Henrique Pedro

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O maior sucesso de todos os tempos

Esta crónica não pretende ser uma prédica religiosa e muito menos uma lição de moral. Deverá ser entendida, tão-só, como uma inócua reflexão natalícia, mais apropositada depois que esmoreceu a alegria das festas familiares, se digeriram os acepipes de consoada e se silenciou o chinfrim dos festejos da passagem de ano.
Muito se fala, hoje em dia, de sucesso e de fracasso, de riqueza e de pobreza. Os meios de comunicação social bombardeiam-nos diariamente com notícias de humanos que alcançam feitos retumbantes no desporto, no espetáculo ou na política, a ponto de os converter em seres de outro mundo, deuses (com letra pequena) do nosso tempo.
Aureolados de fama sobrenadam em dinheiro, estravagâncias e luxúria porque multidões fascinadas os vitoriam, compram produtos a eles relativos e de alguma forma os procuram imitar.
Esta poderá não ser a grande marca da besta apocalíptica mas é, seguramente, um sinal dos tempos, um estigma da Civilização vigente que constrói vidas de sonho para meia dúzia e de tristeza, desilusão e desgraça para milhões.
Civilização que cada vez mais confunde a verdade com a mentira, tudo dependendo da força e arte com que a comunicação trata as notícias. Civilização que já não separa o bem, que reduziu ao prazer, do mal, que se apropriou da liberdade.
Não é de espantar, portanto, que a mensagem de verdade, de amor e de paz de Jesus Cristo, o expoente maior da História do Humanismo e da Humanidade seja, nos tempos que correm, sistematicamente ignorada ou adulterada.
O próprio Papa Francisco se enredou num lamentável equívoco quando, numa homilia proferida em Nova Iorque há dois anos atrás, afirmou referindo-se a Jesus Cristo: “a sua vida, humanamente falando, acabou com um fracasso: o fracasso da cruz". Isto levou a que, talvez injustamente, muitos e insuspeitos seguidores de Cristo tenham acusado o Papa Francisco de ser herético.
Até eu, que nutro pelo actual Papa especial admiração e simpatia, também estou em total desacordo com ele neste ponto. Porque, mesmo se não tivermos em conta o mistério insondável da Ressurreição, Jesus Cristo ao morrer na Cruz cumpriu, gloriosamente, a Sua missão, que no Seu próprio dizer, era essa mesma: morrer para nos salvar.
Por isso, nenhum crente poderá aceitar que o Papa ponha em causa este facto de ânimo leve e muito menos sugira que Jesus Cristo não nos salvou.
Apesar de não ter sido promovido a bispo ou sido eleito Papa, não ter batido recordes, ganho qualquer prémio, tão pouco o Nobel da paz, vendido milhões de discos ou enriquecido, a vida de Jesus Cristo constitui o maior sucesso de todos os tempos. Mesmo humanamente falando.
Tanto assim é que, volvidos mais dois mil anos, acima de mil milhões de almas continuam a seguir a Sua doutrina, considerando apenas a Igreja Católica, a maior organização global que alguma vez operou sobre a Terra.
Muito embora o mal e a dor não tenham desaparecido com a morte de Jesus Cristo crucificado no Calvário, a Sua missão salvífica continua a cumprir-se hora a hora no coração daqueles que seguem os Seus ensinamentos e que acreditam que se consumará apoteoticamente no final dos tempos.
Ninguém é fracassado só porque não é rico, líder político ou campeão numa qualquer modalidade e apenas é bem-sucedido quando ultrapassa as suas limitações e bem cumpre as suas missões.
A competição fundamental de cada um é consigo próprio. É a si mesmo que cada um se deve vencer. Humanamente falando.
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

 

Estado de direito ou santuário do crime?

