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Argozelo com quatro caras novas

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Ter, 04/07/2017 - 15:39


Depois de garantida a contratação do ponta de lança Tiago Antunes (ex-AEAB), o Argozelo vai contar com mais quatro caras novas na equipa que vai competir no Campeonato de Portugal Prio na temporada 2017/2018.

NÓS TRASMONTANOS, SEFARDITAS E MARRANOS - Manoel Cortiços de Villasante (1603 – 1650)

Esplendian Nunes é o primeiro que nos aparece com o sobrenome Cortiços possivelmente  por ter vivido  naquela vila medieval , hoje concelho de Macedo Cavaleiros, sendo filho   de Duarte Nunes,   que se dizia cavaleiro e “vivia de sua fazenda”,  natural de Cortiços, e de Leonor Nunes.  Segundo informação colhida no processo de Duarte Nunes Nogueira, o casal foi morador na Galiza. (1) Esplendián era casado com Beatriz Nunes de Castr, que lhe deu vários filhos, nomeadamente um Duarte Nunes Cortiços e um Gaspar Nunes Cortiços que, em data que desconhecemos, terão abalado para a Flandres, o primeiro deles fazendo carreira no exército de Flipe II de Espanha. (2)
Um terceiro filho chamou-se António Lopes Cortiços que, em finais do século de 500, casou com Luísa de Almeida, irmã de Manuel de Almeida Castro. O casal seguiu para Castela, fixando-se em Valhadolid onde Luísa tinha uma tia materna casada com o fidalgo D. Fernando Villasante. Isso permitiu a António Cortiços, por um lado, aproximar-se da Corte e consolidar uma empresa de importação de especiarias e pedras preciosas da Índia, açúcares do Brasil e telas da Flandres e, por outro, ascender à Ordem de Calatrava. (3)
Para ganhar mais consideração e respeito passou a usar o sobrenome Villasante, título que comprara a uma nobre família castelhana, já referida, por uma pensão mensal de 50 ducados, mais um fato de verão e outro de inverno. A condição essencial era que o reconhecessem como membro da família, e dessem público testemunho disso. Este facto seria fundamental para ele ascender à classe da nobreza, como se verá.
Vivendo na dependência da Corte, António Cortiços, com ela se mudou também para Madrid, instalando-se na “Calle  de Preciados”. Prova da sua ascensão no mundo empresarial foi a tomada das rendas da exportação das lãs e dos negócios dos portos secos, então já com a ajuda dos filhos, todos trabalhando em rede. De seus filhos, citamos:
1-Sebastião Lopes Cortiços, nascido em 20.11.1617, que casou com uma sobrinha, filha de seu irmão Manuel e, anos depois, ficou a dirigir as empresas da família.
2-Luísa Cortiços, que casou com seu primo Sebastião Lopes Ferro, futuro marquês de Castro Forte.
3-Manuel Cortiços, o grande construtor da chamada “Casa Cortiços”, uma das maiores casas empresariais naquele tempo. É sobre ele que vamos falar.
Andaria nos 25 anos quando o pai faleceu e Manuel tomou a direção das empresas da família. Era ainda solteiro mas o casamento estaria já apalavrado com sua prima Luísa Ferro, irmã de Sebastião Lopes Ferro.
Por 1634, Manuel Cortiços era tido como “assentista e factor d´el-rey”, significando isto que ele entrara na atividade bancária. Em breve ascenderia à posição de “banqueiro do rei”.
E como banqueiro de confiança, o rei delegou nele a nomeação de 16 capitães comandantes de outras tantas companhias de cavalaria empenhadas na guerra da Catalunha. Obviamente que os fornecimentos de géneros e ordenados, não apenas àquelas tropas, mas também aos destacamentos da Flandres eram assegurados pela Casa Cortiços, daí resultando bons lucros, naturalmente. (4)
Além de banqueiro, Manuel Cortiços Villasante revelou-se um cortesão exemplar, e foi, por Sua Alteza o rei Filipe IV, chamado à gestão do erário público, nomeando-o para o seu Conselho, com o cargo de “secretário da Contaduria Mayor de Cuentas y de las Cortes e Ayuntamientos de Castilla y León, escribano mayor y perpetuo de ellos, secretario de la comision y administración de millones y “factor” general de los servicios del reino”. (5)
A própria inquisição de Espanha fez questão de o contemplar com a nomeação de “Familiar do Santo Ofício”. E, no entanto, havia já denúncias de judaísmo contra ele!
Manuel Cortiços morreu de súbito, em 3 de setembro de 1650. Por sua alma foram dadas muitas esmolas a pessoas da nação hebreia, para que fizessem jejuns judaicos. E isso chegou ao conhecimento da inquisição, que lançou uma vaga de prisões entre familiares e amigos dos Cortiços, grandes mercadores e assentistas. Um verdadeiro terramoto social que abalou a burguesia cristã-nova portuguesa de Madrid. Curioso: sendo decretada a prisão da viúva, D. Luísa Cortiços, acusada por 32 testemunhas, ela acabou por não ser presa! E Sebastião Lopes Cortiços, seu irmão, igualmente acusado, também não foi preso!

