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Nós Trasmontanos, Sefarditas e Marranos Fernando Montesinos (Vila Flor, 1589 – Antuérpia, 1659)

Seu pai, Manuel Lopes Teles, passou pelas cadeias da inquisição de Coimbra, em 1577, sendo absolvido das acusações que lhe fizeram. Como testemunhas de defesa, apresentaram-se os homens de maior nobreza e fidalguia de Vila Flor e do processo ressalta a ideia que ele era homem de influência e abonado de bens.(1) Faleceu em Vila Flor pelo ano de 1596.

Sua mãe, Filipa Dias, era filha de Pedro Dias, que foi tenente em Monforte de Lemos e tesoureiro da confraria de Nossa senhora do Rosário, passou igualmente pelas celas de Coimbra, empenhando-se particularmente na sua prisão o inquisidor Jerónimo de Sousa que andou atrás dele por terras de Vinhais.(2)

Manuel Lopes e Filipa Dias moraram em Vila Flor e ali criaram 6 rapazes e 2 raparigas, que todos casaram. Apenas a filha mais nova, Beatriz Rodrigues, ficou a morar em Vila Flor, casada com Jorge Fernandes e ali terá falecido, em 1613.

Um dos filhos, Diogo Lopes Teles, frequentou a universidade de Salamanca nos anos de 1592 a 1597, saindo formado em medicina. Exerceu a profissão em Vila Flor, nos primeiros anos do século XVII, ali casando com Isabel Henriques.(3) Mudou-se depois para o Porto e ali comerciava, em rede com seus irmãos. Possivelmente, sentindo o cerco do santo ofício, foi-se dali para Amesterdão, onde se terá circuncidado, tomando o nome de David Arari. Faleceu em 1632.(4)

Os restantes filhos rumaram a Castela e espalharam-se pela Europa, em posições estratégicas, tecendo uma fantástica rede familiar de negócios, em que o líder seria exatamente um dos irmãos mais novos, Fernando Montesinos. No dizer de Markus Schreiber, “os Lopes Teles foram uma das principais famílias de Castela no século XVII”.

Bartolomeu Lopes Teles, seria o primeiro a seguir para Espanha, com mulher e filhos, estabelecendo morada em Valhadolid.

João Lopes Teles foi de casa movida com a família assentar morada em Sevilha, no outro extremo de Espanha.

O irmão Pedro, casado com Guiomar Henriques, estabeleceu-se em Baeza, no sul de Espanha, seguindo mais tarde para Marselha, em França.

A irmã Catarina, casada com Bernardo Lopes Ferro, morou em Medina del Campo. O marido, porém, foi tomar conta da delegação das empresas no Brasil.

Manuel da Serra seguiu para França, passando de seguida à Holanda, para assentar definitivamente em Amesterdão.

Fernando Montesinhos terá começado a viajar e mercadejar entre Vila Flor e Castela com os irmãos. Encontramo-lo, nomeadamente em Baeza, com o irmão Pedro, em 1602. Pouco depois, com o capital de 500 ducados, ganhos por ele ou emprestados pelos irmãos, começou a negociar por conta própria. Nesta situação se manteve até 1612, altura em que se associou ao irmão Bartolomeu, com “lonja” aberta em Valhadolid. Os negócios da “lonja” andavam à volta dos tecidos mas sobretudo da compra de lãs em Portugal e Castela, que eram exportadas para a Flandres e para a França, país este onde ele começou a frequentar as feiras de Ruão, Paris, Lyon e La Rochelle.

Por 1616, Bartolomeu e a mulher faleceram, e Fernando Montesinos mudou-se para Madrid, ali estabelecendo a sede da sua própria empresa e levando também os seus 3 sobrinhos, filhos de Bartolomeu. Era já empresário de nome, um próspero “hombre de negócios” e, por isso, em 1620, alcançou casar com D. Serafina de Almeida, da família dos Lopes de Castro, “banqueiros do rei Filipe”, família onde também casou António Lopes Cortiços. Ligavam-se assim algumas das mais ricas e prestigiadas famílias cristãs-novas de Bragança, Mogadouro, Torre de Moncorvo e Vila Flor.

