Nós trasmontanos, sefarditas e marranos Sebastião Lopes (Nunes) Sobreda (157_-1633)
Sebastião Lopes Sobreda era um dos 6 filhos de António Lopes de Castro e Leonor de Almeida, neto paterno de Francisco Lopes, natural de Vinhais e de Mécia Lopes, de Bragança. Nasceu na aldeia de Castro Roupal, do medievo concelho de Izeda, ao início do último quartel do século XVI. Casou com Filipa de Almeida, da família de sua avó materna e que, em Lisboa “tratava de encomendas para o Brasil”. Possivelmente, o casal estabeleceu morada na Quinta de Sobreda, termo da aldeia de Castro Roupal e certamente o sobrenome foi daí tomado. A quinta (ou pequena aldeia) era dotada de uma capela, da invocação de Santo Antão, ignorando-se quem a construiu. Em ligação com outra sita na margem do rio Sabor, conhecida por Santo Antão da Barca, estaria ligada aos caminhos medievais para Santiago de Compostela.(1)
Na sequência das denúncias feitas por Pedro de Matos, em 1618,(2) na inquisição de Coimbra, Sebastião abandonou a terra e dirigiu-se a Madrid. Com ele seguiriam suas 3 irmãs: Luísa de Almeida (depois casada com António Lopes Cortiços); Mécia de Almeida que casou com António Lopes Ferro e Mariana de Almeida, esta já viúva do Dr. João Soares de Chaves. Em Castela, Sebastião prosperou e rapidamente se integrou na prestigiada classe dos rendeiros. Faleceu em 1633, segundo a informação de Markus Schreiber.(3)
Sobre os descendentes de Sebastião Lopes Sobreda, temos algumas informações recolhida se diversas fontes. Alguns deles ganharam alguma importância, até mesmo a nível internacional. Vejamos um pouco:
* Fradique Lopes, que seria o filho mais velho, casou em Olivença, com Beatriz Queirós. O casal terá regressado a Portugal, fixando residência na aldeia de Limões, na vizinhança da Quinta da Sobreda. Certamente a família se destacava pela sua riqueza e modo de vida e isso despertava invejas entre a gente fidalga cristã-velha e alguma animosidade do povo que neles via cobradores de rendas e prestamistas usurários. E sobre eles, como, aliás, sobre todas as famílias da nação hebreia, havia uma vigilância constante dos esbirros da inquisição que punham a correr notícias e boatos de mau viver, em termos de religião. A propósito, veja-se a informação que o arcediago Francisco Luís,(4) comissário da inquisição enviava para Coimbra em Julho de 1637:
— Estando os dias passados em uma conversação onde estavam, se não me engano, três clérigos, disse o Abade Alfaião que lhe disse um clérigo de Limões que um filho de Fradique Lopes era circuncidado, e que o próprio se dizia do pai. Quanto ao filho, disse que quando o fora baptizar o revendo abade de Vinhas, o pai lho mostrara para que se não deixasse de ver, e lhe mostrara o próprio membro do filho, para mais dissimular e que se não fizesse caso daquilo, porque disse que estava feridinho e ensanguentado. E mais disse que um clérigo lhe dissera, cujo nome ele referirá, quando seja perguntado, dissera que estando com outro por se tirarem daquela dúvida, andando o menino brincando, o chamaram e lhe levantaram o mantéu ou calções e lhe acharam aquele sinal e ferida.(5)
*António Lopes e Baltasar de Almeida fixaram-se na região da Biscaia, trabalhando no negócio do sal, cujo monopólio estava na mão do seu parente Fernando Montesinhos, nascido em Vila Flor em 1589, filho de Manuel Lopes Teles(6) e sua mulher Filipa Dias. Fernando Montesinhos foi casado com Serafina de Almeida, uma das filhas de Manuel de Almeida Castro, de Izeda.
