Na crónica anterior citei uma sondagem de opinião publicada pelo semanário Expresso nas vésperas do Dia de Portugal, este ano comemorado na cidade da Régua. Recordo os temas principais: 91% dos portugueses condenavam a carga de impostos sobre o rendimento, 87% mostravam- -se insatisfeitos com o combate à corrupção e 90% entendiam que a riqueza está mal distribuída. Não há memória de tão expressiva opinião negativa, o que poderá explicar o mau humor que o primeiro-ministro António Costa exibiu no decurso do evento atrás referido. Uma nova sondagem do mesmo semanário, agora centrada na avaliação dos partidos e do governo, coloca o PS com 31% em pé de igualdade com o PSD, que recebe 30%, destaca o Chega em terceiro lugar com 13%, iguala o BE e a CDU com 5% e atribui ao IL uns magros 4%. Já no que ao Governo propriamente dito diz respeito mais de 70% dos portugueses classificam-no como “mau” ou “muito mau”, que é uma forma de dizerem, parafraseando Carlos César, a gente que governa não presta. Ainda assim, para o primeiro- -ministro tudo está bem, aparentemente. A verdade, nua e crua é outra, porém: Portugal, continua alapado na cauda da União, com o interesse nacional subordinado à intriga político-partidária e aos negócios de uns tantos machuchos. Entretanto, no PSD reina grande desconforto porquanto continua colado ao PS nas intenções de voto, apesar da crise do governo, ainda que a chamada direita, expressa no PSD, Chega e IL, alcance a significativa soma de 47%, enquanto que a esquerda convencional se fica pelos 41%, o que deixa muitos políticos descontentes, por razões que só eles saberão. Donde se conclui que o PSD, para formar governo, terá forçosamente que fazer acordos com o Chega e o IL considerando que estes últimos partidos são basicamente constituídos por antigos militantes e simpatizantes do PSD que dificilmente regressarão à origem. Ainda assim é no PS que o desconforto é maior. Tanto que, para citar apenas um caso público e notório, mais de duzentos destacados militantes do PS subscreveram a carta aberta denominada da “gente que não presta”, um documento em que são criticados o secretário-geral, António Costa, e o presidente do partido, Carlos César, subentendendo-se que há muitos mais governantes que merecem ser sancionados. Preocupante, portanto, é constatar que uma bomba poderá estourar quando menos se espera, sendo que o primeiro- -ministro tem o rastilho na mão. Tudo leva a crer, de facto, que António Costa, contrariamente ao que diz, se prepara afanosamente para dar o fora concertando a situação interna de forma a que não prejudique as suas ambições externas. Esta é, em última análise, a estabilidade que o próprio se propõe defender, quando do que mais precisa Portugal é de uma genuína rotura democrática. Entretanto, para manter viva a chama da governança, João Galamba, o super ministro das Infraestruturas que, como se sabe, é o intocável benjamim de António Costa, ainda que seu improvável delfim, teve mais uma das suas monumentais bacoradas quando disse que a solução Santarém para o novo aeroporto “é longe”. Num pormenor tem razão: o aeroporto é de Lisboa e não é de Santarém. Era o que faltava! Na refrega da controvérsia o inefável ministro Galamba foi mais longe ainda quando rematou para canto ao afirmar que a escolha da localização do novo aeroporto é uma decisão política, o que não deixa de ser óbvio. Só que, tratando-se de um assunto complexo são requeridos vários e aprofundados estudos elaborados por especialistas qualificados e não por políticos de pacotilha. Por isso mesmo foi nomeada uma Comissão Técnica Independente para o efeito, não podendo um qualquer governante chico esperto excluir, à partida seja que solução for. A decisão final pertence ao Governo, em qualquer caso, que não deve cair na tentação de escolher localizações como quem escolhe melões, como tentou Pedro Nuno dos Santos, o antecessor de João Galamba. É de uma decisão política que se trata, portanto, e não de uma escolha pessoal ou partidária. A menos que na cabeça do ministro Galamba a localização ideal seja o Largo do Rato, ou um qualquer aeródromo municipal, por mais distante que seja. Bem mais ajuizados e democraticamente mais responsáveis, andaram os cinco deputados do PS eleitos por Santarém que, reagindo à diatribe do ministro Galamba, se manifestaram contra a tentativa de exclusão de opções para a localização do novo aeroporto antes mesmo de serem conhecidas as conclusões da Comissão Técnica Independente. Parabéns, portanto, aos deputados do PS eleitos por Santarém, que deram uma rara lição de justa revolta democrática, que só é pena que seja tão rara e que não seja seguida, por norma, por outros deputados, eleitos por outras regiões. Como é o caso dos deputados eleitos por Vila Real e Bragança, para não ir mais longe, a quem não têm faltado importantes matérias e fortes razões para democraticamente se revoltarem.