Fernando Montesinos logo ascendeu à classe dos “asientistas”, apresentando-se a concursos de prestação de serviços à Coroa, serviços que exigiam extraordinária capacidade financeira, forte liderança e recursos humanos especializados. Foi o caso do comércio do sal, cujo monopólio arrematou por 10 anos, nas regiões da Galiza, Astúrias e Andaluzia.

Obviamente que nos lugares de direção nos diversos postos de abastecimento (“alfolis”) estavam colocados familiares e amigos, e que a porta estava sempre aberta para os cristãos-novos de Vila Flor e Trás-os-Montes que para Espanha se iam e demandavam trabalho nas empresas Montesinos. Deve acrescentar-se que a atividade da empresa não se limitava à venda de sal em Castela, mas também à sua exportação para os países nórdicos.

Outro “asiento” que ele conseguiu foi o provimento das tropas estacionadas na praça de Ceuta, que incluía o pagamento dos ordenados, o fornecimento de géneros alimentares e fardas às tropas, bem como a palha e grão para os cavalos. Imagina-se a quantidade de pessoas a trabalhar para o “asiento”, desde a compra do cereal ao fabrico do pão, aos transportes, etc.

Mas não se pense que os outros negócios de Fernando Montesinos pararam. Pelo contrário, cresceram e estenderam-se à Flandres, Holanda e Alemanha, certamente em rede com seus familiares. Contudo, a inquisição vigiava e Fernando Montesinos foi preso pelo tribunal de Cuenca, acabando por ser absolvido e sem grande prejuízo para os seus negócios. O pior estava para vir.

Por 1650, a inquisição iniciou uma série de investigações a respeito da limpeza de sangue dos Cortiços, que haviam alcançado o grau de Cavaleiros da ordem de Calatrava, concluindo que vários “hombres de negócio” tinham prestado falsas declarações. Por outro lado, falecendo Manuel Cortiços Villasante, fizeram-se muitas esmolas por sua alma, em paga de jejuns judaicos, o que também chegou ao conhecimento dos inquisidores. Em consequência, registou-se uma vaga de prisões entre aquele grupo de mercadores e “banqueiros do rei”.

Foi o caso de Serafina de Almeida e Fernando Montesinos, presos em 1654, que saíram penitenciados dois anos depois e condenados a pagar, respetivamente, 2 mil e 6 mil ducados (12 contos de réis, no total), de acordo com a informação de M. Schreiber, se bem que Cármen Sanz eleve a conta para 10 000 cruzados.(5)

Claro que com a prisão de Montesinos pela inquisição, se colocava o problema da reversão dos “asientos” por ele contratados com a Coroa. Porém, nenhum empresário se apresentou a concorrer, para além dos filhos do próprio Fernando Montesinos, sobre quem os conselheiros da Coroa prestaram a seguinte informação:

— Estos hijos de Montesinos son muy inteligentes y por cuyas manos corrían las negociaciones de su padre y ninguno como ellos podrá com la notícia que tienen y com el crédito, acudir tan bién a la uno e a la outro como ellos.(6)

Na verdade, apesar daquele rombo financeiro, as empresas Montesinos continuaram florescentes, dirigidos pelos filhos, Manuel e Bartolomeu que, mutuamente, se conferiram amplos poderes. E para melhor gestão, estabeleceram uma espécie de direção bicéfala e descentralizada, ficando Manuel na agência de Madrid e Bartolomeu em Pontevedra.

Entretanto, retomada a liberdade, Fernando Montesinos e Serafina de Almeida abandonaram Madrid e foram para a Flandres, estabelecendo morada em Antuérpia, onde viriam a falecer. Com eles para a Flandres, viajou o sobrinho/neto Francisco Teles que em Madrid trabalhava de tesoureiro com Fernando Montesinos. Voltará a Espanha e como “hombre de negócios” e mais tarde ganhará o concurso para o abastecimento das tropas espanholas em Marrocos, indo fixar-se em Larache.

