia e de coordenação. Em nome do mérito que assiste aos trabalhadores da autarquia. Por respeito pela enorme capacidade de trabalho que já demonstraram ter, garante do funcionamento dos serviços municipais.

É também na ótica da responsabilização que a gestão pública tem que ser assumida. Sempre, sempre…em nome da transparência!
 

Igualdade, Inclusão e Excelência desportiva

Nos jogos paralímpicos do Rio 2016, Portugal está representado por uma delegação de 37 atletas que competem em 7 modalidades: atletismo, boccia, ciclismo, equitação, judo, natação e tiro. O histórico das nossas participações remonta a 1972 com 11 atletas na equipa masculina de Basquetebol em cadeira de rodas. É notável a presença de 264 atletas portugueses em 9 jogos e 11 modalidades. O sucesso é só por si revelador do esforço, vontade e determinação do Comité Paralímpico português, que já arrecadou 88 medalhas, das quais 25 medalhas de ouro.
É admirável a capacidade de resiliência destes jovens atletas que, ultrapassando todas as barreiras físicas, conseguem a motivação para cumprir objetivos, alcançar resultados e celebrar em grupo os sucessos de todos. Vidas difíceis, muitas vezes determinadas por fatores genéticos, que devem servir como referência a todos nós. Um dia a dia que surpreende pela positividade com que se encara a vida. A família, os amigos, o trabalho e toda a comunidade têm a obrigação de incentivar projetos sociais vocacionados para tratar e acompanhar pessoas diferentes. Os responsáveis políticos têm o dever de minorar barreiras físicas, promover a igualdade de oportunidades, acentuar a proteção de crianças, jovens e adultos de forma a proporcionar a todos uma vida confortável e feliz.
Muito se tem feito, neste Governo, em matéria de inclusão social. A criação da Secretaria de Estado da Inclusão das Pessoas com Deficiência, liderada por Ana Sofia Antunes, a primeira secretária de estado cega, foi uma conquista de relevância política e institucional. Foram definidas “…um conjunto de prioridades ao nível daquelas que serão as revisões de acordos existentes para respostas sociais da reabilitação, do acolhimento e das residências...vão ver-me sempre lutar pelas soluções que são pela inclusão e não pela segregação.”
A nível autárquico, é reconhecida a necessidade de priorizar alguns aspetos arquitetónicos, como a eliminação das barreiras físicas à mobilidade, a promoção e apoio a projetos locais de inclusão social e qualificar as respostas a situações urgentes. A aposta em programas específicos para a inclusão de pessoas com deficiência deve também ser cumprido de forma escrupulosa pelos serviços públicos.
Em Mirandela, a Associação Portuguesa de Pais e Amigos do Cidadão Deficiente Mental APPACDM, realizou – como habitualmente, uma sardinhada solidária. Um momento de festa e celebração que reuniu utentes e familiares, trabalhadores, amigos e dirigentes. Música, dança e animação fizeram parte da festa. Um ambiente fantástico que serviu também para unir laços de uma família motivada em superar os obstáculos da vida. Naquele final de tarde, em conversa com o nosso conterrâneo e amigo Hilário, fiquei a conhecer melhor a dedicação ao trabalho na Escola Superior de Comunicação, Gestão e Turismo em Mirandela e a paixão pelo desporto. Uma vida dedicada aos outros e à amizade retribuída de muitos com os quais partilha momentos felizes.
Como nos jogos paralímpicos, à distância de um oceano, a participação portuguesa sob o lema “Igualdade, Inclusão e Excelência desportiva”, revela a admiração incondicional de vidas de força, coragem e vontade de vencer. Força Portugal!

