Jorge Nunes

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Alterações Climáticas e Mobilidade Urbana Sustentável (2)

A China, com uma população de 1400 milhões, em quatro décadas mudou a imagem de país de uso generalizado da bicicleta para país de forte crescimento do automóvel, o que associado ao êxodo da população rural para as cidades, criou dificuldades enormes, nomeadamente o engarrafamentos do trânsito nas cidades e seus acessos, a poluição intensa do ar, irrespirável nas grandes cidades. Trabalha aceleradamente para resolver este grave problema, promovendo o uso de bicicletas elétricas partilhadas (desbloqueadas a partir do telemóvel), desenvolvendo o transporte público moderno e de qualidade - o coração da mobilidade urbana sustentável - construindo corredores para o transporte em autocarro, metro, comboio, monocarril e carruagens automatizadas, movido com energia limpa, com eficazes sistemas de informação, corredores dedicados, integração dos meios de mobilidade.

O intenso processo de urbanização de países como a China e a India,  obrigou a que, em pouco tempo fosse projetada a ampliação e a construção de novas cidades, feitas com novas orientações de planeamento, apostando em cidades amigas do ambiente, concentrando competências em várias áreas de formação, tendo a inovação e a tecnologia como aliadas, a desenvolver um planeamento mais inteligente e amigo do ambiente, reservando menos espaço para o automóvel, mais espaço para o cidadão, melhores infraestruturas para o transporte público, infraestruturas para o uso da bicicleta, integração e gestão inteligente da mobilidade, evolução da legislação para estimular o crescimento da mobilidade sustentável.

As decisões para a mudança não são fáceis em termos políticos, sociais e de transformação da economia, no entanto, o ritmo a que tem avançado a inovação e a tecnologia, associado à redução do custo da energia renovável face aos combustíveis fósseis, a possibilidade de milhões de pessoas poderem vir a aceder diretamente a energia limpa e barata em instalações domésticas, permitirão acelerar a transição para uma economia mais sustentável, amiga do ambiente.

As grandes decisões políticas tem uma marca clara a favor da economia verde e do conhecimento e a indústria automóvel não está parada. O CEO da Mercedes Benz referiu recentemente que no futuro, as fábricas produzirão menos automóveis, que a Tesla, Google, Apple e Amazon são hoje concorrentes diretos da indústria automóvel tradicional, que procura construir melhores carros, acompanhando a evolução tecnológica, enquanto as empresas tecnológicas tentam construir computadores sobre rodas.

O tempo é de mudança de paradigma na economia, essa é a exigência crescente dos cidadãos, mudança que atua na produção e no consumo, por isso as empresas tentam não perder tempo. Em lados diferentes do mundo (EUA e China), gigantes da NET, na área dos táxis, partilha de viagens e de partilha de bicicletas, impõem avanços de mudança. Recentemente a Toyota assinou um acordo de 500 milhões de euros com a plataforma informática Uber, para a utilização de veículos elétricos, autónomos e partilhados e a China. Xangai emitiu em março de 2018, as primeiras matrículas de carros autónomos e o Governo Chinês lançou este ano diretrizes nacionais para carros inteligentes e conectáveis, para as autoridades locais promoverem testes de estrada.    

As cidades inteligentes trabalham com empenho na luta contra as alterações climáticas, construindo as cidades do futuro, menos poluídas, mais saudáveis, mais atrativas e competitivas. A urbanização e o planeamento verde das cidades acompanharão esta grande mudança, com melhor oferta e qualidade dos transportes públicos, mais acessíveis, mais baratos, com zero emissões, assegurada a intermodalidade entre sistemas públicos e privados, e evolução futura do transporte individual, para veículos de zero emissões e em parte de condução autónoma. Haverá menos carros a circular nas cidades, alguns espaços de circulação automóvel e de estacionamento serão reconvertidos para fazer cidades mais verdes, mais atrativas e com melhor qualidade de vida.  

Na última década, no âmbito da Mobilidade Urbana Sustentável, a União Europeia tem vindo a aprovar um conjunto de orientações relevantes, com a publicação do Livro Verde em 2007 “Rumo a uma Nova Cultura de Mobilidade Urbana”, tendo lançado uma agenda europeia para a mobilidade, com cinco grandes desafios: cidades de fluxo livre; cidades mais verdes; transportes urbanos mais inteligentes; transporte urbano acessível e transporte urbano seguro.

No ano de 2009 adotou o “Plano sobre Mobilidade Urbana.

No ano de 2011 o “Roteiro para um Espaço Comum Europeu dos Transportes” – COM(2011) 144 final – visando a redução de 60% das emissões de GEE nos transportes até 2050; a descarbonização da mobilidade nas cidades até 2030, reduzindo para metade a utilização de automóveis a gasolina e a gasóleo nas cidades e retirá-los de circulação até 2050; reduzir o número de acidentes mortais nas estradas, para metade até 2020 e quase zero até 2050; transferir para os modos ferroviário e marítimo/fluvial o tráfego de mercadorias em distâncias superiores a 300Km, 30% até 2030 e mais de 50% até 2050; estabelecer até 2030, uma rede de base RTE-T plenamente funcional à escala da EU, que integre todos os modos de transporte.

No ano de 2013 a Comissão Europeia adotou o Pacote da Mobilidade Urbana, com propostas de incidência no nível Local, dos Estados-Membros e da EU. Neste contexto apresentou um conceito para os PMUS e também se centrou nos domínios da logística urbana; regulação e acesso; Sistema de Transportes Inteligentes urbanos e segurança urbana.

No ano de 2016, a Comissão Europeia apresentou a “Estratégia de Mobilidade com Baixas Emissões”- SWD (2016) 244 final – tendo como princípios orientadores: acentuar a eficiência energética do sistema de transportes aproveitando ao máximo as tecnologias digitais; a mudança para modos de transportes de baixas emissões; acelerar a utilização de energias alternativas de baixas emissões; eliminação de obstáculos à eletrificação dos transportes; avançar para veículos de emissões zero; melhorar o motor de combustão interna durante o período de transição para veículos de emissões baixas e zero.

No ano de 2017, a Comissão Europeia apresentou a terceira fase da agenda “Europa em Movimento”. Neste sentido lançou as primeiras normas para a limitação de emissões de CO2 dos veículos pesados, um plano de ação para o desenvolvimento e fabrico de baterias elétricas e uma estratégia para a mobilidade conectada e automatizada. A Europa assumiu querer estar na vanguarda de construção da nova economia, com a indústria europeia líder na inovação, na transição digital e na descarbonização da economia.

A União Europeia consome 20% da energia mundial, é o maior importador do mundo, importa 53% da energia que consome, dispõe de reservas próprias relativamente limitadas e de menos de 10% de interligação das redes de energia. No âmbito do crescimento sustentável, fixou objetivos para o curto, médio e longo prazo, visando a redução de emissões de GEE, o aumento das energias renováveis no consumo de energia e o aumento da eficiência energética. Decisões com implicação direta na política de mobilidade e transportes e consequentemente no financiamento dos investimentos com ajudas do Orçamento Comunitário.

Para o curto prazo, ano de 2020, a redução de 20%, pelo menos, das emissões de gases com efeito de estufa, comparativamente ao ano de 1990, garantir que pelo menos 20% da energia é obtida a partir de fontes renováveis (31% fixados por PT) e 20% de redução no consumo, através da eficiência energética.

Para o médio prazo, ano de 2030, reduzir em 40% as emissões de gases com efeito de estufa, garantir que 27% da energia é obtida a partir de fontes renováveis, aumentar a eficiência energética entre 27% a 30% e assegurar que 15% da eletricidade produzida na EU pode ser transferida entre países através de redes interligadas.

Para o longo prazo, ano de 2050, o objetivo é o de atingir uma forte descarbonização da economia, reduzindo as emissões de gases com efeito de estufa para 80% a 95%, abaixo dos níveis de 1990 e reduzir significativamente a dependência do sistema de transportes dos combustíveis à base de petróleo, sem sacrificar a sua eficiência e comprometer a mobilidade acessível. Trata-se de uma orientação para uma transformação radical, que só pode servir para melhorar o futuro dos povos e a sustentabilidade de vida no planeta.

No âmbito do PT 2020, a Mobilidade Urbana Sustentável é apoiada por fundos da União Europeia no Objetivo Temático 4 – apoio à transição para uma economia de baixo teor de carbono.

No PO SEUR, através do Fundo de Coesão com 102 M euros, apoiando: frotas de transportes públicos; bicicletas de uso público; pontos de carregamento elétrico de uso público e medidas de promoção da mobilidade elétrica e da mobilidade sustentável. Com a reprogramação o valor e elegibilidades vão aumentar (ex. financiamento do Metro).

Nos Programas Regionais a Mobilidade Urbana Sustentável (PI 4.5) é apoiada através do FEDER, com 390,5 milhões de uros, contribuindo o PO Norte 2020 com 237 Milhões de euros, nos eixo prioritários EP3 – Economia de Baixo Teor de Carbono e EP 5 – Sistema Urbano, apoiando: o incremento de modos suaves (ciclovias e zonas pedonais); interfaces de transportes; integração multimodal para os transportes públicos através da melhoria de soluções de bilhética integrada; corredores urbanos de procura elevada; sistemas de informação aos utilizadores em tempo real e soluções inovadoras e experimentais de transporte na articulação entre territórios urbanos e rurais.

Os projetos no âmbito da Mobilidade Urbana Sustentável, apoiados com fundos comunitários, estão integrados nos Planos de Ação de Mobilidade Urbana Sustentável (PAMUS), elaborados à escala das NUT III, enquadrados na concretização das Abordagens Integradas de Desenvolvimento Territorial, exigência do Acordo de Parceria, e elaborados mediante convite que a Autoridade de Gestão do PO Norte, a 20 de julho de 2015, dirigiu às Entidades Intermunicipais, CIM /AMP.

Cada PAMUS integra um Programa de Ação de curto/médio prazo, articula medidas de natureza técnica e política com intervenções infraestruturais, focado em objetivos ambientais e energéticos, de redução das emissões de gases com efeito de estufa e de diminuição da intensidade energética nos transportes, identifica os projetos prioritários para efeitos de financiamento no atual quadro Comunitário. 

No próximo Quadro Financeiro Plurianual (QFP), a EU terá um dos seus focos na inovação e na economia de baixo teor de carbono. A energia e as alterações climáticas continuarão a ser uma das linhas de prioridade no sentido de assegurar a diminuição da dependência energética (Portugal importa 76% da energia que consome e os transportes são responsáveis por 37% da energia final consumida), cumprir objetivos definidos para 2030 de redução das emissões de GEE, desenvolver a “Estratégia de Mobilidade com Baixas Emissões”, aprovada em 2016, assegurar a competitividade e a coesão territorial e um futuro melhor para todos.

No próximo QFP, Portugal deveria assumir uma política de cidades mais robusta, incentivando soluções estruturadas e integradas de gestão dos serviços públicos, de soluções tecnológicas urbanas de maior escala, visando a eficiência e sustentabilidade global na gestão das cidades, afetando recursos significativos a um programa de cidades e territórios inteligentes. Num compromisso global e regional, a concretização das políticas deve responder de forma diferente às realidades distintas, no sentido de promover de forma mais eficaz os recursos, promover a coesão, combater as desigualdades no território.

Alterações Climáticas e Mobilidade Urbana Sustentável

No ano e 2000 foi lançada a iniciativa do Dia Europeu sem Carros, a que aderiram alguns municípios. A apreciação positiva e aceitação por parte dos cidadãos levou a que no ano de 2002, fosse lançada a semana europeia da mobilidade, a que aderiram vários municípios, como iniciativa de sensibilização para a promoção da mobilidade urbana sustentável e da melhoria da qualidade do ar nas cidades.

Bragança aderiu às iniciativas referidas. No ano de 2002 colocou em circulação três miniautocarros elétricos no centro histórico, aderiu à 1.ª fase de instalação de pontos de carregamento elétrico, foi a primeira cidade a promover o pagamento do estacionamento automóvel à superfície por telemóvel, desde o ano de 2003 que dispõe de plano estratégico de mobilidade urbana, tem veículos híbridos há mais de uma década, tem ciclovias urbanas e produção própria de energia hídrica (quatro micro centrais), de energia fotovoltaica e de aproveitamento de energia geotérmica no edifício do Parque de Ciência e Tecnologia.

O município de Bragança não tendo graves problemas ambientais, está numa localização geográfica muito vulnerável aos efeitos das alterações climáticas. Tem estado na primeira linha de combate às alterações climáticas, seguindo a visão de ecocidade, nomeadamente no campo da mobilidade urbana sustentável e da utilização de energias limpa, reduzindo as emissões de gases com efeito de estufa. 

Os problemas da mobilidade urbana à escala global tem vindo a agravar-se resultado do grande crescimento da população no planeta e da forte tendência de urbanização e concentração da população nas grandes cidades e áreas metropolitanas. Esta macro tendência tem consequências na mobilidade e transportes, na procura de água, alimentos, energia, minerais e outros recursos e um forte impacto no agravamento das alterações climáticas.

A Europa, menos pressionada com o crescimento demográfico, com um sistema urbano dos mais equilibrados do mundo, tem 73% da população a viver nas cidades, prevendo-se que em 2050 atinja os 80%. Em muitas das suas cidades e territórios a mobilidade urbana e os transportes são um problema, como os congestionamentos de tráfego, o aumento da poluição atmosférica e sonora, os problemas de segurança rodoviária, representando elevados custos sociais e económicos.

A motivação política em matéria de clima é clara, a de proteger a população, a economia, os recursos naturais de fenómenos climáticos extremos. A segunda semana de setembro do corrente ano foi elucidativa, ciclones tropicais nas Filipinas e na Costa Leste dos EUA, provocaram elevados prejuízos materiais e perdas de muitas vidas humanas. No ano de 2017, três grandes ciclones nos EUA terão provocado um prejuízo estimado de 250 mil milhões de dólares. A perspetiva de investigadores do clima é de que os ciclones que são muito intensos serão cada vez mais intensos e destrutivos, com a subida da temperatura média da água nos oceanos.

O futuro da vida no planeta é uma preocupação, os fenómenos climáticos extremos, hoje em dia mais frequentes e intensos, como os grandes incêndios florestais, secas extremas e inundações, provocam danos materiais elevados em infraestruturas, perda de vidas humanas, danos ambientais irreversíveis.

É nas cidades que se joga muito do êxito na luta contra as alterações climáticas e do futuro do planeta. Na Europa, as cidades representam cerca de 85% do PIB e são os principais polos e motores da economia e do conhecimento. A mobilidade urbana é fator relevante para o futuro das cidades, da sua atratividade e qualidade de vida, para o crescimento da economia, do emprego e da competitividade, daí o esforço atual para assegurar a mobilidade urbana sustentável nas cidades e nos territórios.

O automóvel que foi considerado como ideal de autonomia e de liberdade, um instrumento essencial da vida moderna não é hoje apreciado da mesma forma e certamente no futuro próximo, para os jovens será menos importante ter carta de condução e carro do que foi no passado recente. Ter automóvel ajuda muito no quotidiano, também traz preocupações, como as despesas no orçamento familiar, as emissões de gases tóxicos que representam cerca de 25% das emissões globais de CO2, o tempo perdido nos grandes engarrafamentos de trânsito, a maior dedicação de espaço urbano às funções de mobilidade automóvel, ocupado por ruas e estacionamentos, prejudicando a mobilidade e segurança dos peões.

