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Os regatos que lavam as fragas

Li ou ouvi, já não me lembro onde nem a quem que todos os resíduos levados pelos rios, para o mar, diminuem a massa continental. Um continente é uma unidade e, por isso, uma pedra, um tronco ou uma simples areia que é arrastada para o oceano, empobrece, na devida proporção, a totalidade do conjunto de formações geológicas. Pela mesma razão, quando alguém abandona uma comunidade, diminui-a e, como tal, enfraquece e depaupera, um pouco, todos e cada um dos elementos dessa comunidade. Cumprindo um ritual anual visitei, no primeiro dia de novembro, os velhos cemitérios de Lodões e da Junqueira onde repousam os restos mortais dos meus avós. Este ano, penosamente, fiz, adicionalmente uma visita ao cemitério novo da Junqueira onde foi enterrado, em janeiro, o meu pai. Foi logo de manhãzinha e não havia mais ninguém na sagrada necrópole. Tive oportunidade de, depois de depositar flores e acender velas na campa n.º 13, visitar, uma a uma, todas as restantes sepulturas do campo- -santo. Em cada uma delas, um texto, uma oração, uma prece, uma fotografia. Mas, sobretudo, um nome. E, para lá da simples onomástica, uma pessoa, uma recordação, uma lembrança... uma perda. Com cada um que partiu, algo, da nossa aldeia, se perdeu, para sempre, alguma coisa de cada um de nós desapareceu, para sempre. No dia anterior chovera em abundância e os regatos lavaram as fragas, abriram sulcos na terra solta, arrastaram areias e rolaram pequenos seixos pelas encostas. À primeira vista nenhum dos montes ficou mais pequeno, nem nenhuma leira encolheu e, contudo, uma pequenina parte deles já iniciou uma longa caminhada em direção ao Atlântico e não há forma de a reverter. O mesmo aconteceu (e acontece, continuamente) com a aldeia. Aparentemente a Junqueira continua, como sempre mas, em boa verdade, empobrece, continuamente, porque cada um de nós, mesmo continuando a calcorrear o empedrado das ruas, é menos do que era, porque lhe falta o pedaço, maior ou menor, de que as várias lápides são testemunho indelével. Toda a Vilariça outonava. As videiras, despojadas dos cachos dourados e tintos, vestiram- -se de folhagem multicolor, antes de hibernarem. Despertarão antes da primavera, chorando cada ramo amputado e preparando-se para reverdecer quando o tempo aquecer um pouco mais. Por agora esperam que as ovelhas venham despi-las, antes que a chuva, que regressava, lhes despencasse as parras amarelecidas. O silêncio sepulcral fez-me lembrar o tempo em que, por esta altura, ficavam abandonados e inertes, os arados nas leiras adormecidas e nas noras se amordaçava o tan-tan, ritmado pela cadência do quadrúpede que puxava a roda dos alcatruzes. Já não há noras no Vale. À saída do cemitério reencontrei a chuva. As perdas são mais duras quando lembradas, sempre que são sentidas. As boas recordações não recuperam as perdas mas menorizam-lhes o dano. Inexoravelmente, os regatos continuarão a desgastar os montes milenares e a arrastar consigo o lodo, a terra e as pedras, em direção ao mar. Lavam as fragas mas não a dor. Levam as areias mas deixam as lembranças.

