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O 25 de Abril

Eu não conheço o Sr. Henrique Pedro. Conheço a sua escrita que leio aprazivelmente neste jornal. Porque neste País que maltrata a sua língua aqueles seres empenhados em a defender, o caso de Henrique Pedro, merecem atenção, entendo por bem tecer considerações acerca do seu artigo relativo ao acto restaurador da liberdade de expressão de pensamento, da assumpção de podermos votar de acordo com os ditames desse mesmo pensamento, defender opiniões e conceitos contrários aos de outrem, em suma: a possibilidade de respirarmos sem receio de um espirro suscitar perseguições e entrada, pelo menos, nos arquivos da PIDE. Ora, o acima referido não o conquistámos como conquistámos possessões em várias partes do Mundo, foram os militares de Abril que corporizo no meu antigo vizinho e estimadíssimo amigo Fernando Salgueiro Maia, e não nos militares do exército fujão, assim apelidado por Marcelo Caetano.
O Sr. Henrique Pedro no seu artigo fala em três golpes de Estado no dia em que fui de Santarém para Lisboa às seis da manhã com a finalidade de ouvir uma aula teórica do sábio Padre Manuel Antunes, duas práticas sob a égide do agora Professor Doutor José Matoso, filho do autor de um célebre manual de História Universal, livro único do terceiro ao quinto ano do ensino liceal e na esperança de poder assistir à consumação dos zuns-zuns soprados e ouvidos na Livraria Apolo situada nos rés-do-chão do prédio onde vivia, frequentada amiudadamente pelo Maia, o Palma (morreu general), que o general José Carlos Cadavez conheceu pois o Fernando Salgueiro Maia comprazia-se em levá-lo à livraria vigiada pela PIDE, por isso mesmo o nosso conterrâneo capitão José Augusto Fernandes, comandante da PSP escalabitana, pisou o risco e fez o favor de me avisar. O Comandante Carrazedo (era a sua alcunha) posteriormente à acção vitoriosa viu-se confirmado no cargo e, nessa conturbada, veio posteriormente a comandar a PSP dos distritos de Évora e Portalegre, sendo estimado na cidade do gótico enquanto nela viveu. Se o Sr. Henrique Pedro reparar os militares referidos neste texto verificará serem plurais no pensamento, até opostos, iguais na qualidade de oficiais do exército. 
O seu artigo carreia palavras a justificarem a sua asserção, não contrario a tese apesar de nas dezenas de livros lidos que possuo sobre a revolução (termo em sentido muito restrito no meu modesto entender), os depoimentos e relatos ouvidos e comentados pelos principais intervenientes no processo contrariarem o expendido pelo também colunista do Nordeste.
O golpe resultou, os desvios e entorses sofridos provocaram dor mental e sofrimento físico podem não ter logrado a plena e conveniente reparação (o Maia foi removido para os Açores pelo seu amigo Ramalho Eanes) enquanto outros foram catapultados e exerceram funções derivadas da aplicação dos conceitos – em terra de cegos…, dos enganos comem os escrivães –, são consequência de mesmo nas revoluções sem sangue e dos cravos muitos dos seus filhos são vítimas de si próprios como o genial Francisco Goya lembra pungentemente no quadro Fuzilamentos de 3 de Maio.
Admito, aceito, azedumes contra a data que se tornou universal gostem ou não os seus compungidos detractores, admito, aceito pontos de vista a colocarem em causa posições e atitudes de bazófias e arrogâncias de quem devia ser humilde, já não aceito agressividades a atingirem o calafrio da utilização de armas e ataques físicos a defensores dos ideais expressos no manifesto do MFA sem deixar de considerar um hediondo desastre: a chamada descolonização. 
O seu artigo tem o mérito de permitir-me após a menção da data colocar o advérbio SEMPRE. Por tudo, até pelas desilusões Sempre.