Os novos Pokémons

Há muitos anos não era habitual sofrer-se de stress e ansiedade. Pelo menos nestes termos e na versão diagnosticada de outras problemáticas a que nos fomos habituando como a hiperatividade, a depressão ou o esgotamento. Atualmente, acedemos a mais informação e a grande tarefa é saber separar o “trigo do joio”, o conhecimento fundamentado ou o saber científico devidamente alicerçado.
As fontes de informação fazem parte da nossa vida. Tendo, como julgo, aspetos fortemente positivos, torna-se uma dependência orgânica, difícil de gerir. Os contactos, as relações, a disponibilidade imediata faz parte da vida de milhares. Experimentem deixar um dia o telemóvel em casa. Aposto que, de forma repetida, o vão ouvir tocar, procurar atender, ir às redes sociais ver as novidades…enfim, um cem número de tarefas incluídas no “pacote virtual”. Um pequeno objeto tornou-se mais importante que outros adereços, só ultrapassado por necessidade de leitura, pelos óculos graduados.
Uma revolução tecnológica que veio revolucionar a nossa relação com o Mundo e do Mundo connosco. A relação é recíproca e vem alimentar espaços vazios que se foram construindo.
A nova febre dos Pokémons veio transformar mais ainda esta visão virtual. Tratam-se de ruas reais em espaços virtuais, figuras virtuais em espaços reais. É realmente estranho, mas percebe-se bem quem “anda à caça de Pokémon”. Absortos, sozinhos ou em grupos relativamente reduzidos, vão até onde há pokémons para caçar. Mudam-se rumos e caminhos, não se vá perder um ou outro mais “valioso”. 
A empresa Niantic, startup da Google criou o “Pokémon Go” para a Nintendo. Sem muitas instruções sobre como jogar, são os próprios jogadores que pelas ruas, ensinam outros. Dizia uma amiga que pelo menos agora o filho sai de casa, permitindo que se tornasse mais ativo em vez de passar horas no quarto a jogar. Há sempre o lado positivo de novas situações e inovações tecnológicas. É preciso, como tudo na vida, saber usar com moderação.
O jogo completou 6 meses de vida, provocando nos jogadores alterações comportamentais. Pesquisando sobre esta nova realidade, constatei ser possível caçar mais de 150 monstros coloridos em locais bem diferentes, podendo ser classificadas situações distintas como divertidas ou realmente arriscadas.
"Caminhe, pedale ou ande num comboio para caçar todos!", diz uma empresa no perfil da conta, antes de advertir os fãs para estarem sempre atentos ao que se passa à sua volta. Existem também as Pokétours. Desta vez são motoristas que levam os passageiros a caçar monstros raros e altamente procurados.
Numa visita de alunos da secundária do nosso distrito a diversão também passou por saber e conhecer os Pokémons sedeados na Assembleia da República. Pelos vistos, no exterior, existiam vários, mas o melhor de todos foi no Marquês, em Lisboa. Pena que o autocarro não permitisse dar uma volta diferente para que fosse possível dar caça integral às ambicionadas criaturas.
O stress e a ansiedade, a hiperatividade e todas as formas e sentimentos negativos são fortemente penalizadores nos nossos jovens, mas também em adultos, que vão sendo “testados” a novos perigos e mais e novas “dependências”. Um jogo de monstros coloridos, os espaços virtuais em ruas reais e figuras virtuais em espaços reais…os novos Pokémons.

Porta de Ferro

Foi numa terça feira, já em pleno mês de agosto. Em época de férias para muitos de nós, mais um dia de Verão igual a tantos outros, intramuros de um estabelecimento prisional. Bem no coração da cidade de Bragança, onde tantas vezes passei para ir à Zona Agrária localizada mesmo em frente, um edifício semelhante a outros tantos espalhados pelas nossas cidades. A diferença reside em grades nas janelas e muros altos. Um jardim e hortas bem tratadas. O portão abriu-se e logo à entrada um guarda prisional a controlar as visitas. Cá fora o Senhor Diretor e o Senhor Adjunto aguardavam a minha chegada. À hora combinada, entrei. Lá dentro, mas ainda fora de portas, decorria a vida normal e as tarefas a realizar por alguns que, apesar de detidos, trabalham no exterior. Na semana seguinte iniciava-se um curso de operador agrícola, justificando o trator estacionado no parque.

Era a primeira vez que entrava num estabelecimento prisional, julgando eu ser um ambiente completamente desconhecido. Enganei-me redondamente. A familiaridade de trato e o reconhecimento de algumas caras, umas conhecidas outras amigas de escola, resultaram em reflexões sobre as voltas da vida e despertaram o interesse, já antigo, sobre o funcionamento do sistema prisional em particular do nosso distrito. Um conhecimento que devemos aprofundar e estudar causas e motivações da elevada frequência de reincidências.