Requiem pela Geringonça

Seis longos anos durou a Geringonça. Bastante mais do que se previa. Geringonça que, contrariamente ao que se pensa, não se limitou a fazer prova de vida sempre que foi chamada a aprovar sucessivos Orçamentos de Estado. Sub-repticiamente corrompeu ainda mais e aprofundou as contradições do Regime em consonância com os desígnios ideológicos dos seus constituintes da estrema esquerda. Tornou o futuro do país e da democracia ainda mais problemáticos, como agora diariamente se constata. Acabou por se desconjuntar ruidosamente. Ainda bem. O estrondo ainda se faz ouvir fragoroso e as peças ainda rolam incontroladas pela última ribanceira, o OE2022, que já não conseguiu vencer de tão gasta que andava, presa por arames e a bater válvulas. E agora? Apetece perguntar. Agora que já nenhum bate- -chapas lhe pode valer, resta à rapaziada socialista divertir-se e divertir os portugueses a buzinar o velho calhambeque, com António Costa ao volante, como diz a cantiga de Roberto Carlos, enquanto aguarda, ansiosa, o restauro do Cadillac da maioria absoluta. Rapaziada para quem nem seriam precisos mais orçamentos de Estado ou eleições e melhor seria deixar ficar tudo como está. Em família. Mais divertido ainda será, porém, se o calhambeque socialista for ultrapassado, nas curvas e contracurvas eleitorais, por um Ferrari de maior cilindrada, vindo da direita e em contra mão. Depois do que se viu em Lisboa com Medina e Moedas tudo é possível. Atenção que esta história não é para rir. É para reflectir e eventualmente para chorar. Todos os portugueses livres e de bons costumes, honi soit qui mal y pense, grupo no qual eu humildemente considero que me incluo, têm razões de sobra para se sentirem enojados e desfeiteados e se indignarem cívica e eticamente com o comportamento dos políticos em geral e de muitos governantes em particular. Nunca o Regime desceu tão baixo. Por obra e graça de uns tantos artistas, poucos que fossem seriam demais, incompetentes, cínicos e traidores que campeiam na política portuguesa. Que enfie o barrete quem lhe servir. Não é da democracia que se queixam os portugueses, porém. É da politicalha e dos politicalhos que habilmente se servem da democracia para se servirem a si próprios, devastando o Estado e a Nação. A bondade da Geringonça confinou-se a pontuais e irrelevantes benefícios sociais na esteira do abrandamento da austeridade imposta pela Troica, sem a qual não teria sido possível salvar Portugal dos dislates cometidos por sucessivos governos, com destaque para os socialistas de José Sócrates. Já as suas maldades, porém, vão muito para lá da desfiguração de Orçamentos de Estado, como melhor se verá a partir de agora, à medida que o Estado regurgitar as suas dramáticas incapacidades em todos os domínios, com relevância para a Saúde, a Educação, a Segurança Pública ou combate à corrupção. Particularmente significativo é o tratamento indigno que tem sido dado às Forças Armadas, a que não é alheia a ideologia mais íntima da Geringonça, que preconiza reduzi-las a uns tantos generais enfeitados de medalhas para ornamentar tribunas políticas e a grupos de mercenários sem alma nem pátria. Justa e honrosa é, por isso, a revolta dos paraquedistas que no dia do Exército foram impedidos de cantar o seu hino em louvor ao seu patriotismo. António Costa, o demiurgo da Geringonça, tem vindo a cometer erros capitais atrás de erros capitais. Com a Geringonça foi a sua estrelinha que se apagou. Levado pela sede de poder e instinto de sobrevivência política afrouxou a corda dos princípios ao limite e sobreavaliou a flexibilidade ideológica do PCP e do BE a quem, está visto, a democracia continua a pouco ou nada dizer. Deslumbrado com o sucesso original arredou, com sobranceria e insensatez, o PSD e o CDS do seu confinado diálogo político, como se de portugueses de outro credo ou raça se tratasse. Optou mergulhar de cabeça no pântano da Geringonça, como se viu, acabando por se afundar inexoravelmente. Já nem mesmo as artimanhas de Marcelo Maquiavel, em desespero de causa, foram capazes de lhe valer. Foi com a graça da Geringonça que ambos prestaram um péssimo serviço ao país, confundindo estabilidade política com promiscuidade institucional e convertendo a democracia num perigoso forrobodó. Esperemos que a eventual colação de Marcelo e Rangel a não transforme num permanente delírio. Tudo é de esperar do próximo acto eleitoral porque os portugueses, por natureza emotivos, reactivos e de memória curta, reagem em diferido, como sentem e nem sempre decidem racionalmente. Certo é que Portugal precisa, como de pão para a boca, de uma democracia reformada e renovada, com novos políticos capazes de imprimirem ao Regime a honestidade, a dignidade e a confiança que lhe falta. Democracia é sinónimo de dignidade e de serviço público. Não de aldrabice e corrupção. 