Vendavais - O regresso

Eles não chegaram a partir. Talvez tivessem gostado de o fazer, mas não lhes deixaram alternativa. Não permitiram que abandonassem o seu lugar de permanência. Obrigatoriamente, ficaram retidos, para o bem e para o mal, mas retidos. Simplesmente retidos.
Na inimaginável sensatez e docilidade do jovem ser humano, eis que cumprem contrafeitos, mas sensatamente a determinação que os impede de sair e ir ver a namorada, o amigo, o tio, a avó. Durante quase dois meses ficaram presos a dois mundos: ao interior e ao exterior. Parecem antagónicos e talvez o sejam, mas são duas realidades a que não puderam fugir. O mundo interior que se resume ao local onde permanecem e o exterior ao qual não têm acesso e lhes está vedado. É como se estivessem numa encruzilhada, mas sem alternativa de escolha. Quem são eles afinal?
Todos estamos a viver uma situação para a qual não estávamos preparados e nem sequer sonhávamos que pudesse vir a acontecer. Enfrentar uma tão terrível epidemia é uma obra que arrasta toda a humanidade, que a responsabiliza e não lhe deixa alternativa. Tem de participar na luta global. 
As escolas fecharam antes da Páscoa e os alunos, retidos, não puderam continuar as aulas como costumavam. Não voltaram à escola, não voltaram a ver os colegas, os professores, os auxiliares, o espaço por onde corriam, saltavam, jogavam ou simplesmente se sentavam para ouvir a lição do mestre. Daí para a frente não saíram de suas casas. Mas um período novo surgiu nas suas vidas e tiveram de se adaptar. As aulas começaram a ser dadas por várias plataformas e eles, alunos e professores, viram as suas vidas seguirem rumos paralelos, mas totalmente diferentes do que era habitual. Ficaram todos retidos. Confinados. Presos em casa e ao computador. Por quanto tempo? Incógnita.
Depois do confinamento a que praticamente todos ficámos sujeitos, a etapa seguinte é quiçá mais ligeira, mas de igual se não maior responsabilidade. O mundo está a alargar o cerco e a permitir mais liberdade, mas a luta terá de continuar. O vírus não está vencido!
Em Portugal, o tempo de catástrofe continua, mas dia 18 de maio marca o início de uma nova etapa para toda a sociedade. Tudo vai abrir lentamente até porque a economia tem de iniciar o seu caminho de recuperação. Não acabam as aulas dadas à distância, nem o teletrabalho de quem quer que seja. As aulas continuam para os alunos mais novos e que não têm exame este ano a qualquer disciplina. Mas outros, os que têm exame a alguma disciplina, têm de regressar à escola. Vão ter aulas presenciais. Vão ver os seus professores nas salas de aula, mas sob novas orientações rigorosas e confrangedoras. 
Não sei como é que se pode proibir a uma criança de dois anos, por exemplo, de estar numa sala e não brincar com os colegas, mexer nos brinquedos habituais, repartir com os amigos o que está na sala e até mesmo, impedir o tal abraço há tanto tempo esperado. Como também me custa a acreditar que, apesar de toda a sagacidade juvenil, se impeça o João de abraçar a Paula, sua namorada e que não via há dois meses. E como manter dois metros de distanciamento entre os alunos que percorrem os corredores e se dirigem para as salas de aula onde terão de cumprir esse mesmo distanciamento. Difícil. Mas a verdade é que é um primeiro passo para que tudo possa acabar bem.
O regresso é difícil. Há regressos abençoados. Há regressos esperados e costuma-se dizer que quem regressa é por bem. Pois que seja. A minha esperança é que este regresso às aulas, não traga mais um confinamento forçado que se alargue até ao final do ano e tenhamos que passar o Natal entre quatro paredes. É que já há quem diga que a segunda vaga vem em Outubro. Pode ser que até lá nos deixe dar um mergulho no nosso mar, numa qualquer costa e pisar as areias quentes onde o vírus certamente não se esconderá.