O meu colega Zé reconheceu-me logo. Eu também. Já não o via há longos anos, mas as feições mantêm-se, apesar da dureza da vida. O olhar, o sorriso e a voz eram-me familiares. Gostei de o ver. Falámos dos amigos em comum, das vidas de todos e do período de festas na nossa Terra. A vida levou-o ao mundo das drogas e desde aí têm sido muitos os anos que permanece neste lugar. Um rapaz muito talentoso que não soube tratar de si, nem dos seus. Nasceu e cresceu num bom ambiente familiar e talvez tenha tido o azar de encontrar caminhos demasiado tortuosos que não teve forças para abandonar.

Lá dentro, depois da porta em ferro, um espaço, tal e qual como o conhecemos pela televisão. Em baixo, celas contínuas e um varandim superior com a mesma disposição. Um espaço exterior, com muros altos, a que chamam recreio. Sabiam da minha visita e aproximavam-se para cumprimentar. Sempre, sempre educados e com boa relação com guardas e direção. Muitos questionavam-me sobre as festas, a noite dos bombos, ficando a promessa de que sairiam logo que lhes fosse autorizado e não voltariam a entrar neste lugar. Um sítio que merece ser qualificado, mas que mantém um ar limpo e arranjado. Têm espaços de dormir exíguos e áreas comuns apertadas. Ninguém pensaria poder ser nenhum hotel, mas concordo ter que haver condições de higiene e salubridade.

Hoje, este drama afeta muitas famílias. Não escolhe estratos sociais, género ou idade. A criminalidade pode entrar pela porta dentro sem que para tal haja necessariamente responsáveis diretos.

Hoje, eles. Amanhã, outros. As grades permanecerão e os muros são altos, como gigantes são os medos sentidos dentro e fora da porta de ferro.

 

 

Sentir do Ferroviário

Dizem os sábios das nossas terras que as memórias mais antigas vão sendo recordadas com o decorrer dos anos. É mesmo assim. O meu avô Tatá, conhecido por todos, especialmente por todos quantos frequentavam há décadas atrás, o café Mira, teve uma vida saudável durante os seus 100 anos. Era uma pessoa especialmente afável, com um espírito de humor imparável, sempre oportuno em todas as suas dicas aos mais novos. Os comboios sempre foram a sua paixão, apesar de durante anos a fio ter convivido com o desgosto de não ter tirado a carta de condução. À época, como ele tão bem retratava, não era necessário, porque não pagava bilhete de comboio e tal era extensível a toda a família. Já o meu bisavô Lima, ferroviário também e, por sinal, respeitado em todas as estações que chefiou, tinha uma grande família, como também era habitual à época. Viviam nas estações ferroviárias de então e foram aprofundando a proximidade com o “sentir do ferroviário”. Anualmente, o meu avô e amigos organizavam um almoço em Mirandela, onde juntavam dezenas de colegas. Ainda temos, felizmente, fotografias destes convívios. Um dos últimos, foi na Residencial Globo, onde o meu avô fez um discurso com alma e coração.
Recordo-me perfeitamente da primeira viagem de comboio, acompanhada pelo som caraterístico das nossas antigas locomotivas e carruagens, dos cheiros típicos e da buzina à chegada a cada estação. As viagens até ao Porto, as paragens no Tua e as paisagens únicas da linha que fazem parte da memória coletiva de todos os estudantes da minha geração.
Sempre gostei de andar de comboio. Infelizmente, não pelas nossas terras. Foi, nos idos finais da década de 1980, um golpe duro à nossa interioridade e riqueza regional, altura em que o governo de então e a CP planearam o encerramento de grande parte das linhas secundárias em Portugal. Ficamos sem comboio e estamos seguramente mais pobres.
A história do comboio em Mirandela e em todo o Distrito (como julgo em Portugal) fortaleceu todo o crescimento urbano, ainda hoje visível, nas proximidades das estações ferroviárias. Em Mirandela, a estação ferroviária ao abandono desde o encerramento da linha, tem criado um movimento da sociedade civil, em torno da legítima qualificação do edificado. Há umas semanas o apelo de um anónimo figurava na entrada principal da estação. Está escrito: “Não me deixem cair” numa faixa branca, visível por todos quantos passam numa das ruas mais movimentadas da cidade, particularmente nas viagens do centro até ao nosso Liceu. Concordo e apoio esta luta! Desde os tempos ainda do meu avô a todas as novas gerações, o poder político nada fez para preservar este e outros edifícios que fazem parte da memória de todos. Vale a pena recordar também as palavras de uma historiadora brasileira, bem a este propósito: “Um povo sem memória é um povo sem história. E um povo sem história está fadado a cometer, no presente e no futuro, os mesmos erros do passado.”