Este último,  sucedeu ao irmão na direção da casa e, no que diz respeito a cargos honoríficos, Sebastião ultrapassou o  seu irmão Manuel  Cortiços. E, sem renunciar aos cargos que detinha nas Finanças do Estado, tomou para so o assento da exportação de lãs de Espanha para a Itália.
Segundo Federica Ruspio, os Cortiços Villasante detiveram aquele contrato de exportação da lã no anos 1621-1629 e 1631-1636. Cederam-no a Simão da Fonseca Pina que o administrou de 1637 a 1650. Obtiveram-no de novo entre 1682 e 1692. No decurso da sua carreira destingiram-se como compradores entre 1638 – 1652, e eram dos principais no que dizia respeito à lã de Segóvia. No que toca a Sebastião Cortiços, entre 1662 e 1665, ele foi responsável por 80% da lã exportada pelo porto  de Cartagena .
A mesma autora fala circunstanciadamente sobre a presença oficial de Sebastião Cortiços na cidade de Veneza, onde foi recebido  com toda a pompa e circunstância  pelas autoridades  da República, no ano de 1670, sendo homenageado com a representação de uma peça teatral da autoria do célebre Marco Boschini intitulada “La Regata único cimento  marítimo a l’ uso  venezian, rapresentà il presente ano sul Gran Canal de Venezia in honor  de l´ilustrissima ecelenza del sig.  cavalier don Sebastião  Cortizos de ordem de Calatrava  del  consegio dá azienda  de S. M.  Católica. (6)

De facto, sob a sua gerência e com Agostinho da Fonseca, seu parente e correspondente da Casa Cortiços naquela cidade, foram investidos por conta da empresa cerca de 190 000 ducados em imóveis na cidade lagunar e em Terraferma. Explica-se, assim a homenagem a este grande empresário, investidor estrangeiro.

À morte de Sebastião Lopes Cortiços, sucedeu-lhe, na direção da Casa, o seu sobrinho Manuel José Cortiços, filho do fundador Manuel Cortiços Villasante. Tal como o pai e o tio, também o Manuel José foi elevado à categoria de cavaleiro da Ordem de Calatrava, em 1668, e distinguido com o título de visconde de Valfuentes. Em 1674, ascenderia a marquês de Vila Flores.
Manuel José afirmava-se então como o assentista mais abastado e poderoso da corte de Carlos II. Contudo no ano de 1678, Manuel José foi constrangido a abandonar Madrid e “refugiar-se” em Nápoles  para escapar às disputas com coroa e os credores.
Da situação familiar de Manuel José, diremos que casou duas vezes. Primeiro com Mécia Ferro de Castro, sua prima e sobrinha, filha de Sebastião Ferro de Castro, seu tio, e de Luísa Cortiços, sua irmã. Deste matrimónio houve dois filhos: Sebastião Manuel Cortiços e Luísa Ferro Cortiços. 
Depois do falecimento de sua mulher, Manuel José voltou a casar, desta vez  com uma senhora da família dos condes de Vergheyth, de Bruxelas, da qual teve Giovanna.
No início dos anos 80, Manuel José foi estabelecer-se em Veneza, próximo da residência de Agostinho da Fonseca, falecido em 1681. (7) Ali morreu o seu único herdeiro masculino Sebastião Manuel Cortiços, em 1689,  e ele próprio  em 1691 .
Da família Cortiços Villasante restou Luísa Teresa Cortiços, que, em 1693, casou com Francesco de Galuzi mudando na ocasião a sua residência para Nápoles, e Giovanna Cortiços, que em 1705 , na  cidade lagunar  casou com Bartolomeu Santa Sofia. (8) 