Notas:

1 - Inq. Coimbra, pº 458, de Manuel Lopes. Este processo é bem revelador das preocupações do arcebispo de Braga, Frei Bartolomeu dos Mártires, relativamente aos procedimentos da inquisição contra os cristãos-novos, bem como da atuação verdadeiramente estranha e singular desenvolvida pelo inquisidor de Évora, Jerónimo de Sousa, enviado para Vila Flor como abade da igreja matriz.

2 - Idem, pº 9881, de Pedro Dias.

3 - DIOS, Ángel Marco de – Índice de Portugueses en la Universidad de Salamanca (1580 – 1640), in: Brigantia, vol. XII, n.º 3; Bragança, 1992.

4 - 3-SCHREIBER, Markus – Marranen in Madrid 1600-1670, pp. 164 - 171, Stuttgard, Steiner Verlag, 1994.

5 - SANZ, Cármen Ayán – Los Banqueros de Carlos II, Valladolid, Universidad, 1989, pp. 336 – 338. Outros prisioneiros do círculo de F. Montesinos, condenados em “multa” para o santo ofício foram os seguintes: António de Sória, originário de Bragança, agente dos Cortiços – 1000 ducados; Gaspar de Gouveia, empregado da Casa Cortiços – 4000; Diogo da Costa Brandão, “asientista” – 4000; Gaspar Nunes, de Aveiro, negociante de sal – 2000; Francisca da Veiga – 4000; Mência de Almeida, irmã de Serafina – 4000; André da Fonseca, médico de Mirandela – 500.

6 - Idem.

O Estado falhou, ele disse

O Estado falhou! Esta declaração solene, feita pelo Presidente da República a propósito dos acontecimentos de Pedrógão, faz lembrar uma outra proferida por Karl Jaspers no fim da 2.ª Grande Guerra. Jaspers, filosofo, judeu, expulso do ensino pelos Nazis pelo facto de o ser, declarou com humildade que “a culpa do Nazismo é de todos nós”. Claro que ninguém lhe aceitou a tese. Para coisas concretas há culpados concretos e não abstracções como TODOS. “O Estado falhou” é culpar uma abstracção, isto é, não culpando ninguém foi a maneira encontrada de endossar as culpas a alguém. E esse alguém é o rosto visível do Estado, o Governo. A culpa caiu assim inteirinha no colo do Governo. Foi o que as oposições quiseram ouvir. Cavalgando esse mote conseguiram a demissão da Ministra e do Secretário de Estado. Depois calaram-se porque parece que os problemas que Portugal tinha com os incêndios eram dois: a Ministra e o Secretário de Estado. O resto estava tudo bem.

“O Estado falhou”. Dito por quem é, a primeira figura do Estado, quer dizer que o Presidente também falhou no sinistro de Pedrógão. Claro que, também aqui, ninguém aceita a tese. Ninguém acha que o Presidente tenha qualquer culpa nos acontecimentos de Pedrógão. Mas ele acha. Esta pretensa humildade, esta auto co-responsabilização faz lembrar aquele monge tibetano que, quando estalou a guerra, se inquiriu assim: “que falta de calma existiu em mim que tivesse contribuído para esta guerra”? Eu até entendo que o monge veja uma guerra como o somatório de faltas de calma mas que fale logo da sua, percebo mal. Também o Presidente fala da sua culpa que no limite é filosófica como a culpa de Jaspers. Mas fala. São dois exemplos de alter ego, pessoas que atribuem demasiada importância ao que são e ao que fazem. Shakespeare comparou-os àquelas ondas concêntricas que se formam quando uma pedra cai nas águas de um charco, vaticinando: “à custa de tanto crescerem, desaparecem”.