Política de Afetos

Há muitos anos que convivíamos diariamente com a personalidade política do Professor Aníbal Cavaco Silva. Uma figura austera, rígida que motivava receios e eliminava proximidades. Sendo o político que mais anos esteve no poder, enquanto primeiro-ministro e, depois, como presidente da república, assumiu sempre um poder distante do povo, exceção feita a períodos eleitorais. 
A mudança de perfil presidencial a que temos vindo a assistir, veio confirmar que passámos do chamado “8 para o 80”. A afetuosidade que a figura do atual Presidente da República manifesta, surpreende os Portugueses, justamente, parece-me, pelo contraste com a personalidade de quem ocupou o cargo até há pouco tempo.
Em visita ao Distrito de Bragança, o Presidente da República veio visitar diferentes concelhos, instituições e empresas. Em todas as ocasiões, o nosso Presidente tem um sentido de humor adaptado às circunstâncias, assumindo-se como o unificador de vontades e sentires. Esta mensagem vai passando junto de todos, até dos que iam desconfiando desta nova missão presidencial. Pois bem, confirmou de viva voz a qualidade dos autarcas socialistas e a dificuldade de fazer política no interior do País. Ficou assim o convite para voltar a visitar o nosso distrito e conhecer outras realidades e outros concelhos.
Como há uns dias partilhei, a política é a arte de transformar o impossível em realidade. A política dos afetos é reconhecida como de proximidade, que inclui naturalmente a capacidade de ouvir e retornar respostas. Uma agenda complicada não pode justificar o afastamento da realidade vivida pelos nossos conterrâneos. Preocupa-me fundamentalmente que se perca a noção da realidade, quando envolvidos e imersos em diferentes escalas de poder. Por isso mesmo, vemos políticos com comportamentos distintos em períodos eleitorais e não eleitorais, internamente em estruturas partidárias e externamente em contacto com as populações.
No nosso Distrito existem projetos muito interessantes, que encaixam como luva neste tema. As Universidades Sénior conferem simpaticamente um projeto de aprendizagem e de afetos entre gerações que se distinguem das demais pela experiência, serenidade e capacidade de multiplicar ideias e conhecimentos. Sempre que se aborda, como prioridade política, o envelhecimento ativo, só posso concordar. Duas razões fundamentais. Uma delas porque representam os mais conhecedores, sendo uma mais valia para qualquer sociedade. Outra, porque pessoas ativas contribuem para o bem-estar social.
Asseguro-vos que, na função de deputada existe uma realização pessoal e política que ultrapassa o caráter formal. Trata-se da oportunidade de aprender com todos. Poder receber jovens de diferentes escolas do distrito na assembleia, reunir com instituições e empresas para conhecer e apoiar a resolução de problemas, divulgar a nossa cultura e tradições, trabalhar em iniciativas legislativas que promovam o desenvolvimento estrutural, em particular na área agrícola e alimentar. Defendo de forma intransigente o nosso Distrito, também porque somos pessoas de afetos.

Nota: Portugal está na final do Euro 2016. No próximo domingo, disputamos com a França o Campeonato da Europa. Quando for publicado este artigo já conheceremos o resultado. A nossa seleção já é, seja qual for o desfecho, uma vencedora.
 

