Luís Ferreira

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Vendavais - Desmandos da ignorância

A questão bíblica sobejamente conhecida Quo Vadis Domine, Para onde vais Senhor, pode-se aplicar aqui perfeitamente, quando queremos saber para onde quer ir este governo com algumas medidas que pretende implementar. Impõe-se colocar de lado o Domine, já que este senhor do governo, nada tem de bíblico.

Numa sociedade que se diz moderna e onde o conhecimento se deve pautar como base de progresso, não se entende que se proponha passar os alunos até ao nono ano, mesmo não sabendo a matéria curricular que é dada saber e que promove a progressão normal do ensino básico. Todos sabemos que as bases são essenciais seja o que for que se queira construir. Se as bases forem fracas, toda a construção cairá mais facilmente. Uma casa sem bases sólidas, arrisca-se a cair ao menor vendaval.

Ora se queremos uma sociedade conhecedora, moderna, preparada para podermos falar dos homens de amanhã, desses que nos irão governar, como costumamos dizer, então teremos de os preparar convenientemente, caso contrário arriscamo-nos a construir uma sociedade onde predomina a ignorância e cujo futuro é inconsequente.

O governo até pode desculpar-se com as justificações que entender, mas isso jamais servirá para convencer a opinião pública da tremenda injustiça e irresponsabilidade dessa pretensão. Os alunos não podem ser joguetes de uma qualquer satisfação do governo, nem podem ser atirados para um mundo de trabalho onde predomina a ignorância e a irresponsabilidade. Um governo responsável prepara a sua juventude convenientemente e alerta-a para os perigos de um futuro cada vez mais incerto. Não podemos preparar uma sociedade do salve-se quem puder. Isso quase já nos toca pela porta com tanta corrupção, roubos e assassinatos diariamente.

Os professores têm a responsabilidade e obrigação de ensinar os seus alunos e, estes têm a obrigação de aprender o que lhes é ensinado para assim poderem progredir depois de avaliados convenientemente. Se os alunos souberem que podem passar mesmo sem saber e que não são retidos mesmo se não souberem a matéria, eles não se preocuparão em estudar e assistem às aulas como quem vai a uma sessão de cinema, ou seja, para passar tempo sem se preocuparem com mais nada. E os professores como sabem que não adianta insistir muito com os alunos para que aprendam, pois passam sempre, deixam simplesmente a turma ao sabor dos ventos, e esperam que o final de ciclo chegue para passar o atestado de incompetência aos alunos que pretendam seguir para o ensino secundário, mesmo pouco mais sabendo do que escrever o seu próprio nome.

Antigamente era imprescindível aprender a ler, escrever e contar correctamente e não me refiro a umas dezenas de anos atrás, refiro-me a alguns séculos, pois entendia-se que isso era a premissa indispensável para poder participar na vida pública com a responsabilidade que isso acarreta. Hoje, isso torna-se irrelevante e escrever mal, ler mal e dar erros no seu próprio nome, é coisa normal e quando vemos ministros a dar erros e a usar vocábulos desajustados, legendas nas televisões, cheias de erros e até alguns professores a dar erros, não podemos querer que isso continue a ser normal. Afinal que sociedade queremos nós formar?

O sistema de ensino está dividido em ciclos e um deles é chamado de Básico e vai até ao nono ano. Se queremos que seja básico, temos de o considerar realmente como a base de todo o restante sistema para não corrermos o risco de o ver desabar completamente. Não sei o que passa pela cabeça destes governantes ao pretender facilitar a passagem de alunos pouco preparados, ao longo de três anos e depois atirá-los às feras acreditando piamente que meia dúzia deles se conseguirá salvar. Não pode ser assim. Nem eles são peões de um tabuleiro de xadrez, nem os professores podem ser os palhaços de um circo irresponsável, onde nada faz rir e nada é consequente.

Felizmente há sempre alguns alunos que querem aprender e sabem bem o que querem ser e até têm pais que os motivam e lhes indicam o caminho da responsabilidade, do respeito e da educação como fatores vencedores das muitas barreiras que o futuro lhes reserva. Há bons alunos sim e poderão continuar a haver porque nem todos entrarão no saco desconfortável que o governo está a mostrar. A ignorância nunca foi causa vencedora e só apoia a ignorância quem quer promovê-la.

Espero sinceramente que esta medida agora em análise pelo governo, não siga para diante sob pena de entrarmos num sistema onde os desmandos, a irresponsabilidade, a falta de educação e o desconhecimento das coisas mais básica, passam a ser a marca da sociedade portuguesa.

De facto, as armas e os barões assinalados que daqui partiram e levaram a nossa língua para o mundo inteiro, não passam de uma História sobre a qual pouco se aprendeu. São os desmandos da ignorância!

Vendavais - Galinha gorda por… muito dinheiro

Conversávamos despretenciosamente um com o outro, ele dizendo que nem por isso e eu teimando que seria demasiado. Levantámo-nos e iniciámos uma marcha lenta onde a conversa continuou sobre o mesmo tema. Ele na sua e eu na minha, sem desviarmos a certeza inicial que cada um tinha sobre o tema versado. Caminhámos sem destino pelo passeio que a cada passo se estreitava e causava os incómodos de pisar o alcatrão onde os automóveis passavam sem a preocupação de distinguir se a passadeira existia por ali ou não. Apesar de tudo, o assunto em debate continuava a ser o mesmo. O meu amigo fazia valer as suas visões sobre o que se passava e eu contrapunha com as minhas. Nenhum desmarcava. Passou talvez mais de uma hora. Resolvemos parar e sentarmo-nos novamente ocupando uma mesa de esplanada que recebia o Sol do fim de tarde. Era tempo para um café, ou talvez não.