“O Estado falhou!” Foi este o resumo sintético que o Presidente da República fez dos acontecimentos de Pedrógão e de 15 de Outubro. E não fez grande serviço, o nosso Presidente. Por razões múltiplas, a primeira das quais é mesmo saber se é justa esta apreciação. Não obstante as conclusões da Comissão Técnica que aludem disfunções, desconexões, erro nas previsões e falta de planificações como falhas determinantes no combate ao fogo, temo que estas conclusões estejam inquinadas pela conclusão extemporânea do nosso Presidente. Isto porque “Roma locuta, causa finita” que é como quem diz depois de Roma ninguém mais pode falar. Só que “Roma” devia falar no fim e não fazer findar a conversa. Devia fazer a conclusão da conversa e nunca condicioná-la ou sugeri-la. Como podia a Comissão Técnica não falar no falhanço de toda a estrutura de combate aos incêndios se o Presidente já o tinha feito? Só assim se entende que a Comissão Técnica fale da falta de previsão e falta de planificação e ao mesmo tempo diz que a ocorrência foi “inédita”, “o maior fenómeno piro-convectivo registado na Europa”, “o 5.º maior incêndio em potência desenvolvida”, que “pertence a uma nova tipologia de incêndios de 6.ª geração cuja intensidade libertada permite dominar a meteorologia envolvente criando condições de tempestade de fogo e de propagação extrema”, que “durante 10 minutos se propagou a uma velocidade de 15,2Km/h, velocidade quase sem paralelo na literatura referente a fogos florestais”, que “a extrema raridade de incêndios com formação de pirocumulonimbos implica a inexistência em Portugal (e na Europa) de capacidade de leitura necessária para identificar uma situação potencialmente catastrófica deste tipo”, que o “incêndio de Pedrógão era motivado por downdraft(s) e que o de Góis, ali ao lado, não tinha qualquer semelhança”. Falou ainda, na ocorrência de “downburst(s)” que é, para leigos, um tornado invertido ou mais grosseiramente, só para fazer uma ideia e só para nós, imagine-se um fluxo de ar a uma velocidade incrível descendo pela chaminé fazendo maçarico no braseiro da lareira. Isto à escala real!!! (a única vez que tinha ouvido falar em downburst foi quando, já há anos, um avião que se fazia à pista no Aeroporto de Faro foi subitamente projectado contra o solo. Alguns peritos responsabilizaram este fenómeno atmosférico pelo acidente.)

Depois desta caracterização tão exaustiva e tão bem feita pela Comissão Técnica, só lamento que nas conclusões apareça a falta de previsão e falta de planificação porque não têm razão de ser. Não havia saber de experiência feito pelo simples facto de não haver experiência. Foi inédito e além disso o gigantismo do incêndio foi tal que nem as estruturas nem os bombeiros estavam preparados para isso. Temo que as conclusões intempestivas do Presidente tenham feito a Comissão Técnica tropeçar nos sinónimos.

Mas também a Procuradoria foi tocada por essa magistratura de influência. Assim, numa ânsia reparadora, constituiu mais de uma dúzia de arguidos. Autarcas, bombeiros, agentes da protecção civil, enfim, está lá de tudo. Só não vi lá nem os incendiários nem aqueles que à revelia da lei levaram a mata até à berma da estrada e não desmataram o logradouro das suas casas.

“O Estado falhou” é expressão que não me ocorreu quando vi os incêndios na Austrália ou aquele na Grécia em que tiveram de resgatar as pessoas por mar ou ainda os da Califórnia. Na Califórnia, o Estado mais rico do País mais rico do mundo, a mata ardeu como cá. O fogo teve tanto desprezo pelas mansões dos actores de cinema como pelos casebres abandoados de Pedrógão. E o que vimos naquela parafernália de meios técnicos, que faz as delícias de qualquer bombeiro, não foi um helicóptero com um lato da água pendurado mas sim um avião de carga, quadrimotor, largando calda retardante. Pois de pouco lhe valeu. Será que aqui o Estado também falhou? (que fique pelo menos uma conclusão: o incêndio na mata não se combate. Dar mais meios aos bombeiros para este fim é um luxo e um luxo caro.)

Quando se fala no combate aos incêndios, fala-se sempre no ordenamento florestal e na dificuldade em o concretizar porque 97% da mata é privada. Poderemos assim dizer que o Estado falhou nos seus 3% porque no resto estava tudo bem?

Não me parece que o Estado tenha falhado assim tanto neste caso em apreço. Já quando vejo (para dar só um exemplo) um licenciado trabalhar nas caixas do hipermercado, aí sim, acho que o Estado falhou.