Sobre a casa

Quando era pequena odiava sair de casa. Não era sair para o quintal, ou sair para ir comer um gelado ao café, ou brincar com os amigos. Não. “Sair” no sentido de “dormir fora de casa”. No início, parecia sempre uma boa ideia. Dormir fora, noutra cama ou até no chão, num local improvisado. Algo diferente, num ambiente diferente. Ah! Que coisa maravilhosa.
Mas depois, chegava a parte de vestir o pijama e arranjar-me para dormir, efectivamente. E aí, meus amigos, caía na dura realidade - não estava na minha cama, no meu quarto, na minha casa. Pasmem-se, eu já sabia de antemão que era isso que ia acontecer. Mas só naquele momento parecia real. Só ali se concretizava. E descobria, afinal, que tudo o que eu queria era estar em casa. Quando toda a euforia de estar num sítio diferente do habitual e sem os meus mais próximos se esvaía, só queria voltar ao aconchego diário.
Há um clássico familiar, quando eu tinha uns 5 anos. Não sei bem, mas ainda era pequena. E fui passar uns dias a casa dos meus padrinhos. No início, pareceu-me uma óptima ideia. Ia, consequentemente, passar uns dias por lá. A minha mãe arranjou-me a mala. Provavelmente foi assim que aconteceu. Se escolhi alguma coisa, foram os brinquedos. O que me lembro, e que se conta como uma espécie de lenda, é que ainda nem a viagem tinha 5 minutos quando eu, já ensonada, disse “se estivesse em casa, a minha mãe já me tinha feito a cama”. Naquele momento, já não me devia parecer boa ideia ter deixado o meu lar, e assaltavam-me pensamentos em que os meus pais estavam tristes, à janela, a aguardar de forma impaciente o meu regresso. Em que estavam abalados com o facto de não terem a criança para ir deitar. Se calhar, nem era assim que se processava e até era um alívio uns dias de descanso de mim, mas o que é certo é que eram estas as imagens projectadas pelo meu cérebro.
A conclusão é que é bom viver aventuras, ver coisas novas e criar novas memórias, mas poder regressar a casa rapidamente. Hoje conservo esta dificuldade em deixar a casa para ir para outros locais, ainda que saiba que é temporário. Sempre, ou quase sempre, por períodos curtos. Muitas vezes ainda nem parti e já estou a sonhar com o momento do regresso. Quando passa o frenesim de empacotar os pertences, averiguar o que é preciso, ver se nenhuma torneira ficou a correr ou se não deixei o ferro de passar ligado à tomada, ir já não me parece uma ideia tão promissora como parecia antes, durante o planeamento, em que tudo eram expectativas.
O ideal é ir ver coisas novas e voltar logo. Voltar para o aconchego, onde sei onde estão as coisas e onde está tudo o que preciso. Na minha cabeça, este é o ideal. Nem sempre é possível assim, até que finalmente alguém invente o raio do tele-transporte. Como é que ninguém está a investir nisso? Não sei. Se eu fosse cientista ou de uma dessas novas engenharias, era o que queria inventar - o tele-transporte. Se eu tivesse 5 anos, num banco de trás do carro dos meus padrinhos, era o que me parecia bem. Ficar no meu ninho, onde eu conheço e me sinto bem. Onde está tudo o que preciso. Na minha casa. De preferência, na minha casa de quando tinha 5 anos, com a minha família para me aconchegar nos lençóis. 

 