Justiça Territorial

O distrito de Bragança, um território de excelência no contexto nacional, é como disse – e bem, o nosso presidente da Comunidade Intermunicipal “uma oportunidade e não um encargo para Portugal”. As políticas de valorização da coesão social e territorial, referidas na Moção apresentada ao 21.º Congresso por António Costa e a apresentar no âmbito da Unidade de Missão para o interior, terão que rumar ao encontro das nossas necessidades, das expetativas e da justiça territorial que Portugal anseia.
A Moção “Cumprir a alternativa, consolidar a Esperança” refere-se assim à justiça territorial: “os dados conhecidos sobre a distribuição dos fundos aprovados atestam que não está a ser cumprido o objetivo de promover a coesão territorial, o que significa que não foi devidamente acautelado o contributo deste instrumento financeiro para o desígnio europeu da convergência.”
Estes dados foram confirmados no primeiro diagnóstico com estatísticas das empresas de Trás-os-Montes apresentado pelo IPB, no passado dia 27 de maio, em Bragança, no fórum sobre "Empreendedorismo e Coesão Territorial", promovido pela Associação Empresarial NERBA. Foram debatidos os apoios e a execução de fundos comunitários, no âmbito do Portugal 2020. Uma das conclusões apresentadas, no plano da coesão territorial, foi a de que os sucessivos Quadros Comunitários de Apoio não permitiram corrigir as intensas assimetrias de desenvolvimento que existem na região Norte, ou mesmo desta face ao resto do país.
No atual quadro de políticas, na implementação do Portugal 2020, e apesar das grandes expetativas iniciais, os atuais dados de execução, tanto dos Programas Operacionais Nacionais como do Programa Regional, demostram uma preocupante assimetria na concentração de incentivos na Região Metropolitana do Porto e NUT limítrofes do litoral.
A aplicação do Programa Regional “Norte 2020” está a gerar profundos desequilíbrios internos na região Norte. As três CIMS do Interior - Terras de Trás-os-Montes, Alto Tâmega e Douro representam, no seu conjunto pouco mais do que 3% do total dos apoios aprovados até ao momento. No “Norte 2020” de um total de 376 mil milhões de euros de apoios, as três CIM conseguiram 12 mil milhões de euros.
Mais grave ainda porque este desequilíbrio mantém-se em outros Programas Nacionais, com particular incidência no COMPETE 2020. Neste programa, de um total global de apoios na ordem dos 430 mil milhões de euros, 2,5% foram para as CIM do interior, representando valores abaixo dos 11 mil milhões de euros. A área metropolitana do Porto arrecadou mais de 50% dos apoios da Região Norte.
Ao Governo compete, nas palavras do Presidente do Partido Socialista Carlos César em debate quinzenal na Assembleia da República: “desfazer o que foi mal feito, refazer o que foi destruído, e fazer o que é preciso fazer”.