Retomámos o assunto em debate depois de saborearmos o apetitoso e bem cheiroso café. Agora, reconfortados, talvez pudéssemos desviar o assunto para margens mais calmas. Não. O meu amigo não estava satisfeito com a minha posição e tentou convencer-me de que tinha toda a razão. Eu achava que não e tinha o meu direito de o defender. Teimava eu convictamente que o novo governo era demasiado grande para um país tão pequeno e ele continuou a rebater o contrário, aduzindo que a necessidade assim o impunha. Mas que necessidade? Pedi-lhe que me dissesse que necessidade impunha a um país como o nosso, um governo com tantos ministérios. Ele adiantou uns poucos, sem coerência política o que me facilitou a contradição imediata que ele continuou a não aceitar. Continuámos o debate.

Afinal, que não quer galinha gorda por pouco dinheiro, questionei. Todos, respondeu ele. Finalmente tínhamos chegado a um consenso. Claro que sim. Mas era um consenso que não servia para explicar o que estava em debate e me permitiu rebater. Então o que temos no governo é uma galinha gorda, mas por muito dinheiro, ou não será? Ele apressou-se a responder que não, que isso nada tinha a ver com o governo, que era só um modo de falar. Pois é. Falar, falar é o que todos fazem, disse eu. Este governo é uma galinha gorda, primeiro ponto. Ele pediu que eu justificasse e aduzi o facto dos dezanove ministérios e quase cinquenta secretarias de estado. Não gostou, nem ficou satisfeito. Sentiu-se incomodado. Aproveitei para reforçar a ideia das cinquenta secretarias de estado e questionei que razão justificava a existência de uma secretaria para o Cinema, Audiovisual e Média ou para a Internacionalização ou até para a Integração e para as Migrações se, no fundo, isto já estava atribuído a outros serviços e funcionavam adequadamente. É uma necessidade, respondeu. Assim funciona tudo melhor. Pois, se calhar não, respondi, mas mesmo que fosse mais funcional era com toda a certeza mais caro, muito mais caro. Continuei com a minha visão mais minimalista e pedi para me justificar a razão de uma secretaria para a Transição Digital. Transição Digital? O que é isto? Não me soube dizer. Talvez a necessidade de engordar a galinha, disse eu. Olhou-me de soslaio e o esgar do rosto disse tudo o que ele pensava.

O tempo ia passando sem nos apercebermos. Contudo o tema de conversa continuava o mesmo. Ele defendendo a sua dama e eu a minha. Os dois aduzíamos razões plausíveis que sustentavam minimamente as nossas visões egocêntricas. Talvez fosse uma questão de cidadania e igualdade, tal como a nova secretaria de estado à qual eu não achava graça nenhuma por não lhe encontrar justificação. Afinal todos somos cidadãos e a igualdade já é assim considerada desde a Grécia antiga e reforçada ao longo dos séculos e foi uma das causas das revoluções liberais mais recentemente. Refutou a minha justificação, mas não acrescentou mais nada. No intervalo em que ele nada disse, eu chamei-lhe a atenção para o facto da existência da secretaria para o Desenvolvimento Regional e outra para a Valorização do Interior. Então não chegava uma só? É uma necessidade e é mais funcional, retorquiu. Não, não é. Se queremos desenvolver e valorizar o interior ao mesmo tempo que as regiões, não é preciso duplicar, a não ser para engordar a galinha. E ainda acrescentar outra para a Descentralização e Administração Local, piora tudo. Assim é quase triplicar o mesmo serviço. Não é, respondeu ele. E eu que sim e ele que não. Mas afinal o interior não é sempre interior? A região não é sempre a região? Então a administração local não é na região? Na região não está o objetivo do desenvolvimento? Então para quê a descentralização se o interesse é desenvolver o interior e as regiões? Não conseguiu responder. Baralhou-se. Então? Não dizes nada, perguntei. Esta conversa não leva a lado nenhum, disse. Pois não, concordei. Afinal sempre tenho razão, disse eu. Isto não é mais do que uma galinha gorda, mas por muito dinheiro. Mais do que o que temos para o que mais necessitamos. Galinhas destas, ninguém compra.

Vendavais - Rio sem margens

As margens condicionam os rios para que saibam por onde correr até se poderem espraiar no oceano imenso que se abre à sua frente. Todos os rios têm margens. É o GPS indispensável para que o caminho não se altere demasiado.

Ora acontece que as últimas eleições deixaram Rio quase sem leito e sem margens. Desgovernado e sem orientação, Rio tenta agora encontrar a segurança das margens e voltar ao leito original. Não será fácil. Este Rio tem demasiados afluentes, mas parece que nem todos correm na mesma direcção, muito embora queiram desaguar no mesmo oceano.

Faz-me lembrar este cenário o de Boris Johnson no Reino Unido, que parece estar cada vez mais desunido e sem rumo certo. As margens já as perdeu e o leito por onde corre é cada vez mais estreito. As verdadeiras margens estão a orientar outros interesses, que são obviamente contrários aos dele. Os objectivos são completamente diferentes. Ele quer sair da EU e os outros querem ficar. Aqui, a segurança parece estar no leito e nas margens da União Europeia que, pelos vistos, não é o que interessa a Johnson. Difícil a solução quer para o Reino Unido, quer para a União Europeia que não quer mais adiamentos. Parece-me que somente um novo referendo resolverá o que realmente quer a União Europeia e se assim for, a escolha será certamente a permanência. Acaba-se o Brexit e ainda bem.

Por cá, já Rio não pode navegar da mesma forma. A escolha de avançar pelo leito que ainda tem, parece ser o mais sensato, mas as margens são demasiado baixas e terá sempre de ter atenção aos afluentes. Alguns têm caudal volumoso e podem causar inundações perigosas.

O oceano para onde correm uns e outros é e será sempre o PSD. Disso ninguém duvida, ao que parece. No entanto, as margens extremam-se e a segurança deste Rio é pouco fiável. A verdade é que este desaguar de interesses pode ser conflituoso, o que não é nada bom para o grande oceano que os espera receber de braços abertos.