Cronicando - HÁ LÍDERES E ASSIM-ASSIM

Nesta nova normalidade na qual tudo pode acontecer, não havendo lugar para desafios, há ainda a perplexidade face a uma nova ordem que vai fazendo o seu caminho. Sem tempo para refletir sobre o que se está a passar, dou por mim a pensar se tudo isto não será uma experiência pavloviana e as cobaias somos nós. Desejaria, acima de tudo, que isto terminasse e alguém analise os conceitos-chave com que a comunicação social nos bombardeou desde o dia treze de março e observasse a sua evolução nestes dois meses de confinamento, sobretudo, do discurso político do presidente da república e primeiro-ministro e a redundância que os mesmos apresentaram. 
As novas rotinas já se estão a instalar-se e, não fosse a necessidade das dinâmicas económicas seguirem o fluxo, continuaríamos confinados um pouco à semelhança dos habitantes da lendária aldeia retratada no livro das Aventuras de João Sem Medo. Esta situação não será de todo má desde que se continue a confiar nas lideranças e se considere o Estado paternalista e que estará sempre aí para ajudar. O problema é que governar uma nação não é governar uma casa e, qualquer primeiro-ministro necessita de delegar. Para isso é que há a figura dos ministros em função das áreas fundamentais que organizam a sociedade. E também aqui há exemplos de verdadeiras lideranças e depois há os assim-assim. Neste grupo, inserem-se aqueles que não sendo bons comunicadores, carecem de estratégias políticas e de capacidades técnicas que respondam de eficazmente aos desafios, em tempos de pandemia. E deste grupo emerge a educação que tem andado numa constante deriva e, escudando-se atrás da pretensa autonomia das escolas, não soube responder nem dar orientações claras a quem está no terreno.
Hoje, o fascínio das aulas síncronas já passou e o número dos que assistem à telescola decresceu 50%. Não vamos falar dos novos heróis, vilipendiados até há pouco, que num esforço titânico preparam excelentes aulas que maravilharam os pais, nem tão pouco dos encarregados de educação que interrompendo aulas acusam a professora de insensível ou lançam imprecações bem piores. Concentremo-nos na violação de um dos princípios fundamentais do cidadão que é o direito à privacidade, claramente posto em causa quando o professor, a pretexto de melhor comunicação, exige ao aluno que mantenha a webcam ligada e esta atitude vai sendo respaldada por diretores de agrupamento que, lá está, sob a capa da autonomia tomam decisões contrárias aos preceitos democráticos e não se ouviu nem se leu uma única linha em que a tutela clarifique o que é legal ou deixa de o ser.
Se a partir de determinado momento, deixou de fazer sentido aquela ideia da “escola para todos”, em tempos de pandemia é por demais evidente que a escola pública não é mesmo para todos. A desigualdade no acesso aos meios informáticos coloca a nu as dificuldades que há em muitas das casas portuguesas e a resposta foi diversa conforme o aluno esteja no meio urbano ou no rural. Não é o apoio das juntas de freguesia ou a colaboração da GNR que colmata as dificuldades pois há quem considere que um telemóvel basta para aceder às aulas síncronas, quando outros pensam ser obrigatório o uso do computador.  
Com o regresso à escola, no dia dezoito, não só se evidenciou que as comunidades educativas ainda não são máquinas como não se teve em consideração o preço da interioridade. Como quer a tutela que um aluno assista às aulas de manhã numa escola e esteja às catorze no seu domicílio a mais de cem quilómetros a assistir às sessões síncronas? – É que na província há os deslocados e quem tivesse alugado quarto… e também há quem esteja no estrangeiro e não consiga regressar.
Dividir as turmas para manter o distanciamento social poder-se-ia considerar uma boa medida, até porque há muito se reclama pela redução do número de alunos. No entanto, também é verdade que os agrupamentos já preparam o novo ano letivo e, surpreendentemente, nada foi necessário fazer em termos de candidaturas já que, a pretexto da pandemia, por ordem do ministério, as direções gerais tomaram a iniciativa de preencher os formulários com igual número de alunos ao do ano de 2019/2020, pelo que voltaremos a ter turmas de 36 alunos. em alguns casos.
Com efeito, ou a pandemia foi um pré-teste para novos tempos que se avizinham ou o sistema educativo é o parente pobre onde tudo é assim-assim, e publicamente me retrato da reação extemporânea que tive quando um estudioso destas questões afirmou: “A escola de hoje é o mundo do faz de conta onde qualquer um pode reinar”.

 

Nós trasmontanos, sefarditas e marranos - Manuel Lopes um judeu do tempo da inquisição 2

No último texto ficámos na inquisição de Barcelona com o Manuel Lopes a dizer que as declarações feitas anteriormente eram falsas e que agora, sim, diria toda a verdade. Vejamos.