A aposta política no sentido da mudança de paradigma e de transição para a mobilidade limpa e sustentável é clara. Hoje é crescente o número de pessoas que associa o automóvel à perda de qualidade de vida nas grandes cidades, como ameaça à saúde pública devido à poluição do ar, ao ruido e a uma convivência difícil no espaço urbano entre o peão e o automóvel.

Em muitas das cidades europeias a qualidade do ar é inferior às normas europeias, o dióxido de azoto e as partículas finas emitidas pelo gasóleo provocam irritações pulmonares e são responsáveis por doenças respiratórias e cardiovasculares, uma ameaça à saúde pública, o que leva a uma maior preocupação política dos governantes locais pela saúde dos cidadãos, e pela imagem de cidade saudável.

A luta contra as alterações climáticas impõe mudança radical na mobilidade, tal exige empenho político, mudança cultural e percorrer um caminho que exige tempo, muita inovação, muito investimento em tecnologia, equipamento e infraestruturas. Trata-se de um desafio para o futuro das cidades, para o comércio e a indústria à escala global. A mudança de paradigma na economia está em curso e a indústria é naturalmente protagonista relevante que reage a este grande desígnio da Humanidade.

O futuro da mobilidade aponta para as energias limpas. Com uma aposta muito forte na eletricidade. Prevê-se que até 2030, a procura por capacidade de baterias de íons de lítio, nas casas e nas empresas, triplique a cada ano. É intensa a atividade neste âmbito, juntando investimento público e privado, fabricantes, startups e universidades estão a testar muitas soluções de baterias, prevendo-se que muitas das soluções ou não chegarão ao mercado ou tornar-se-ão obsoletas face ao ritmo de inovação tecnológica.

Também o setor da aviação está fortemente implicado na investigação e experimentação, envolvendo empresas de aviação, centros de investigação e fundos financeiros que trabalham na perspetiva da 3.ª revolução da aviação com aeronaves elétricas e hibridas-elétricas, perspetivando a mobilidade urbana por via aérea, como a 3.ª dimensão a integrar na rede intermodal de transportes nas cidades, no transporte de pessoas e mercadorias.

No campo da mobilidade urbana a aposta de mudança de paradigma é clara e de âmbito global, apontando para a utilização de energias limpas, carros menos poluentes e de zero emissões, da gestão partilhada e os de condução autónoma que poderão ser uma realidade num futuro próximo, e para a gestão integrada e inteligente dos vários meios de transporte.

É elevado o empenho dos países e cidades nesta mudança. O governo da cidade de Oslo, na Noruega, no ano de 2015, decidiu interditar a circulação automóvel no centro da cidade até 2019, transformar 56 Km de vias rodoviárias em ciclovias e o desenvolvimento dos transportes públicos. Levantaram-se vozes representativas dos automobilistas, protestando contra a construção de um muro discriminatório e do comércio local que temia uma cidade deserta e a falência do comércio. Os planos foram revisto, para uma transformação gradual, começando por limitar os lugares de estacionamento, aumentar o espaço para peões, pela construção de ciclovias e aquisição de bicicletas elétricas.

Na Alemanha, país que viu um dos seus engenheiros inventar no séc. XIX o diesel, algumas cidades procuram limitar o acesso dos veículos a diesel aos centros históricos, decisões geradoras de controvérsia, algumas já validadas por instâncias judiciais, exemplo das cidades de Estugarda e Dusseldorf, que optaram por uma mobilidade mais amiga do ambiente, reforçando o investimento no transporte público, em ciclovias e bicicletas elétricas partilhadas. Governos federias estão a exigir aos fabricantes a recolha dos modelos mais antigos e a substituição dos motores por motores menos poluentes, enquanto preparam novas infraestruturas para a mobilidade sustentável, nomeadamente a construção de superauto-estradas para bicicletas.

Na Polónia, o Estado apostou nos incentivos às empresas que fabricam carros elétricos e aos compradores, incentivando as cidades a definir zonas exclusivas para carros elétricos, concedendo incentivos aos governos locais para a compra de veículos elétricos e incentivando a utilização de carros partilhados. Na Polónia está localizada a LG, a maior fábrica de baterias na Europa, tendo este país uma importante quota de produção de autocarros elétricos.

A França e o Reino Unido anunciaram pretender acabar com a produção de novos veículos a gasóleo e gasolina, substituindo-os por modelos híbridos ou elétricos, com objetivo de reduzir a poluição do ar e incentivar a generalização de veículos elétricos, decisões que implicam um caminho para mudanças profundas na indústria automóvel e uma forte colaboração entre os governos centrais e locais. A Volvo anunciou que no curto médio prazo iria produzir apenas veículos híbridos e elétricos.

 

Imagens:

Fonte: site da EU e Câmara Municipal de Bragança

Alterações Climáticas e Eficiência Energética nos Edifícios

As alterações climáticas são uma realidade cada dia mais presente, bem acentuada pelos noticiários à escala global, associadas a estragos devastadores provocados por fenómenos climáticos extremos, como inundações e secas extremas, que provocam grandes fluxos migratórios de população, alteração de preço de matérias-primas e de alimentos essenciais, danos em infraestruturas e na economia em geral, para além da perda de biodiversidade no planeta e de vidas humanas.

A Europa vive um ano de temperaturas elevadas, os países do norte foram surpreendidos pelos efeitos do aumento da temperatura, já os países do sul, bastante mais vulneráveis, sujeitos às influências do deserto do norte de África, sofrem desde há anos efeitos negativos crescentes de degradação da natureza. Investigadores do clima referem que em Portugal no ano de 2050 podemos ter temperaturas máximas à volta dos 55 graus, o que nos dá uma ideia do muito que há a fazer.    

O 1.º dia de agosto foi referido pelo “Global Footprint Network”, como o dia do ano em que se caminha na super utilização dos recursos da Terra, tendo como medida a Pegada Ecológica, medida de sustentabilidade de utilização dos recursos do planeta, significando que até ao final do ano estaremos a viver consumindo recursos para lá da garantia de sustentabilidade de gerações futuras. No próximo ano este dia poderá chegar mais cedo. A obrigação de todos é garantir que esse dia ocorra progressivamente mais tarde, a meta ideal seria 31 de dezembro de cada ano, reestabelecendo o necessário equilíbrio. Estou confiante que as próximas gerações o alcançarão.

As alterações climáticas são uma preocupação dos cidadãos e dos governos das nações, uns mais do que outros, sendo também certo de que muitos consideram a descarbonização da economia como essencial para o futuro do planeta, para cumprir os objetivos do Acordo Climático de Paris 2015 e assim reduzir a pegada ecológica da humanidade, pretendendo a Europa assumir-se como ator importante e líder na transição para a economia verde e do conhecimento.

A Agenda Estratégica da União Europeia inclui no conjunto de dez prioridades de ação que vinculam os Estados-Membros, a agenda da “União da Energia e do Clima”. Também o presidente da EU no seu discurso sobre o estado da União (2018), para uma Europa mais forte, no conjunto das cinco prioridades referidas incluiu as alterações climáticas.

A União Europeia visa reduzir a dependência de importações de energia, atualmente de 53%, reduzir as emissões de gases com efeito de estufa e estimular o emprego e o crescimento, assentando a estratégia em cinco vertentes: a segurança, solidariedade e confiança; a integração do mercado europeu de energia; a eficiência energética; o combate às alterações climáticas; desenvolver a investigação, a inovação e a competitividade.

A União europeia consome 20% da energia mundial, é o maior importador do mundo, dispõe de reservas próprias relativamente limitadas e de menos de 10% de interligação das redes de energia. Na Europa 50% da energia final é utilizada para fins de aquecimento ou arrefecimento e desta 80% é utilizada em edifícios. Portugal importa 76% da energia que consome, os transportes são responsáveis por 37% da energia, a indústria por 31% e os edifícios consomem 29% da energia total, bastante menos do que a média da EU, situação favorecida pelo clima, ainda assim, corresponde a uma fatura muito pesada a evidenciar o impacto do consumo energético nos edifícios.

A EU fixou objetivos globais para o setor da energia e que obriga os Estados-Membros. Fixou para o curto prazo, ano de 2020, a redução de 20%, pelo menos, das emissões de gases com efeito de estufa, comparativamente ao ano de 1990, garantir que pelo menos 20% da energia é obtida a partir de fontes renováveis e 20% de redução no consumo, através da eficiência energética. Fixou para o médio prazo, ano de 2030, reduzir em 40% as emissões de gases com efeito de estufa, garantir que 27% da energia é obtida a partir de fontes renováveis, aumentar a eficiência energética entre 27% a 30% e assegurar que 15% da eletricidade produzida na EU pode ser transferida entre países através de redes interligadas. Para o longo prazo, ano de 2050, o objetivo é o de atingir uma forte descarbonização da economia, reduzindo as emissões de gases com efeito de estufa para 80% a 95%.

A Europa é um continente desenvolvido, assumiu estar na vanguarda de construção da nova economia, ajudar a salvar o planeta, sabendo-se que outros países lhe seguirão o exemplo, que países em desenvolvimento assumirão mais lentamente os desafios das alterações climáticas, que o forte crescimento da população no planeta irá pressionar muito a extração de recursos naturais (a água potável, os minerais, os solos, as florestas, etc.), poluir o ambiente, extinguir parte da vida nos oceanos pela elevação da poluição, tornar o ar cada dia menos respirável, que guerras generalizadas podem ocorrer na disputa de bens essenciais para a sobrevivência dos povos, mesmo assim, e por isso, não podemos cruzar os braços. Trata-se de proteger o planeta azul, o único no universo com condições para continuar a acolher a vida humana e as muitas outras formas de vida existentes na Terra.  

É neste contexto que a redução do consumo energético nos edifícios, nomeadamente através de medidas de eficiência energética pode contribuir muito para a concretização de objetivos de combate às alterações climáticas. Na União Europeia, os edifícios são responsáveis pelo consumo de 40% da energia total, por 35% das emissões de CO2 e em média 35% dos edifícios tem mais de 50 anos e cerca de 75% são energeticamente ineficientes, por outro, a renovação média anual dos edifícios é de 0,4% a 1,2%, dependendo do país, enquanto o valor da média anual apontada pela EU como desejável é de 3%.

A situação em Portugal não é muito diferente. Os edifícios consomem 29% da energia total, estima-se que mais de 50% do consumo pudesse vir a ser resolvido através de medidas de eficiência energética. Dois terços dos edifícios em Portugal tem menos de 40 anos e cerca 29% do parque habitacional necessita ser reabilitado.

A União Europeia através de diretivas específicas (EU 2018/844) relativas ao desempenho energético dos edifícios promove uma estratégia para a renovação dos edifícios dos Estados-Membros, reforçando a ligação entre o financiamento público e os certificados de desempenho energético dos edifícios, visando melhorar o ambiente.

A investigação, o Setor da Construção Civil em geral e os cidadãos assumem que o incremento de renovação dos edifícios antigos tem um elevado potencial para a redução do consumo de energia e da redução das emissões de CO2.

Por outro a concretização dos objetivos da EU em matéria de clima e de energia está associada aos esforços de renovação do parque imobiliário dos Estados-Membros, sendo dada prioridade à eficiência energética e à introdução de energias renováveis nos edifícios. A Eficiência Energética promove: a economia, em particular a indústria da construção; a redução das importações de energia a países terceiros; a redução das emissões de gases com efeito de estufa; melhora a qualidade do ar interior, proporcionando níveis de conforto e bem-estar mais elevados para os seus ocupantes e melhora a saúde.  

O Programa Operacional da Região Norte financia a eficiência energética na habitação social, prevendo-se que pelo menos 5800 famílias tenham as suas habitações melhoradas, financia a eficiência energética nos equipamentos e infraestruturas da administração local, mobilizando apoio financeiro até 107 milhões de euros.

As intervenções elegíveis podem incluir a envolvente opaca dos edifícios, a envolvente envidraçada, a intervenção nos sistemas de produção de água quente sanitária e outros sistemas técnicos, a iluminação interior, a instalação de sistema e equipamentos que permitam a gestão de consumos de energia, a instalação de painéis solares térmicos para produção de água quente sanitária e de produção de energia, desde que, para autoconsumo, são ainda elegíveis os custos relativos a auditorias e diagnósticos.

Na habitação social o financiamento é feito sob a forma de subvenção não reembolsável à taxa de 85% sobre o investimento elegível, nos equipamentos da administração local podem coexistir subvenção reembolsável com taxa de apoio de 95% ou de subvenção não reembolsável com taxas de apoio que podem atingir os 45% ou 50%, conforme a classe de desempenho energético alcançado com o investimento, a dimensão do investimento e se o imóvel tem mais de 40 anos e é classificado ou em vias de classificação.

Fazem parte das exigências de elegibilidade, ter projeto aprovado, certificado energético, relatório energético e demonstrar que a redução do consumo de energia será pelo menos de 30% dos consumos de energia primária.  

As instituições sociais, após aprovação da reprogramação do Programa Operacional, apresentada à Comissão Europeia, poderão candidatar-se a apoios no âmbito de avisos a publicar, visando a eficiência energética nos equipamentos sociais. É uma oportunidade para melhorar a envolvente dos edifícios construídos há mais de 30 anos, de baixa eficiência energética, valorizar o património edificado, as condições de conforto para utentes e trabalhadores, reduzir a fatura de energia, aumentar a sustentabilidade financeira das instituições e contribuir para o combate às alterações climáticas, na defesa da sustentabilidade de vida na Terra.