Notícias como as que dizem respeito à RARÍSSIMAS – Associação Nacional de Deficiências Mentais e Raras, são recorrentes e vulgaríssimas. O que nos leva a justamente admitir que a maioria dos factos que as originam são verdadeiros e graves, ainda que as condenações em tribunal sejam raríssimas. É o regime político vigente que cada vez mais se compromete e transfigura numa democracia libertina que mais parece um santuário do crime que um estado de direito.
O chorrilho de escândalos de toda a espécie envolvendo governantes, amigos, afilhados, cães e gatos de partidos, parece não ter fim. Os factos referentes à célebre operação Marquês expostos recentemente pelo Ministério Público, para não citar outros de igual calibre, serão tão só a ponta do iceberg. Somos constrangidos a concluir, portanto, que o Estado português é altamente vulnerável ao assalto por gente da pior espécie: ladrões, aldrabões, farsantes.
Lamentavelmente, como a Raríssimas bem o demonstra, muitas IPSS, para lá dos serviços que bem ou mal prestam aos infelizes utentes, existem sobretudo para promover a imagem pública de destacadas “socialites”. Caridade interesseira, é o que é!
Não quero com isto dizer que não há pessoas íntegras e verdadeiras a servir o Estado, designadamente políticos. Acredito que os há e que não serão tão raros quanto se diz. Conheço alguns a quem tiro o meu chapéu. Deixemo-nos de facciosimos, de uma vez por todas, portanto.
A corrupção não tem pátria, nem raça, nem ideologia e muito menos partido. Mas tem rostos ainda que muitos se sujeitem a operações plásticas. É gente de todos os credos e religiões. Gente que acredita ou não, na vida depois da morte, no inferno seguramente não, mas que é capaz de todas a virtudes para alcançar o céu das vaidades terrenas, dos carros topos de gama, dos almoços e jantares pagos com dinheiros públicos, da fama e da glória seja ela qual for. É gente que, acima de tudo, está convencida que continuará impune, nesta vida ou em mais que houver.
A situação que presentemente se vive em Portugal é sobretudo chocante porque o Governo e os partidos que o apoiam se dizem de esquerda mas sistematicamente calam, consentem e apadrinham estas desgraças.
Partidos que têm demonstrado ser abertamente contrários e incompetentes para fazer as reformas indispensáveis a pôr cobro a tamanha degradação da democracia. Partidos que, antes pelo contrário, optam por iludir o povo com tiradas demagógicas e populistas e atemorizar os incautos com o imaginário inferno da direita a quem responsabilizam por tudo, inclusive pelas suas próprias contradições. 
São a Geringonça solidária no seu pior, sempre pronta a apaga todos os fogos, não só os florestais, com palavras inflamadas e lágrimas de crocodilo. Eles são os verdadeiros garantes do Regime
Os portugueses exigem mais do que as migalhas que caiem da mesa do Orçamento de Estado. Exigem verdade, justiça e transparência. Reformas políticas, em duas palavras!
 
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

Os engolidores de sapos e de espadas

Contrariamente ao que se possa pensar a expressão “engolir sapos”, cujo significado não me parece que seja necessário explicar, tem origem bíblica, nas pragas do Egipto, muito embora na actualidade assente que nem luva a Jerónimo de Sousa e aos seus apaniguados do PCP, que até já engoliram a emblemática coerência comunista herdada do seu mítico fundador.
Também se aplica, talvez com maior razão até, ao PSD e ao CDS, a dita oposição e, porque não, a muitos ambiciosos caçapos do PS nascidos nos tempos áureos de José Sócrates. Para não falar nos renomados economistas e analistas políticos cujas previsões falharam estrondosamente e que agora andam roídos de inveja.
Já o engolimento de espadas, que é uma profissão como outra qualquer, terá começado na Índia, muitos anos antes de Cristo também, se bem que Catarina Martins e Mariana Mortágua e os fiéis do BE, só muito recentemente se dediquem a esta modalidade política radical.
Existe mesmo uma associação internacional de engolidores de espadas (a Sword Swallowers' Association International), na qual a “geringonça” se poderá matricular uma vez que reúne todos os créditos, designadamente os que lhe são conferidos pelos ministros com competências de faquirismo, em especial dormir em camas de pregos.
O inesperado produtor deste fenomenal espectáculo de engolidores de sapos e de espadas é Mário Centeno, o competentíssimo e afortunado ministro das Finanças português que, com invejável mestria, amaciou as políticas de direita, os gordos sapos domesticados que alegremente o PCP digere, sem pestanejar, para gáudio do seu povo trabalhador privativo.
Mérito menos apreciado publicamente tem o primeiro-ministro António Costa que com frio cinismo afia as espadas que BE e oposição engolem com rufar de tambores e prepara as camas de pregos em que os seus ministros dormem que nem anjinhos.
Tudo isto tem a ver com a economia nacional, um anafado sapo domado pelo encantador Centeno, que quanto mais lhe batem mais incha. Tanto que o bicho corre o risco de estourar de tanto inchar agora que o seu tratador foi promovido a treinador principal do Eurogrupo, embora continue a orientar as finanças lusas, em “part-time”, muito provavelmente aos fins-de-semana.
Mesmo assim, no meu modesto parecer, Mário Centeno poderá ser mais útil ao seu país do que outros políticos de renome, de quem se dizia que seriam uma bênção para Portugal quando foram designados para importantes cargos internacionais, mas depois foi o que se viu.
A Mário Centeno, porém, bastar-lhe-á fazer engolir uma boa meia dúzia de sapinhos aos arrogantes de Bruxelas, ainda que a sua promoção a presidente do Eurogrupo possa ter sido uma punhalada fatal nas costas da “geringonça”. Há sapos e espadas para os quais o PCP e o BE, apesar de tudo, parecem não ter garganta.
Certo é que este espectáculo circense vai continuar na capital do fado com a “geringonça” a evoluir na pista durante alguns meses mais. Tudo leva a crer, porém, que quando António Costa afiou a espada da taxa das renováveis que Mariana Mortágua engoliu espumando de raiva, deu um sinal claro de que já tem planeado o fim da “geringonça” aproveitando a oportunidade de oiro que se lhe oferece para finalmente formar um mítico governo do Bloco Central, tendo o PSD como subalterno e contando com o beneplácito entusiasta do presidente da República.
A menos que, como a OCDE admite e teme, a barraca da economia mundial abane. Se tal acontecer o mais certo é António Costa cair desamparadamente do trapézio, a estrelinha de Mário Centeno apagar-se e, ironia do destino, ser ele o engolido, sem apelo nem agravo. Competência não basta.
Boas Festas!
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