NOTAS e BIBLIOGRAFIA
1- A.N.T.T. Inquisição de Lisboa  processo 10875 de Duarte Nunes Nogueira, solteiro , 50 anos  natural de Bragança,  morador  na vila de S. Paulo de Luanda, Angola, ouvidor  geral daquele reino, primo de Espledián. ANDRADE e GUIMARÃES, Nós transmontanos sefarditas e marranos, Duarte Nunes Nogueira  - Jornal Nordeste - 7 Fevereiro 2017.  

2- Andrade e Guimarães –Nós transmontanos sefarditas e marranos, Manuel de Almeida Castro  - Jornal Nordeste - 27 Dezembro 2016.  

3-ANDRADE e GUIMARÃES - Nas Rotas dos Marranos de Trás-os-Montes, pp. 41-77, Âncora editora, 2014.

4-AYÁN, Carmen Sanz – Consolidación y Destrucción de Patrimonios Financieros en la Edad Moderna. Los Cortiços (1630-1715), p. 2; SCHREIBER, Markus – Marranen in Madrid, 1600-1670, pp. 67-76.
BAROJA, Julio Caro – Los Judíos en la España moderna y Contemporânea, vol 2, p. 115: - …aprestó en varias ocasiones a los tércios de Flandres, adelantando 600 000 escudos en un momento.

5-BAROJA… ob. cit. P.115.

6- RUSPIO, Federica - Da Madrid  a Venezia : L’ ascesa  del mercante  nuovo cristiano  Agostino  Fonseca . Mélanges de L´Ecole  francaise de Rome  - Italie  et Mediterranée  modernes  et  comtemporaines (en ligne).

7- ANDRADE e GUIMARÃES, Agostinho da Fonseca, in: – Nós transmontanos sefarditas e marranos  - Jornal Nordeste, nº 1076, Bragança, 27.6.2017.

8- RUSPIO, Federica, ob. Cit.

Do Movimento Operário e Outras Viagens, de Ernesto Rodrigues

Um poema é a projecção de uma ideia em palavras através da emoção.
A emoção não é a base da poesia: é tão somente o meio de que a ideia se serve
para se reduzir a palavras.

Ricardo Reis (Fernando Pessoa)

 