 

Está aí a minha mulher!

Foi muito falada e comentada a recente crise no PSD e tudo o que aconteceu à sua volta, desde os bastidores, da (in)explicável ausência de meia-bancada do partido, numa sessão plenária na Assembleia da República, passando pela surreal discussão sobre normas regimentais cristalinamente expressas nos estatutos (com o único objetivo de desgastar uma oposição já fragilizada?), continuando com a reserva de lugares de assistência (ao expetáculo??) e terminando com a “vitória de todos”, epilogada por uma reconciliação histórica, depois das questionadas interferências presidenciais.

Os cestos foram rapidamente lavados e arrumados (acordado o gigante adormecido, resgatado o partido do coma dos últimos tempos) pois há novas vindimas no horizonte e estão todos de tesoura em punho e cesta no braço para, “com o máximo empenho, como só assim sabem fazer”, se embrenhar pelos valados, tentando encher o recipiente com uvas, se possível as mais acessíveis, maduras, saborosas e generosas. Com o objetivo único de encher a dorna até à borda e com mais conteúdo que a do concorrente, da vinha ao lado. O problema é que, sendo importante para todos, o nível com que a aduela se  apresentar ao final do dia, o mais importante para cada um é garantir o convite para a participação na colheita ou, se aí já não houver um dos disputados e limitados lugares, pelo menos um lugar na preparação do pio, na transfega do mosto ou tratamento do vinho. Por muito que batam no peito, que garantam que apenas o sucesso da safra os move, uma cuidada análise facilmente descobrirá, para lá das encenadas aparências, o verdadeiro motivo de tanta encenação, movimentação e preocupação, dificilmente vai para lá do lugarzinho e da promoção pessoal. É verdade que o êxito coletivo assume grande relevo e genuíno desígnio, para todos, principalmente porque com esse intento assegurado, serão maiores as probendas e em maior quantidade, melhorando as “merecidas” recompensas e aumentando a probabilidade de lhes cair uma no regaço.

Das notícias que antecederam e se sucederam ao último Conselho Nacional do PSD, pouco se soube das propostas concretas para solucionar os problemas que afligem os eleitores. Em vez disso soube-se, exaustivamente, em que condições se pode votar de braço no ar; quem apoia, apoiava ou sempre combateu o líder; quem pode ser descartado nas “inaceitável limpeza” que a direção atual estará a preparar-se para fazer nas listas candidatas às próximas eleições. Ah, também se soube que o Presidente da República não resistiu à tentação de intervir e, espante-se, não teve o cuidado de, dissimuladamente, o fazer de forma discreta e em segredo como alguns dos seus antecessores fizeram.

Lembro-me, a propósito, o espanto causado ao candidato à Presidência da Câmara que abordou um conterrâneo para o convidar a encabeçar a lista a apresentar à Junta de Freguesia, e ouviu deste:  “Que pena ter vindo só agora. Já me comprometi com o seu adversário! Já não posso aceitar o seu convite. Mas está aí a minha mulher que ainda não vai em lista nenhuma e está disponível. Pode ser ela a primeira da sua lista!”. Esta história só é insólita pela inusitada franqueza como este cidadão assumiu a sua principal motivação: trazer para a órbita familiar o controlo da presidência da Junta de Freguesia.

Concorde-se ou não com a intervenção de Marcelo na crise da oposição, existindo, é de louvar que tenha publicitado a reunião, a seu pedido, com Rui Rio e que Montenegro não tenha sido introduzido no Palácio de Belém, à socapa e por furtivas entradas laterais.

A Queda dum Anjo

Entre Marcelo Nuno Duarte Rebelo de Sousa, eclético alfacinha com fundas raízes em Terras de Basto, e Calisto Elói de Silos e Benevides de Barbuda, morgado da Agra de Freimas, transmontano dos quatro costados que saiu de Caçarelhos, já em mil oitocentos e picos, para assumir o papel de deputado em Lisboa, onde se deixou corromper por luxos e prazeres, não há a mais ínfima semelhança, note-se bem.