Entre montes, serras e rios, erguem-se outras barreiras difíceis de ultrapassar. Montenegro é um afluente que vai correndo em margens diferentes, mas com algumas margens seguras. Maria Luís pode ser uma dessas margens de Montenegro e a outra até pode ser a de Cavaco Silva que parece amparar Maria Luís Albuquerque. Montenegro é assim, o afluente que parece querer encher com a última chuvada e avançar destemido para o oceano tenebroso que o espera. Chegará lá?

Por outro lado, Rio permanece em sossego, no leito estreito, sem nada fazer a não ser, envolver-se na manta de silêncio que o cobre, sem sair da estreita margem que o sustem, deixando adivinhar que quer seguir o seu caminho até ao final.

Para o PSD isto não é vantajoso. Todos sabem que a mudança é necessária, embora isso não signifique uma nova liderança. O líder actual tem mais dois ou três meses para fazer alguma coisa de novo. Talvez uma nova estratégia a partir dos novos deputados dos quais ele faz parte e da composição da nova Assembleia onde haverá muita inexperiência. A sustentabilidade do governo de Costa vai depender muito dessa nova agremiação e do modo como ele vai gerir os interesses do governo e do país. Catarina não parece querer dar tudo de mão beijada, até porque ela não se dá muito bem com esse tipo de cumprimentos. Já o afirmou e continua a dizer que o relacionamento entre o BE e o PS nunca foi fácil e só existiu como um comprometimento nacional cujos interesses abarcavam o país inteiro. Agora, que o espectro político é um pouco diferente e apesar de Costa ter outra sustentabilidade, não lhe dá a certeza de chegar ao fim da legislatura. Aqui, as margens também são estreitas. Na margem esquerda tem a Catarina, na direita tem Rio. Quem o vai amparar? Muito embora o caudal seja maior, não significa que o leito de Costa o consiga segurar até ao desembocar final. Certamente não transbordará.

O que esperar então deste Rio? Sem leito seguro, sem margens que o amparem devidamente e com rumo débil, que caminho seguirá? Avança até às diretas ou até ao Congresso? Fica pelo caminho? Deixa-se ultrapassar pelos afluentes?

Pois a incógnita das margens por onde correm os rios do PSD não parecem nada seguras para impedir que eles percam caudal. Estreitecem à medida que eles avançam e nenhum parece receber mais enxurradas de modo a chamar as margens ao seu dever obrigatório de os amparar do descalabro final. O PSD está à espera que eles cheguem à foz ou que, pelo menos um deles, chegue com o caudal necessário para se afirmar no oceano imenso onde se irão espraiar.

Contudo, o que parece estar a acontecer é que todos os rios estão bem pouco caudalosos e o oceano que por eles espera não se engrandecerá tão depressa. Desafios das correntes.

Vendavais - A quinta avenida

Ir a Nova Iorque e não ir à 5.ª avenida é como ir a Roma e não ver o Papa. É obrigatório. É um ritual que todos fazemos com gosto, seja em Nova Iorque seja em Roma. Mesmo assim todos esperamos ver o que nos leva lá realmente. Deslumbramo-nos com a grandiosidade, com as luzes, com as montras e com o que por lá se vende, ainda que não possamos comprar o que mais nos cativa. Ficamos somente pela superficialidade e vamos navegando docemente, sem nos cansarmos para não corrermos o risco de nos afogarmos. Mas afinal esta avenida é somente uma entre muitas outras, não nos deixemos enganar pelas aparências. O que há nesta também existe nas outras, só que a outros custos. Temos que escolher bem o que queremos. Os nossos bolsos não assim tão fundos!

Pois este fim-de-semana não fomos nem a Roma ver a sagração de Tolentino nem a Nova Iorque ouvir as asneiras de Trump. Ficámos por cá, a refletir para escolher qual a avenida onde iriamos comprar o que mais nos poderia cativar e se estaria de acordo com a fundura dos nossos bolsos. Mas muitos, demasiados, não escolheram nem foram à avenida mais próxima de casa ver o Sol brilhante que poderia iluminar e esclarecer as mentes mais fechadas.

Pois é. Por vontade de alguns acabava-se o leitão da Bairrada, a posta Mirandesa, a feijoada à Transmontana, os bifinhos com champinhons e outros pratos quejandos. Não podemos matar os animais! Comer mesmo, só sardinha, carapau, camarão, vieiras, berbigão, gambas e gambão, ostras, amêijoas, lagosta e lagostim, santolas e percebes. Enfim. Somos ricos e já que ficamos sem poder saborear a bela carne que criamos, vamos à pesca. Saímos do prado e vamos ao mar que é largo e tem muito peixe. Bem, afinal parece que não vai ser bem assim.

A realidade destas eleições não é muito diferente do que estamos habituados. Ganhou o PS e já contávamos com isso. Costa talvez quisesse mais, embora não o pedisse diretamente, mas cada um tem o que merece. O PSD cresceu depois de lhe terem dado inicialmente 19 a 20% nas sondagens. Se cresceu, teve uma vitória ainda que pequena. O BE manteve o seu score, mas possivelmente não lhe vai servir de nada. A geringonça a que estava habituada não vai funcionar. A CDU não atingiu os seus objetivos e não conseguiu manter os seus deputados. Pior está o CDS que vê baixar muito o seu grupo parlamentar e a sua líder demitir-se com a dignidade a que ela nos habituou. Enfim. Enquanto uns crescem, outros baixam e hoje são uns, amanhã serão outros. É a política e a vontade dos portugueses a funcionar. As vitórias e as derrotas são sempre momentâneas. Nem sempre se ganha e nem sempre se perde. Sabe bem ao PS ganhar hoje, mas há quatro anos não teve essa sensação e sabe o que é perder. Curioso é os partidos mais pequenos e que não ganham qualquer expressão de nota, terem recebido cerca de 8 ou 9% dos votos dos eleitores quando a abstenção rondou os 48% dos portugueses. Isto é que é muito mau. Se nos questionarmos sobre isto e virmos que metade da população portuguesa ficou em casa e não votou, será lógico perguntarmos quem ganhou de facto estas eleições.