Este livro de poesia é composto por quarenta poemas, elaborados como resposta aos estímulos das deambulações do poeta, como se infere da leitura do título “Outras Viagens”. Os topónimos poetizados por Ernesto Rodrigues são as cidades míticas que enformaram a sua cultura, nessa busca interminável do ser por ele próprio e, através dele, pelo outro, lato sensu, pelo homem em busca da sua felicidade, que o poeta só consegue descortinar pelo amor à língua, cultura e civilização.
A obra abre com a composição poética que dá título ao livro, “Do movimento operário”, onde, para além de se fazer uma sentida homenagem ao honesto trabalho com o qual o Homem ganhará o pão, metaforizada no pai do poeta, se compara o ofício da forja, isto é, do ferreiro ao ofício cantante, ou seja, à ars poetica. Assim, para o eu lírico, o processo alquímico é análogo, pois, tal como o ferreiro domina e molda o ferro em brasa para dar forma aos mais belos e proveitosos utensílios, o poeta funde, molda e dá forma às palavras para escrever o verso mais perfeito que consiga auxiliar o leitor na sua autognose permanente.
O segundo poema é um soneto, embora a arquitetura estrófica não seja a canónica, uma vez que é composto por um dístico e três quadras, dedicado à mãe do poeta, onde se patenteia o carinho e a ininterrupta preocupação maternal. Parece-me que o dístico resultaria melhor no final, visto tratar-se da súmula do poema, funcionando, assim, como chave de ouro.
Os poemas deste livro podem reunir-se, segundo creio, em dois grupos: o primeiro marcado pelo tom mais intimista, ou seja, mais lírico, presente nos sete sonetos e nas composições mais curtas, onde se ouve a voz dolorida do poeta murmurando com saudade as doces alegrias pretéritas; o segundo, e mais amplo, compreende o grande número de poemas narrativos, que, na minha ótica, se organizam em torno de duas realidades, significativas a todos os níveis para o poeta, a saber: Europa, e Portugal/Nação/Pátria.
No primeiro grupo, encontramos textos sobre topónimos da Hungria e de outras cidades e países da Europa, que enformaram culturalmente o poeta. Nestes poemas de grande fôlego o tom épico alterna com o lírico, facilitando a comunicação com o leitor.
O seguinte reúne poemas sobre o país, assunto de questionação constante pelo poeta, onde o tom épico secundariza, de vez, a voz lírica, nos quais o eu poemático assume, sem ambages, a atitude prometaica da poesia. Esta atitude leva-o a declarar abertamente o seu intento, que passa por provocar a reflexão no leitor e levá-lo à ação, para que, em conjunto, se possa construir um mundo melhor. Nem outra função pode ser cometida à poesia a não ser inventar novas realidades a partir do real concreto. 
Menciono o poema épico “Outra Pátria”, em jeito de epítome do que afirmei atrás. Esta composição apresenta a estrutura interna da epopeia, pois encontra-se dividida em quatro partes: proposição, invocação, dedicatória e narrações. Aqui, creio que o modelo é Camões, uma vez que as epopeias clássicas não apresentam, na sua estrutura interna, a dedicatória. Poema singular e fulcral na arquitetura do livro, onde imitador e imitado se confundem num derradeiro esforço de refundação da pátria que, por incrível que pareça, continua numa austera, apagada e vil tristeza. Não falo nas aproximações estilísticas, realço, tão só, os motivos e propósitos enunciados no incipit do poema: “A luz, a cor, o dom de minha terra / canto, no tempo mau em que navego.” (p. 50, sublinhado meu) Resulta, também, feliz a decomposição dos versos da “proposição” em elementos, realçando, desta forma, o ritmo e a compreensão da leitura. A primeira estrofe da composição 4 da narração corrobora a ideia de privação e do abatimento que persiste em acompanhar o país, no presente, como se percebe pela interrogação com que termina a estrofe: “Que bravia sombra vem, / ronronante, levando-me por sobre / sonhos gastos de pátria tão pobre?” (p. 61)      