A sombra do CDS

Como não se interrogar sobre a sorte de um partido que faz parte da história da nossa Democracia? Como não recear que o seu destino se veja hipotecado por um desnorte que o faz perder o rumo? Como não temer que as suas bases ideológicas se afundem em lutas intestinas que lhe retiram todo o crédito? Como não duvidar da capacidade do seu atual líder para fazer renascer aquilo que já muitos têm como conjunturalmente perdido? Se o CDS foi, durante o período áureo do cavaquismo, aquilo que alguns, acintosamente, chamavam “o partido do táxi”, não é menos verdade que a “corrida” tinha um rumo e os “passageiros” sabiam bem para onde se dirigiam. Era o tempo de deputados coerentes e competentes, como Nogueira de Brito e Lobo Xavier. Hoje, subsistem ainda grandes talentos centristas na Assembleia da República – de que Cecília Meireles e João Almeida são dois brilhantes exemplos. Mas, justamente, por serem brilhantes, enérgicos, assertivos e resilientes, correm o risco de ofuscar Francisco Rodrigues dos Santos, acentuando a sua inutilidade como líder do partido. Por isso, são olhados pela direção como uma ameaça: por serem combativos, resilientes e não se vergarem perante a mediocridade da dita chefia. Olhando o presente do CDS, não podemos deixar de ouvir o seu passado, que nos grita, como se chamasse por alguém que urge aparecer. Esqueçamos as brumas sebásticas! Ninguém deseja o Desejado, mas tão-somente uma figura forte, carismática, um verdadeiro líder que congregue esforços, que saiba inspirar e que permita compreender a ideologia do Partido, unindo os militantes e marcando uma posição conspícua no espectro político nacional. O CDS está num ponto de não-retorno. O seu futuro joga-se neste presente. Depois do período de liderança de Paulo Portas – paradigma de inteligência, mas, talvez por isso, inibidor do surgimento de outras entidades –, o partido está à deriva, buscando um verdadeiro timoneiro. É fundamental que o CDS assinale o seu espaço no lugar que deve ocupar na direita democrática. Mas há esperança. Há nomes que o CDS conhece bem e que reconhece como eventuais líderes, dignos de um voto de confiança. Eles estão aí, com o Partido e pelo Partido. Com vontade, competência e capacidade de tirar o CDS deste limbo em que se encontra. É a hora!