Marcelo Rebelo de Sousa continua a merecer a imagem de homem impoluto, sóbrio, nada dado a vaidades e devotado às grandes questões sociais dos nossos dias. Mas é aqui que a porca torce o rabo.

A Lisboa actual conserva aspectos idênticos, sobretudo no que ao abandalhamento da democracia diz respeito, aos versados em 1866 pelo genial Camilo no seu romance satírico “A queda dum Anjo”, que caricatura a vida social e política portuguesa daquele tempo. Hoje até nem lá faltam transmontanos finórios, mal-afamados, que deixaram a pureza das berças para aprimorar as suas competências na desnorteada capital.

Para muitos compatriotas que o elegeram Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa continua a ser um verdadeiro anjo, se bem que esteja em queda acentuada, como as sondagens o demonstram, desde que se consolidou como uma figura popularucha, beijoqueira, verdadeiro papa beijos.

O homem exagera, é voz corrente, como ainda aconteceu recentemente com o telefonema de viva voz que teve o desplante de fazer a uma conhecida e astuta figura mediática.

O problema não está tanto na excessiva exposição mediática ou na matéria foleira que alimenta programas televisivos e revistas cor-de-rosa. Está, sobretudo, na consequente perda de autoridade política e no aligeirar da dignidade institucional a que um Presidente da República jamais se deve arriscar.

Não se contesta que Marcelo Rebelo de Sousa procure ser amado pelo seu povo. Em nenhuma circunstância, porém, deve ser objecto de chacota pública, deixar de se fazer respeitar, sobretudo pela classe política que, como se sabe, tem especial apetência pelos cínicos jogos de poder.

Marcelo Rebelo de Sousa pode até pretender ser, o que só lhe fica bem, um émulo do bondoso padre Cruz que calcorreava as ruas de Lisboa para valer aos mais pobres e infelizes. (Pena é que atitudes idênticas não as tenham o Cardeal Patriarca, por exemplo, e todos os clérigos, mais votados que andam, ao que parece, a discutir o sexo dos anjos, ou diabos, sabe-se lá).

O afã e cordialidade com que Marcelo Rebelo de Sousa se devota à causa pública são deslumbrantes. Tanto que ele parece nem se dar conta de que está a pisar o risco que separa o populismo mais saudável da perigosa subversão do principal órgão de soberania, que a sua verborreia e mediatismo doentio estão a entorpecer a opinião pública, a encobrir os males do Regime, a postergar reformas urgentes, a branquear as falhas graves do governo e a desacreditar, ainda mais, o discurso político.

A queda do anjo Calisto deveu-se aos luxos e prazeres. A do anjo Celito ao populismo bacoco e risível. Que se cuide.

 

Este texto não se conforma com o novo

Acordo Ortográfico.

Parábola da política e do rebanho

É comodo ser do rebanho. Os pássaros que cantem e façam os ninhos nos ramos altaneiros e contemplem as paisagens mais deslumbrantes. O verde dos campos que seja verde. Os peixes em cardume que descubram os segredos da profundidade do rio, ou fiquem, somente, ao sol nos remansos tranquilos. As rosas, essas que se cansem, todos os anos, de ser rosa e rosas e perfume. É cómodo ser do rebanho, sendo levado para os prados cheios de flores e à tarde ir beber água fresca no leito do ribeiro que canta há milhares de anos. Nem um desgosto! O pastor será o caminho seguro, o pensamento. A ameaça do lobo unirá o rebanho e assim estará tudo bem, justo e perfeito! E até os cães do gado que podiam morder, ladrar, se calam para que a côdea do pão duro não falte no bornal sebento do pastor. Claro que no final do verão o rebanho terá que sofrer as grandes secas, os prados cinzentos de terra dura, comida pouca, mas o pastor lá estará para manter o gado unido. Ele sabe que algumas ovelhas irão morrer de fome, de sede e de doenças. Mas só é preciso esperar e logo surge a promessa de prado verde e água fresca. Não se sabe quando será, mas o rebanho adormecido cala-se, deixa de balir, morre e o pastor já nem se importa.