SOS Animal

Na altura de decidir sobre a universidade a que concorreria, optei pelo curso de Medicina Veterinária, essencialmente pelo gosto de trabalhar em segurança alimentar, na empresa de alheiras do meu Pai. Na minha família sempre tivemos animais de estimação, cães e gatos. Na cocheira, havia um pátio onde estavam dois pastores alemães, o King e a Queen. Ao lado, na cortinha do Sr. Arnaldo, um amigo da família, pai do Isidro e da Iolanda, pernoitavam duas vacas leiteiras, onde diariamente íamos buscar o leite para casa. Na cortinha, tratada de forma exemplar, o Arquiteto Mendo tinha uma horta onde plantava com toda a perícia e dedicação, morangos e alguns hortícolas. Andávamos por ali de bicicleta e no fundo a ribeira, muitas vezes sem água no verão, permitiu-nos uma infância entre o café Mira e a cortinha do Sr. Arnaldo. Mesmo no centro de Mirandela, a natureza foi o pano de fundo das nossas vivências.
Os animais, convenientemente tratados, tinham o seu espaço próprio e conviviam saudavelmente com todos. Lembro-me que era essa a normalidade do “campo” e vivíamos felizes essas rotinas.
Hoje em dia, assisto a debates constantes sobre animais de estimação e de alguma forma vocacionados para a humanização de cães e gatos. Concordo com um projeto lei do PS, aprovado recentemente na Assembleia da República, que altera o código civil e estabelece um estatuto jurídico próprio dos animais, reconhecendo a sua natureza de seres vivos dotados de sensibilidade. Parece-me óbvia a diferença de tratamento aos animais no campo e na cidade. No meio rural, a grande maioria não passa da “condição de animais de companhia”, permanecendo ao ar livre, alguns mantendo o trabalho com os rebanhos, onde o pastor os sabe tratar, mas também como animais de companhia, contrariando a solidão dos mais velhos e mantendo a condição livre. Nos grandes centros, assistimos a uma suposta “humanização” dos animais de companhia que, pela necessidade de conforto, acompanhamento, e pelo constrangimento de espaços de apartamentos exíguos, os animais permanecem em espaços reduzidos, apenas com regulares passeios à rua. Uma vida animal distinta do meio rural, onde me parece que os cães e gatos mantêm uma vida livre como animais que são.
Por outro lado, assistimos a um fenómeno lamentável de abandono de cães, quando a situação financeira não se compadece com gastos na alimentação e em assistência veterinária dos cães. Também nestes casos, o País não tem soluções milagrosas estando, no entanto, em curso em muitos canis municipais campanhas de adoção de animais. Como em tudo na vida, devem existir políticas locais, regionais e nacionais apropriadas à nossa realidade, que estimulem o bem-estar dos animais, mas que não pretendam criar uma metamorfose em seres humanizados. A continuar assim, haverá que criar uma linha de apoio SOS animal. Sim, essa sim, caricata. Na cocheira, na cortinha do Sr. Arnaldo, os animais eram tratados como animais. E eram “felizes”, assim.

“Supercola 3”

Há alguns meses, escrevi um artigo de opinião sobre a CRESAP, Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública. A forma aparentemente transparente como se avaliam e recrutam altos dirigentes tem sido frequentemente referida pelos responsáveis políticos. O último Governo PSD/CDS, criou a CRESAP e com esta organização tentou “tapar o sol com a peneira”, promovendo três candidatos, tendo a tutela que selecionar “o escolhido”. Talvez, por isso, os preferidos correspondessem ao perfil desejado incorporando o alinhamento político necessário.
Se refletirmos sobre o papel de cada alto dirigente em cada instituição pública e verificarmos que cada um deles terá forçosamente que cumprir as orientações políticas do Governo, facilmente chegamos à conclusão inevitável que terá que existir confiança política e lealdade institucional. Sem pôr em causa a razoabilidade pessoal inerente a estes cargos, há que retirar várias ilações sobre a permanência destes altos dirigentes.
Quando, há já 20 anos, comecei a trabalhar na Direção Regional de Agricultura, existia a figura implícita do “colocar o lugar à disposição”, mesmo em lugares de direção intermédia. Vislumbrava-se assim que o nosso dirigente pudesse não “querer” trabalhar connosco, por razões de ordem meramente política, se fosse o caso. Atualmente perdemos essa figura e demos lugar a uma espécie de “supercola 3” nos lugares de alta direção.
Convém recordar que o anterior Governo e concretamente o Ministério da Agricultura era liderado pelo CDS/PP. O mesmo Diretor Regional, antes alinhado com as políticas defendidas pelo CDS e atualmente dirigente distrital do mesmo partido, mantém-se. Estará agora alinhado com as políticas do Governo PS, de acordo parlamentar de esquerda, que tanto é criticado pelos companheiros de partido? É seguramente estranho um dirigente partidário despir o fato de diretor, sob a tutela de um Governo PS, e, depois das horas de serviço, passar a ser o presidente distrital do CDS/PP.
Parece-me óbvia a incompatibilidade ética e moral da situação, ainda que possa ser defendida pelos altos dirigentes que asseguram ter preenchido os requisitos de concurso em que só faltaria mesmo ter a fotografia do escolhido.
Julgo existir em Portugal a necessidade expressa de fazer a separação entre cargos de confiança política e cargos meramente técnicos que poderão ser transversais a todos os partidos políticos e a todos os Governos. Sem essa separação caímos no ridículo ciclo partidário e assegura-se o palco institucional a altos dirigentes que, julgando-se altamente qualificados para o lugar – o que nem sempre acontece, se perpetuam no poder da administração pública.
Um tema polémico, mas que contribuirá certamente para que haja uma ponderação conjunta do que pretendemos para o futuro do nosso País. Uma administração pública orientada, nos cargos de alta direção, com os objetivos estratégicos do Governo ou uma obscuridade absoluta em resultado de concursos manipulados e perpetuadores de um mal-estar institucional, não assumido pelos dirigentes “supercola 3”.

