Eu não conheço o Sr. Henrique Pedro. Conheço a sua escrita que leio aprazivelmente neste jornal. Porque neste País que maltrata a sua língua aqueles seres empenhados em a defender, o caso de Henrique Pedro, merecem atenção, entendo por bem tecer considerações acerca do seu artigo relativo ao acto restaurador da liberdade de expressão de pensamento, da assumpção de podermos votar de acordo com os ditames desse mesmo pensamento, defender opiniões e conceitos contrários aos de outrem, em suma: a possibilidade de respirarmos sem receio de um espirro suscitar perseguições e entrada, pelo menos, nos arquivos da PIDE. Ora, o acima referido não o conquistámos como conquistámos possessões em várias partes do Mundo, foram os militares de Abril que corporizo no meu antigo vizinho e estimadíssimo amigo Fernando Salgueiro Maia, e não nos militares do exército fujão, assim apelidado por Marcelo Caetano.
O Sr. Henrique Pedro no seu artigo fala em três golpes de Estado no dia em que fui de Santarém para Lisboa às seis da manhã com a finalidade de ouvir uma aula teórica do sábio Padre Manuel Antunes, duas práticas sob a égide do agora Professor Doutor José Matoso, filho do autor de um célebre manual de História Universal, livro único do terceiro ao quinto ano do ensino liceal e na esperança de poder assistir à consumação dos zuns-zuns soprados e ouvidos na Livraria Apolo situada nos rés-do-chão do prédio onde vivia, frequentada amiudadamente pelo Maia, o Palma (morreu general), que o general José Carlos Cadavez conheceu pois o Fernando Salgueiro Maia comprazia-se em levá-lo à livraria vigiada pela PIDE, por isso mesmo o nosso conterrâneo capitão José Augusto Fernandes, comandante da PSP escalabitana, pisou o risco e fez o favor de me avisar. O Comandante Carrazedo (era a sua alcunha) posteriormente à acção vitoriosa viu-se confirmado no cargo e, nessa conturbada, veio posteriormente a comandar a PSP dos distritos de Évora e Portalegre, sendo estimado na cidade do gótico enquanto nela viveu. Se o Sr. Henrique Pedro reparar os militares referidos neste texto verificará serem plurais no pensamento, até opostos, iguais na qualidade de oficiais do exército.
O seu artigo carreia palavras a justificarem a sua asserção, não contrario a tese apesar de nas dezenas de livros lidos que possuo sobre a revolução (termo em sentido muito restrito no meu modesto entender), os depoimentos e relatos ouvidos e comentados pelos principais intervenientes no processo contrariarem o expendido pelo também colunista do Nordeste.
O golpe resultou, os desvios e entorses sofridos provocaram dor mental e sofrimento físico podem não ter logrado a plena e conveniente reparação (o Maia foi removido para os Açores pelo seu amigo Ramalho Eanes) enquanto outros foram catapultados e exerceram funções derivadas da aplicação dos conceitos – em terra de cegos…, dos enganos comem os escrivães –, são consequência de mesmo nas revoluções sem sangue e dos cravos muitos dos seus filhos são vítimas de si próprios como o genial Francisco Goya lembra pungentemente no quadro Fuzilamentos de 3 de Maio.
Admito, aceito, azedumes contra a data que se tornou universal gostem ou não os seus compungidos detractores, admito, aceito pontos de vista a colocarem em causa posições e atitudes de bazófias e arrogâncias de quem devia ser humilde, já não aceito agressividades a atingirem o calafrio da utilização de armas e ataques físicos a defensores dos ideais expressos no manifesto do MFA sem deixar de considerar um hediondo desastre: a chamada descolonização.
O seu artigo tem o mérito de permitir-me após a menção da data colocar o advérbio SEMPRE. Por tudo, até pelas desilusões Sempre.
O 25 de Abril
Armando Fernandes