Agora que dá a impressão de estarmos na quinta avenida onde tudo é luminosidade, brilho, grandiosidade e enriquecimento, resta não nos ofuscarmos com essa luz fictícia, pois o custo de vida aí é demasiado caro e alguém terá de pagar e pagam sempre os mesmos. Dos nossos bolsos tem saído demasiado dinheiro para pagar as dívidas de quem anda pela 5.ª Avenida e isso não pode continuar. Ainda agora se noticiou que teremos de pagar 30 milhões pela dívida à Caixa da clínica Maló. E perguntamos porquê? Porque este governo vai deixar que assim seja.

Assim sendo e uma vez que o PS não vai precisar de fazer uma geringonça visto ter maioria e ser indigitado a formar governo, restar-lhe-á simplesmente fazer alguns acordos pontuais sobre matérias mais sensíveis com os partidos que estiverem disponíveis e de acordo com ele. Claro que tanto o BE como a CDU estão à espera dessa altura e mesmo até o PSD como afirmou o seu líder, a bem de Portugal, claro. Não interessa tanto saber que a Catarina Martins diz que o BE vai exercer o seu mandato, arvorando a sua vitória e crescimento, como dizer que a direita foi a grande derrotada. Não interessa nada. Quem vai governar vai ser o PS e quando precisar de algum voto vai beber um café à esquina com o Jerónimo ou com o Rio e os outros ficam todos invejosos. É assim na política. E a Catarina, possivelmente, vai ficar calada e cheia de inveja. Pois é natural. Mas nem o governo socialista vai ser a 5.ª avenida, nem o Vaticano. Não se enganem. Nem vai haver o deslumbramento da 5.ª avenida nem a paz de espírito do Vaticano. Se pensam que os salários vão aumentar, enganam-se. Se pensam que os sete anos que roubaram aos professores para pagar as dívidas aos bancos, lhes vão ser retribuídos, enganam-se. Se pensam que as pensões vão aumentar, enganam-se. Se pensam que as greves vão acabar, enganam-se. O deslumbramento da 5.ª avenida vai acabar e depressa. Fica-nos somente a sombra das árvores da avenida da Liberdade. E daqui a quatro anos, usem novamente a liberdade para eleger novo governo.

Vendavais - As golas do enforcamento

Normalmente quando alguém se quer enforcar, não compra qualquer tipo de golas e nem sei sequer se as há para esse efeito. Possivelmente não há. O método de enforcamento é completamente diferente e também ninguém vai pedir instruções seja a quem for, para se enforcar. Quando alguém quer cometer esse tipo de atrocidade individual, fá-lo sozinho e em completo silêncio. Só os condenados à morte por crimes cometidos subiam ao cadafalso perante a multidão silenciosa e estupefacta, que assistia quase incrédula, à execução do criminoso a quem colocavam previamente, uma grossa corda à volta do pescoço.

Podemos dizer então que havia dois tipos de enforcamento: um por crime e outro por iniciativa própria. Infelizmente, este último ainda subsiste em grande escala, mesmo em Portugal e com alguma preponderância no Alentejo. Talvez a cobardia esteja na base de tal iniciativa. A fuga a responsabilidades e o medo de encarar consequências, leva a este tipo de atitudes inqualificáveis e desnecessárias.

Mas a verdade é que há casos em que não sendo a cobardia a mover situações destas, elas acontecem quase sem querer ou sem se esperar e até sem se saber quem vai sofrer as consequências ou ser enforcado. E que motivos estarão na base de tal castigo.

Ficámos bastante admirados quando no início da época dos incêndios surgiram notícias a referir a aquisição por parte do governo, de golas antifumo ou antiígnias ou anti qualquer coisa, que as pessoas deveriam colocar no pescoço para evitar morrerem asfixiadas ou mesmo queimadas e que foram distribuídas pela população mais em risco de enfrentar situações em presença de incêndios. Lembramo-nos bem do que então se divulgou e da importância que isso teria para as populações. O governo enalteceu a sua própria ação que seria de louvar se por trás dela não houvessem rabos-de-palha para atiçar mais os incêndios no futuro.

As investigações que se seguiram sobre o processo de aquisição dessas golas antifumo que foram financiadas pela União Europeia em cerca de dois milhões de euros, levaram à descoberta de um contrato de três milhões de euros onde os intervenientes estavam comprometidos, de alguma forma, com elementos do governo, indiciando atos ilícitos e favorecimento em negócio por quem não deveria. Suspeita de crime, logo castigo dos criminosos.

O que ninguém estaria à espera era do desfecho que tal investigação e relatório final suscitaram. De facto, o ministro da tutela e o secretário de estado, demitiram-se do cargo a semana passada, já que por eles passou o contrato assinado com as cerca de treze empresas fornecedoras das golas e do material que com elas vinha para o mesmo efeito. Mas aconteceu. Enforcaram-se sem contar e com golas que aparentemente serviriam para salvar pessoas. Coisas do destino! Crime e castigo. Li há muitos anos um livro com este título, mas não tinha golas, nem ministros.

Em altura de início de campanha para as eleições legislativas, este episódio não traz benefício algum a Costa e ao PS. Será tema de campanha, certamente. A demissão do ministro e do seu secretário de estado, leva a uma substituição desses elementos e consequentemente à alteração do governo o que significa colocar no governo pessoas a prazo, a muito curto prazo, e que possivelmente, também elas se queimarão, já que não têm golas salva-vidas! O tempo de vigência acaba em Outubro. Pode ser que tenham sorte e Costa possa chamá-los para o novo governo, ou talvez não.

Na verdade, o que se nos apresenta como possibilidade concreta é o PS ganhar as eleições com quase maioria absoluta e isso significa ter de constituir novo governo. Os apoios virão certamente de algum lado. Claro que se perfilam todos os partidos para tirar dividendos dessa oportunidade de completar a maioria necessária ao novo governo. Nele, podem entrar os novos elementos do executivo do Ministério da Administração Interna. Seria uma forma de fugir ao escaldão!