(Imagens do texto, obtidas de fonte da CE)

Agosto de 2018

 

O Programa Nacional de Investimentos 2030 e o reforço da centralidade Ibérica de Bragança

A presente reflexão ocorre na sequência de contributo apresentado no âmbito da revisão do Plano Nacional de Políticas de Ordenamento do Território, documento indicativo para a execução de políticas públicas. Também pelo facto de estar em curso a revisão do Plano Estratégico de Transportes e Infraestruturas (PETI 3+) aprovado no ano de 2014, para execução no periodo de programação 2014-2020, agora em atualização, com a designação Programa Nacional de Investimenos 2030, em fase de consulta pública e que visa o contributo do investimento público para uma década de convergência com a União Europeia. 
A execução deste Programa será estabilizada com votação na Assembleia da República para garantir a continuidade dos investimentos, face à alteração de ciclos politicos. Trata-se de um documento essencial para a concretização de investimentos na próxima década, em primeiro lugar pela via do consenso político e em segundo lugar porque ficará ligado à programação financeira do Quadro Finaceiro Plurianual, em negociação com a União Europeia para o periodo 2021-2027. Dependendo Portugal em 85% dos fundos comunitários para a realização de investimento público, fica bem evidente ser importante para Trás-os-Montes dispor de alguns investimentos inscritos nesse Programa, nas acessibilidades, nas infraestruturas agricolas e outros. 
É essencial que o Programa Nacional de Investimenos 2030 não exclua Bragança do investimento público, de outra forma será presciso aguardar mais década e meia para que projetos como a ampliação do aeroporto regional de Bragança, a ligação de Bragança a Puebla de Sanábria, a conclusão do IC5 poderem ser concretizadas, eventualmente até a melhoria das ligações aos concelhos de Vinhais e Vimioso. Nessa altura será ainda mais dificil reverter o processo de despovoamento de Trás-os-Montes. Acho ser o momento de os deputados eleitos pelo circulo eleitoral de Bragança e os autarcas da CIM Terras de Trás-os-Montes utilizarem o poder dos seus mandatos para em conjunto assegurarem que os investimentos acima referidos serão incluidos no documento a ser votado na Assembleia da República.  
Bragança, tem sido ao longo da História, uma centralidade política e administrativa, capital dos Povos Zoelae, capital das Terras de Bragança sob administração da familia dos Bragançãos, durante o período da Reconquista e da fundação do Reino de Portugal, mais tarde sob a influência da Casa de Bragança deu o nome à IV Dinastia do Reino, a última e a mais longa Dinastia que governou Portugal. É a mais antiga cidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, foi um importante centro nas relações comerciais e políticas com o Reino de León e mais tarde de Castela e León. Foi Cidade Fortaleza na consolidação das fronteiras do Reino de Portugal, condição que marca a sua História e identidade. 
A sua centralidade ibérica esteve sempre presente no contexto geopolitico, social e económico. Com a estabilização de fronteiras no final do século XVIII, os ciclos de emigração que se seguiram e o centralismo crescente que tomou conta do país, Bragança, cercada a norte e nascente por uma extensa fronteira, ficou mais periférica, mais isolada num território progresssivamente esquecido. Com a adesão à CEE, abriu-se uma porta de esperança no sentido de vencer o isolamento, retomar o desenvolvimento, recuperar a centralidade que teve o que, de algum modo, tem vindo a ser conseguido no plano das acessibilidades, da economia e das relações sociais, apesar de se agravar o despovoamento do território, o seu principal problema. 
Bragança tem como ligações fronteiriças principais, a norte o Portelo e a nascente a de Quintanilha que integra a Autoestrada Transmontana e como ligações secundárias, Rio de Onor, Petisqueira e Parâmio. As duas ligações  para norte não reunem condições minimas de segurança e de mobilidade para veículos pesados de transporte de pessoas e bens. Trata-se de estradas de montanha estreitas e com um traçado muito dificil, que em tempos serviram para as necessidades do momento em que o transporte se fazia por carroças puxadas a cavalo ou carros de bois, enquanto no presente os grandes fluxos de passageiros e de mercadorias se fazem através de veiculos pesados. 
A reconquista da centralidade económica que Bragança teve, em particular com terras do antigo Reino de León, exige uma ligação capaz para norte, entre Bragança e Puebla de Sanábria, em substituição das duas existentes que não asseguram a circulação de tráfego pesado de transporte de mercadorias para exportação, que tem vindo a crescer, sendo Bragança de forma destacada o principal pólo exportador do Interior Norte, como não são opção para o transporte de turistas. 
É sobre a construção da curta ligação entre Bragança e Puebla de Sanábria e ampliação do Aeroporto de Bragança, visando o reforço da centralidade de Bragança no contexto ibérico e da sua posição no sistema urbano nacional, e consequentemente da coesão e da competitividade regional que é apresentado a presente reflexão.
Tem sido várias as iniciativas de cooperação transfronteiriças em defesa da construção de uma nova ligação entre Bragança e Puebla de Sanábria, o que corresponde à conclusão e ligação do IP2 à rede viária do país vizinho. Foi nesse sentido que, a 11 de janeiro de 2008, nas jornadas técnicas realizadas em La Bañeza com a colaboração da Associação dos Amigos de Portugal em Espanha, tendo como tema as Comunicações entre Trás-os-Montes e León, foi decida a constituição da Associação Autovia León Bragança, plataforma reivindicativa da ligação entre Bragança e Puebla de Sanábria, tendo sido apresentado estudo técnico de suporte à reivindicação, estudo que integra o mapa abaixo impresso.
A ligação do IP2 de Bragança á fronteira corresponde aos últimos KMs desta via que percorre todo o Interior de Portugal de Bragança a Faro. O plano Rodoviário de 2000 prevê esta ligação, a sua conclusão permitirá estabelecer a articulação intermodal da A4 e do IP2 com a rede espanhola através da A52 e com a linha ferroviária de Alta Velocidade que liga Madrid à Corunha, e em consequência a articulação com o modo de transporte aéreo no Aeroporto de Bragança. 
A execução desta curta ligação fronteiriça entre Bragança e Puebla de Sanábria permitirá a estruturação de um nó de intermodalidade, envolvendo três modos de transporte, rodoviário, ferroviário e aéreo e a eliminação de um forte bloqueio na fronteira, dando expressão à política de mobilidade e da coesão territorial da União Europeia. 
Esta ligação ganha maior relevância após finalização na Puebla de Sanábria da Estação de Alta Velocidade (AVE), ligação Madrid/Corunha e representa para Trás-os-Montes uma oportunidade de desenvolvimento social e económico, permitindo-lhe ganhar atratividade para a captação de investimento, nomeadamente industrial e de turismo. Coloca o Interior Norte a um passo da rede ferroviária europeia de alta velocidade com todas as vantagens económicas e sociais que isso representa. A fronteira tem que ser aberta no sentido de unir e de permitir o desenvolvimento contra a atual situação de divisão e de isolamento.  
Tem sido muitas as iniciativas a favor da construção desta ligação fronteiriça, desde instituições públicas, associações empresariais e cívicas, contam-se por mais de três dezenas. Também antigos titulares de Órgãos de Soberania, como os Ex- Presidentes da república, Dr. Jorge Sampaio, Professor Cavaco Silva, o Presidente da Junta de Castela e Leão, se manifestaram a favor da construção desta ligação.
Destaco cinco das iniciativas, a realizada a 26 de maio de 1999, de assinatura de protocolo entre a CCRN e a JAE para a realização dos primeiros estudos, e a assinatura do contrato com equipa técnica para a realização do estudo de corredores de ligação entre Bragança e Puebla de Sanábria. O estudo foi finalizado em 2002 e identificou o corredor mais curto e de menor impacto ambiental a ser desenvolvido em zona de reduzida biodiversidade, o planalto da Aveleda. Mais tarde veio a ser tomada a opção de traçado em versão que envolve a retificação do corredor de Bragança a Rio de Onor, com variante à aldeia de Varge e Rio de Onor.
Em julho de 2002 foi entregue ao Primeiro-ministro documento assinado pelos municípios do distrito de Bragança, Associações Comerciais e IPB, relativo à importância desta ligação para o desenvolvimento regional. A 31 de Janeiro de 2006, a Assembleia Geral do Eixo Atlântico do Noroeste Peninsular manifestou unanimidade, e inscreveu no Plano Estratégico de Infraestruturas do Noroeste Peninsular esta ligação como necessária à coesão e mobilidade territorial;
A 11 de Janeiro de 2008, na cidade de La Bañeza foi decidida a criação da Associação Autovia León Bragança, que conta com participação muito alargada, desde municípios, ayuntamientos; Instituições de Ensino Superior de ambos os lados da fronteira e as principais Associações Empresariais ao longo deste corredor rodoviário. Na Assembleia Geral de 27 de julho de 2011 decidiu concentrar esforços no troço Bragança /Puebla de Sanábria, como primeira prioridade e mais recentemente a Associação RIONOR tem vindo a reivindicar esta ligação.
É no contexto da intermodalidade e do reforço da centralidade ibérica de Bragança que o transporte aéreo tem maior relevância. O facto de o aeroporto de Bragança estar a meia distância do Porto e de Valladolid, a 200 KM de cada uma das cidades, é um bom argumento para se olhar para o conjunto dos três meios de transporte existentes e construir uma solução integrada de maior viabilidade destas infraestruturas que podem marcar a diferença para o futuro da região. 
Iniciado no ano de 1962, o aeródromo municipal conta a partir do ano de 2004, de condições que lhe permitiram certificar a infraestrutura e o serviço, podendo operar à noite, dispõe de sistema de segurança e de informação e apoio à navegação aérea, pista com 1700 metros, tem voos diários desde há duas décadas. No mês de julho de 2005, realizaram-se os primeiros voos de ligação entre Bragança e Paris (Orly), em aeronave de 48 lugares.
O plano de expansão, já com estudo de impacto ambiental, está aprovado pela Autoridade Aeronáutica e envolve a ampliação da pista para 2300 metros e novo terminal para 200 passageiros em hora de ponta, com o custo estimado de 12 milhões de euros, investimento de valor relativamente baixo para o benéfico daí resultante e que permitirá um novo impulso para rentabilizar o muito investimento já realizado ao longo de cerca de seis décadas nesta infraestrutura.
Este investimento permitirá projetar o desenvolvimento futuro na perspetiva do transporte aéreo, da logística, da atividade industrial e de serviços, nomeadamente como escola formação e de manutenção de aeronaves, áreas de oportunidade e de necessidade das companhias aéreas que necessitam de instalações e espaço aéreo e disponível, sendo o caso de Bragança, que deverá seguir o exemplo de Beja.
A construção da ligação rodoviária entre Bragança e Puebla de Sanábria e o desenvolvimento do Aeroporto de Bragança, nas perspetivas de entrada e saída de turistas, da indústria e serviços aeronáuticos é essencial para o futuro de Trás-os-Montes. O transporte aéreo direto a Bragança poderá ajudar Trás-os-Montes a acelerar o crescimento turístico, a rentabilizar investimentos feitos, a promover novos investimentos, a contribuir para contrariar o ciclo de despovoamento, de redução do emprego e da atividade económica. Lutar contra um ciclo de despovoamento exige medidas políticas públicas capazes de fazer uma inversão da situação e isso não ocorre sem visão de futuro, ousadia e planeamento.    
Reforço a ideia de que a centralidade geográfica de Bragança no contexto ibérico deve ser robustecida em termos de atividade social e económica, permitindo uma posição de maior destaque no Contexto do Sistema Urbano Nacional visando a coesão e ancoragem territorial. 
Para isso a rede de conetividade é essencial, Bragança necessita abrir uma nova porta de entrada e saída. Olhando para o mapa de infraestruturas surge como demasiado óbvio, a construção de um nó de intermodalidade do transporte rodoviário, aéreo e ferroviário, assegurando um salto qualitativo e quantitativo na estratégica de atratividade e competitividade do Interior Norte. 
Para isso, quem tem responsabilidades de representação política deve assegurar que o Plano Nacional de Políticas de Ordenamento do Território e o Programa Nacional de Investimenos 2030 incluam os investimentos relativos à ampliação do Aeroporto Regional de Bragança, à construção da ligação à Puebla de Sanábria e à conclusão do IC5, não podendo ser esquecida a melhoria das ligações interconcelhias em falta e outros investimentos essenciais ao desenvolvimento da atividade económica, designadamente na agricultura e florestas.

Turismo Sustentável e Coesão Territorial Caso das Terras de Trás-os-Montes - Parte I

Nos anos mais recentes, a atratividade de Portugal conjugada com fatores externos tem permitido um forte crescimento do turismo no país, não de forma homogénea, crescendo muito nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto e cidades próximas do litoral, no corredor fluvial do Douro, menos no Interior. Debruçando-nos sobre os dados relativos aos municípios de Terras de Trás-os-Montes, constatamos que assim é.

Da análise da informação estatística constata-se que a taxa líquida de ocupação por cama no país tem vindo a subir, de forma mais expressiva no período e 2014 a 2016, evoluindo de 43,6% para 46,4%. No mesmo período, nos municípios de Terras de Trás-os-Montes, a taxa líquida de ocupação evoluiu de 14,5% para 16,3%. Sendo quase três vezes inferior à média nacional. O município de Bragança é o que apresenta a taxa mais elevada (23,7%), inferior à média nacional (46,4%) e à média regional (37,6%).

A capacidade de alojamento cresceu na Região Norte, no período de 2002 a 2016 à taxa média anual de 6,14% e em Terras de Trás-os-Montes a 5,8% enquanto no período de 2013 a 2016 cresceu 8,7%, ligeiramente acima da média regional. Já no que respeita ao crescimento médio anual do número de hóspedes, foi de 15,1% na Região Norte e em Terras de Trás-os-Montes de 8,7%, cerca de metade da média regional.

É forte o crescimento da capacidade hoteleira e da procura turística no país, de forma concentrada no litoral. A Região Norte representa 15,3% da capacidade de alojamento do país, bastante abaixo do seu peso na economia nacional (29,5%). Nos municípios de Terras de Trás-os-Montes a capacidade de alojamento tem crescido, acompanhando a tendência no país, representa uma proporção equivalente à do PIB pc, tem em termos gerais uma boa capacidade de alojamento é uma baixa taxa de ocupação. A procura é insuficiente para uma melhor rentabilização dos investimentos, por outro a taxa média de crescimento do número de hóspedes, fica bastante abaixo da média regional.

Para que a situação melhore em termos relativos e absolutos é necessário que a taxa média anual cresça, de forma continuada e significativa acima da média nacional e assim, contrariar a tendência atual que corresponde a uma concentração de 93% das dormidas no litoral.

Terras de Trás-os-Montes tem que captar mais turismo interno e criar condições para que alguns dos muitos turistas estrangeiros que chegam ao Porto, sobem o Rio Douro, ou adquirem programas para visitar cidades na Região Norte, mais focados em cidades como Braga, Guimarães, Viana do Castelo, Aveiro etc. ou até em Espanha, caso de Salamanca, cheguem ao Nordeste Transmontano. Deve dar muita atenção à realidade da Região de Castela e Leão que em 2017 recebeu 8,15 milhões de turistas, o que deu origem a 13,57 milhões de dormidas, bastante acima da Região Norte.

Se olharmos para as três cidades espanholas mais próximas de Bragança, com as quais existem relações seculares, projetos de cooperação transfronteiriça que tem vindo a ser executados com êxito, constatamos que estas cidades, Zamora, Salamanca e León, no ano de 2017 foram visitadas por 3,22 milhões de turistas que representaram 5,43 milhões de dormidas. A Província de Zamora, o território nosso vizinho, tem três vezes mais dormidas do que o conjunto dos municípios das Terras de Trás-os-Montes.

A presente reflexão pretende contribuir para a identificação de oportunidades visando o aumento de fluxos turísticos nos concelho de Terras de Trás-os-Montes, com no sentido de promover a economia e a sustentabilidade dos investimentos no setor de hotelaria e restauração, visando a criação de emprego, a fixação de novas competências e o crescimento da economia. Temos recursos patrimoniais e naturais de excelência, cidades atrativas, capacidade hoteleira, é preciso que a política regional seja capaz de promover o território de forma integrada, o que não tem sido feito de forma capaz, que ao nível sub-regional exista estratégia e cooperação intensa e um plano específico de promoção dos recursos turísticos do território, de aproximação a agentes turísticos relevantes e à imprensa da especialidade, esforço que deveria ser apoiado por um plano estratégico nacional para a promoção do turismo no Interior.

A Comunidade Intermunicipal poderá ter que agir em parceria com operadores turísticos, agências de viagens, imprensa especializada e outras entidades privadas e públicas, no sentido de assegurar integração e organização da oferta, a melhoria da formação na área da hotelaria e restauração, a construção de uma estratégia integrada de promoção do território, no mercado interno, dar primazia à ação de cooperação com as cidades fronteiriças de Zamora, Salamanca, León, no sentido de trazer turistas para o Nordeste Transmontano, dos muitos que se dirigem à Península Ibérica, o primeiro destino turístico mundial. 