 

Confessou então que não nasceu no mar de Itália, mas em Portugal, na vila de Torre de Moncorvo, onde o batizaram. E que tinha 2 anos quando o seu pai morreu, em Mogadouro (1) e ele foi levado para Lebução, para casa de sua tia paterna, Isabel Cardosa, casada com Lopo Nunes.(2) Falou também dos irmãos, cuja existência antes negara.

Em Lebução, até aos 8 anos, frequentou a escola e aprendeu a ler e escrever, bem como a doutrina cristã. Depois, os tios foram-no introduzindo no judaísmo (3) e ele passou a frequentar as “juntas e congressos” que se faziam em casa dos mesmos tios e em que participavam outros cristãos-novos das suas relações.

Cumpridos os 12 anos de idade e catequizado na lei de Moisés, a tia mandou-o para Bragança, onde vivia um seu irmão, 7 anos mais velho, chamado João Ventura, em cuja casa ficou morando. João era tecelão de sedas, ofício que Manuel Lopes começou também a aprender. 

Em Bragança, com o irmão, viveu cerca de ano e meio. Nesse tempo, por 1696, reencontrou um segundo irmão, o mais velho de todos, chamado Luís Lopes Penha, que morava em Castela, em Benavente, metido no negócio do tabaco. Deslocou-se a Bragança, para casar com Ângela Gomes, filha de Manuel da Costa e, como “chefe” que era da família, para concertar o casamento do irmão João Ventura, com Beatriz Pereira, sua parente, da vila de Chacim.

E foi para Chacim que Manuel e João foram morar, casando-se este com a noiva citada, filha do falecido Bartolomeu Pereira. Ali ficaram morando por ano e meio, fabricando e vendendo sedas, com Manuel a cumprir as ordens do irmão.

Por 1697, deixaram Chacim e foram os três para Lisboa, levando também uma irmã de Beatriz, chamada Maria Manuela. Instalaram-se em uma casa da rua da Figueira, paróquia de S. Nicolau, “empregando-se em fazer chocolate e vender”.

Estando em Lisboa, Manuel Lopes teve oportunidade de assistir à celebração de um auto-da-fé, em 9.11.1698. Nele foram penitenciadas 39 pessoas, várias delas de Trás-os-Montes. Foi o caso de Francisco Rodrigues Coelho, o Riqueza, de alcunha, natural de Vimioso e morador em Bragança. (4) Tinha sido preso em 30.5.1698 e o processo decorreu em Coimbra, tendo sido condenado em cárcere a arbítrio e penitências espirituais. Certamente porque nos cárceres de Lisboa havia falta de prisioneiros para sair no auto, trouxeram-se, de véspera, os presos que estavam despachados em Coimbra, para que o auto-da-fé tivesse mais brilho e dignidade. 

Manuel Lopes havia conhecido o Riqueza em Bragança, morando ao cimo da Rua Direita, o qual era também conhecido pela alcunha de Cara de Renegado, “porque tinha muito má cara”. A respeito deste auto, contou Manuel que se realizou “no pátio sagrado, antes de entrar na igreja dos Domingos (sic), se levantou ali um tablado e adorno para a dita função”. (5)

Sobre o Cara de Renegado, diremos que, depois de sair penitenciado, se ficou a viver por Lisboa, e será um dos fugitivos do navio de Nª Sª la Coronada, juntamente com a mulher e 3 filhos.