Seja como for e o que daqui para diante se nos apresentar, a campanha trará mais descuidos a público e quiçá, alguns laivos de corrupção acrescida, que é o que neste país mais se vai descobrindo em cada dia que passa. Infelizmente. Para alguma coisa servem as campanhas, quanto mais não seja para descobrir destas situações onde uns e outros se vão enforcando quase sem darem conta, mas que bem podiam contar com isso. Hoje todos são inspetores e investigadores e até acusam e condenam na praça pública os que bem entendem, mesmo sem que os tribunais e a justiça tenham funcionado previamente. Os visados são enforcados em público sem serem condenados. Rui Rio quer acabar com isto. Já o disse e prometeu, se for primeiro-ministro. A comunicação social terá de estar mais atenta a estes pressupostos e ao que escreve, sobrepondo-se aos tribunais e à justiça, sob pena de ser ela a enforcada. E como não tem destas golas, que deixam muito a desejar, talvez não se safe … ou talvez sim.

Vendavais A pele da cobra

Nesta opaca claridade em que tudo se quer ver e nada se vê, dá-se o arranque das eleições legislativas e os partidos tentam posicionar-se em duas vertentes essenciais, na sua e na dos eleitores e para isso agrupam promessas que não os comprometam e que interessem à maioria dos que vão votar. Infelizmente votam poucos!

Diríamos com um pouco de razoabilidade, que todos comungam dos mesmos objetivos, mas seguindo por caminhos diferentes. Na verdade, o que temos observado neste titubear inicial, é a abordagem de temas comuns, como o ambiente e os impostos. É evidente que é de bom-tom e pode ganhar votos, dizer que se quer baixar os impostos e defender o ambiente que tanta agressão tem sofrido e cuja pureza se nos escapa por entre os dedos.

Engenharia económica e proliferação de projetos todos têm e todos prometem cumprir. Claro que têm de prometer cumprir. Já vimos e sabemos que as promessas não são para cumprir, mas sim para prometer. Se nada se prometer, nada se pode cumprir. E como se ganham votos se nada se prometer? No que a isto concerne, o problema reside essencialmente no modo como se fazem as promessas e em que bases são sustentadas.

Temos vindo a assistir pelas televisões, a debates entre os líderes partidários, onde se esgrimem promessas, aparentemente realizáveis e necessárias para o avanço da economia e da melhoria da situação dos portugueses. Claro, mas isto sempre foi assim. Promete-se sempre o mesmo. Então porque é que não vemos os resultados?

O que temos de diferente neste início de campanha são as bases em que assentam os objetivos. Muito embora se tenha sempre referido o interior como algo a que se te de dar prioridade, a verdade é que as populações que por cá estão não têm visto as promessas cumpridas. Agora António Costa vem apostar em promessas para desenvolver o interior do país já que cá existem inúmeros recursos que têm de ser aproveitados e enaltecidos economicamente. É verdade, mas sempre cá estiveram! E se fizerem o que sempre têm feito, continuaremos na mesma, como sempre estivemos.

Eles sabem e nós também, que aqui o ar é mais puro, que o ambiente é saudável e que existem recursos, sejam hídricos, sejam minerais, sejam hidroeléctricos, sejam agrícolas ou sejam humanos. Afinal temos tudo. Que maravilha. E para que nos serve isso? Para sustentar as promessas que nunca são cumpridas.

Apostar pois no interior e nos seus recursos parece muito bem, mas depois das eleições, quem ganhar, despe a pele que tem e depressa muda de fato. É interessante falar de descarbonização da economia, como diz a Catarina Martins do Bloco. É um termo novo e deixa as pessoas a pensar no que será isso. E como muitos não percebem e ela também não explica, fica tudo muito mais interessante, já que deixa a ignorância predominar e na dúvida, ela falou muito bem, dirá o povo. E como se referia também ao interior, pensar-se-á que é coisa de muito interesse para o povo. É desta que o interior vai arrancar!

Em regiões de baixa densidade como o interior do país, as promessas custam muito dinheiro se forem cumpridas e é por isso que só se promete e não se cumpre quase nada do que se promete. Mas é bom que se saiba que as promessas do PSD custam mais do que as do PS, isto se fossem cumpridas, mas o medo da descapitalização leva a que se fique somente pelas promessas. Mas apesar de tudo Costa veio dizer que há cerca de 1.700 milhões para as empresas do interior no sentido de atrair as populações. Talvez não seja uma promessa, mas o que eu duvido é que as empresas lhe tenham acesso e consigam atrair seja quem for. Não é fácil.

O potencial do interior e a baixa densidade não se conjugam com o desenvolvimento da economia. O potencial existe, mas ninguém lhe toca e a população não cresce e portanto também não pode crescer a economia já que não há desenvolvimento. O interior está sempre em desvantagem.

A verdade é que até outubro o caminho terá de ser percorrido e quem chegar em primeiro terá de olhar para trás e analisar as promessas que foi fazendo. Depois e para que não pareça muito mal, terá de pegar na peneira e peneirar muito bem as promessas mais viáveis e necessárias, caso contrário poderá não chegar ao fim do mandato. Se o PS tiver maioria, o que parece ser possível, então o caso muda de figura. Já não interessa o que se prometeu. Vale tudo. Não será preciso mudar de pele, como a cobra. E mesmo que mude de pele, a cobra será sempre a mesma. Quem vier depois que pague as dívidas.