Abrir novas portas de entrada, com alguma expressão é necessário, como é importante assegurar boas ligações entre concelhos ainda em falta. Há duas portas essenciais a abrir, uma nova ligação entre Bragança e Puebla de Sanábria, em substituição das duas existentes, que é estratégica, permite a saída para norte em várias direções, León, Astúrias, Santander, Galiza e norte da Europa. É o ponto mais próximo de dois importantes corredores europeus de transporte de mercadorias (A4 e A52), ligação que não concorre com o corredor rodoviário da A11/E82 entre Quintanilha e Zamora, via prioritária para todo o Norte de Portugal. Este último troço do IP2 que percorre todo o Interior do País fará a ligação necessária a norte às autoestradas A52, A6 e A66 em território espanhol e também à linha ferroviária de alta velocidade que liga Madrid à Corunha e a Vigo. Também a conclusão do IC5 é importante.

A execução daa ligação fronteiriça entre Bragança e Puebla de Sanábria permitirá estruturar um nó de intermodalidade na Rede Transeuropeia de Transportes (RTE), envolvendo três modos de transporte, o rodoviário, o ferroviário e o aéreo, elimina um bloqueio na fronteira, dando expressão à política de coesão e mobilidade territorial da União Europeia;

Esta ligação é ainda mais relevante face à construção na Puebla de Sanábria da Estação de Alta Velocidade (AVE) da ligação Madrid/Corunha e representa para o Trás-os-Montes e Douro uma oportunidade de desenvolvimento económico em termos industriais e de turismo. Coloca o Interior Norte a um passo da rede ferroviária europeia de alta velocidade, com todas as vantagens económicas associadas. Para isso, a fronteira tem que ser rasgada, no sentido de unir e de permitir o desenvolvimento contra a atual situação de divisão e de isolamento. 

O facto de existir uma infraestrutura aeroportuária é uma razão adicional que fundamenta a importância de se derrubar a barreira da fronteira, para garantir a intermodalidade dos diversos meios de transportes. Iniciado no ano de 1962, o aeródromo municipal, a partir do ano de 2004, passou a dispor de condições de operação noturna, de sistema de segurança de informação e apoio à navegação aérea, possui a quarta maior pista de aviação civil do continente. Dispõe de instalações e serviços certificados e de projetos aprovados pela Autoridade Aeronáutica para melhorias que, com um baixo investimento, permitirão um salto enorme, como porta de entrada e de oportunidade para o desenvolvimento de Trás-os-Montes e Província de Zamora, com ganhos para a economia, melhoria da logística transfronteiriça e da mobilidade de pessoas e bens nos modos de transporte rodoviário, ferroviário e aéreo.

Esta infraestrutura aeroportuária tem como aeroportos mais próximos o do Porto e o de Valladolid a pouco mais de 200 Km, está vocacionada para voos regionais no espaço europeu, deve assegurar complementaridade ao Aeroporto Francisco Sá Carneiro em particular na perspetiva da rentabilização turística da Bacia do Douro. A articulação com o TGV é uma mais-valia significativa.

A construção da ligação rodoviária entre Bragança e Puebla de Sanábria e o desenvolvimento do aeroporto de Bragança, nas perspetivas de entrada e saída de turistas, da indústria e serviços aeronáuticos é essencial para o futuro de Trás-os-Montes. Sem esta evolução, o turismo continuará a ser pouco expressivo, aqui poderão chegar mais autocarros com turistas, mas o seu número será sempre pouco significativo face ao que é necessário, assegurando plena sustentabilidade no seu crescimento. Entendo que só o transporte aéreo direto a Bragança poderá ajudar Trás-os-Montes a acelerar o crescimento turístico, a rentabilizar investimentos feitos, a promover novos investimentos, a contribuir para contrariar o ciclo de despovoamento, de redução do emprego e da atividade económica, o principal problema da região.  

Fica o alerta, em particular para a Comunidade Intermunicipal das Terras de Trás-os-Montes e das principais Instituições regionais, no sentido de que a revisão do Programa Nacional da Política do Ordenamento do Território (PNPOT), atualmente em discussão pública, não poderá omitir de entre outros investimentos, as duas infraestruturas referidas – ligação de Bragança a Puebla de Sanábria e Aeroporto Regional de Bragança - como prioritárias à coesão e à criação de um sistema urbano mais equilibrado, sob pena de todo o empenho e vontade política ao mais alto nível, para resolução dos problemas da interioridade e da coesão territorial, não terem qualquer expressão futura.

Acredito que nos próximos cinco a dez anos, se poderá chegar ou partir de Bragança, para destinos europeus, em voos feitos a partir do Aeroporto Regional de Bragança, viajar de automóvel, de Bragança até à estação do TGV na Puebla de Sanábria, por uma via nova com características de Itinerário Principal, e a partir daí para qualquer destino europeu, viajando em comboio de Alta velocidade. Nessa altura a centralidade geográfica de Bragança no contexto ibérico estará bem evidenciada através do sistema de intermodalidade de transportes, verdadeira alavanca para afirmar uma nova centralidade económica regional.

Desejo que o Plano Nacional de Políticas de Ordenamento do Território, agora em discussão pública, documento indicativo de grandes linhas de estratégia de políticas públicas, no domínio das políticas territoriais, sociais, económicas, de conectividade e do sistema urbano, Plano que deverá apoiar a definição da estratégia regional para a utilização das ajudas da União Europeia, venha a incluir no sistema de conectividade, o aeroporto regional de Bragança e a ligação à Puebla de Sanábria, o que não acontece na versão em discussão. Se assim não for, o risco de o “Plano Nacional de Investimentos” não os vir a incluir é elevado, e nessa altura estaremos a agravar os problemas da interioridade, a não ser capazes de vencer os problemas da coesão territorial, a ficar ainda mais para trás na política urbana e na política rural.

Aristóteles referiu, “ A Esperança é o sonho do homem acordado”. Nenhum português, nenhum cidadão que viva no Interior, pode perder a Esperança de viver num país mais igual em termos sociais e do território, de valorizar o potencial do todo nacional, de assumir, mesmo com os graves problemas demográficos, que o território de fronteira é a interface de desenvolvimento das relações com o país vizinho e que o Interior não são as costas do litoral.

Maio de 2018

 

Turismo Sustentável e Coesão Territorial – Caso das Terras de Trás-os-Montes - Parte 1

Portugal como destino turístico tem um conjunto de fatores distintivos de atratividade e competitividade como: a posição geoestratégica, entre a Europa, a América e a África que nos permite, face à nossa posição periférica relativa ao centro da europa, onde se concentra a economia e os grandes fluxos de cidadãos, contrapor uma visão atlântica próxima de mercados mais amplos; ser um dos países mais antigos do mundo, com a fronteira continental mais estável da europa, praticamente inalterada desde o século XIII, sendo a mais antiga nação da europa; ter sido o país que iniciou o caminho da globalização.

Por outro lado, a língua portuguesa é a 5.ª mais falada no mundo, o que lhe permite ligações históricas e culturais com vários povos e uma imagem de povo aberto, com capacidade de acolher e de se integrar em culturas diversas; o povo português tem facilidade de falar línguas estrangeiras e cultiva a tradição de bem receber; integra a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, mercado com elevado potencial, também para o turismo; beneficia de um clima mediterrânico moderado pela influência do atlântico, muito favorável ao turismo e de uma extensa faixa costeira com potencial turístico elevado.

Portugal é um dos países do mundo (22.º) com melhores infraestruturas, tem bons serviços tecnológicos e serviços de saúde de qualidade, infraestruturas culturais e de lazer de qualidade; tem um território diversificado, património natural de elevada biodiversidade e um vasto património cultural, é um dos países mais seguros do mundo.

A Organização Mundial do Turismo reconhece a importância crescente do turismo na economia global, considerando-o uma oportunidade para a prosperidade dos povos e dos territórios. Os seus efeitos fazem-se sentir no alojamento, na restauração, nos serviços de transporte, na animação turística e de forma indireta em diversas outras atividades económicas. Estima que um em cada dez empregos a nível mundial esteja diretamente ligado ao setor do turismo;  

De acordo com o Banco de Portugal, o turismo é um dos setores que mais contribui para a recuperação da economia portuguesa. As receitas do turismo tiveram no período de 2012 a 2016, um crescimento médio de 10,2%. O crescimento da atividade turística teve reflexos positivos nas taxas de ocupação dos quartos, no número de dormidas, no rendimento médio por quarto disponível, na redução da sazonalidade e no emprego;

Em 2016 as receitas do turismo foram de 12,7 mil milhões de euros, representaram 16,7% do total das exportações portuguesas, ano em que se registou o valor de 55 milhões de dormidas e 19,1 milhões de hóspedes;

Os principais mercados geradores de receitas turísticas em Portugal estão na Europa. Cinco países (França, Reino Unido, Espanha, Alemanha e Países Baixos) representam 65% das receitas totais;

Portugal e Espanha são países com posição relevante no turismo a nível mundial, juntos são o primeiro destino turístico do mundo. Portugal é, segundo a Organização Mundial de Turismo, o 26.º país em receitas turísticas, ocupa a 15.ª posição como destino competitivo, venceu em 2017 o prémio de melhor destino turístico do mundo. O país vizinho ocupa a 3.ª posição em termos de receitas e nos anos de 2015 e 2016 conseguiu atingir a 1.ª posição como destino turístico mais competitivo do mundo, sucesso atribuído à oferta cultural e natural em combinação com o serviço de apoio aos turistas; 

Portugal que tem como principais portas de entrada turística, Lisboa, Porto e Faro e por isso se foca quase totalmente no litoral, não pode deixar de promover o turismo no Interior, fortalecendo novas portas de entrada a partir do país, que em termos turísticos é muito forte, trabalhando de forma mais integrada, em particular com as suas regiões fronteiriças, a interface territorial entre os dois países.

A Região Norte tem, na perspetiva da promoção turística, um grande potencial em termos de património natural e cultural, que exige uma promoção mais integrada em termos regionais, com maior benefício económico para a região no seu todo, criadas as condições o crescimento turístico em Trás-os-Montes e Alto Douro e não exclusivamente na orla litoral e cidades próximas.

 Portugal pretende com a “Estratégia Turismo 2027”, afirmar o turismo em todo o território e posicionar Portugal como um dos destinos mais competitivos e sustentáveis do mundo, valorizando num dos seus eixos a oferta turística cultural, tendo por base o conjunto de bens patrimoniais com dimensão histórica, identitária e de religiosidade. Ora, para isso, não pode deixar de estabelecer metas específicas para o Interior, contando com os seus ativos, sob pena de a linha de fratura entre o Portugal despovoado e envelhecido e a estreita faixa da orla costeira, se acentuar.

A Região Norte é de entre as Regiões NUT II do País, a que dispõe de maior número de monumentos nacionais (272) e de imóveis de interesse público (961). Dispõe de um vasto património cultural e natural onde se incluem quatro bens inscritos na Lista do Património Mundial da UNESCO (Porto, Guimarães, Douro e Vale do Côa), o Gerês/Xurês e a Meseta Ibérica, espaços que integram a Rede Mundial de Reservas da Biosfera da UNESCO, um Parque Nacional, quatro Parques Naturais e várias Paisagens Protegidas de interesse nacional e local, dezanove Sítios de Interesse Comunitário e seis zonas de proteção especial integradas na Rede Natura 2000.  Em Trás-os-Montes e Alto Douro está muita da riqueza patrimonial e ambiental que deve ser mobilizada para o desenvolvimento sustentável. 

O desenvolvimento sustentável do turismo obriga-nos a equacionar as grandes tendências mundiais: as alterações climáticas, seus efeitos sobre a vida humana e a economia; o forte crescimento e urbanização da população mundial; a limitação de recursos do planeta e a luta pela sua posse; a pobreza e a fome; as desigualdades crescentes.

Por outro sabe-se que, o forte crescimento da população mundial, o aumento de rendimento em países de economias emergentes, o impulso da globalização, a redução de preços, a maior facilidade nas fronteiras e que viajar é essencial à promoção dos negócios e à qualidade de vida, são um conjunto de fatores quer contribuem para que as perspetivas de crescimento do turismo a nível mundial sejam elevadas. No ano de 1950 o número de turistas era de 50 milhões, em 2016 foram contabilizados 1,24 mil milhões e prevê-se que no ano de 2030 atinja o valor de 1,8 mil milhões.

É no âmbito do contexto acima referido que o turismo tem que ser pensado em termos globais, num cenário de crescimento económico inteligente e inclusivo, com utilização eficiente dos recursos no sentido de minimizar impacto das atividades humanas sobre o planeta.

A sustentabilidade económica, social e ambiental é a nova tendência de pensamento para o turismo global. O turismo bem concebido e gerido deve contribuir para o crescimento económico, para a criação de emprego, para a redução das desigualdades, para a paz, através de uma maior compreensão cultural e religiosa entre os povos.

O Fórum Económico Mundial, na análise de tendências para o turismo global, acentua que as preferências dos turistas se alteram, que novos produtos e destinos turísticos competem no mercado global, que a oferta turística e os turistas estão cada dia mais alinhados com questões como, a sustentabilidade ambiental e o respeito pelos hábitos das diversas culturas e religiões.

Portugal, em particular Trás-os-Montes e Alto Douro estão bem posicionados para uma mudança de paradigma, como destino turístico sustentável e beneficiar dessa nova sensibilidade dos turistas. Necessita ter visão e orientações simples e claras para que essa mudança seja assumida, num contexto de crescimento turístico, em que se exige elevada formação das profissões do setor e adequação de competências às necessidades do mercado, em que no âmbito da política pública e dos negócios, se exige sejam conciliados os interesses dos turistas, da indústria e serviços, com o interesse das comunidades locais e do meio ambiente.

Por outro não pode conceber-se o desenvolvimento sustentável do turismo em Portugal, sem pensar no território no seu conjunto, concentrando-o a oferta e a procura de forma maciça em meia dúzia de cidades, inclusive criando problemas de equilíbrio e de perda de qualidade em determinados centros urbanos, quando se sabe que as várias regiões do País se complementam e enriquecem a oferta turística e se deseja, que todas beneficiem da conjugação entre a melhoria da oferta e o aumento da procura. 