E porque não mudar o Infarmed para Boticas?

Qualquer observador minimamente atento, ainda que se limitasse ao acompanhamento do processo através dos órgãos da comunicação social, desde logo ficava com a sensação de que ninguém acreditava, talvez nem mesmo os seus proponentes, no sucesso da candidatura da cidade do Porto à importante Agência Europeia do Medicamento que, já se sabe, deixará Londres em consequência do Brexit e será reinstalada em Amesterdão, na Holanda.
Ainda assim, este insucesso da "antiga, mui nobre, sempre leal e invicta cidade” não é dramático nem desonroso e muito menos deslustra o esforço empenhado do autarca Rui Moreira que ousou arrebatar a candidatura portuguesa à “mui nobre e sempre leal cidade de Lisboa" que já foi cabeça de um secular império colonial mas que agora pouco mais é que a capital do fado e, que tem em António Costa, seu filho extremoso, um hábil executante de um penoso fadário.
Como é óbvio, o processo rendeu pingues proventos eleitorais a Rui Moreia e não tantos a António Costa, pese embora o enorme sucesso deste nas últimas eleições autárquicas. Quanto ao futuro logo se verá quem mais fica a lucrar.
Surpresa grande, isso sim, que deixou muito boa gente boquiaberta porque ninguém estava a contar com tão estapafúrdia notícia, foi o anúncio da transferência do Infarmed, entidade que em Portugal representa a Agência Europeia do Medicamento, de Lisboa para o Porto, que assim ganha importante prémio de consolação.
A seguir a um doloroso período de tragédias e comédias o Governo parece agora apostado em divertir os portugueses com um novo ciclo de embaraçantes anedotas e chistes, tal a leveza, populismo e amadorismo com que a “geringonça” governa o país, trate-se do Orçamento de Estado ou, como é o caso, de transferir um organismo público complexo e volumoso como o Infarmed, da sua localização actual para outra a mais de 300Km e sem que se vislumbre o menor interesse nacional na operação.
Que ninguém se afoite, porém, porque, no dizer do primeiro-ministro tudo se resume a uma questão de descentralização, sendo que descentralizar, para o insigne governante, significa apenas desconcentrar, isto é, reduzir o país a Lisboa e ao Porto, tornando Portugal bipolar, portanto.
Só que bipolar já Portugal o é há muito tempo dado que alterna entre estados depressivos e estados de excitação eufórica por obra dos seus inefáveis governantes.
Mas se a ideia for mesmo de descentralização então porque não mudar o Infarmed para Boticas que, além do mais, tem nome afim com o negócio dos remédios? E a sede do governo para Mirandela, por exemplo, cidade em que o PS acaba de alcançar uma vitória estrondosa, não menos sonante que a alcançada no Porto pelo independente Rui Moreira?
E, já agora, porque não há-de a presidência da República instalar-se no Castelo de Monforte que está devoluto, e já foi sede do heroico concelho de Monforte de Rio Livre, para lá de que possui melhores ares e águas que a capital do reino republicano que mantém a corte em Lisboa?
Ora, aqui está uma causa bem interessante e digna para os políticos transmontanos embandeirarem. Sobretudo os nossos mal-amados deputados que, quando no poder, se limitam a tecer loas ao governo e, se na oposição, só de vez em quando fazem umas perguntas de chacha aos ministros que, porque são pessoas educadas e politicamente correctas, sempre respondem, mal seria que o não fizessem, com palavras de circunstância que, para bom entendedor, equivalem a mandar os perguntadores abaixo de Braga.
Falando mais claro: à badamerda, com vossa licença, que é o que todos os governantes por norma fazem aos transmontanos e seus afins. Melhor seria que pura e simplesmente os ignorassem.