É, ainda, pertinente salientar que este carme é antecedido pelos poemas “Língua” em que lemos: “Eu comovo-me, povo, com teu fado, / a coragem de ser além de nós, / tão pequeno, já solo embarcado, / para longes contactos, uns após // outros – em sintonia cor e língua.” (p. 44); “História de Portugal”, no qual se revisitam os acontecimentos fundadores da nossa identidade como Nação; “Pátria”, onde “Chão, Deus, água, valor, língua, / são quinas de Portugal” (p. 46); “Rimas Pobres”, em dois andamentos: no primeiro o poeta apresenta um retrato mórbido do país, como se pode constatar pela primeira quadra: “A maldade tomou conta de nós. / Prometia baixar impostos; dar / emprego a milhares; ser correcto; / ajudar quem precisa, e avós” (p. 47). A segunda parte encerra com um aviso e a convocação à não resignação dos leitores/eleitores para que não embalem no falar melífluo dos governantes: “Mas, se fores // na conversa, em ti chorarás quanto / buscou evitar-te este meu canto.” (p. 47, sublinhado meu) O vate acredita na possibilidade de a poesia, “este meu canto”, ajudar a transformar o mundo e a tornar o ser humano mais cônscio; “Governo”, onde se faz uma crítica desvelada à imigração e se apela à pátria, adjetivada de amada, para que, tal como uma mãe, continue a sustentar os seus filhos, “O exílio // não é vocação - pesa-, ó amada pátria: sê grande, mas em ti; cria bens;” (p. 48).
A composição “Outra Pátria” precede o carme “Democracia”, um longo poema narrativo organizado em seis partes no qual o poeta, recorrendo a adágios populares e a frases feitas, continua a pintar um quadro do país com cores esmaecidas, onde, apenas, é nítida a falta dessa mesma liberdade que dá título ao carme. O sujeito lírico chega ao ponto de a apostrofar, “Sê, democracia, igual aos que te desejam recta, cultivada” (p. 64). Ato contínuo, o poeta continua a enumerar as desventuras da democracia, recorrendo, despojado das demais armas, à poesia como a derradeira salvação, “A ti cabe, amigo verso, tal / dedicatória (…) Por ti começa, verso, sermos outros” (p. 65). Mas, e apesar destes desejos e incentivos para que a democracia seja o sol do país, a composição culmina de forma disfórica, como se pode constatar pela leitura destes versos: “Tens, ó democracia, sangue vil em ti. / Não digas, pois, que és democracia. Oh, / mas que de ilusões o homem se sacia…” (p. 68) 
Este conjunto de poemas, sob o signo da portugalidade, apresenta três momentos. O primário formado pelo conjunto de carmes que precedem “Outra Pátria”, nos quais o poeta reflete sobre o país no passado, no presente e “sem futuro”. Por essa razão, ele propõe uma alternativa, seguindo no encalço de Camões, que passa por reedificar uma “Outra Pátria”, acreditando que o canto/a poesia, como aconteceu com o épico, pode cumprir esse desígnio. Penso ser essa a inferência que se pode retirar da leitura da estrofe que encerra o referido poema: “Honrar quem nos comove: língua, chão, / dignidade; ser grande na incerteza / lida de viver. Um poema não / faz muito - mas é cais, casa, desperta / asas do sim, que dão cor ao lugar. / Um poema faz-se para criar.” (p. 61, sublinhado meu).
Os antepenúltimos poemas do livro, “Civilização” e “Cultura”, reacendem a proposta de Pessoa na Mensagem. No entanto, o que em Pessoa era sonho, crença e esperança nesse Quinto Império capaz de redimir o país, é, no presente, para Ernesto Rodrigues, desalento, pois “A civilização é um mal sem cura; / sobrevivemos?” É, ainda, miséria e sujeição, “dependência, necessidades falsas – sonho de verbo-acto, adjectivo, / quando a vida é nome pobre” (p. 71). É, por fim, hipocrisia: “Cresce sociedade / no equilíbrio certo / entre o ser e o ter. (…) Morrem / povos famintos. Voam / palavras, que encobrem / os ares; e não vende / arte fora de moda” (p. 74). A deceção é total, como se depreende da interrogação “Que mundo nos calhou, / tão desequilibrado?”
O livro de poesia Do Movimento Operário e Outras Viagens abre com um tom épico cantando as capacidades do homem que, modificando o mundo, pelo trabalho, se transforma. E finda com o registo lírico em tom autobiográfico no poema “Dono de mim, não perco nada. Séneca”, e com a crença nas potencialidades da vida humana em “A vida não é uma linha; tem”, onde as últimas palavras constituem um repto à não resignação do ser humano e à crença nas suas capacidades para transformar o mundo: “Faz / da dor teus pés de lã, rasgando lagos; / do riso, praia nua, que afago” (p. 76).
Epilogando, este livro pode ler-se como uma sonata em três movimentos e em forma circular: o primeiro, onde se faz a apologia épica do trabalho; o segundo, onde ecoam algumas vozes resultantes da fadiga e do ceticismo emanados da espuma dos dias, para, no último andamento, se reforçar, de novo, as capacidades individuais do ser humano.
 