Terras de Trás-os-Montes - Evolução da População e da economia 2000/2016 Parte I

O Nordeste Transmontano tem, no contexto do País e da Região Norte, um conjunto de especificidades identitárias, culturais, patrimoniais e de recursos económicos que exigem uma visão de desenvolvimento estratégico construída em forte cooperação entre atores do território, envolvimento dos cidadãos e suficiente conhecimento ligado às oportunidades e fragilidades territoriais. O conhecimento da evolução da população, das empresas e do emprego é importante nesse contexto, assim como na tomada de decisões políticas e administrativas. O presente trabalho visa um contributo nesse sentido.
O ritmo a que cresce a população mundial, e o impacto que representa sobre os recursos do planeta, é o principal desafio que a humanidade enfrenta. A ONU prevê que a população atual de 7,6 mil milhões de pessoas, no ano de 2050, chegue aos 9,8 mil milhões (mais de 220 vezes a população de Portugal). Essa não é a tendência na Europa, em perda em termos de peso relativo no contexto mundial, onde há regiões que registam um crescimento da população e outras se despovoam. Portugal, que representa 2% da população europeia, é um dos onze países que perde população.
Se no ano de 1900 a Europa representava 25% da população mundial, em 2016 representava apenas 7% (510,1 milhões), registando nesse ano, e pela primeira vez desde o ano de 1960, um saldo natural negativo, prevendo-se que no ano 2030 seja a região mais idosa do mundo, com a média etária de 45 anos, contra a média mundial de 33 anos e do continente africano de 21 anos.
Portugal deverá, nos próximos anos, sofrer uma redução significativa da sua população. Em cenário moderado, poderá perder nos próximos 30 anos, 1,5 milhões de habitantes, meio milhão no Interior, onde o impacto será muito mais negativo do que no Litoral. As regiões entrarão em competição entre si pela fixação de população para garantir mão-de-obra qualificada para o crescimento da economia. Neste contexto, a mobilidade da população regional e das migrações adquirem relevância, tanto na vertente pública como privada.
No Nordeste Transmontano a demografia é um problema crítico desde há anos, com saldo natural negativo, continuando muitos jovens a percorrer os caminhos da emigração, deixando para trás um território mais frágil em termos de desenvolvimento social e económico.
Na NUT III Terras de Trás-os-Montes a demografia está a evoluir negativamente, condicionando a captação de novos investimentos empresariais, que exigem disponibilidade de mão-de-obra ativa, jovem, em número suficiente, com qualificações ajustadas aos desafios de mudança e inovação da economia. Em década e meia, diminui em 17.560 pessoas, 13,83% do total. Só em cinco concelhos a população diminuiu mais de 20%, por ordem decrescente: Vinhais; Mogadouro; Alfândega da Fé; Vimioso e Vila Flor.
Bragança regista em 2016 os primeiros valores de perda populacional. A emigração de jovens qualificados tem fragilizado a região. Travar esse processo não é tarefa fácil, porque a mobilidade atual da força de trabalho entre regiões é intensa e tende a aumentar, seja pela crescente facilidade de deslocação entre países, pela diminuição de exigências nas fronteiras e redução de custos no transporte, pela atratividade de mercados de trabalho com melhores condições sociais e de remuneração. Esta tendência é contrária à fixação de jovens em territórios mais pobres e é agravada pela evolução demográfica negativa.
A região tem que fazer um esforço muito acrescido para contrariar o despovoamento, fixar jovens, em particular os empreendedores. Para tal conta com importantes ativos, como melhores acessibilidades, boas infraestruturas, população mais qualificada, elevados padrões de qualidade de vida. O seu principal desafio está do lado do crescimento da economia e da criação de postos de trabalho, que exige condições de maior atratividade e competitividade do lado das atividades económicas, ou seja, boas empresas, bem geridas, com produtividade elevada e capacidade competitiva, mão-de-obra mais qualificada, com melhores remuneração, maior incorporação de tecnologia nas atividades económicas.
Inverter o ciclo de despovoamento e de abandono dos campos, é uma prioridade política para a coesão nacional, exige medidas de política nacional de rotura com o que tem sido feito. Ao nível das políticas locais exige orientação, agora mais voltada para o apoio ao empreendedorismo local, à criação de novas empresas, à captação de talentos, de investidores nacionais e estrangeiros, para a qualificação da força laboral, atenta à mudança nas atuais profissões e à criação de novas profissões, em resultado da inovação e evolução tecnológica. 
Com o território a perder população, importa perceber o que se passa com as empresas e o pessoal ao serviço, em particular no período de crise económica e financeira. Da leitura dos dados do quadro relativo ao número de empresas, verificamos que no período entre 2008 e 2012 se regista uma redução de 10,2% do número de empresas, logo seguido de um grande aumento, no período entre 2012 e 2015, e uma quebra ligeira no ano de 2016. Estamos perante uma situação que importa esclarecer.
A transposição de diretiva da EU relativa à tributação em IVA do setor Agrícola levou a que, a partir de 1 de abril de 2012, os agricultores tivessem iniciado o registo da sua atividade nas Finanças, processo que teve expressão nos anos de 2013 a 2015, razão do elevado crescimento do número de empresas, sem correspondência direta num aumento equivalente na economia.
Esta situação pode ser lida como se o crescimento do número de empresas em cerca de 40% correspondesse a uma dinâmica empresarial muito positiva, tal não é verdade. O registo de atividade agrícola, feita de um modo geral por agricultores de idade avançada introduziu uma variação estatística positiva no número de empresas que necessita ser desgregada para se perceber a tendência nos anos recentes e nos próximos.
A situação descrita pode ser lida no mapa seguinte, com o registo das empresas na CAE agricultura, produção animal, caça, floresta e pesca.
Analisado o número de empresas, constatamos que no período de 2008 a 2012 se regista um crescimento médio anual de 1,6%, e que de 2013 para 2015, por razões de registo obrigatório dos agricultores para efeitos de tributação em IVA, se verifica um incremento no número de empresas de 558,6%, finalmente, no ano de 2016 se regista uma quebra de 2%, tendência que irá manter-se.
Feita a leitura cruzada dos dois mapas, se ao primeiro deduzirmos as empresas na CAE Agricultura, produção animal, caça, floresta e pesca, obtemos a informação do número de empresas nos setores da indústria, comércio e serviços (excluído o emprego da administração pública e setor financeiro) constatamos: de 2008 a 2012, uma perda de 12% (diminuição de 1341 empresas no conjunto dos municípios, sendo 466 do concelho de Bragança); já no período de 2012 a 2016, a perda foi de 10,7% (de 1053 empresas no conjunto dos municípios, sendo 288 do concelho de Bragança). Conclui-se que, desde o início da crise, em cerca de uma década, o território da CIM TTM perdeu 8,1% das suas empresas nos setores da indústria, comércio e serviços, número muito significativo com reflexos negativos no emprego e na economia.
Interessa-nos analisar o que ocorreu com o pessoal ao serviço do conjunto das empresas, e separadamente na indústria, comércio e serviços (excluído o emprego da administração pública e setor financeiro), para se perceber a evolução no período em análise, cruzando informação com os dados do INE relativos à taxa de população empregada. 
Analisado o quadro com o pessoal ao serviço das empresas, constatamos que, entre os anos de 2012 e 2015, ocorreu um elevado crescimento, cerca de 8500 empregos e que, no mesmo período, na CAE agricultura, produção animal, caça, floresta e pesca se verificou um crescimento de cerca de 9500 pessoas ao serviço, pela razão já acima descrita, ou seja, a evolução do emprego ao serviço das empresas nos setores da indústria, serviços e comércio foi de diminuição. É certo que o desemprego baixou, que novos empregos têm sido criados, que a formação de população ativa desempregada contribui para a diminuição da taxa de desemprego e que a emigração de jovens tem efeito idêntico. A realidade está aquém do desejável.
Analisarmos os dados dos quadros acima, comparando-os com a evolução da população na NUT III Terras de Trás-os-Montes e com a informação relativa à percentagem de população empregada, percebe-se bem a tendência de diminuição.
O ano com maior percentagem de emprego (indivíduos nos setores de atividade primário, secundário e serviços) foi o ano de 2007, com o valor de 57,20%. Entre 2000 e 2016, a população empregada (aplicação da taxa de emprego ao número total da população) baixou de 68 690 para 58 205, o equivalente a uma perda de cerca de 10 550 empregos, correspondendo a 15,3% do total. Em década e meia, a população global na NUT Terras de Trás-os-Montes diminui de 17 560 pessoas, correspondendo a 13,83% do total, situação preocupante no presente e em termos futuros. A criação de novos empregos, associados a investimentos mais significativos como o caso da empresa Faurécia, está muito aquém do que é necessário para inverter esta situação.
Analisada a evolução do emprego pelos setores de atividade económica, conforme CAE correspondente, verifica-se que de um modo geral todos os setores perdem emprego, com exceção da indústria transformadora devido ao efeito de instalação da Faurécia, e do setor da saúde que mantém o emprego. Os setores com maiores quebras são o da construção com 45%; atividade imobiliária com 33%; outras atividades e serviços com 49%; os setores do comércio por grosso e retalho e o de alojamento, restauração e similares com perda de 7%, cada. 
Analisada a produtividade – rácio entre o PIB e o emprego, a da NUT Terras de Trás-os-Montes era, no ano de 2016, de 74,4% da média nacional, ocupando a 19.ª posição no conjunto das 23 NUT III, acima da Beira e Serra da Estrela, Oeste, Tâmega e Sousa e Douro. Nos últimos anos baixou, enquanto a média da Região subiu. Passou, na última década e meia, de 89,6% para 84,4% da média da Região Norte. Considerando que a produtividade em Portugal no contexto da EU é baixa, de 68,9 pontos, pouco mais de metade da registada na França ou Alemanha, cerca de 1/3 da registada na Irlanda, significa que é grande o esforço de mudança exigível aos concelhos desta NUT, sendo obrigatório fazer esse caminho.
Analisado o crescimento económico, pela taxa de variação do PIB, no contexto regional, tendo por base dados do boletim Norte Estrutura, edição de Inverno 2017/2018, constata-se que na Região Norte, no período entre 2003 e 2008, o PIB cresceu à taxa média anual de cerca de 1,5%, ligeiramente superior à média nacional (cerca de 1,4%) e inferior à da UE28 (cerca de 2,3%); já no período de 2008 a 2013, coincidente com a recessão económica e ajustamento financeiro, o PIB da Região Norte diminuiu a uma taxa média anual de -1,2%, enquanto a diminuição na EU28 foi de -0,2%; finalmente, no período de 2013 a 2016, o PIB da Região Norte cresceu à taxa média de 2,0%, igualando o ritmo de crescimento da UE28.
Na NUT III Terras de Trás-os-Montes verifica-se que, no período de 2003 a 2008, a taxa média de crescimento económico foi de 2,59%, valor superior à média regional, e o segundo melhor valor da Região Norte. Já no período de 2008 a 2013, Trás-os-Montes a par da Área Metropolitana do Porto registou a maior quebra, -1,8%, valor muito influenciado pela quebra de -10% no ano de 2012 (valor em parte explicável pela quebra de produção de cerca de 70 milhões de euros por parte da Faurécia), e que no período de 2013 a 2016 teve um crescimento médio anual positivo, de 1,94%, ligeiramente inferior à média da Região Norte.
No período entre 2003 e 2016, o crescimento médio anual do PIB na NUT III Terras de Trás-os-Montes foi de 0,75%, valor acima da média da Região Norte (cerca de 0,60%) e inferior ao das NUT III Cávado (com 1,18%); Ave (1,09%); Douro (0,96%); Tâmega e Sousa (0,93%) e Alto Minho (0,80%).
Trás-os-Montes foi, no ano de 2016, responsável por 1573 milhões de euros de riqueza criada na Região Norte, ou seja 2,90% de 54462 milhões, valor a preços correntes ligeiramente acima do atingido no ano de 2010 (1562 milhões). Em termos de PIB per capita relativo à média nacional, estava no ano de 2000 a 63,6 %, atingindo no ano de 2011 o valor de 79%, ou seja, no período de onze convergiu 15,4 pontos, à média anual de 1,4 pontos. Já no ano de 2016, o valor atingido foi de 79,7%, ou seja, nos cinco anos seguintes, a convergência foi de 0,7 pontos percentuais, o equivalente a uma média anual de 0,18 pontos.
No período de 2000 a 2011 teve um crescimento continuado que lhe permitiu convergir de forma significativa, ficando no ano de 2011 a 2,3 pontos percentuais abaixo da média regional, a segunda melhor posição na Região, abaixo da Área Metropolitana do Porto. Nos cinco anos seguintes, de 2011 a 2106, o crescimento foi muito baixo, o que lhe fez perder posição relativa na região, passando no ano de 2016 para a quarta posição, 6 pontos percentuais abaixo da média regional, tendo sido ultrapassada pelas NUT III do Ave e do Cávado. 
Numa leitura breve, dos dados do PIB per capita das regiões NUT III do país, constatamos que o PIB per capita da Região Norte entre o ano de 2004, (ano de alargamento da EU de 15 para 25 Estados-membros) evoluiu de 63,1 pontos da média da UE, para 65,3 da UE28 no ano de 2016, mantendo-se como a região mais pobre de Portugal a 84,5% da média nacional. Por outro lado, constata-se que no ranking nacional do conjunto das 25 NUT III, sete das oito NUT III da Região Norte incluem-se no grupo das dez de mais baixo rendimento per capita do país.
A Região Norte está 55,3 pontos percentuais abaixo da Área Metropolitana de Lisboa, diferença inaceitável. A Área Metropolitana do Porto foi até 2013 a única acima da média da Região Norte, e no ano de 2016 estava 33,7 pontos percentuais acima da NUT III Tâmega e Sousa.
Entre 2003 e 2016, regista-se uma ligeira convergência intrarregional, resultado de três fatores: o crescimento mais acentuado de riqueza nos territórios menos desenvolvidos, a redução acentuada de população em algumas das NUT III, sendo exceção o Cávado que registou crescimento populacional, e o menor crescimento da economia na Área Metropolitana do Porto. Parte do crescimento das regiões mais pobres é feito pelo efeito de perda de população, sendo o caso da NUT III Terras de Trás-os-Montes, em que no ano de 2015 esse contributo foi 53% e o da riqueza criada de 47%, enquanto na CIM Alto Tâmega a convergência é explicada exclusivamente pela redução de população.
É positivo e muito relevante o crescimento das exportações nos concelhos da NUT III Terras de Trás-os-Montes, o que nos interessa analisar, no sentido de perceber se as empresas estão a acompanhar o crescimento significativo que se regista no país, em resposta à crise económica e financeira, sendo o Norte responsável por 49% das exportações nacionais.
Analisada a evolução das exportações dos concelhos desta NUT, sem Bragança, no período entre 2005 e 2016 verifica-se um crescimento de 12,5 milhões de euros para 34,3 milhões, crescimento em termos percentuais superior à média da Região Norte, sinal positivo de reação de empresários locais empreendedores que acompanharam os desafios da Região e do País, evolução que é distinta entre concelhos. Crescem significativamente os concelhos de Alfandega da Fé, Macedo de Cavaleiros, Miranda do Douro, Mirandela e Vila Flor; reduzem os concelhos de Mogadouro, Vimioso e Vinhais.
Bragança, hoje um dos principais concelhos exportadores da Região Norte, exige uma análise própria, no sentido de ponderar o efeito Faurécia, empresa que se instalou em Bragança no ano de 2001 e que hoje é a segunda maior empresa exportadora do Norte. No ano de 2005, as empresas do concelho, deduzido o valor exportado pela Faurécia, exportaram 19,4 milhões de euros, enquanto no ano de 2016 exportaram 28,6 milhões, o que representa um crescimento de cerca de metade da média da Região Norte e significativamente inferior à média do conjunto dos concelhos de Terras de Trás-os-Montes (sem efeito Faurécia), o que exige particular atenção a algumas áreas de atividade económica que necessitam melhores condições de apoio institucional assim como diversificação.
No ano de 2016 as exportações dos nove concelhos, deduzido o valor exportado pela Faurécia, foram de cerca de 63 milhões de euros o que representa cerca de 10% do total das exportações (634 milhões de euros).
Na análise à última década e meia concluiu-se:
No conjunto dos municípios de Terras de Trás-os-Montes, a população diminuiu em 17 560 pessoas, valor superior ao conjunto da população dos concelhos de Alfândega da Fé, Vimioso e Vila Flor, e que Bragança regista no ano de 2016 a primeira redução de população;
A evolução do número de empresas no conjunto dos concelhos é de diminuição em 2394 empresas, correspondendo a 8,1% do total;
Que o emprego ao serviço das empresas, considerando todos os setores de atividade, diminuiu 10 550 empregos, sendo os setores de atividade económica mais atingidos: a construção em 45%; atividade imobiliária com 33%; outras atividades e serviços com 49%; os setores do comércio por grosso e retalho e o de alojamento, restauração e similares com perda de 7%, cada. Com exceção da indústria transformadora que cresceu, e do setor da saúde que mantém o emprego;
Ao nível da produtividade, Terras de Trás-os-Montes regista uma tendência de divergência face à média regional, que está a crescer, ocupando a 19.ª posição no conjunto das 23 NUT III do País. Por outro lado, sabendo-se que a média nacional é de cerca de metade de países como França e Alemanha, significa que temos muito para mudar se pretendemos ter uma economia competitiva no contexto regional europeu;
Em termos de PIB per capita, no período de 2000 a 2011, Terras de Trás-os-Montes convergiu 15,4 pontos percentuais com a Região Norte, o que lhe permitiu atingir, no ano de 2011, a segunda melhor posição atrás da Área Metropolitana do Porto, 2,3 pontos percentuais abaixo da média regional. Nos cinco anos seguintes o crescimento foi residual, e em termos comparativos passou a ocupar a quarta posição, 6 pontos percentuais abaixo da média regional, tendo sido ultrapassada pelas NUT III do Cávado e do Ave que passou a estar acima da média regional juntando-se à Área Metropolitana do Porto. Em regiões do Interior, em forte declínio demográfico, como é o caso de Terras de Trás-os-Montes, o crescimento do PIB per capita é feito maioritariamente à custa da redução da população, o que agrava a tendência recente;
Ao nível das exportações, o conjunto dos municípios de Terras de Trás-os-Montes (deduzido o efeito Faurécia, a segunda maior empresa exportadora da Região Norte), reagiram globalmente de forma muito positiva, resultado de atitude mais empreendedora e inovadora de alguns empresários. Apesar desse registo, nem todos evoluem da mesma forma, ocorrem mesmo algumas quebras significativas. Bragança, após a instalação da Faurécia no ano de 2001, considerada hoje a segunda empresa exportadora da Região, representando 90% das exportações do conjunto dos municípios de Terras de Trás-os-Montes, surge como um dos concelhos mais exportadores na Região Norte.
O conjunto dos municípios da NUT III Terras de Trás-os-Montes representava no ano de 2016, no contexto da Região Norte, 20,54% do território; 3,05% da população; 2,9% da riqueza criada e 3,3% do emprego. 
Os cidadãos dispõem de condições para uma elevada qualidade de vida, de boas acessibilidades, de maior proximidade aos principais mercados das exportações portuguesas, com destaque para Espanha, de instituições de conhecimento e de inovação mais qualificadas, maior formação dos jovens. A NUT III Terras de Trás-os-Montes deve construir uma agenda estratégica de desenvolvimento robusta, que lhe permita ganhar peso relativo em termos regionais, ao nível da criação de riqueza e de emprego, a sua principal prioridade, em todos os setores de atividade, não descurando a agricultura e florestas, e com essa agenda retomar a rota de convergência com a Região Norte, colocando como objetivo superar a média regional da qual já esteve muito próximo. 