Egídio Frias

Educação

Bons dias, caros amigos. Amigos e amigas, bem subentendido. Hoje em dia arrastam-se as regras da língua para servir os propósitos destes nossos dias pós-modernos em que tudo tem de ser dito com as devidas pinças e ressalvas. Há quem considere amig@s mais inclusivo, há quem prefira usar os dois géneros e talvez inventar um terceiro, enfim, a imaginação e os gostos são variados e infindáveis. Nesta matéria, eu prefiro deixar a língua portuguesa como está e falar por si mesma (com redundância e tudo), até porque na língua portuguesa o género masculino tem essa dimensão abrangente porque absorveu, digamos assim, o género neutro do latim. Ou, se preferirmos, o género neutro, talvez por conveniência e economia linguística, foi incorporado no género masculino, embora ainda se avistem algumas reminiscências como isto, este, esta, ou isso, esse, essa, entre outras. Mas não foi de educação no sentido dos conhecimentos linguísticos de que vos vim falar. Antes de mais, nem vos perguntei pela saúde. Espero que estejais bem e que o Outono vos traga boa-ventura e ouriços em quantidade e bem pesados. Hoje vim falar de educação e da sua importância, embora o objetivo inicial fosse o de dedicar palavras de apreço ao contributo que os militares têm dado ao nosso país. Num país ainda com uma crónica aversão a fardas e a disciplina, fruto dos efeitos pós-traumáticos que perduram das largas e cinzentas décadas de regime fascista, temos a sorte de ter do nosso lado grandes militares que nos dão a mão com grande perspicácia, coerência e um inabalável sentido de missão ou dever cívico sempre que deles precisamos. Só no decorrer do Portugal mais contemporâneo escolho três nomes demonstrativos da qualidade e distinção dos nossos militares: Salgueiro Maia, nome maior dos capitães de Abril, homem cuja determinação e coragem fez carburar uma revolução e que, pela integridade de não querer nada em troca nem de tomar partidos, acabou semiabandonando por entre as recentes brumas da memória. De seguida, o ex-Presidente Ramalho Eanes. Um presidente-militar num tempo em que presidir um país com ânsia de tudo por ter falta de quase tudo, com pressa de deixar de ser terceiro-mundista, constituía uma autêntica, diária e minuciosa Task Force onde não havia ainda escolinhas de presidentes patrocinadas pelo comentário televisivo nem selfies para sustentar popularidades. Ser presidente não era ser-se popular nem o confortável passeio que é hoje. Por todas as grandes qualidades que soube colocar ao serviço do equilíbrio e da sustentabilidade que o país tanto precisava, qualidades essas que sempre demonstrou ao longo da sua vida, o ex-Presidente Ramalho Eanes é e será sempre das pessoas mais admiráveis e insignes da nossa sociedade. O último nome que escolho é o Vice-Almirante Gouveia e Melo. Ninguém sabe bem o que é um vice-almirante, mas todos reconhecemos a hombridade e sucesso com que este homem liderou, contra alguns ventos e marés, um processo de vacinação no meio de uma pandemia. A sua obra é recente, mas não menos digna de reconhecimento e agradecimento. Todos estes citados militares não nos pediram nada, no sentido de terem sido eles a querer assumir um papel de destaque, nem quiseram mais do que cumprir a missão que lhes atribuíram. Temos os melhores desportistas do mundo, mas também temos militares com os quais nos devemos orgulhar, com formação, sensibilidade e princípios para responder e assumir da melhor forma quando o país necessita deles. Este artigo era para se chamar “oficiais e cavalheiros” e discorrer sobre a preciosa mão que os militares deste país tem dado ao Portugal contemporâneo. O denominador comum destes homens é a educação. A educação, a formação superior, humana e académica, que fez parte da vida destes militares e que contribuiu para que se tornassem grandes homens para grandes missões. Educação, é também o título do livro que acabei hoje de ler e que, a talhe de foice, me virou um pouco o tema da crónica. Um livro de memórias ou autobiográfico de uma cidadã norte-americana que cresceu num meio demasiado improvável e insólito para ocorrer nos dias de hoje. No seio de uma família Mórmon, encrostada no sopé de uma montanha do Idaho, com uma visão do mundo vincadamente peculiar e apocalíptica. A jovem cresceu naquele meio sem conhecer uma escola, um hospital ou um bilhete de identidade até aos seus 17 ou 18 anos. Uma família onde, ainda hoje, os partos continuam a ser feitos em casa e as doenças por mais sérias que sejam são tratadas à conta de ervanária e fé na providência, não tanto por motivos estritamente religiosos, mas sim por uma construção muito própria, ameaçadora e paranoica do mundo em redor. Apesar do tardio começo académico, a pessoa que nos conta a sua inusitada vida conseguiu chegar aos corredores de Cambridge e Harvard, graduando-se e libertando-se das suas restritivas correntes. Aquilo que permite que esta jovem mulher nos conte a sua história e que a sua vida não se tornasse como a dos seus irmãos que continuam a viver num meio tétrico e a perpetuar as mesmas verdades quasi-medievais por entre os seus congénitos, é precisamente, tal como a própria autora sublinha, a palavra que intitula, mas também que termina e coloca uma última pedra nas mais de 300 páginas de uma vida psicoticamente verosímil: educação. A educação é a arma mais libertadora que existe. A educação, em sentido lato, do conhecimento do mundo de maneira a que possamos antever e acreditar em novos mundos e poder ir além das amarras e correntes do nosso próprio. Poder extrapolar o mundo que nos foi destinado. Negar a educação é atrofiar, aprisionar, matar. A educação abre portas, desbrava caminhos, é um valor maior, superior. Eu nutro gratidão por ter crescido num meio familiar e num tempo histórico de uma sociedade ou de um país em que o acesso à educação me foi permitido, facilitado, privilegiado. Necessitei apenas de fazer a minha pequena parte para alcançar os valores e princípios que dela podemos recolher. A todos os muitos cidadãos do mundo, novos e velhos, femininos e masculinos, enclausurados, cativos ou privados deste bem, que a educação entre de alguma forma nas vossas vidas e que vocês a consigam agarrar seja como for. O sonho comanda a vida, a educação permite o impossível, sonhar com liberdade, corporizar os sonhos. Educação e liberdade. Um abraço fraterno!

Que saudades já tinha do magustão a nossa familiazinha!

Ter, 09/11/2021 - 09:30


Estamos nas férias dos picos, isso é o que muita gente lhe chama, porque tiram férias para ir à procura das castanhas nos ouriços, como é o caso do tio Luís Correia, que guarda as suas férias para vir apanhar a sua castanha na aldeia de Mós, Bragança.
Agora os soutos são o ginásio do povo. Se repararmos nos castanheiros seculares de alguns soutos da nossa zona, facilmente percebemos que a produção de castanha já tem alguns séculos nesta região do país.