DE REGRESSO À CLARIDADE

1. Após algumas semanas nas profundezas bem perto do Hades, mercê de um acto cirúrgico fora do esperado, consegui voltar à claridade. Foi um refrigério, apesar de a convalescença ainda ser longa e neste momento me faltar a legitimação do equilíbrio de forma duradoura e sustentada. Exercício e fisioterapia por mais uns tempos. Voltar à claridade deu-me a exacta noção da nossa pequenez ante um simples dói-dói, parafraseando o desbocamento alar do deputado Amaral.
2. Falando em desbocamentos, fiquei aturdido em face da profusão de especialistas no domínio da protecção florestal, tantos outros no referente às causas da tragédia de Pedrógão e ainda no que tange às formas de poder ter sido evitada, sem colocar em dúvida as dúvidas suscitadas pelas contradições inseridas nos relatórios da burocracia especializada na linguagem de pau e no enterro da culpa que morre sempre solteira e virgem.
3. A par da tragédia, tal como aos antigos folhetins radiofónicos estilo TIDE da minha adolescência, um senhor funcionário antigo «papa» Pinto da Costa oferece aos fanáticos da bola ingredientes de mensagens onde o Benfica surge na pele do grande manipulador dos bastidores do universo do desporto-rei. Na sequência, os palradores televisivos animam horas e horas nas televisões para gáudio de uns e desespero de outros. Assim irá continuar enquanto não chega o campeonato e consequentes tribulações.
4. Os jornais dão conta de traições, raivosos ciúmes, além das inevitáveis proclamações de fé na vitória nas próximas eleições autárquicas, fazendo lembrar a rã a soprar para dentro na esperança de conseguir atingir o volume do boi, ora muitos dos candidatos não conseguem passar de girinos esganiçados a prometerem sol na eira e chuva nabal. O povo moita carrasco!
5. Eu não vi o amplexo entre Marcelo e Jorge Gomes no palco da desgraça, os homens também choram e muito, não lhes fica mal apesar da velha e abstrusa crença no ser sinal de fraqueza os homens chorarem. O escritor Sttau Monteiro escreveu um livro intitulado Um Homem não chora no qual exorciza o mito.
6. No vendaval dos prós e contras, acerca de quem tem culpas no cartório decorrentes dos negregados acontecimentos derivados dos malefícios do fogo não li, nem ouvi safanões à acção de Jorge Gomes o que muito me apraz, sem fanfarronadas, discreto, não corre para ficar em lugar saliente é merecedor de elogio. A sua Ministra de voz ciciada está tremida, no rescaldo veremos se não será imolada porque não se tem mostrado convincente na apresentação dos seus argumentos.
7. Este jornal reproduz declarações de João Gonçalves, ele manifesta incertezas sobre a adesão à Comissão Intermunicipal do Douro, a seu tempo nas colunas de o Nordeste lamentei a falta de coesão levando à desunião no Distrito fazendo prevalecer a ganância sobre a identidade e os liames da unidade, nunca é tarde para arrependimentos veja-se S. Pedro, só que agora a orelha não verte sangue ao menos o Santo cortou uma.
8. Passou mais uma festa em honra do chaveiro do céu na aldeia de Lagarelhos da qual é orago, revejo-o no andor sempre direito apesar dos tropeções dos mordomos sustentáculos do andor, barba cerrada canosa tal como a florescente cabeleira, nas mãos as chaves, o Santo proporcionava colorido dia de festa apimentada pela língua dos jogadores de paus e comparsas, apostavam-se litros de vinho, tentavam-se ajustes de contas lembrando jogatanas antigas. Tenho a obrigação de visitar o Santo de vez em quando, estou em clamorosa falta, espero repará-la na próxima ida á aldeia dos prodígios.
9. Atirado para a obscuridade durante tempo a não desejar a ninguém, no retorno à claridade levanto neste escrito casos e assuntos por demais conhecidos, foi uma forma de recuperar lembranças, de voltar à escrita e agradecer ao Teófilo Vaz os seus cuidados e o toque a rebate a dizer ter chegado a hora de recomeçar. Assim o faço para lá das cautelas e limites de quem a ainda faltam muitas sessões de adestramento dos músculos para estar em pleno. Ao Teófilo o meu obrigado