Abril de 2018

[colaboração Dr. Vasco Leite, CCDR-N]

Interioridade: roturas políticas contra o despovoamento do Interior e as assimetrias regionais

Na década de cinquenta, o conceito de Interior referia-se ao país rural atrasado, em contraste com o país moderno das cidades do litoral. Com a construção de novas estradas para o Interior, há quem o defina como espaço geográfico subdesenvolvido, outros referem tratar-se de uma questão cultural, outros ainda referem que, com o avanço das tecnologias de informação e comunicação, o êxodo da população rural para as grandes cidades seria travado, e por isso, o problema não existe. A realidade é que a alternativa à cidade tem sido a de fazer melhor cidade, que atrai mais fluxos populacionais das áreas rurais para as cidades. 
Os problemas da interioridade vêm de há décadas. São lembrados regularmente, com destaque para as campanhas eleitorais, logo esquecidos. Ganharam relevo na imprensa e no debate público após a tragédia dos incêndios. Destaco dois momentos de debate da Interioridade por parte dos transmontanos: um primeiro foi a realização do III Congresso Transmontano, em Setembro de 2002, a maior reunião de Transmontano Durienses no pós 25 de abril, que teve como resultado mais visível, o desencravamento das acessibilidades ao território (A4, o IP2 e o IC5), a 1.ª das reivindicações do Congresso, concretizada numa década e pouco, o que acrescentou muito às perspetivas de futuro da região. 
Um segundo momento foi a realização nos anos de 2008, 2009 e 2010 dos Cursos de Direito e Interioridade, promovidos pela Faculdade de Direito de Lisboa, sendo Diretor o Professor Doutor Vera Cruz Pinto, com o apoio da Câmara Municipal de Bragança, no qual participaram centenas de cidadãos e destacados professores, como Vera Cruz Pinto, Adriano Moreira, Costa Andrade, Marcelo Rebelo de Sousa, Romano Martinez, Menezes Cordeiro, Eduardo Paz Ferreira, Duarte Nogueira, trazendo o tema para o debate público. Cursos de que resultou uma publicação editada pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.   
É certo que a questão do Litoral e do Interior não se coloca hoje como há meio século, o país mudou no seu todo para melhor, temos uma boa rede de estradas (ainda que falte resolver algumas ligações), boas redes de comunicação e informação, um bom sistema de saúde e de ensino, melhoraram muito as infraestruturas ambientais no país, a qualidade urbana das cidades, vilas e aldeias. Estão em falta, entre outras medidas, os incentivos ao investimento dirigidos às empresas e à fixação de pessoas. Há de facto problemas resolvidos, outros que não o foram, outros que se agravaram de forma muito preocupante, sendo necessário refletir sobre todos. 
Nas décadas mais recentes, assistimos a uma espécie de despovoamento programado do Interior, tendo como resultado a concentração, no Litoral de 70% da população, de quatro quintos da economia, de 85% dos alunos do ensino superior, de 93% das dormidas turísticas, dos centros de poder político e administrativo e do conhecimento. Aí se concentram às sedes do bancos e das seguradoras, dos partidos políticos, o poder do Estado, as sedes patronais e sindicais, as sedes das principais empresas, tudo o que era possível. 
Paralelamente, têm sido reduzidos ou extintos serviços públicos no interior: transportes, escolas, serviços de saúde, tribunais, serviços do ministério da agricultura, das florestas, do ambiente e outros. Exercício de racionalidade errada, que omite o valor histórico, cultural e identitário dos territórios, a relação do homem com a terra e a preservação de bens naturais e patrimoniais, reduzindo a condição de vida de algumas populações ao limiar mínimo de sobrevivência. Não considera os efeitos negativos do despovoamento, situação que irá agravar-se perante as projeções demográficas para o país.
É preciso devolver a esperança ao Interior, restabelecer a equidade e a justiça social, repensar o ordenamento do território, reequilibrar o sistema urbano, assumir que o Interior é parte ativa nas políticas de coesão, da competitividade e do crescimento global da economia do país. É possível olhar em frente, encarar o futuro e inverter a realidade, com políticas para o Interior concebidas, numa perspetiva de mudança de paradigma de desenvolvimento, apostando na inovação, na economia verde e do conhecimento.
Encarar o futuro significa fazer agora, de forma diferente, o que não tem sido feito ou tem sido feito, mas de forma insuficiente, podendo significar encarar os problemas da interioridade não com um elevado número de decisões políticas, mas sim com um número restrito que rompa com o ciclo vicioso que tem condenado o interior ao despovoamento, à desertificação do território, ao empobrecimento relativo e à saída de serviços públicos. Proponho nesta reflexão um conjunto de sete orientações: Estatuto Jurídico de Interioridade; Política de incentivos fiscais à Interioridade; Agricultura e Florestas; Ensino Superior, Sistema de Inovação e de Interface Tecnológico; Descentralizar competências para os municípios, desconcentrar serviços da Administração Central para o Interior; Fundos da União Europeia como instrumento de combate às assimetrias regionais; Cooperação transfronteiriça e conectividade dos territórios.
 
1 - Estatuto Jurídico de Interioridade
 
É urgente romper com o ciclo vicioso que, aceleradamente, enfraquece a demografia no interior de Portugal, ficando muitas aldeias e vilas próximas de uma situação de despovoamento irreversível, que inviabiliza explorações agrícolas familiares levando ao abandono dos campos, que obriga os jovens mais qualificados a emigrar, que desinveste com a ideia de que não se justifica investir em territórios onde ninguém quer viver, concentrando investimento no Litoral, onde se ganham eleições e se elegem deputados. Romper com esse ciclo exige visão de futuro, que se olhe para o Interior não como as traseiras do Litoral, mas sim como o território da fronteira mais antiga e estável da Europa, o interface com o nosso principal parceiro económico. 
Este ciclo errado de pensamento fracturou o país na vertical, 2/3 do território para o interior e 1/3 para o litoral. Fractura que tem vindo a progredir em direção à Costa Atlântica. Progressão que tem sido atenuada e, em parte controlada, devido a duas medidas políticas importantes, a regionalização do ensino superior, decisão do início da década de setenta, e a aposta mais recente de reforço de uma rede urbana de cidades de média dimensão no Interior, tendo em vista ancorar territórios contíguos, fixar novas competências. 
Estas e outras políticas não chegaram para conter os efeitos devastadores da emigração para as cidades, do desinvestimento e encerramento de serviços públicos no Interior.
Hoje os cidadãos, no plano dos princípios, querem e exigem que o país se desenvolva como um todo, que a situação de despovoamento e abandono do interior seja resolvida, que novas ponderações na decisão política sejam tidas em conta, naturalmente os recursos naturais e patrimoniais, também tudo o que tem a ver com o exercício de soberania no território, impondo-se: 
Olhar para o Interior com outros olhos e políticas, assumir e decidir a Interioridade como estatuto jurídico, obrigando a que cada decisão relevante com impacto político e administrativo no território, nomeadamente normas legais, se conformem com avaliação prévia sob o ponto de vista do seu impacto positivo para a coesão territorial e impedir que decisões setoriais anulem orientações que visem o combate às assimetrias regionais. 
 
2 - Política de incentivos fiscais à Interioridade
 
Poderá tratar-se de uma das mais eficientes medidas para a fixação de atividades económicas, de emprego e de população jovem no interior, decisiva para a tentativa de inversão do forte declínio demográfico que devasta o interior de Portugal. O governo do país tem, na área da fiscalidade, que assumir decisões a sério, que captem a atenção e o interesse dos investidores. Não adotar medidas a fazer de conta, como já aconteceu no passado recente. 
O governo deverá colocar nas suas prioridades a captação de investimento externo para o interior, incentivar o investimento interno, ambas as medidas apoiadas num pacote de incentivos fiscais à interioridade, envolvendo impostos nacionais e locais, suficientemente diferenciador que permita às empresas e quadros qualificados fazer uma opção de fixação no interior.
Incentivos do tipo: redução de 30% no IRC para as empresas com sede e atividade principal no Interior; de 60% para as novas empresas, podendo 30% da redução obtida estar associada à contratualização de objetivos associados à promoção da economia verde e do conhecimento e à criação de postos de trabalho altamente qualificado; não aplicação de derrama; redução de 30% no IRS dos trabalhadores residentes, medidas a manter por NUT III, até que o rendimento médio nessa NUT atingisse um determinado valor do PIB pc da média nacional.
 
3 - Agricultura e Florestas
 
Nas últimas décadas incentivou-se o abandono dos campos, a economia e atividades rurais foram desvalorizadas em termos económicos e sociais, em particular a agricultura familiar, considerada como residual e economicamente inviável. As políticas públicas concentraram apoios ao investimento e à produção nas grandes explorações agrícolas, que representam 3% do total das explorações, enquanto as familiares representam 97%, concentrando-se nas Beiras, Minho e Trás-os-Montes - os territórios parentes pobres da política agrícola, onde o despovoamento e o envelhecimento da população são mais intensos. 
Essa orientação política não tem dado suficiente valor à preservação e valorização dos ecossistemas naturais, ambientais e patrimoniais, que a atividade rural assegura como função social de que todos beneficiamos: a qualidade da água, do ar, a qualidade da paisagem, as energias renováveis, e outros bens patrimoniais, legado de gerações, que representam parte importante da identidade e cultura do povo português, função social pela qual os agricultores não são compensados.  
Fomentar a fixação de pessoas jovens no mundo rural exige, para além da qualidade de vida, que as pessoas possam dispor de rendimentos compatíveis, que lhes permitam aceder a bens e serviços de proximidade, com qualidade e equidade. Exige serem ouvidas e que a sua opinião seja tida em conta nas decisões de ordenamento do território, de planeamento, do debate e medidas contra as alterações climáticas, em síntese, sobre aquilo que lhes diz respeito.  
É preciso apostar nas explorações familiares viáveis, agrícolas, de pastorícia, florestais, aproveitar os recursos naturais, com projetos bem estruturados e sustentáveis, apoiados no conhecimento, no saber fazer, na inovação, nas tecnologias, considerando as prioridades nacionais e o potencial de recursos a nível regional e local. Planear e investir para o médio e longo prazo, sempre na perspectiva do que pode ser legado às próximas gerações, fazendo reformas necessárias de reorganização da dimensão da propriedade, infraestruturas adequadas, seja de armazenamento de água, de transformação dos produtos, de estruturas associativas e cooperativas, ligadas à produção e ao comércio dos produtos. 
Dar prioridade ao investimento sustentável na modernização e viabilização das explorações familiares, mobilizar apoios comunitários para esse objetivo, aplicados regionalmente de acordo com as prioridades, correspondentes ao cruzamento das potencialidades naturais e opções de política regional e sub-regional. 
A política nacional de reflorestação deve ser feita com perspetiva de futuro, apostando na utilização diversificada de espécies como o carvalho, o sobreiro, o castanheiro e outras, compatíveis com os bons princípios de ordenamento do território eficazes, controladas ao nível dos planos diretores municipais;
Projetos específicos de reflorestação com espécies de crescimento lento devem ser apoiados por programas de compensação financeira aos produtores, por perda de rendimento, pelo número de anos necessários, assegurando o desenvolvimento da floresta numa perspetiva ambiental e económica sustentáveis, legado às próximas gerações como ativo que lhes permita prosseguir a atividade florestal de forma autónoma; 
O emparcelamento nas zonas de minifúndio é essencial para assegurar a instalação de explorações agrícola e florestais viáveis. Dar prioridade ao uso do solo em detrimento do abandono, promovendo a mobilização produtiva das terras abandonadas;
A política agrícola e florestal deve ser apoiada por um programa de investimento público de médio a longo prazo, dirigido ao investimento nos projetos e infraestruturas, mobilizando um envelope prioritário de fundos da União Europeia, fazendo uma aposta como se fez para a resolução de outros desafios, como a construção da rede de autoestradas. 
 
