Escolas do distrito com dificuldades em substituir professores obrigam alunos a estarem sem aulas algumas semanas

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Ter, 16/11/2021 - 12:15


A falta de professores substitutos no distrito está a causar constrangimentos

Nalguns casos os alunos chegam mesmo a estar sem aulas mais de um mês. Esta não é uma situação nova, mas que tem vindo agravar-se de ano para ano, o que para muito é o resultado da “interioridade”. Andreia Afonso é aluna do 12º ano de Ciências da Secundária Emídio Garcia, em Bragança, e no ano passado chegou a estar sem aulas à disciplina de Geometria mais de dois meses. “O ano passado, a Geometria, estive cerca de um mês sem aulas, no início, e depois um mês e meio quando fomos para casa sem aulas. Na primeira vez foi o professor que pôs baixa por causa da covid e depois simplesmente ficamos sem aulas do professor substituto e não tivemos qualquer justificação”, contou. A jovem estudante relembrou como foi difícil conseguir aprender a matéria e admitiu que isso lhe trouxe consequências, já que teve exame no 11º ano e a nota não foi a que desejava. “Foi muito difícil obter uma boa nota, tive que ir à segunda fase, porque na primeira foi um bocado impossível conseguir uma nota que me desse acesso ao ensino superior”, disse, acrescentando que lhe foi dito que a matéria que não tivéssemos dado em exame a escola iria mandar um e-mail para o IAVE para não serem avaliados nessa matéria no exame, o que não acabou por acontecer. Este ano, Ricardo Vinhais, também não tem aulas de Geografia há duas semanas. Frequenta o 11º ano na Secundária Emídio Garcia e este ano vai ter exame, o que o está a deixar preocupado. “A professora de Geografia está a faltar, por motivos de saúde e agora não está a ser leccionada a matéria. Vamos ter exame a Geografia este ano e não sabemos como é que vamos fazer”, referiu, salientando que até agora a escola, nem a directora de turma, deu qualquer informação de como será nos próximos tempos. No entanto, o subdirector da escola disse já ter sido resolvido o problema. “Neste momento está ultrapassado, mas o grupo de recrutamento de Geografia, que é difícil de colocar docentes, temos que fazer alguma ginástica para abranger as turmas todas”, referiu Carlos Fernandes. Mas o responsável admite que não só a Geografia é que houve problemas. Aconteceu também à disciplina de Espanhol. Os alunos chegaram a estar três semanas sem aulas. “Tivemos uma situação de uma docente que foi colocada ao abrigo da lei autárquica numa autarquia próxima e tem que exercer essas funções nessa autarquia e nós tivemos alguma dificuldade em arranjar um professor de Espanhol”, explicou. Carlos Fernandes admite que Geografia, Espanhol e História são “os três grupos que é mais difícil proceder à substituição”. Neste que é o maior agrupamento de escolas, de Bragança, mas também do distrito, com mais de 2 mil alunos e mais de 350 professores, tem sido “cada vez é mais difícil a colocação de professores profissionalizados”. “No ano anterior já notávamos alguma dificuldade na substituição dos docentes, porque as bolsas nalguns grupos de recrutamento estão saturadas”, disse, acrescentando que este é um problema que para além de trazer preocupação, traz também “pressão de toda a comunidade e dos encarregados de educação”, uma vez que “não entendem esta falta de docentes” e a direcção se vê obrigada a “arranjar estratégias alternativas para colmatar essa falta”. O agrupamento de escolas Abade de Baçal, em Bragança, também não escapa a esta problemática que está afectar a região. Até ao passado dia 11 de Novembro, ou seja, cerca de um mês depois do arranque do ano lectivo, os alunos do 10º ano não tinham aulas de Filosofia. “Este ano lectivo tivemos muita dificuldade na substituição de um docente da disciplina de Filosofia. O horário foi a concurso no início do ano lectivo, não foi aceite, foi sucessivamente a concurso e só agora, a 11 de Novembro, é que houve um candidato que aceitou o horário. Só a partir de agora haverá aulas de Filosofia para algumas turmas”, avançou a director do agrupamento. Teresa Sá Pires explicou que em causa estarão as poucas horas de horário, mas também o tempo limitado de substituição. “É um horário que é apenas de 14 horas, porque o docente que está de baixa só tem 14 horas lectivas, é um horário temporário, porque é uma substituição, além de que os candidatos não sendo aqui da zona acabam por querer ficar mais perto da sua zona de residência, por causa das despesas que as deslocações acarretam”, frisou. O tempo de demora na substituição de professores pode variar consoante a disciplina mas também o número de professores que estão na bolsa de recrutamento. Ainda assim, Geografia e Filosofia parecem ser disciplinas que causam mais constrangimentos no que toca a arranjar professores substitutos. Paulo Dias, director do agrupamento de escolas de Macedo de Cavaleiros, também se queixa que esta tem sido uma situação recorrente. Este ano, um professor colocou baixa por doença e o agrupamento não conseguiu arranjar um substituto. Valeu o professor ter voltado a trabalhar antes do tempo previsto mas, ainda assim, foram duas semanas sem aulas. “Em anos transactos estivemos até meses sem conseguir substituir professores”, admitiu o director.