Oliveiras sim, eucaliptos não!

Vale a pena evocar e, porque não, que os mais directamente envolvidos comemorem o venturoso evento com a devida dignidade. Melhor dizendo: trata-se de um imperativo moral.
Os órgãos de comunicação social, nacionais e regionais, com especial referência para as televisões, mais focadas na Web Summit Lisbon, quando as tragédias de Pedrógão Grande, de Oliveira de Hospital ou de Vouzela já caminham para o esquecimento, não lhe deram o merecido tratamento, com excepção do Diário de Notícia que o destacou na revista Magazine de 5 de Novembro. Merece, por isso, a devida vénia.
Aconteceu em 31 de Março de 1989, já na vigência desta mal-amada democracia que os poderosos do costume não desistem de amordaçar e viciar.
No campo de batalha, porém, não se viram bandeiras do PS, do PSD ou do CDS e muito menos se fizeram notar as meninas do BE, os “apparatchik” do PCP ou os habituais agitadores dos grémios sindicais. Foi a prata da freguesia que tudo promoveu e organizou, arregimentando os fregueses no final da missa dominical com o toque dos sinos a rebate.
Não se tratou sequer duma revolução, é certo, mas tão-somente de uma justa revolta de camponeses determinados a defender o seu habitat natural, as suas hortas, olivais e vinhedos da infestação alienígena importada da distante Austrália pelos todos poderosos capitalistas da celulose, que ameaçava chupar-lhes a água e o sangue e tudo reduzir a cinzas, ao menor descuido.
À carga policial forte e feia, que meteu tiros para o ar e bastonadas, respondeu o povo com transmontana bravura, compostura e raras pedradas. E assim foi que homens e mulheres, velhos e crianças fizerem valer a voz do seu amor, direito e razão, sobre o extremoso vale da ribeira de Lila, gritando: Oliveiras sim, eucaliptos não!
E porque a oliveira é emblema e motivo de paz não houve mortes nem feridos, muito menos “catarinas eufémias”, tendo revoltosos e repressores acabado em alegre e pacífico ágape, que meteu vinho e borrego assado. Desde então, naquele chão sagrado assim esconjurado dos daninhos eucaliptos, florescem viçosos olivais prateados, imunes aos incêndios florestais.
Esta lídima lição de democracia e poder local, que os machuchos de Lisboa devem ter em conta, aconteceu há 28 anos, em Veiga de Lila, no concelho de Valpaços, à sombra da serra de Santa Comba. Não no Alentejo vermelho mas no ardente coração da Terra Quente transmontana.
Lição que os autarcas transmontanos devem começar por bem aprender e melhor respeitar desde logo deixando os partidos à porta dos paços do Concelho onde só deve entrar e tomar assento o povo a que pertencem.
Muito em particular os autarcas da alargada bacia do rio Tua, com a nova presidente da Câmara de Mirandela à cabeça, de quem muito se espera e em quem muita gente acredita. Começando desde logo por defender com alma e coração o cumprimento imediato, integral e rigoroso do Plano de Mobilidade do Vale do Tua, sobretudo no que às compensações devidas às populações lesadas diz respeito.
Assim como é de vital importância que, na esteira do genial Camilo de Mendonça que há cinquenta anos atrás o congeminou e iniciou, de uma vez por todas se levante o indispensável e urgente sistema integrado de aproveitamento das águas dos rios da Terra Quente, para regadio e abastecimento das populações.
Uma eventual quebra de abastecimento de combustíveis a Trás-os-Montes em cujas terras não brota petróleo até poderia ser admissível, mas uma falha dramática de fornecimento de água às populações da Terra Quente, como aconteceu no concelho de Bragança e no distrito de Viseu, por exemplo, quando os rios são deixados a correr negligentemente para o mar, seria obviamente criminosa.
Se tal acontecer, esperemos que não, aí estará a gente de Veiga de Lila para dar o lamiré.
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

Desculpem qualquer coisinha.