4 - Ensino Superior, Sistema de Inovação e de Interface Tecnológico 
 
As instituições de Ensino Superior sedeadas em cidades do interior trouxeram a essas localidades novas dinâmicas sociais e económicas, melhores oportunidades de formação técnica e científica aos jovens dessas regiões, novas perspetivas à economia local e à fixação de jovens empreendedores. Trouxeram novos empregos diretos e indiretos, a entrada de fluxos financeiros adicionais na economia local. 
Aumentou a oferta cultural, as instituições melhoraram as suas competências, a economia cresceu e fixou novos investimentos. As cidades do interior ganharam atratividade e competitividade, estão melhor preparadas para atrair investimento, fixar população, difundir oportunidades para os territórios envolventes mais frágeis. 
As instituições de ensino superior não são apenas estabelecimentos de ensino, desempenham um papel importante na coesão e desenvolvimento regional. Estas instituições e os centros de investigação associados devem ter bem presente na sua missão o exigente contributo para o desenvolvimento social e económico das regiões onde se encontram, tarefas exigentes que as tendências demográficas tornam ainda mais complexas. 
A política de ensino superior deve ter um papel ativo no combate às assimetrias e ao despovoamento, apostar na qualidade e no crescimento das instituições de ensino superior do interior, nomeadamente no crescimento do número de alunos e no desenvolvimento de competências. O Estado não pode deixar o sistema funcionar por si próprio, sob pena de os desequilíbrios se agravarem. 
Dar um novo impulso na regionalização do ensino superior apoiando: 
I – O aumento do número de alunos nas instituições de ensino do interior, objetivos globais de qualidade e de empregabilidade e de ligação às empresas; 
II – Apoiar o desenvolvimento de centros de investigação, de inovação e de interface tecnológico, decisivos para a competitividade e a coesão territorial;
III – Criar condições de evolução do ensino Politécnico para a categoria de Universidades de Ciências Aplicadas, colocando-as ao lado das suas congéneres europeias.
 
5 - Descentralizar competências para os municípios, desconcentrar serviços da Administração Central para o Interior
 
Os cidadãos têm boas razões para confiar no Poder Local. Os municípios são responsáveis pela maior fatia do investimento público; a dívida pública dos municípios é de 1,7% (4 075 milhões de euros) da dívida pública do país (240 958 milhões de euros); o peso da despesa dos municípios é de 11,85% da despesa pública nacional, menos de metade da média dos países da União Europeia que é de 26,6%, sendo desejável uma aproximação à média europeia. Com saldo financeiro positivo contribuem para o equilíbrio das contas públicas.
O municipalismo tem sido, ao longo da história do país, o cimento da coesão territorial, as suas instituições asseguram o 1.º nível de proximidade aos cidadãos, dando resposta aos seus problemas. Ao fazê-lo, atuam na primeira linha do combate às assimetrias territoriais e às desigualdades sociais. 
As autarquias podem executar de forma mais eficaz, com redução do custo, maior garantia de qualidade e satisfação dos cidadãos, várias políticas públicas de proximidade, atualmente sob responsabilidade da administração central. Devem poder fazê-lo com caracter universal, tendo por base o princípio da subsidiariedade e da autonomia local, por referência uma matriz clarificadora: das competências, do custo de execução, dos recursos associados, financeiros, patrimoniais, humanos e outros. Também a avaliação do impacto nas estruturas organizacionais das autarquias, na sustentabilidade financeira, e capacidade de investimento, deve ter em conta as diferentes realidades no território. A nova lei de finanças locais que irá acompanhar o processo de descentralização tem que ajudar à coesão territorial e à redução das assimetrias regionais.  
O processo ganharia coerência administrativa e financeira, seria clarificador, se fosse acompanhado da Lei-Quadro de instituição das regiões administrativas, dotadas de autonomia administrativa e financeira e de órgãos próprios eleitos pelas populações. Um exercício global de reorganização do Estado, concentrado no nível local e regional, daria consistência e futuro à reforma de modernização da administração pública, tornando-a mais eficiente nas políticas e na utilização dos recursos públicos, estruturando de forma mais compreensível os patamares de decisão, criando um ambiente mais favorável ao crescimento da economia, à criação de emprego, libertando mais recursos para políticas sociais.
Impõe-se: Descentrali­zar novas competências para os municípios, com meios financeiros compatíveis, proceder à instalação nas cidades capitais de distrito do interior, de serviços públicos de âmbito nacional, desconcentrando o excesso de emprego público existente na capital. Ambas as medidas podem contribuir para travar o centralismo excessivo de Lisboa. 
 
6 - Fundos da União Europeia como instrumento de combate às assimetrias regionais
 
Portugal depende em 85% dos fundos da União Europeia para executar investimento. É o país mais dependente no conjunto dos 28 estados membros, daí a importância do próximo Quadro Financeiro Plurianual como um dos instrumentos de apoio ao investimento na resolução dos problemas da interioridade. A quantidade de fundos a que as regiões NUT III do interior devem poder aceder, as políticas a financiar, o modelo de governação dos fundos, devem ser decididas de modo a assegurar uma mudança no sentido de corrigir assimetrias e garantir maior coesão territorial. 
Alterar a arquitetura dos fundos de coesão, a forma como são aplicados, assegurar a negociação prévia de dotações indicativas globais de fundos para o interior, e uma política diferenciada de apoio ao crescimento económico, visando as empresas, a criação de emprego, a fixação de empresas e pessoas no interior, são questões relevantes do debate.
Dados do Eurostat indicam que em Portugal o apoio público às empresas tem diminuído, é de 0,56% do PIB, muito abaixo da média (1,28%) de um conjunto de 63 países analisados, o que significa, face à escassez de recursos nacionais, que a competição pelos apoios para a economia será muito intensa.  
As políticas de coesão e de competitividade devem dar particular atenção às regiões menos desenvolvidas, apoiar a inovação e a produtividade, encarar as especificidades regionais e locais como elas são, confiar nas autoridades regionais e locais, para enfrentar desafios, fazer opções, assumir a sua resolução e resultados, responder perante os cidadãos e autoridades financiadoras, pelas escolhas feitas e resultados de mudança face ao ponto de partida. 
A territorialização das políticas públicas deve ser uma prioridade, apoiada num Plano de Desenvolvimento Regional, contemplando políticas de carácter transversal e sub-regional, envolvendo as necessidades da região nas distintas realidades do território, a mobilização de pessoas e intuições, de capacidades locais de inovação, envolver o escrutínio público, aberto e informado. Decidir as prioridades de desenvolvimento, no âmbito de estratégias integradas de médio/longo prazo, focadas no contexto local e alinhadas com orientações de política europeia e nacional, identificar os resultados a atingir no quadro comparativo da região, sempre focados num duplo objetivo, o da convergência com a União Europeia e da coesão e competitividade regional.
Deverá aceitar-se que o investimento nas regiões NUT III seja adequado às necessidades específicas, evitando a uniformização de políticas. Em determinado território o investimento é mais necessário na agricultura, florestas, armazenamento de água e regadios, setor cooperativo e organização da comercialização, noutros a prioridade será a mobilidade, a qualidade do ar, a regeneração e a reabilitação urbana, a proteção da orla costeira, a capacidade de acolhimento empresarial e captação de investimento externo. 
Cada território deverá poder elaborar a sua carteira de projetos prioritários, investir no que é verdadeiramente relevante para o desenvolvimento, fazendo-o com pensamento estratégico, com foco nos resultados concretos para as pessoas e o seu bem-estar, preocupados com a qualidade e oportunidade do que se investe e assegurar que os projetos respeitam uma estratégia partilhada.
A utilização dos fundos de coesão através de vários programas não ajuda à execução de políticas territoriais integradas de desenvolvimento. Desejável seria que os cinco fundos da política de coesão integrassem um único fundo, operacionalizado através dos programas regionais das regiões de convergência (sem programas temáticos), assegurando uma maior eficácia da estratégia política europeia, uma redução da estrutura burocrática e de gestão aos beneficiários, lidar de forma mais simples e eficaz com os fundos, aproximando os recursos ao contexto regional e local. 
Qualquer que venha a ser a metodologia e o modelo de aplicação dos fundos da política de coesão, seria importante para as regiões NUT III menos desenvolvidas assegurar: 
I – Que cada NUT III possa dispor à partida de um envelope financeiro indicativo, negociado ao nível da Região, compatível com a concretização dos objetivos relevantes e metas estabelecidas.
II – Um sistema diferenciado nas taxas de apoio às empresas com atividade no interior, existentes, a criar ou a captar, nos seguintes moldes: 
O incentivo não reembolsável, reconhecido o mérito ao projeto, deverá ser obtido se alcançados os objetivos de projeto (não se superados como hoje é exigido). Por outro lado, fixar dois níveis de apoio, um dirigido à inovação e competitividade do território, outro mais simples, transversal à economia, a puxar pelo micro empreendedorismo, pelas pequenas empresas e pelo potencial de recursos da economia local. 
1.º Nível - inovação e competitividade – majorar o incentivo às empresas em 25 a 30 pontos percentuais acima do sistema geral, concorrendo em regime aberto, alinhado com as prioridades estratégicas para a especialização inteligente;
2.º Nível – regime mais simplificado de apoio ao micro empreendedorismo e às pequenas empresas – majorar o incentivo em 25 a 30 pontos percentuais, relativamente ao sistema geral, em concursos fechados dirigidos a territórios específicos, a projetos alinhados, pelo menos, com a Estratégia de cada uma das NUT III, contemplando um envelope financeiro especifico da ordem dos 20% da dotação que vier a ser atribuída ao sistema de incentivos.
 
7 - Cooperação transfronteiriça e conectividade dos territórios
 
A fronteira luso-espanhola, com 1234 Km de extensão, é a mais antiga e extensa da União Europeia, unindo, ou separando, conforme a perspetiva, duas faixas territoriais constituídas por 17 regiões NUT III que representam 23,5% do território ibérico e 10% da população dos dois estados. As 10 NUT III fronteiriças de Portugal, com a área de 50200 Km2, representam cerca de 55% do território do continente e 20% da população.
Trata-se de um amplo corredor, não homogéneo, em termos populacionais e económicos, constituído por grandes espaços rurais de muito baixa densidade populacional, em declínio demográfico acelerado e em situação de empobrecimento crescente e territórios urbanos com cidades dotadas de dinâmicas sociais e económicas positivas. Trata-se de um largo corredor central ibérico, de elevada qualidade ambiental, elevada biodiversidade que acolhe uma variada gama de ecossistemas naturais, sendo mais de metade do perímetro fronteiriço raia húmida. Quer a parte de raia húmida, quer a seca, devem ser vistos como o território de interface entre os dois estados, o corredor que os liga e não a parte esquecida que os fragiliza. 
A política de cooperação fronteiriça tem que ser adotada de forma efetiva pelos dois estados ao nível mais elevado, atuando em áreas temáticas específicas, as cimeiras ibéricas têm que dar impulso prioritário à construção das ligações fronteiriças em falta, abertura à evolução de políticas de cooperação como: a partilha de redes de serviços públicos; a gestão partilhada de ecossistemas naturais; a gestão conjunta de bacias hidrográficas; a valorização conjunta de redes de património natural e cultural, em especial na perspetiva de atração de fluxos turísticos para os territórios fronteiriços; o incremento de transportes públicos nas áreas fronteiriças que não dispõem desse serviço; na área da proteção civil e segurança; nas redes do conhecimento científico e tecnológico.  
 
Compromisso Político
 
Os problemas da interioridade vêm de longe, já desde D. Manuel I, com a reforma das cartas dos forais, continuado pelos sucessores, para assegurar contingentes para a expansão marítima, a posse e gestão dos impérios, da Índia, Brasil e África. Pelas migrações para o Brasil na primeira metade do século XIX, pela crise na agricultura na segunda república, que acelerou após a segunda Grande Guerra, nos anos 60 e 70, pela migração para o litoral, pela emigração para a Europa, na maioria a salto, pela mobilização de jovens para as guerras em África. Período em que se iniciou um ciclo intenso de despovoamento que hoje atinge proporções há poucos anos não imagináveis. 
Portugal, com um PIB de 77,6% no contexto da média dos países da EU, é um país de grandes desigualdades internas. Em termos de PIB pc, só a Região de Lisboa está acima da média da EU, sendo desde o ano de 2010 a única acima da média nacional, cerca de 40 pontos percentuais acima da Região Norte (64.5% da média da EU). Na Região Norte, só a Área Metropolitana do Porto tem um PIB pc acima da média da região, estando 40 pontos percentuais acima da NUT III mais pobre desta região. 
De 2000 a 2015, em Portugal a convergência com a média da EU foi negativa (-0,7%), e a convergência inter-regional foi baixa. Nesse período, cerca de metade das regiões NUT III do interior teve crescimento negativo, a outra metade cresceu ligeiramente. Esta ligeira convergência ocorreu, em parte, por alguma diminuição do PIB pc na AMP, manutenção do PIB pc na AML, com crescimento de população, e pelo crescimento real da economia em algumas das regiões do interior, sendo que em algumas das NUT III a diminuição da população corresponde, por razões negativas, ao principal fator de crescimento do PIB pc. 
Confrontados com fortes assimetrias regionais, com um processo de intenso despovoamento do interior, com perspetivas demográficas pouco animadoras e com dificuldades de convergência com a média dos países da União Europeia, algo de diferente tem que ser feito para mudar e isso requer compromisso político, com medidas capazes de contrariar a fratura criada entre o Litoral e o Interior e que progressivamente nos aproxima de um centralismo mais forte, cada vez mais Lisboa e o resto do país.