*Também naquela região de Espanha e na mesma atividade começaria Manuel de Almeida e Castro a sua vida de empresário. Nascido por 1593, Manuel de Almeida deixou a Biscaia, passando a Córdova e trocando o negócio do sal pelo dos cavalos, associando a seu primo Manuel Ferro e Castro, filho da sua tia Mécia de Almeida, no fornecimento daqueles animais à Coroa de Espanha. E na Corte madrilena terá ganho alguma influência já que, em 1665, foi elevado à categoria de cavaleiro, condecorado com a Ordem de Avis, conforme consta de documento apresentado pelo Abade de Baçal, do teor seguinte:
— Manuel de Castro Almeida, capitão, natural de Bragança, filho de Sebastião Lopes de Castro e de Filipa de Almeida, neto paterno de António Lopes de Castro e de Leonor de Almeida e materno de Francisco Lopes de castro e de Maria de Almeida, todos naturais de Bragança. Habilitação de genere a 5 de Fevereiro de 1665 em Madrid para o hábito de S. Bento de Avis. Como testemunhas no processo depuseram: Manuel Pimentel “platero” (ourives da prata, artista), viúvo, residente em Astorga, natural de “Bergança”; Jerónimo Dias, viúvo, residente na vila de Baneza, tesoureiro de alcabalas, tenente de corregedor na mesma vila; António Garcês Brandão, licenciado, de cinquenta anos, natural de Moncorvo, residente em Madrid; Luís de Almeida de Figueiredo, cavaleiro do hábito de Cristo, de sessenta e cinco anos, natural de Freixo de Espada à Cinta, residente em Madrid.(7)
*A filha Serafina de Almeida, faleceu solteira, enquanto Leonor de Almeida e Oliveros Nunes se mantinham solteiros em 1639, vivendo com a mãe, em Castro Roupal. Posteriormente Oliveros Nunes terá casado com Guiomar Pimentel, de Chacim. O casal fugiu para Espanha em 23 de Dezembro de 1651, com a ajuda de um grupo de passadores de Vimioso.(8) Do grupo de fugitivos fazia parte a irmã de Oliveros, Mariana de Almeida, cujo marido se encontrava já em Madrid, uma moça de 15 anos, filha bastarda de Oliveros e 4 crianças filhas dos casais Oliveros-Guiomar e Mariana-António Lopes.
*Mariana de Almeida, outra filha de Sebastião Sobreda e Filipa de Almeida, nasceu em 1612, em Castro Roupal. Casou com António Lopes Pimentel, ou Alvim, da vila de Chacim, onde nasceu por 1615, o qual cedo seguiu para Castela, empregando-se no negócio da exploração do sal. A mulher foi juntar-se-lhe em 1651, fazendo parte do grupo de fugitivos atrás referido. O casal acabou por se fixar em Madrid. Pouco depois, Mariana e o marido foram presos pela inquisição de Cuenca, como, aliás, vários outros parentes e amigos, onde abjuraram “de vehementi”.(9)
NOTAS E BIBLIOGRAFIA:
1 - ANTT, Memórias Paroquiais de 1758, de Castro Roupal. A fama da Sobreda ficou plasmada em antigas quadras populares, como esta, retirada de ALVES, Francisco Manuel – Memórias Arqueológico Históricas do Distrito de Bragança, tomo IX, p. 282:
Ó Sobreda, ó Sobreda
Arrasada sejas tu
De beijos e abraços,
Não te quero mal nenhum.
2 - ANTT, inq. Coimbra, pº 3099, de Pedro de Matos, lavrador, ex-rendeiro, natural de Freixo de Numão, morador na aldeia de Lagoa.
3 - Agostinho da Fonseca, filho de Mariana de Almeida, vivia já então em Veneza e casaria mais tarde com sua prima Mariana Ferro, filha de Mécia de Almeida.
3 - SCHREIBER, Markus – Marranen in Madrid 1600-1670, Franz Steiner Verlag Stuttgart., 67 e seguintes .
4 - A informação do comissário Francisco Luís fazia parte de um sumário na sequência do qual foi lançada uma verdadeira operação de limpeza da heresia judaica em Quintela de Lampaças, com o mandado de prisão de 19 moradores de uma só vez, em Novembro de 1637, pela inquisição de Coimbra. Ver: ANDRADE e GUIMARÃES – Nas Rotas dos Marranos de Trás-os-Montes, 1ª Parte Uma Missa Judaica em Quintela de Lampaças. Ed. Âncora, Lisboa, 2014, pp 13-40;
5 - ANTT, inq. Coimbra, pº 3305, de Guiomar de Leão. Ver: ANDRADE e GUIMARÃES – Nas Rotas dos Marranos de Trás-os-Montes, 2ª Parte: Os Almeida Castro, uma Família de Cristãos-Novos de Izeda, p. 53.
6 - A.N.T.T. inquisição de Coimbra processo 458 de Manuel Lopes Teles.
7 - ALVES, Francisco Manuel – Memórias Arqueológico Históricas do Distrito de Bragança, tomo VIII, p. 55.
8 - ANTT, inq. Coimbra, pº862, de André Álvares. O padre Belchior de Macedo era o líder do grupo e recebeu de Oliveros Nunes 22 000 réis em paga; André Álvares, outro dos 6 passadores envolvidos recebeu 15 mil réis; Amaro Ferreira 16 mil… Contratado também para ajudar no “salto” foi “um homem pobre da Torre de Moncorvo que vive em Vimioso, o qual lhes levou o fato que ia num burro, até à dita raia de Castela”.
9 - ANDRADE e GUIMARÃES – Nas Rotas dos Marranos de Trás-os-Montes, 3.ª Parte: Vimioso Anos de 1650, uma Rede de “Passadores de Judeus” desmantelada pela Inquisição de Coimbra, pp. 111-113.
9 - SCHREIBER… Marranen… pp. 80-85. António Lopes Pimentel era filho de Mateus Lopes Pimentel, natural de Mogadouro, onde faleceu em 1637, e de Isabel Nunes, de Chacim, falecida em 1639.
Por António Júlio Andrade / Maria Fernanda Guimarães