A coroar quarenta anos de escândalos e de crises, portadores dos piores males e misérias e nos quais a democracia mais genuína seguramente se não revê, Portugal acaba de ser devastado por catastróficos incêndios florestais que horrorosamente sacrificaram mais de cem inocentes cuja memória não está a ser devidamente respeitada. Que as suas almas descansem em paz!
Incêndios florestais sempre os houve mas não há memória de que tenham ardido tantas casas e morrido tanta gente e a culpa por tal não pode ser imputada às alterações climatéricas.
Seria de esperar que imediatamente a seguir a Pedrógão Grande se ouvisse o ruído das motosserras a desbastar as matas que sufocam as aldeias e as estradas mais críticas. Mas não! Prevaleceu o barulho dos discursos políticos feitos de palavras ocas e cínicas que não cortam árvores nem apagam fogos.
Inacreditavelmente, a Pedrógão Grande seguiu-se uma tragédia ainda mais devastadora o que levou o Presidente da República, a declarar, alto e bom som, num compreensível assomo de repúdio dos acontecimentos e das políticas, que o Primeiro-ministro, enquanto tal, deveria apresentar um pedido de desculpas público às famílias enlutadas em particular e aos portugueses em geral.
O chefe do governo, porém, que na véspera já havia proferido um discurso peregrino, frio e calculista, limitou-se a tirar partido de uma deixa do debate parlamentar para responder, a contragosto e contrafeito, como se cantarolasse o conhecido fado de Paulo de Carvalho: desculpem lá qualquer coisinha.
Depois disso, porque tomou consciência da gravidade do gesto e do desgaste da sua imagem e porque é verdadeiro mestre em golpes de rins, entendeu convocar, com popa e circunstância, um conselho de ministros extraordinário para anunciar um chorrilho de medidas e contramedidas urgentes, pondo vários ministros, como é seu timbre, a bolçar milhões. Falta saber quando, como e se tais medidas chegarão a ser postas em prática e se não acabaremos todos a contar tostões. A ver vamos como dirá qualquer ceguinho que veja.
Ficou ainda mais claro que, para o Primeiro-ministro, o que verdadeiramente importa é que se faça silêncio para que o seu naipe de fadistas e guitarristas possa continuar a cantar e a tocar o fado vadio da demagogia eleitoralista.
É de elementar justiça, contudo, que se diga que tudo que de mal tem acontecido a Portugal não é apenas da responsabilidade do actual governo e do Primeiro-ministro António Costa que, como sabemos, tem uma já longa vida dedicada à governança pública, com experiência comprovada em matéria de incêndios florestais.
Sobram motivos e é já tempo dos principais governantes, do presente e do antecedente, se reunirem na praça maior e mais simbólica do país para em uníssono pedirem perdão, não um mero pedido de desculpas, a toda a Nação, pelos muitas e sofridas provações e vergonhas a que submeteram a Pátria portuguesa.
Falta saber se perante a gravidade dos acontecimentos, que extravasam os incêndios florestais, não deveria já o senhor Presidente da República ter dissolvido a Assembleia pondo termo ao governo de “boys” e “teddy boys” que, ao arrepio da vontade dos eleitores, embora com a conivência da Assembleia da República, governam Portugal como se governar fosse uma festa de amigos e compinchas.
Falta saber se o próprio partido socialista não deveria já ter desmantelado a “Geringonça” que está a aproveitar-se da conjuntura económica favorável para iludir os portugueses com o aumento ilusório dos vencimentos públicos e das pensões, a bloquear reformas indispensáveis à sobrevivência da Nação e a reduzir a cinzas os símbolos maiores da História pátria.
Mas já não restam dúvidas de que é já tempo de restaurar a Democracia e de reformar o Estado por forma a torná-lo mais transparente, democrático, justo e melhor defendido do assalto de corruptos e aventureiros.
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