 

Vendavais: Um governo à procura de rumo

Esgota-se o mês de agosto e também as férias dos portugueses. O tempo de lazer chega ao fim e com ele regressam as preocupações do tempo da continuidade. O tempo não pára, os serviços também não e se as preocupações entram em stand by para uns, a verdade é que para outros elas continuam. Nada fica parado na sua totalidade. O país não pode parar, mas houve quem quisesse fazê-lo.
Sabemos que todos devem ter o seu tempo de férias e mesmo o governo tem o direito de o gozar como qualquer cidadão em repouso e sem grandes preocupações, contudo as coisas não são bem assim. Os membros do governo estão sempre em alerta e esse tempo de lazer é muitas vezes reduzido devido a percalços diversos como os fogos ou situações mais complexas que chamam os ministros à ribalta quase sem contarem, como foi o caso da greve dos motoristas de matérias perigosas. Neste caso, um sindicato conseguiu monopolizar ministros e até o Presidente da República, face a uma greve em tempo de férias, agravando toda a circulação no país e travando a normal fluência dos veraneantes, nacionais e estrangeiros, que pretendiam deslocar-se de um lado para o outro. Realmente foi uma greve cirúrgica que atentou contra a vida dos portugueses e não só. Foi uma greve que não se limitou a exigir direitos, mas a atingir a economia do país. Perante isto, o governo teria de intervir de um modo mais ou menos subtil já que não era o visado diretamente, mas cabia-lhe resolver a parte da economia e da saúde nacionais, que ficavam reféns de um sindicato de motoristas. Foi uma situação caricata e nunca antes vista. Um país amarrado a exigências de um sindicato!
Claro que o governo teria de tentar resolver a situação. A greve estava condenada ao fracasso pois o governo ao intervir, teria de usar os meios mais eficazes para evitar o pior e minorar as consequências terríveis que poderiam surgir. O governo teria de ter uma posição de força neste imbróglio, já que tinha muito em jogo e não poderia ficar muito mal. As eleições estão à porta e era preciso contabilizar a seu favor os desagrados da população. Saiu-se mal o sindicato devido ao timing escolhido e à atuação do governo. Na verdade, ganharam todos alguma coisa.
Todos têm direito à greve. Sabemos disso. É constitucional e todos os trabalhadores têm esse direito e devem usá-lo quando é necessário, mas esta greve não deu jeito nenhum ao sindicato, mas deu algum ao governo que conseguiu demonstrar a força necessária no momento certo e contabilizou votos certamente. Interromper as férias para tentar minimizar os efeitos desta greve como intermediário, foi um tempo ganho. Se todos pensavam que o governo estava todo de férias, enganaram-se e se lhe faltava algum rumo no meio da desorientação que preconizava, encontrou-o. 
Muitos criticaram o governo na forma como agiu, mas alguma coisa teria de ser feita para travar a arrogância de um pardalito qualquer que pensava que metia na gaiola todos os passarões, passaritos e cucos que andavam à sua volta. Enganou-se.
Contudo, o governo precisa de se afirmar no regresso de férias e não me parece que o decreto que acaba de sair sobre a necessidade de ter espaços próprios nas escolas para os alunos que se afirmam ter uma escolha diferente, diga-se género, não me soa muito bem e não dá certamente muitos votos ao executivo nem tão pouco afirmação. É tão prematuro como a falta de rumo que demonstra o governo. As coisas não se podem fazer de um momento para o outro, de um tempo de férias para um tempo de afirmação governativa. Não é por aí António Costa. Não sou contra a igualdade de género ou o que lhe queiram chamar, mas sempre haverá o género masculino e o feminino e as casas de banho serão sempre para quem as deve usar e nas escolas elas são diferenciadas. Sobre isto a Lei é explícita. Não vale a pena perder tempo. 
Assim, não resta muito tempo ao governo para encontrar o rumo certo se quer ganhar as eleições de outubro, até porque Rui Rio está a facilitar-lhe a vida o mais possível. Até consegue dividir o próprio partido ao demarcar-se de tudo durante as férias, até mesmo da greve que, pelos vistos, não o afetou muito.
Entretanto Costa foi de viagem pela nacional 2 de Chaves até ao Algarve. É preciso encontrar o rumo certo. Será este?

Vendavais Democracia em parte incerta

Quando do outro lado do Atlântico, doidos à sol ta, começam aos tiros e matam dezenas de ino- centes, é razão mais do que sufciente para nos questionarmos sobre como se deve conduzir esta sociedade do século XXI e para onde quer ir.

De facto, parece não bastar termos que morrer naturalmente como ainda termos de enfrentar a morte sem encomenda, desnorteada e dirigida para simples alvos em movimento que servem os desígnios de loucos atiradores, como se vivessem no mais fantástico flme de uma qualquer série negra americana. Para justifcar o que é democrático à moda de Hamurábi, “olho por olho, dente por dente”, Trump anuncia a possibilidade de pena de morte para quem pratique atos deste calibre. Dá-nos a impressão de ser tão vilão o criminoso como o juiz, já que ambos tiram a vida a seres humanos. Não sei se o contexto de democracia se aplica nestes caso, mas a verdade é que nos apetece dizer que quem mata deveria morrer da mesma forma, já que matar por prazer, parece ser um jogo de desfecho desconhecido e porque, na maior parte dos casos, o assassino é liquidado pela polícia. Perante isto e sabendo o assassino que o mais certo é ser morto, questionamo-nos sobre que prazer será esse já que não fcará vivo para se vangloriar seja do que for. Na verdade, estas americanices não têm comparação, nem justifcação, nem suporte democrático seja onde for.

O facto, contudo, que subjaz a estes episódios, é o de ser ou não democrático castigar com a mesma pena, quem comete determinados atos atentatórios à vida humana. A vida humana é um direito inalienável que ninguém pode tirar, seja sob que justifcação for. Os direitos humanos são para respeitar, é verdade, mas revoltados com estas atitudes, o que nos apetece fazer é castigar do mesmo modo quem pratica estes abomináveis crimes. Verdade?

Por cá como por lá, quando somos confrontados com os fogos que grassam um pouco por todo o lado e destroem propriedades, casas e haveres de toda a espécie e também vidas humanas, o que dizemos frequentemente é que quem ateia estes fogos deveria ser metido no meio deles para saber quanto custa morrer entre as chamas. Não vale a pena dizer que o não pensamos ou dizemos, por que seria mentira. A revolta é tão grande que não se compadece com atenuantes. Não buscamos a democracia para a impormos como panaceia a quem é criminoso desta estirpe.