Em Lisboa, entre os membros da nação vindos de Bragança, destacava-se João da Costa Vila Real, grande mercador. Manuel conhecera-o em Bragança, mas nunca privou com ele, nem entrou em sua casa. Em determinada altura, adoecendo o seu irmão João Ventura e passando alguma necessidade para sustentar a família, escreveu uma missiva para D. Leonor Nunes, mulher de João Vila Real, contando-lhe as suas necessidades e pedindo-lhe ajuda. E disse ao Manuel que fosse a sua casa levar-lhe a carta, como ele próprio contou:

- E com efeito, havendo ele levado à dita mulher o dito papel, logo que o leu, lhe deu a ele confessante alguns reais, para que os levasse a seu irmão; e lhe parece que voltou a ver a dita mulher para o mesmo efeito de socorrer o dito seu irmão, 3 ou 4 vezes mais, e o socorreu em cada uma delas com alguma quantidade, que não recorda qual foi; e muitas vezes a dita mulher, nas vésperas do sábado, enviava socorro ao dito seu irmão, por intermédio do seu filho mais velho, sem ter-lhe pedido então nada… (6)

Na primavera de 1699, Manuel Lopes reencontrou em Lisboa os tios que o criaram e muitos outros parentes, amigos e conhecidos de Lebução, Bragança e Chacim que, fugidos da inquisição, rumaram a Lisboa e, em 13 de abril, se embarcaram no navio Nª Sª La Coronada, com destino a Livorno. Disso falaremos adiante.

Eles próprios, o Manuel e o irmão, ainda em Chacim, terão sentido também apertar-se o cerco da inquisição e planearam a fuga para Lisboa e Livorno, o que aconteceu no ano seguinte. Veja-se a descrição dessa viagem, feita por Manuel Lopes na inquisição de Barcelona:

- Na cidade de Lisboa estiveram até ao ano de 1700 e embarcaram em um navio chamado Picaron e o capitão era genovês e não se recorda do nome nem do apelido. E do porto de Lisboa, passaram em 48 horas ao porto de Cádis e estiveram detidos na baía por causa do mau tempo e não desembarcaram e algumas vezes João Ventura seu irmão ia a Cádis buscar mantimentos. E do dito porto passaram à cidade de Almeria, Cartagena e Alicante, porque o capitão tinha nos ditos portos negócios e mercadorias. E também, no mesmo tempo, arribaram a Maiorca e em nenhum dos ditos portos desembarcou pessoa alguma da família do seu irmão. E desde Maiorca, rumaram a Génova. E do mesmo navio, sem saltar em terra, tomaram uma falua e se foram para Livorno, em companhia de outra família que, entre marido e mulher e filhos, seriam 6 pessoas, de cujos nomes não se lembra, que embarcaram ao mesmo tempo e ocasião no dito navio Picaron, no dito porto de Lisboa, quando embarcou a família do dito seu irmão João Ventura. (7)

A família referida, que com eles embarcou era a de João Cardoso Pereira, (8) de Chacim, a sua mulher, Isabel Cardosa Pereira e 4 filhos. E levavam com eles um rapaz de 8 anos, sobrinho de João Cardoso Pereira, chamado Gabriel Cardoso. Aportaram em Cádis e ali permaneceram algum tempo, acabando por falecer João Cardoso Pereira, “tendo-se confessado e recebido o viático pela mão do capelão do navio”. O cadáver foi a sepultar numa igreja daquela cidade espanhola. (9) E dele e dos que o acompanhavam ficou a descrição física, feita por Manuel Lopes, verdadeiros bilhetes de identidade. Vejam:

- João Pereira Lopes era alto de corpo cara redonda e cheia de carnes, olhos negros, com algumas brancas assim como a barba e cabelo, que era curto e liso, e teria 50 anos e ouviu dizer a sua mulher e filhas que havia sido mercador.

Isabel Pereira, sua mulher, era alta e magra, cara comprida e branca, olhos negros, assim como as sobrancelhas e o cabelo, este curto e liso, com algumas brancas, de 40 anos.