— Que rebanho é este… até tem medo de morrer!… Diz o pastor. Na verdade poucas ovelhas chegarão à próxima primavera, mas que se há de fazer?! Nada, não se faz nada, o melhor é ficar no rebanho sem a maçada de dizer não, sem o incómodo do pensamento, sem a estranheza apocalíptica da ovelha morder o pescoço do cão. Ficar balindo, balindo e não fazer nada!

O pastor é que gosta de um rebanho assim, amigo do seu pastor, manso, com medo do lobo! É cómodo ser do rebanho!

Mas um dia, há milhares de anos, um sapiens sapiens assustou-se com a novidade do pensamento e a maldição começou. Perdemos o rebanho, ganhamos a revolução, perdemos o paraíso, ganhamos a humanidade e agora já podemos ignorar o rebanho. Conquistamos o dom da divindade, inventamos a filosofia e todos os dias acordamos na intranquilidade do pensamento. Platão anda por perto e cedo abandonou o rebanho e ao pastor e disse não: “O preço a pagar pela tua não participação na política é seres governado por quem é inferior.”

Vem esta deslavada prosa a propósito da recente demissão do presidente da concelhia do PS de Bragança, André Novo. Conheço este jovem há muitos anos. Foi meu aluno. Pensa bem e muito. Na intranquilidade do pensamento descobriu que este não era o caminho para a política bragançana. E porque pensa, aprendeu a dizer não e corajosamente disse um incómodo não à inoperância e à aparente tranquilidade em que vive uma região que morre paulatinamente. André Novo não quer nada da política. Doutorou-se muito cedo, também para servir a política. “Apresentei este pedido de demissão por discordar das opções políticas e só políticas do Presidente da Federação do PS de Bragança, Jorge Gomes.” Diz André Novo. Com esta demissão perde o partido socialista que não soube aproveitar um grande quadro. Também o presidente da distrital do PS, Jorge Gomes sai fragilizado. Não sei se tem fracos conselheiros, ou não valoriza os melhores. Na lonjura de Lisboa, Bragança fica distante. Lisboa seduz. Mas o deputado tem que ser o representante de todos os cidadãos que o elegeram, sem fações, nem sensibilidades. Bragança tem uma longa tradição de dizer não e valorizar os seus e já o primeiro deputado bragançano às Cortes constituintes de 1821, o abade de Medrões, padre Inocêncio António de Miranda, dizia não ao absolutismo, enquanto D. João VI, em plena invasão francesa resolve ir a banhos para o Brasil abandonando o país à sua sorte. O padre Inocêncio nasceu em Paçó de Rio Frio em 1761, frequentou o seminário de Bragança e licenciou-se em Salamanca. Um grande liberal, padre e maçon, daqueles transmontanos que antes preferem quebrar do que torcer. Polemista temido, foi ouvido e respeitado nas Cortes, sendo um dos principais obreiros na elaboração da constituição de 1822. A tradição vai-se manter, a juventude bragançana é promissora. O grande partido socialista, sem dúvida, vai continuar a fazer o seu caminho pois “é na queda que o rio ganha mais força”.

Quem mais dá mais amigo é do santo

Ter, 22/01/2019 - 09:54


Como vai a nossa gente boa a amiga? Como diz o nosso povo “NÓS CÁ VAMOS E CÁ IMOS!”.

Para nós, que nos queixamos com o frio, lembro a todos que estamos em pleno Inverno e que além das geadas que têm sido ásperas, também o nevoeiro tem marcado bem a sua presença. A chuva e a neve ainda andam a fazer os exercícios de aquecimento para poderem entrar nesta época.

Medidas para se proteger do frio!

A eventual repercussão de uma vaga de frio sobre a saúde humana não depende exclusivamente das temperaturas atingidas mas também da vulnerabilidade, que é maior, em determinados grupos populacionais, relacionados com o grupo etário, o estado de saúde e com situações de carência social.

O risco é, assim, acrescido quando se aliam vários fatores, como acontece com os idosos, que, frequentemente, são portadores de doenças crónicas (sobretudo as doenças cardíacas e respiratórias) e que vivem isolados em habitações insalubres.