Olhando para o horizonte político e democrático que entre nós vigora, constatamos que os criminosos que atearam fogos e que foram apanhados, mas não julgados, continuam à espera de benesses da justiça, do mesmo modo que aqueles que deveriam ajudar quem tudo perdeu, não o fez cometendo um crime tremendo e a quem nada acontece. Olhemos para Pedrógão Olhemos para Mação. Olhemos para o nosso horizonte democrático e julguemos. Peguemos na democracia e com ela, como se fosse a vara da justiça, chicotemos quem merece. O que acontece? Nada. Os criminosos andam à solta. Impunes.

Estou a lembrar-me de um episódio caricato que aconteceu no fnal do jogo da supertaça Cândido de Oliveira em que um diretor de departamento do Sporting foi espancado por cerca de quinze indivíduos benfquistas, sem que nada parecesse justifcá-lo. Não está em causa o clube, seja ele qual for, mas sim o atentado criminoso que teve lugar. Como se justifca tal atitude? Possivelmente ninguém reconhecerá os indivíduos que praticaram o atentado e eles fcarão impunes para se poderem vangloriar do vil e selvático crime. Neste caso, para castigar do mesmo modo os indivíduos em causa, seria muito mais difícil, já que seriam necessários trinta outros juízes que, de igual modo, exerceriam justiça hamurábica. E seria democrático? Mas apetecia fazer o mesmo? Possivelmente.

Claro que a revolta que nos invade em situações como as mencionadas, nos leva a repensar muitas atitudes e até a querer alterar a própria justiça e o modo como se aplica. Mas será que se o fzéssemos, o resultado seria outro? Na melhor das hipóteses, o medo que invadiria os que pensariam em fazer tais atentados, coibiria o seu modo de ação, resultando em menos atos extremistas, mas só isso. Nada impede um criminoso de praticar o seu crime. Ele não pensa na justiça, mas sim no resultado imediato da sua performance. E muito menos pensará na democracia que é um conceito que para ele não existe.

Neste tempo de férias, a nossa política democrática anda a banhos, porque também tem esse direito, intervalando com o futebol como já vimos. Também vimos que nem com a presença das altas individualidades da Nação, os criminosos deixaram de praticar atos horrendos. Ora a ser assim, o que fazer com a justiça, com a política e com a democracia? Nada disto mete medo aos assassinos porque eles não são nem cobardes nem democráticos. Infelizmente.

Deste modo não parece que a democracia seja a solução que justifque o castigo, mas se o fosse, também ela parece andar em parte incerta!
 

Vendavais - Eleições ao rubro… e as promessas queimam

Em período de férias, os portugueses vivem mais momentos de preocupação do que de relax. O suposto tempo de lazer e descanso que todos aguardam com alguma ansiedade, parece esvair-se em ameaças grevistas que causam um alvoroço tremendo no governo, que por sua vez, vê as eleições aproximarem-se a passas largos e não necessita deste cenário de incerteza onde o medo paira como machado prestes a cair sobre ele.

Não estando diretamente sob a tutela do governo, a ameaça de greve dos motoristas de matérias perigosas e transportes alimentares, não ajuda nada a estratégia do governo, seja ela qual for, em termos de visão eleitoral, num momento em que a maioria dos portugueses vão partir para as ansiadas férias, sendo o Algarve um destino por excelência. A acontecer, o governo sofre um duro revés e Costa arrisca, com toda a certeza, a suposta maioria com que parece estar a contar. Claro que para o BE, não sendo um objetivo a greve dos motoristas, ela é uma benesse nas suas ambições para a continuidade da geringonça. Uma vez mais, a muleta que o PS pode precisar para continuar a governar. Joga-se, portanto, nesta greve e em outras semelhantes, o futuro de uma possível maioria do PS, o que faz depender do governo e só dele, o resultado das eleições. O problema está em como resolver uma greve em que o governo pouco pode ajudar a não ser na requisição dos serviços mínimos. Ora estes também não foram além dos 25% o que é manifestamente pouco para as ambições que o ministro tinha. A continuar assim, a greve vai parar, uma vez mais, este pequeno país que parece andar a brincar às greves, quando o governo diz que tudo está bem e muito melhor do que se esperava. Então como se explicam tantas greves? Se tudo está bem, não se justificam tantas greves em tantos sectores como o dos motoristas, dos corticeiros, dos juízes, dos enfermeiros, dos médicos e mais alguns que todos sabemos. Afinal o que é que está bem?

Talvez por isso mesmo, todos os partidos estejam a preparar a sua rentrée com o maior cuidado e com mais certezas. Não sabem muito bem o que vão dizer e o que podem esperar, mas sabem que têm que que subir o seu score eleitoral. Aqui as sondagens desempenham um papel primordial, para o bem e para o mal, já que, como diz Rui Rio, se as sondagens fossem assim tão certas não seria preciso fazer eleições. Talvez tenha razão. Talvez. É que estas dão como certa, a falha de uma maioria do PSD na Madeira e por isso o PSD aposta mais no Chão da Lagoa. São 920 Km a separar a rentré habitual do partido. Segurar a Madeira é importantíssimo. Mas também na Madeira, na Fajã da Ovelha, o CDS aposta a sua rentrée e joga uma geringonça que poderá ser com o PSD. Mas o PSD/ Madeira, segundo parece, não se importa de arranjar uma geringonça com o PS. A ser assim, os interesses partidários sobrepõem-se novamente, aos interesses dos portugueses. Mas o que pode acontecer é a esquerda ganhar e o PS conseguir fazer a geringonça com ela. Desta feita perde o CDS e o PSD, pois podem não conseguir a maioria para governar a Pérola do Atlântico. Seria um desastre para o PSD ver o PS a governar a Madeira. Penso que seria o princípio do fim de Rui Rio.