Maria Pereira, filha dos anteriores, era alta de corpo, cara larga e branca olhos negros e também sobrancelhas e cabelo, este comprido e liso, que seria de 18 anos (…) e lhe diziam que havia casado em Livorno, com um filho da terra, corretor de lonja…

Gabriel Cardoso, sobrinho de João Cardoso Lopes, de 6 anos de idade e altura correspondente à idade, cara comprida, morena, olhos azuis, cabelo preto.(10)

O barco seguiu viagem, acostando em Almeria, Cartagena e Alicante. Neste porto estiveram uns 15 dias. Ao zarpar, entraram dois novos passageiros: uma mulher e um seu cunhado. (11) Iam para a Itália, a tentar impedir que o marido daquela casasse com outra mulher. Manuel não fixou os nomes, mas isso não nos impede que os identifiquemos.

A viagem do navio Picaron terminou em Génova. Dali para Livorno, Manuel Lopes e os parentes alugaram uma faluca e com eles seguiram também os ditos cunhados que Manuel voltará a encontrar em Pisa, como adiante veremos. 

 

Notas:

1- A sua mãe tinha falecido 2 anos antes, possivelmente na sequência do parto de Manuel. 

2- Inq. Coimbra, pº 1145, de Lopo Nunes.

3- Pº 630, tif 95: - Começou a instruí-lo nos ritos e cerimónias dos judeus, advertindo-o e aconselhando-o que aquelas cerimónias e ritos havia de observar e guardar e não a doutrina cristã.

4- Inq. Lisboa, pº 18001, de Francisco Rodrigues Coelho.

5- Pº 630, tif 211.

6- Idem, tif 185-186. ANTT, inq. Lisboa, pº 2366, de João da Costa Villa Real: ANDRADE e GUIMARÃES – Nós, Trasmontanos… João (Abraham) da Costa Villa Real (Bragança, 1653 – Londres, depois de 1729), in: jornal Nordeste nº 1046, de 29.11.2016. Foi casado a primeira vez com Isabel de Sá, da família La Faia – Pissarro e segunda vez com Leonor Nunes ou Leonor da Costa, viúva de Luís Pereira d´Eça. A fuga de João da Costa Vila Real para Inglaterra, levando 17 membros da sua família, foi verdadeiramente espetacular.

7- Pº 630, tif 102-103.

8- João Cardoso Pereira era filho de Diogo Cardoso Nunes (pº 5724-C) e Maria Lopes, de Chacim.  

9- Pº 630, tif 110.

10- Idem, tif 163-165.

11- A mulher chamava-se Ângela e era filha de João Lopes, o Galego, de Chacim. A propósito diria Manuel Lopes: - E a dita mulher e seu cunhado, ao princípio que se embarcaram, tiveram o rancho entre a peça da artilharia e a praça de armas, onde como disse, ia ele confitente, seu irmão, Isabel Pereira (Cardosa) e sua família, e algumas vezes a dita mulher e cunhado entravam na conversação na dita praça de armas com os sobreditos, e passados alguns dias que estiveram entre a dita praça de armas e peça de artilharia, se separaram da dita praça de armas e dali foram com os demais até Génova.- Pº 630, tif 231

 

Viver num jardim de rosas

Ter, 19/05/2020 - 09:45


As saudades já são muitas. Há mais de dois meses que estamos privados de abraçar os nossos nos lares e hospitais. Embora com muitas restrições, agora já podemos visitá-los, sem beijinhos e abraços.

No dia treze de Maio, quarta feira, tivemos um programa com trinta participações. Todas cantaram ou tocaram melodias à Senhora de Fátima. Dia quinze, sexta feira, foi o dia internacional da família. Para o assinalar, o nosso primo Marco cantou uma canção, nomeando cento e trinta participantes da nossa família.

Rui Pires ansioso pelo regresso aos relvados

Qui, 14/05/2020 - 19:03


O jogador, natural de São Pedro Velho no concelho de Mirandela, já iniciou a fase de recuperação após cirurgia aos ligamentos cruzados.

Rui Pires espera voltar aos relvados no início da temporada 2020/2021. O jogador mirandelense lesionou-se no passado mês de Dezembro ao serviço do Troyes, da 2ª Liga francesa, e pelo qual realizou 14 jogos.

 

- Rui qual é a tua opinião em relação ao cancelamento do campeonato em França?