Estourou uma bomba em Mirandela

O regime político vigente em Portugal, embora formalmente se inscreva no sistema da democracia liberal, também dita representativa, enferma de graves anomalias que são, quanto a mim, a causa essencial dos males de que o nosso país padece nos domínios político, económico e social.
As culpas não devem ser imputadas ao carácter dos portugueses, portanto, até porque são milhares os compatriotas que se evidenciam fora da pátria, em todos os domínios, mas obedecendo a regimes democráticos diferentes.
É a permissividade do regime político instalado em Portugal, volto a frisar, que explica que na vida política nacional prevaleçam a mediocridade, a mentira, o oportunismo e a multifacetada corrupção que tantos males origina.
Fenómeno que tem maior impacto, embora mais silenciado, em terras do interior. O concelho de Mirandela, que até às últimas eleições autárquicas foi, durante décadas, governado de forma hegemónica pela mesma força partidária, não foge à regra.
Tratou-se de um longo e obscuro período em que as reais potencialidades da capital da Terra Quente foram subaproveitadas e a maioria dos pacatos mirandelenses se fartou de ver as mesmas personalidades a ocuparem os organismos públicos de influência partidária. Com uma apertada teia de amigos e correligionários a partilhar sinecuras e a conduzir a vida económica e cultural do concelho a seu bel-prazer, a inventar empregos camarários para empregar clientes e colaborantes, com as freguesias amordaçadas e manipuladas numa lógica de domínio partidário e a presidência da Câmara assegurada por astucioso mecanismo hereditário.
A mudança de poder em Mirandela por força das últimas eleições autárquicas, ainda que para outro partido igualmente vicioso, ambos pilares do actual regime, soou, por isso, que nem uma bomba. Surpreendentemente, o município mirandelense irá ser governado, a partir de agora, por uma força política diferente e tendo à cabeça, o que também é inédito, uma mulher.
Trata-se da veterinária Júlia Rodrigues, destacada militante do partido socialista, que ousou ganhar a confiança massiva do eleitorado mercê, também da sua condição feminina, de pertencer a uma alargada geração mirandelense que está na força da vida e que nela se revê e, como é óbvio, de uma campanha eleitoral criativa e eficaz.
Beneficiando, naturalmente, da conjuntura favorável que o seu partido atravessa, do seu relacionamento privilegiado com o poder central, do desejo de mudança que a maioria dos mirandelenses, agora se constata, calavam no peito, duma maior maturidade do eleitorado rural e ainda e sobretudo, do facto saliente dos seus adversários não possuírem nem perfil nem predisposição eleitoral para tanto.
É por tudo isto que as expectativas que agora se abrem são fantásticas. Importa, para tanto e para começar, que Júlia Rodrigues saiba valorizar a equipe pouco qualificada e mal preparada que chefia, que não deixe vingar os sentimentos revanchistas que, é público e notório, grassam nas suas hostes e que não proceda a uma limpeza cega da administração municipal na lógica do olho por olho dente por dente.
A nova presidente da Câmara de Mirandela será grande se for capaz de ser justa, humana e generosa. E se souber colocar os interesses regionais acima dos partidários.
Júlia Rodrigues já anteriormente deu provas de ser determinada bastante e granjeou carisma suficiente para fazer história em Mirandela, como ela mesma diz pretender. Oxalá a faça pela positiva.
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

Poder Local - a lei da selva

O papel do Poder Local na democracia portuguesa, sobretudo no que às freguesias diz respeito, é simbólico, para não dizer de papel de embrulho, ainda que a Constituição da República lhe confira importância fundamental na governação do país, articuladamente com o Poder Central, (que compreende, como é sabido, o Presidente da República, a Assembleia da República, o Governo e os Tribunais) e o Poder Regional, que apenas se encontra estabelecido nas regiões autónomas da Madeira e dos Açores, já que o Portugal continental, lamentavelmente, continua não regionalizado.
Melhor dizendo: Portugal é na verdade governado como se estivesse divido em três regiões, considerando que o Continente, depois das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, é tratado erradamente como uma terceira região, una, homogénea e autónoma relativamente à União Europeia.
Isto explica a diminuta importância que as Câmaras Municipais provincianas e as Freguesias rurais merecem dos órgãos do Poder Central em geral e do Governo em particular o que, como é óbvio, mais afunda as escandalosas assimetrias regionais que estigmatizam o país, sendo que a maior de todas se consubstancia na macrocefalia de Lisboa.
Basta olhar para as competências das freguesias, seja qual for a sua população, como sejam o Equipamento rural e urbano, o Abastecimento público, a Educação, a Cultura, tempos livres e desporto, os Cuidados primários de saúde, a Ação social, a Proteção civil, o Ambiente e salubridade e o Desenvolvimento e o Ordenamento urbano e rural para concluirmos que o Poder Local vegeta num mundo de fantasia e penúria.
O panorama não é mais prestigiante para os Municípios provincianos que estão praticamente confinadas ao trato de parques, jardins, feiras e romarias, com total omissão das suas atribuições fundamentais como sejam o Ordenamento do território, a Energia, os Transportes e as comunicações, a Saúde, a Proteção civil, a Polícia municipal, a Promoção do desenvolvimento e a Cooperação externa, áreas em que o Governo central põe e dispõe a seu bel-prazer, sendo em Lisboa, capital do império fracassado, que tudo se decide ou se adia.
Neste quadro ganha especial gravidade o despovoamento de vastas regiões do interior, a principal causa, ainda que não a única, da manifesta inutilidade das Freguesias que são, por regra, canibalizadas pelas Câmaras Municipais, que por sua vez são canibalizadas pelos partidos instalados em Lisboa, que procuram conquistar autarquias como se de troféus de caça se trate, lançando mão de todas as armas e argumentos, tendo em vista a tomada do poder central e alimentar as clientelas com benesses e mordomias. É a lei da selva no Poder Local!
Só haverá vantagens, portanto, em estabelecer constitucionalmente que apenas movimentos de cidadãos independentes e partidos locais podem concorrer em eleições autárquicas para governar democraticamente as autarquias.
Na versão actual o Poder Local não passa de um enfeite democrático de duvidoso efeito, já que o próprio acto eleitoral autárquico, que se requer autêntico e dirigido aos assuntos locais, é sistematicamente adulterado e anulado em proveito dos interesses partidários centrais.
Os nossos doutos governantes não se demovem com verdades e crises sistémicas, porém. Tratam as autarquias provincianas como inúteis, subservientes ou mesmo escusadas e como se as populações remanescentes estivessem a mais, melhor servindo os seus propósitos nas metrópoles litorais.
Há mesmo muitos que gostariam de responder às necessidades locais com meia dúzia de serviços, públicos e privados, contratados em Lisboa, ainda que, politicamente correctos, afirmem o contrário.
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