Para complicar tudo isto, parece que o próprio PSD, por ordem de Rio, não está a fazer o trabalho bem feito. As listas que estão a surgir todos os dias, trazem novidades extraordinárias. Rui Rio está apostado em renovar e muito, estas listas de candidatos a deputados e o resultado é uma debandada enorme de nomes que não vão fazer parte do hemiciclo. São mais de 60 os que se vão embora. Será que é razão para dizer “quem não está comigo, está contra mim”? Temos aqui então uma ditadura parlamentar, que pouco terá de democrática. Certamente vamos ter uma Assembleia constituída por nomes completamente desconhecidos e com muito poucas referências políticas. Será um meio para acabar com a cedência de favorecimentos que levam a voos muito mais arrojados e perigosos. Talvez Rio tenha razão. Ele lá saberá para onde quer correr.

E para onde correm os outros partidos? Parecem estar todos à espera de coligações e geringonças. Não há afirmações que nos conduzam a outras conclusões. Tudo são suposições. Os líderes avançam com promessas fantásticas se ganharem as eleições. Rui Rio promete reduzir os impostos, aumentar salários, aumentar a economia, enfim, um pacote extraordinário, na esperança de que todos sejamos ingénuos e acreditemos em tudo isso. Mas Costa não fica atrás nas promessas. Não interessa o que se promete ou o que se vai fazer. Se der para o torto, quem ganhar que resolva os problemas. É sempre assim que se faz. O PS deixa o país de pantanas. Dá tudo o que pode e o que não pode. Depois se perder, o PSD e os outros que solucionem as asneiras e que fiquem com o ónus do resultado, que nunca é bom. Como os portugueses acreditam que tudo vai correr bem com o PS, voltam a dar-lhe certamente, a possibilidade de ganhar. Depois e como não se pode dar continuadamente o que se não tem, nas próximas eleições, o PS perde e o PSD e o CDS que voltem a tentar tapar o buraco e que fiquem mal novamente na fotografia. Claro.

Vendavais - Pontes sem margens

Em tudo na vida procuramos os meios para suplantar os problemas que se nos deparam no dia-a-dia. Procuramos pontes que nos permitam passar para outras margens, eventualmente mais calmas. Umas vezes conseguimos encontrá-las, outras não.
A alguns meses das legislativas, os partidos políticos começam a movimentar as suas estruturas com o objetivo de arrastar as multidões que lhes darão os votos necessários para passar as pontes que têm pela frente. É um trabalho insano. Meses de trabalho, de procura de estratégias, de slogans convincentes, de promessas exequíveis que agradem às maiorias e o mais importante, de compromissos que façam esquecer os erros e as asneiras que alguns cometem numa governação desregrada em nome de quem não tem culpa nenhuma a não ser o facto de os ter elegido. Mas as culpas ninguém as aceita.
O Partido Socialista terminou agora a sua agenda política imediata, assim como a Assembleia da República. Tempo de férias. E as férias servem de ponte para outra margem bem mais complicada. E todos eles sabem disso. É altura de equacionar estratégias, preparar o novo ciclo político que vai incluir as eleições legislativas, claro.
Os partidos de centro direita estão em crise. Não se veem grandes alternativas ao que têm sido as estratégias da governação e as da oposição e a continuar assim, as vantagens são do Partido Socialista que, sem nada a impedir a sua progressão, passa facilmente a ponte para a outra margem, continuando a governar o país como quer. O único óbice a tal constatação será, por ventura, a falta de uma maioria absoluta. Costa bem tenta, mas não será fácil lá chegar e ainda bem. As maiorias absolutas são ninhos de malfazer. São geradoras de governos surdos e prepotentes que só agem em nome próprio, no seu próprio interesse, satisfazendo todos os que esvoaçam à sua volta. 
Para que não aconteça tal ninhada, compete à oposição aprumar a sua postura política, dignificar as estruturas, dar ouvidos aos pares e aplicar as estratégias adequadas a um salutar sucesso que impeça a maioria absoluta. 
As estratégias de Rui Rio não têm sido as melhores e a sua postura política interna também não. Acusado de prepotente e ditador dentro do seu partido, leva a concluir que fora dele será ainda pior se tiver poder de decisão política. Ora isto não serve de ponte ao que ele pretende. Pelo contrário. Esta ponte não leva a margem alguma que interesse ou descanse os portugueses. E por mais que ele negue esse rótulo, certo é que ele já vincula um propósito que não augura nada de bom. Felizmente que não será o PSD a ter a maioria absoluta. Penso que seria um desastre para Portugal considerando a atual conjuntura.
Mas se isto acontece com o PSD, com o CDS as coisas não são muito diferentes. Cristas mesmo afirmando que é a única oposição com alguma dinâmica e talvez isso seja inquestionável, é facto que não desmarca dos valores dos scores obtidos nos últimos anos. A percentagem das europeias não foi famosa e a continuar com esses valores não pode ambicionar outros voos e outras margens. Falta-lhe a ponte ou, quiçá, uma margem segura. Claro que nem todos os partidos podem ter as mesmas percentagens de votos e os portugueses já se efectivaram politicamente. Como não cresce a população, também poucos são os jovens que podem fazer a diferença ao contribuir para um aumento percentual de resultados.
O que marca esta situação é descredibilização dos políticos no que confere às suas atuações enquanto detentores de cargos importantes. Num país pobre como o nosso, com um rendimento económico muito abaixo do necessário, com uma dívida pública de mais de duzentos e vinte mil milhões de euros, será que é admissível que se tenham gastado, por exemplo, em 2018, 1,3 milhões de euros em subsídios de deslocação de deputados da Assembleia da República? E a quantidade de milhões desviados em nome de boas atitudes e que vão dar bom nome à corrupção que grassa em todas as esquinas? Estas pontes levaram a outras margens quem não devia passar por elas. Mas levaram.
Parece-me, pois, que há muitas pontes em Portugal, mas infelizmente faltam margens credíveis que possam descansar os portugueses e os políticos mais sérios, porque também os há. Mal estaríamos se não os houvesse. As legislativas estão aí. Os partidos que se aprumem para que Costa não tenha o prazer de esfregar na cara dos outros que conseguiu a maioria porque a oposição não teve mérito algum nem fez o seu papel. O BE e o PCP estão expectantes. Costa sabe disso. Eles serão sempre a ponte que falta ao PS. E a margem? Qual será?