Descentralizar para os municípios, melhorar a administração pública

O XXIII Congresso da Associação Nacional de Municípios Portugueses realizou-se no dia 9 de dezembro de 2017, sob o lema “Descentralizar Portugal”, desenvolvendo as orientações do anterior Congresso, realizado no ano de 2015, que reafirmou a importância de aprofundar o processo de descentralização de competências, que deveria assumir caracter universal, ter por base o princípio da subsidiariedade e da autonomia local. Assumiu que as negociações deveriam ser apoiado numa matriz clarificadora das competências a transferir, do custo de execução e que tivessem em conta as diferentes realidades no território.
Várias políticas públicas atualmente sob responsabilidade da administração central podem ser executadas de forma mais eficaz pelas autarquias, com redução do custo associado, com maior prontidão e qualidade. Seguindo o princípio da subsidiariedade, o Estado central deve transferir para as autarquias locais todas as tarefas que possam ser asseguradas com maior proximidade e eficácia. No quadro da autonomia local não pode a transferência de tarefas deixar de ser acompanhada dos recursos financeiros, patrimoniais, humanos e outros, no mínimo idênticos aos utilizados pela administração central para o exercício de tarefas idênticas, por forma a assegurar uma melhoria de qualidade do serviço aos cidadãos, fazendo-o de preferência a custo mais baixo.
É essencial conhecer a realidade atual associada à execução das competências a transferir, a forma como são exercidas pela administração central, os meios envolvidos, os resultados obtidos e as melhorias a alcançar. Avaliar o seu impacto na reorganização das estruturas organizacionais das autarquias é um exercício de boa política, fator de êxito na aplicação das novas competências, garantia de qualidade e satisfação dos cidadãos.
A proposta de Lei-Quadro de transferências de novas competências para as autarquias, inclui áreas como a da educação, em que novas competências serão transferidas, ao nível da rede educativa e do planeamento, do investimento, apoios e complementos educativos, gestão de pessoal não docente, conservação, manutenção e funcionamento dos edifícios escolares. Amplia competências já exercidas no domínio dos transportes, propõe transferir um conjunto alargado de competências na área social, da saúde, novas competências na cultura, na gestão do património imobiliário público sem utilização, na habitação, nas áreas portuárias e praias, estradas, proteção e saúde alimentar e segurança alimentar e áreas protegidas.
Pretende atribuir competências às entidades intermunicipais, essencialmente ao nível do planeamento, da articulação institucional, da participação em projetos, competências dependentes de prévio acordo dos municípios integrantes da entidade intermunicipal. Estas estruturas são recentes, ainda pouco consolidadas, partilham espaço associativo com outras entidades participadas pelos municípios, de escala intermunicipal ou supramunicipal. Prevê um reforço de competências a transferir para as freguesias, mediante protocolo com os municípios, o que tem plena justificação pela proximidade aos problemas das populações, pelo papel relevante e secular no quadro da administração local. Pela sua autonomia e legitimidade, assumem com os municípios uma complementaridade de funções essencial na prestação do serviço público de proximidade.
É certo que qualquer que seja a versão final da Lei-Quadro e dos vários Decretos-Lei setoriais, o Poder Central não pode desresponsabilizar-se das funções sociais e de soberania que lhe competem, desde logo rever lei de financiamento das autarquias, fazendo-o de forma compatível com o pacote das transferências, assegurando universalidade, equidade e a igualdade de oportunidades, tanto para os cidadãos que vivem no litoral como os que vivem em áreas mais isoladas do Interior. A nova lei de finanças locais tem que integrar princípios de coesão, ajudando a reduzir assimetrias.
Os municípios para além de erem que acautelar o envelope financeiro, terão que garantir que este processo de descentralização de competências é acompanhado de ajustamentos na organização técnica e administrativa do município, numa visão coerente de reorganização dos Serviços, relacionando a dimensão e diversidade das tarefas a concretizar, com os meios financeiros disponíveis, de modo a que a sustentabilidade económica e financeira dos municípios não seja posta em causa, assegurando que não perdem capacidade de investimento, uma vez que as transferências de competências trazem associadas necessidades importantes de investimento.
Os cidadãos não devem recear face a novas competências das autarquias, os portugueses sabem que os municípios tem dado um bom exemplo de responsabilidade na gestão dos recursos públicos, utilizados para assegurar a prestação de serviços e o investimento nos seus concelhos, o que lhe tem permitido transformar as cidades, vilas e aldeias para melhor, num processo de gestão equilibrado e com estabilidade política. Pelo poder autárquico democrático, que tem funcionado como escola política e administrativa da democracia, já passaram milhares de homens e mulheres, gerindo o bem comum, e para trás têm deixado obra de que os cidadãos se orgulham, ativos que permitem aos atuais e futuros autarcas encarar novos desafios na construção de um futuro melhor. Os cidadãos confiam no Poder Local, tem boas razões para isso.
Cito alguns exemplos, os municípios são responsáveis pela maior fatia do investimento público, havendo afirmações de que um euro investido pelos municípios vale três euros investidos pela administração central, outra razão importante é a baixa dívida pública dos municípios que é de 1,7% (4 075 milhões de euros) da divida pública do país (com o valor de 240 958 milhões de euros). Não menos importante é o facto de o peso a despesa dos municípios portugueses ser de 11,85% no total da despesa pública nacional, menos de metade da média europeia que é de 26,6%. É desejável que em Portugal a despesa pública realizada pelos municípios cresça para valor próximo da média europeia.
De destacar que os municípios portugueses, pelo 6.º ano consecutivo transitam com saldo financeiro positivo contribuindo para o equilíbrio das contas públicas, ao contrário da administração central e do setor público empresarial, responsáveis por uma pesada divida pública, com um elevado serviço da divida, que muito condiciona o desenvolvimento da economia, impõe baixos níveis de investimento público. Muita da poupança em vez de ser orientada para o investimento tem que ser utilizada no pagamento de juros.
O municipalismo tem sido ao longo da história do país e continua a ser, mais hoje do que ontem, o principal instrumento de combate às assimetrias e às desigualdades. Este importante passo na descentralização administrativa, se for bem dado, pode resultar num novo impulso para um maior desenvolvimento do país e um melhor serviço aos cidadãos.
É certo tratar-se de um importante momento e um desafio para o poder local. O processo ganharia em coerência administrativa e financeira se fosse acompanhado pela Lei-Quadro de instituição das regiões administrativas previstas na Constituição da República, dotadas de autonomia administrativa e financeira e de órgãos próprios eleitos pelas populações.
O conjunto das duas decisões, envolvendo o nível local e o regional, se tomadas no mesmo exercício global de descentralização e desconcentração do Estado, permitiria uma reforma mais consistente de modernização da administração pública, tornando-a mais eficiente, menos consumidora de recursos públicos, podendo permitir aliviar a carga fiscal e o orçamento das famílias, criar um ambiente mais favorável ao crescimento da economia e à criação de emprego, assegurando mais recursos para políticas sociais. Uma efetiva descentralização e desconcentração do Estado é necessária para romper com o forte centralismo de Lisboa que asfixia e não deixa o país desenvolver-se ao nível que é desejado, assegurando convergência com a média dos países europeus. 

Janeiro de 2018
 

Ordenamento do Território e Fogos Florestais (Ensaio)

Portugal é no conjunto dos países da União Europeia, segundo o 7.º Relatório da Coesão, publicado no passado mês de outubro pela Comissão Europeia, um dos que regista maiores desigualdades territoriais e sociais. O país continental, em termos de desenvolvimento inclina-se para a frente atlântica e para sul, convergindo ambos os planos em Lisboa, que centraliza cada vez mais a população, a economia, a administração pública, o poder político, agravando-se as assimetrias no território. Apesar disso, a Região Norte no período de 2010 a 1015, foi a única região NUT II da Península Ibérica com crescimento positivo. Também a nível social, a situação não é positiva, embora se registem algumas melhorias. A diferença da média de rendimento entre os 20% da população mais rica e os 20% da população mais pobre é de cerca de 1 para 6, uma das mais elevadas na EU.  
Nos últimos 15 anos Portugal não convergiu com a média dos países da EU, divergiu ligeiramente enquanto, países mais pobres do leste europeu tem estado a crescer continuadamente, convergindo com a média da EU, ficando Portugal em termos comparativos mais afastado de um processo de convergência. Desde há trinta anos que Portugal recebe da EU, uma média de 9 milhões de euros de por dia, ajudas que não tem sido suficientes, em parte por razões internas, entre elas o fraco ordenamento do território e uma visão centralista para o país, sem comparação na maioria dos estados desenvolvidos da EU, tendo como consequência direta o intenso despovoamento e empobrecimento do interior do País.   
Nas últimas quatro décadas, incentivou-se o abandono dos campos, a economia e atividades rurais foram desvalorizadas em termos económicos e sociais, em particular a agricultura familiar, considerada como residual e economicamente inviável. As políticas públicas concentraram os apoios ao investimento e à produção nas grandes explorações agrícolas, que representam 3%, enquanto as explorações agrícolas familiares representam 97%, do número total de explorações, que se concentram nas Beiras, no Minho e em Trás-os-Montes. 
É nestas regiões que ocorre um intenso despovoamento e envelhecimento da população. Ao desvalorizar a função social e económica dos agricultores, prejudicou-se o valor de outras funções fundamentais associadas à presença e atividade humana no território, como a preservação e valorização dos ecossistemas naturais, da biodiversidade essencial à humanidade, dos serviços ambientais prestados à comunidade, não quantificados na função económica, mas que representam um importante benefício social, função nunca compensada aos agricultores, mas de que todos beneficiamos, como a qualidade da água, do ar, a preservação da paisagem e de outros bens patrimoniais, legado de gerações, que representam parte importante da identidade e cultura do povo português. 
Muito do que tem sido insistentemente dito sobre os problemas da interioridade não tem sido ouvido pelos poderes públicos instalados em Lisboa, a não ser nas campanhas eleitorais, logo esquecido, também a imprensa nacional pouco tempo tem dedicado aos problemas do interior. Situações de fundamentalismo ambiental, como os planos de áreas protegidas (ex. do Parque Natural de Montesinho e Douro Internacional), quem não protegeram nem desenvolviam, pelo contrário, conduziram de forma mais intensa ao empobrecimento e abandono de atividades rurais e consequente despovoamento das aldeias que integram essas áreas, são exemplo de orientações erradas. Lembro os inimagináveis obstáculos levantados durante 14 anos à construção da barragem de Veiguinhas destinada a abastecimento de água para consumo humano da cidade de Bragança. Este ano, com 95% do país em situação de seca extrema, se a sua construção não tivesse sido autorizada no ano de 2012, este ano em Bragança teria ocorrido a rotura no abastecimento, com danos de elevadíssimo impacto social e económico. É só mais um exemplo de como se gastam recursos e tempo para tentar evitar a regressão imposta por políticas erradas, decididas longe do interesse das pessoas e dos territórios, o que nem sempre é possível, e muito disso é o resultado de quase tudo ser decidido em Lisboa.
A realidade negativa da interioridade, que algumas teses tentam desvalorizar, entrou este ano pela casa dentro de todos os portugueses, em resultado dos intensos fogos florestais que no inicio do verão e inicio do outono devastaram parte do país e da seca extrema que está a atingir o país, com forte impacto negativo no meio rural. Ambas as situações acarretam graves danos económicos, humanos e ambientais, enfraquecendo ainda mais os territórios do Interior, as pessoas e atividades económicas, com consequências negativas na coesão territorial. 
O mapa relativo à alteração da população ao nível NUT III, no período 2005-2015, publicado no 7.º Relatório da Coesão da EU, evidência de forma muito clara a fratura existente em Portugal, com mais de 2/3 do território em forte perda populacional, situação que vem de décadas anteriores, evidenciando que o Interior está cada dia mais frágil, com menos pessoas. As regiões fronteiriças espanholas, com as suas delebilidades não foram tão abandonadas com as portuguesas. Portugal deixou parte do seu território esquecido, as pessoas ficaram em parte ignorados, aí permanecem os que por opção, ou falta de alternativa, persistem em habitar nas suas pequenas aldeias que compõem e dão identidade ao território do Interior. O estado alheou-se em parte de funções de soberania, deixou que a situação em termos de ordenamento e desenvolvimento do território se tivesse aproximado de uma situação de fratura.
 A intensidade e frequência dos fogos florestais que este ano devastou o país, não pode dissociar-se das alterações climáticas, mas é certo que não poderá deixar de estar associado ao fraco ordenamento do território, ao despovoamento do Interior do país e abandono das atividades agrícolas. Durante a minha infância e juventude, as atividades agrícolas, pastoril e silvícola garantiam uma presença numerosa de pessoas no meio rural, asseguravam a valorização dos recursos naturais e sustento para as famílias. Muitas dessas atividades desapareceram, a emigração para as cidades e a perda de rendimento associado às politicas de incentivo ao abandono da atividade levaram a maioria das propriedades deixassem de ser cultivada. Hoje, a maioria das pessoas que ficaram nas aldeias são idosas, em parte dependentes de apoios sociais, por outro as tendências demográficas no país não ajudam a perspetivar uma inversão desta realidade, a não ser que as políticas públicas mudem de forma radical. 
É preciso repensar o ordenamento do território, reequilibrar o sistema urbano do país, olhar para o Interior com outros olhos e políticas, assumir a interioridade como estatuto jurídico, obrigando a que cada decisão política tomada seja avaliada sob o ponto de vista do impacto para a coesão territorial, assumir descentralizar e deslocalizar serviços nacionais relevantes da administração pública, para cidades do Interior, criar condições fiscais fortes de incentivo ao investimento privado e á fixação de mão-de-obra qualificada no Interior, garantir o desenvolvimento dos centros de conhecimento e de inovação nas instituições de ensino superior do Interior, assegurar o acesso às redes de informação, assumir que os territórios do Interior serão parte ativa nas políticas de coesão, da competitividade e do crescimento global da economia do país, nomeadamente no setor primário e que a relação entre territórios fronteiriços pode ser feita de forma mais estratégica e temática. É preciso devolver a esperança ao Interior, reestabelecer a equidade e a justiça social.  
É possível olhar em frente, encarar o futuro e inverter a realidade do abandono e despovoamento do Interior, com novas políticas que não podem omitir os desafios das alterações climáticas, da globalização, do crescimento da população do planeta e da pressão sobre os recursos naturais. As políticas para o Interior não podem ser vistas na perspetiva do passado, sim numa perspetiva de mudança de paradigma de desenvolvimento, centrado no crescimento verde, no conhecimento na inovação. Olhar para o futuro significa fazer agora, de forma diferente, o que não tem sido bem feito.
É preciso fazer ordenamento e gestão adequada do território, das áreas agrícolas e florestais, aproveitar os recursos naturais, com projetos bem estruturados e sustentáveis, apoiados no conhecimento, no saber fazer, na inovação, nas tecnologias, tendo por base planeamento a nível nacional, regional e local. Fazer planos de investimento de médio e longo prazo, fazer reformas necessárias, infraestruturas adequadas, seja de armazenamento de água, de transformação dos produtos, desenvolver estruturas associativas e cooperativas. Dar prioridade ao investimento na agricultura, mobilizar apoios comunitários maioritariamente para esse objetivo, aplicados regionalmente de acordo com as prioridades, correspondentes ao cruzamento das potencialidades naturais e opções de política regional e sub-regional. Corrigir a política, ordenar o território, modernizar a agricultura familiar, reabilitando-a económica e socialmente. 
O ordenamento da floresta deve incluir a aposta na diversificação e utilização de espécies como o carvalho, o sobreiro, o castanheiro, e outras espécies que permitam em cada parte do território fazer de forma compatível formações menos combustíveis e a criação de áreas para contrariar a propagação de incêndios. Para que os bons princípios de ordenamento do território sejam aplicados, deve existir uma estratégia florestal nacional, enquadrada por planos regionais de ordenamento florestal e a nível local transferidos para os planos diretores municipais, garantindo eficácia na sua aplicação. Os programas específicos de florestação com espécies de crescimento lento tem que ser acompanhados por programas de compensação financeira aos produtores, por perda de rendimento, pelos anos necessários, só assim se pode assegurar que os cidadãos que cuidam da agricultura e da floresta, na perspetiva das gerações futuras, o podem fazer com rendimento que lhes permita uma vida digna. 
Por outro, tanto na política florestal como agrícola, são necessárias políticas públicas que deem prioridade ao uso do solo em detrimento do abandono, promovendo a mobilização produtiva das terras abandonadas, políticas que fomentem uma adequada gestão e sustentabilidade económica e ambiental dos projetos, um programa intenso de investimento em infraestruturas de apoio ao ordenamento do território na perspetiva agrícola e florestal. O ordenamento do território exige o seu povoamento, que as pessoas que os habitam obtenham rendimento compatível para uma vida digna, que acedem a bens e serviços com qualidade e equidade, que os próprios e os seus bens estão protegidos, que as politicas para o território se façam com os seus atores mais próximos, designadamente com as pessoas que o habitam, proprietários e utilizadores dos bens. Não é possível construir um futuro melhor para o Interior se tudo se continuar a concentrar em Lisboa. É o tempo de juntar competências, conhecimento e vontades políticas para ajudar a construir um futuro melhor para o mundo rural e para o país, enfrentando o grave problema das assimetrias que fraturam o País.