Diga-me lá em quem devo votar?

Sempre que um acto eleitoral se aproxima, a maior parte dos eleitores não sabe, à partida, em quem votar ou está predisposta a não o fazer. A questão coloca-se com maior acuidade aquando da eleição de uma nova Assembleia da República.
Por isso as forças políticas habilitadas ao acto eleitoral em jogo respondem com encenações vistosas baseadas em cartazes com fotografias cuidadosamente retocadas e chavões ridículos, que pouco ou nada dizem, mas sempre despertam a curiosidade dos transeuntes, como se de um produto de supermercado, detergente ou pasta de dentes, se tratasse.
No próximo dia 1 de Outubro vão ser eleitos novos e reeleitos velhos autarcas em processos eleitorais que continuam a ser, em muitos casos, deturpados pelas forças que detêm o poder.
Tanto assim é que o hábil exercício do poder autárquico conferia claramente aos seus detentores o condão de se fazerem reeleger até se fartarem, razão pela qual a limitação de mandatos veio pôr fim, justamente, à gesta heroica dos chamados autarcas dinossauros. O que ainda não acontece, lamentavelmente, com os deputados vitalícios.
A decisão de votar ou não votar, e em quem, não é linear para a maioria dos eleitores, portanto. Vários amigos meus, confrontados com este dilema, porque não se sentem devidamente informados e pensam, erradamente, que eu o estarei, ou porque nenhum candidato ou partido seja de seu agrado ou lhes inspire confiança, vêm ter comigo para, em privado, me fazerem esta pergunta embaraçosa: Diga-me lá em quem devo votar? Situação que, por certo, não só a mim é colocada.
Apetece-me dizer-lhes que também eu não sei e tenho as mesmas dúvidas, mas resisto à tentação de aconselhar que não votem, que se abstenham, porque entendo que devemos ir às urnas sejam quais forem as circunstâncias. Porque, mesmo se for inconciliável a aversão pelas forças partidárias e candidatos em presença sempre nos é dada a possibilidade de chegar à mesa de voto e escrever no boletim uma mensagem, politicamente correcta, do género “Viva a democracia” ou “ Abaixo a mediocridade”.
Também porque a lei em vigor e a inteligência política instalada olham os abstencionistas como cidadãos de segunda categoria e os tratam como comodistas, marginais, ausentes em parte incerta ou mesmo defuntos, não lhe reconhecendo a justa relevância política.
É por tudo isto que eu partilho a ideia de renomados estudiosos destas questões de representatividade que defendem, face ao peso esmagador da abstenção, que deveriam ser deixadas vagas nas Assembleias as cadeiras correspondentes aos abstencionistas.
De facto, se a abstenção não conta como voto, então, se não há votos não deve haver atribuição de mandatos, pelo que é abusivo os partidos elegerem deputados excluindo os abstencionistas. E o que se diz para a Assembleia da República diz-se para as Assembleias Municipais. Seria, além do mais, uma forma simples e espontânea das Assembleias mais fielmente espelharem o sentir da Nação e de reduzir o número de deputados e os gastos correlativos.
E mais! Entendo que os boletins de voto, da mesma forma que têm quadradinhos para colocar a cruzinha correspondente ao partido preferido, também deveriam ter um, de igual tamanho, com o dizer “ Abstenho-me”. Ou mesmo “Não voto em ninguém”.
Será pedir demais? Será que os portugueses, mesmo não gostando, são obrigados a engolir a caldeirada do regime e a render-se à lei do “come e cala-te”, apanágio da generalidade dos nossos políticos?
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