Mundividência

Boas tardes meus caros. Como têm passado? O calor aperta por aí? Costuma dizer-se que o tempo que vem no seu tempo não é mau tempo. O tempo, sempre tão dado a ditos e lengalengas. Sem perder tempo vou dar-me a outras considerações e mudar um pouco de assunto. Por mais que os tempos avancem e se celebrem vitórias há uma coisa de que os portugueses mal conseguem desprender-se. De cada vez que se fala do estado das coisas em geral ou de algum tema em particular lá vem o velho argumento “porque lá fora é assim”, porque “na Europa faz-se assado”, porque “lá é diferente” (entenda-se por diferente muito melhor do que cá). Primeiro este tema não é novo. Já Eça de Queirós escrevia acerca desta tendência para o português facilmente se deslumbrar de cada vez que ia ao estrangeiro e uma vez regressado ninguém o calava com esses “porque lá fora isto, porque lá fora aquilo”. Falava desta espécie de basbaquice portuguesa acompanhada pelo constante engrandecimento de tudo o que se fazia no estrangeiro e a tendência para a desconsideração da nossa própria forma de fazer as coisas. Hoje em dia ainda é comum estar a ler notícias ou entrevistas e surgir o tal “porque na Europa”. Portugal, país acontinental de morada desconhecida, onde a Europa é outra coisa. Penso que estes princípios e atitudes, como tudo, têm um lado bom e um lado mau. O lado bom é que olhamos para fora e de uma maneira ou de outra nos inspiramos ou aprendemos algo com isso. Somos um povo atento ao mundo, basta ver o espaço que as notícias - de todo o tipo - estrangeiras têm nos nossos meios informativos. Nas décadas mais recentes apreendemos e adoptamos muitos modelos e condutas importadas, nem todas se aplicam à nossa realidade, mas a verdade é que essa atitude nos ajudou a melhorar, a desenvolver, tentativa, erro, a encontrar o nosso estilo com essa noção presente de como é “lá fora”. É verdade que sermos um país que se cruza em duas horas ajuda um pouco a esta predisposição. Países territorialmente extensos, quiçá demasiados extensos para um país só, têm muito com que se entreter dentro de portas, diferenças de vária ordem para agregar diariamente, sendo que não possuem nem de perto nem de longe esta visão global como povos de todo um vasto mundo que os circunda. São de certa forma países autónomos e auto-suficientes no que à mundividência (visão ou concepção do mundo) diz respeito. Países há que têm objectivos muito concretos no que respeita a esse “olhar para fora”, perseguem ferozmente certos modelos económico-sociais (mais económicos do que sociais) e fazem uma filtragem do que consideram acessório ou dispensável para conservar essa concepção. A China, pois claro, tem ambas as características. Em chinês, China (中国 –Zhong guó) significa “país do meio”. Reparem bem em como é gráfico esse primeiro caracter e nele se consegue divisar perfeitamente o significado de “meio / centro”. Historicamente a China sempre se viu e se vê como o país do centro. Aliás, o que para o Ocidente a Antiga Grécia representa, a Oriente todas as culturas beberam de uma forma ou de outra da ancestral China Imperial. Por exemplo, aqui o mapa do mundo tem a China (Ásia) no meio. A Europa e África à esquerda e as Américas do lado direito. Quando vejo um mapa-mundo dos chineses lembro-me do Cabo da Roca e da pedra que cita Camões, “onde o mar começa e a terra acaba”. Isto porque à esquerda de Portugal no mapa só o Oceano Atlântico. Mas se afinal o planeta é redondo quem os impede de o apresentar deste modo e de se colocarem no lado que quiserem da fotografia? Estas coisas ajudam a perceber como os povos se vêem no meio do mundo. Isto é, os chineses vêem-se literalmente no meio, no centro do mundo, mas o que eu queria dizer é como nos vemos como parte deste planeta, deste conjunto de territórios e nações. Não me esqueci, o lado mau. O lado mau é que esta ideia constante de tomar o lá fora como exemplo, por vezes faz-nos ver um pouco mais pequenos em relação aos outros e, como consequência, faz com que os outros nos vejam também dessa forma. Um pouco como aquela do “se não gostares de ti quem gostará?”. Neste caso, se te vês a ti mesmo de um determinado modo como queres que os outros te vejam? Os nossos olhos postos lá fora, e nos que vêm de fora, dão-nos uma visão do mundo mais ampla e inclusiva. Em jeito de balanço creio que esta postura tem-se despido bastante da pequenez de outrora e tem tido um impacto considerável e positivo em nós enquanto sociedade. Mas o que será exactamente este “lá fora” que tanto repetimos? Talvez volte a falar disso. Cuidai-vos!

Helena Alves, o primeiro elemento da Família do Tio João

Ter, 04/07/2017 - 10:15


Olá familiazinha! Já estamos no mês sete, que é Julho. Mês de férias para alguns e de trabalho para muitos. E que seja de vida para todos.

Os nossos amigos emigrantes já têm o ponteiro das saudades no vermelho. Já falta pouco!

Nos dois últimos dias do mês de Junho, o Verão abrasador foi de férias e tivemos a oportunidade de refrescar as casas e de passear os casacos. Mas agora já voltou o Verão em grande.

Os escritórios da terra também tiveram rega automática vinda do céu: a chuva.

 

Segurança e democracia

Ter, 04/07/2017 - 09:42


Vivem-se tempos paradoxais em que, apesar de todas as globalizações, festejadas ou sofridas, os indivíduos se deixam embalar em ilusões sobre redomas que os manteriam a salvo das agruras da história, mesmo quando os sinais de risco se repetem a ritmos avassaladores.