Serra das Memórias

A estrada serpenteada da Serra do Marão foi conduzida durante décadas e décadas por Transmontanos e visitantes. Já nessa altura se registavam muitos acidentes que assinalavam o seu lado negro e violento. Aqui e ali, imensas filas de carros a aguardar, entre ravinas, a chegada dos bombeiros para desobstruir a estrada. O som das ambulâncias ecoava no silêncio sepulcral. Sabíamos o perigo daquela estrada e em alguns lugares era assustadoramente evidente. Encostas inteiras, muitas vezes fustigadas pelo fogo, permaneciam inalteradas anos e anos. A insegurança era vivida com preocupação pelos adultos, mas sempre desvalorizada pelas crianças.
Os momentos de descanso interrompiam a exaustão da viagem. Recordo com saudade, as merendas à sombra do arvoredo, os piqueniques nas fontes naturais, a excelente água da Serra, a família reunida nas longas horas de viagem entre Mirandela e o Porto e no caminho de regresso. O dia de viagem começava bem cedo. A minha Avó Alaíde preparava os “tupperwares” dos bolos de bacalhau, os rissóis e os panados, acompanhados com o pão da D. Inês, as laranjadas tang em arcas frigorificas coloridas coincidiam com a frescura dos dias. Em agosto, depois da noite dos Bombos, partíamos habitualmente para o mês de férias nas Caxinas. A carrinha Toyota Hiace transportava-nos bem repleta, até ao destino final. No Marão repetiam-se as curvas contracurvas, solavancos e demoras sucessivas, pela passagem de um camião maior.
O Marão sempre caraterizou as nossas gentes e o nosso território. Como Miguel Torga bem apreciou em um Reino Maravilhoso: “Vê-se primeiro um mar de pedras. Vagas e vagas sideradas, hirtas e hostis, contidas na sua força desmedida pela mão inexorável dum Deus criador e dominador. Tudo parado e mudo. Apenas se move e se faz ouvir o coração no peito, inquieto, a anunciar o começo duma grande hora. De repente rasga a espessura desembainhada: - Para cá do Marão, mandam os que cá estão!.... Sente-se um calafrio. A vista alarga-se de ânsia e de assombro. Que penedo falou? Que terror respeitoso se apodera de nós?”
Da Serra, memórias permanecerão inalteradas em todos os Transmontanos. Umas boas, outras assustadoramente más. Muitos anos passaram e, finalmente, estamos a dias de inaugurar o Túnel do Marão. Um sonho concretizado, uma mais-valia óbvia para todos – e são muitos, que “passam o Marão”. Um investimento que terá o óbvio retorno para o desenvolvimento socioeconómico do interior, fundamental para a coesão territorial.
Ainda a este propósito, recentemente, um amigo do Minho abordando o custo excessivo pela paragem da obra, garantia que o túnel não era necessário, porque não havia pessoas. Dizia ele que “Era um investimento avultado, para ficar às moscas”. Fiquei surpreendida pela ignorância. Defendia, como contraponto e com unhas e dentes, uma fábrica de pneus da Continental Mabor, em Vila Nova de Famalicão que estava sem acessos e onde trabalhavam 3.000 pessoas. Havia que estabelecer prioridades, dizia o Senhor. Expliquei-lhe depois a necessidade do Túnel e o potencial de crescimento regional que poderá catapultar. Das memórias da Serra ficará o eterno horizonte e o silêncio sepulcral. O pior e o melhor dos Mundos no mesmo Marão. Felizmente, a serra das memórias manter-se-á viva.