O partido que falta à Região de Trás-os-Montes e Alto Douro

Trás-os-Montes, e o Alto Douro, têm tido autarcas excelentes. Presidentes de Câmara e de Junta de Freguesia. Poucos. Não tantos quantos os necessários para provocar o progresso definitivo da Região, é certo.
Conheço e reconheço a obra de alguns, que não cito porque não é esse o propósito central desta crónica, porque não quero ser injusto e ainda porque, sendo amigo pessoal de muitos, também não quero dar aso a que digam que me movem motivos pessoais.
Trás-os-Montes e Alto Douro também têm tido muitos políticos famosos, de alto gabarito, embora ser-se famoso não signifique que se é herói. Poderá ser-se simplesmente vilão e ser vilão e famoso não é glória nenhuma.
O problema reside, sobretudo, quanto a mim, no regime político vigente que lançou o país, e em especial as suas regiões interiores, em becos sem saída mas que convém distinguir do sistema democrático teórico que possui virtudes incontestáveis.
Trás-os-Montes e Alto Douro são disso exemplos mais que evidentes porque estão amordaçados pelos partidos que em Lisboa ditam leis e que fazem dos autarcas meros moços de recados. Por isso os seus olivais, soutos, vinhedos, saudosos trigais, hortas, paisagem genuína, ares e rios não ousaram, até hoje, ser devidamente valorizados. Por isso os transmontanos e os alto-durienses continuam a emigrar em procura de melhor vida. 
Veja-se o caso dos rios, ou das águas em geral, sector em que Trás-os-Montes e Alto Douro, felizmente, ainda não vivem o drama de outras regiões. Águas que continuam a correr livremente para o oceano sem que as populações ribeirinhas delas tirem outro proveito que não seja refrescarem-se em meia dúzia de praias improvisadas, ditas fluviais, na época estival.
Por isso a EDP, verdadeiro negócio da china, ousou emparedar o Tua e o Sabor para seu consumo privado, a troco de uns amendoins que atira às populações como a macacos enjaulados: jogos florais a premiar meia dúzia de aldeias, um tímido plano de mobilidade que faz que anda mas não anda e tabuletas alienígenas nas entradas de Mirandela com o sibilino dizer Parque Regional do Vale do Tua. Tudo só para calar os mais contestatários. 
Falta um partido a Trás-os-Montes e Alto Douro, portanto. Livre. Independente. Ambientalista. Regional e regionalista. Que pugne pelos interesses da Região como um todo e acima de tudo e que não sirva aqueles que apenas projectam ganhar dinheiro para levar para fora.
Partido vocacionado para eleger verdadeiros autarcas e deputados transmontanos e alto-durienses e que se não enrede nos ditames políticos e corruptores da Lisboa macrocéfala e centralizadora. Que ouse, entre outras coisas, promover uma política de repovoamento coerente e consequente, privilegiando, naturalmente, os milhares de transmontanos e alto-durienses emigrados.
Só desta forma as universidades, os centros culturais, as bibliotecas, os museus, os teatros, as cooperativas, os jornais, os grupos desportivos e as empresas transmontanas alcançarão o brilhantismo que almejam, libertando-se da caridade de Lisboa e do estigma da emigração.
Exemplo maior deste atávico marasmo provinciano é Mirandela, eterna princesa do Tua, sempre adiada e adormecida à espera do príncipe que tarda, apesar de reunir as melhores condições naturais, designadamente água corrente, centralidade, pujança agrícola e suficientes atractivos turísticos para se transformar numa exemplar metrópole regional, capaz de dar guarida a 50 000 habitantes, que se estima ser o seu óptimo populacional, inseridos nos 500 000 que a Região claramente comporta e de que precisa.
Só por esta via a região de Trás-os-Montes e Alto Douro se poderá converter na terra de eleição com que os transmontanos e alto-duriense sempre sonham e trazem no coração.
 
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.