Escolas criam estratégias para minimizar impacto da falta de professores

No caso do agrupamento de Macedo de Cavaleiros, a direcção tentou arranjar uma solução para que os alunos não saíssem tão prejudicados em termos de aprendizagens, por não terem tido aulas. Desta forma, algumas turmas estão a ter carga horária extra a algumas disciplinas. “O que temos feito é reforçar a carga de disciplinas no ano seguinte de forma a recuperar aprendizagens e conteúdos que não foram trabalhados no ano anterior. Este ano temos, por exemplo, no oitavo e no nono ano, pelo menos a matemática, temos duas turmas com reforço para recuperação, porque no ano anterior estiveram dois ou três meses sem aulas”, explicou Paulo Dias.

Professores perto de entrarem na reforma preocupam agrupamentos

Segundo a dirigente de Bragança do Sindicato dos Professores do Norte, a média de idade dos professores no distrito é de “50 e bastantes anos”, o que significa que em poucos anos muitos professores se irão reformar. Teresa Pereira estima que haja “uma quebra muito grande” e que muitos professores se irão aposentar ao mesmo tempo. “Não sei se haverá condições para repor os professores nas escolas. Vai ser uma situação preocupante”, afirmou. Este cenário também está a preocupar o director do agrupamento de escolas de Macedo de Cavaleiros que prevê que até ao final de Dezembro cinco professores irão para a reforma e ao longo do próximo ano “serão outros tantos, pelo menos”. “É muito preocupante. Batemos um record a nível nacional de aposentações e no próximo ano serão ainda mais e as escolas de formação de professores há uns anos que deixaram de ter candidatos e entretanto quem tinha as habilitações arrumou a sua vida por outra via. Vejo com dificuldade que as pessoas agora aos 40 e poucos anos comecem uma carreira de docente, porque isso significa que nunca vão chegar ao topo”, frisou Paulo Dias.

Carreira pouco atractiva

Segundo Teresa Pereira, dirigente de Bragança do Sindicato dos Professores do Norte, “há cada vez menos jovens a entrar na profissão” e “os cursos de formação de professores estão quase vazios”. A razão estará no atraso na progressão das carreiras, visto que há poucos concursos para entrar para os quadros, o que vai havendo é contratações. “Vai havendo contratos, porque há falhas, embora no distrito haja poucos, porque há poucos alunos, mas para os quadros é que é mais difícil. Os professores com 20 e tal anos de serviço muitas vezes não estão nos quadros, ainda estão contratados. Antes de 30 anos de serviço é difícil entrar nos quadros”, afirmou. Outra das razões para tornar esta profissão menos atractiva é também o ordenado. “Não é atractiva do ponto de vista monetário, porque os professores têm que muitas vezes terem que andar a correr o país e têm que ter mais de uma habitação e o vencimento não é grande para fazer face a essas despesas. Também o desgaste que a carreira de professor traz, porque há situações que nem sempre são fáceis de resolver. Depois há muita burocracia que não é fácil de resolver, que não está relacionado com os alunos, e esse trabalho cansa os professores”, concluiu Teresa Pereira.

Jornalista: 
Ângela Pais