Nuestros hermanos também estão a braços com a falta de gente

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Ter, 11/02/2020 - 10:04


É nas costuras entre Portugal e Espanha que o despovoamento mais assombra e assusta as gentes e as entidades políticas, que têm, pelo menos, unido esforços, para discutir o problema. “Razones Para Quedarnos”, um congresso organizado pelo jornal zamorano La Opinión, pôs em cima da mesa a quebra demográfica do outro lado da fronteira, já que várias capitais de províncias espanholas têm assistido à fuga de gentes que, à semelhança do que acontece por aqui, fogem para as grandes cidades, em busca de melhores oportunidades.

Encontrar, discutir e compreender estratégias que travem o despovoamento que o interior de Espanha tem vindo, nas últimas décadas, a registar, juntou várias personalidades, com “voto” na matéria.

O desafio da igualdade de oportunidades

Agustín Sanchez de Vega, presidente do conselho consultivo de Castela e Leão, deixou a nu, no encontro, uma realidade que não adianta negar: o despovoamento “condiciona as políticas públicas” e “orienta a decisão sobre os recursos orçamentais”, numa comunidade autónoma com 2248 municípios, representando 25% de toda a Espanha, e muitos deles com menos de cem habitantes. Frisando ainda que o despovoamento “é um problema social e político”, que assume “grande envergadura”, Agustín Sanchez de Vega acredita que se está a pôr em causa o sistema de direitos da constituição espanhola já que traduz um “desafio à igualdade de oportunidades”.

A vontade que faltava

Teresa Ribera, quarta vice- -presidente do Governo espanhol e Ministra da Transição Ecológica e Desafio Demográfico, estreou-se publicamente no cargo, no congresso, em Zamora, território que, nas suas palavras, é marcado pela baixa natalidade. A governante espanhola sublinhou que não pode estar tudo localizado em Madrid ou nas cidades que, supostamente, mais gente e impacto têm. “É necessário reorganizar os serviços de maneira equilibrada, para que ninguém seja privado de cuidados básicos”, assinalou, vincando que, em muitos casos, será necessário o entendimento entre os municípios. Ainda assim, recordando que esteve fora do país, por mais de cinco anos, quando voltou a terras espanholas viu o seu povo com uma “vontade” que, provavelmente, antes não existia, pelo menos com a “intensidade” que se precisava para poder “reverter a situação”. “É a grande oportunidade que temos para poder acertar as políticas que nos ajudem a ficar onde queremos”, explicou, assegurando que encontrou nas pessoas “conexão emocional” e capacidade de “construir pontes” entre o urbano e o rural e entre os vários sectores de actividade económica, industrial, social e cultural.

Tecnologia digital: um mundo de oportunidades

Pelo congresso passou também o manager institucional da Google de Espanha e Portugal, que apontou luzes de esperança se à inovação tecnológica a gente se souber agarrar. Sublinhando que a tecnologia digital oferece um “mundo de benefícios interminável”, António Vargas reiterou que o caminho passa pela digitalização, como “grande oportunidade” para “reverter” o processo de abandono. Veja-se que, para este especialista, a digitalização quebrou barreiras de espaço, criando um mundo sem fronteiras; de tempo, oferecendo repositórios infinitamente maiores que as maiores bibliotecas da história da humanidade; económicas, dando acesso a um mundo cultura, educação, comunicação e entretenimento gratuito; e de intermediação. “O mundo rural pode aproveitar mais que ninguém estes benefícios”, deixou assente.

Futuro pouco promissor para jovens estudantes

Uma das grandes características dos territórios onde o despovoamento mais se sente, é que a economia destas regiões é fortemente sustentada em actividades com grande exigência de mão- -de-obra, onde o trabalho no sector primário ainda impera. É o caso da província de Zamora já que segundo José María Díaz, vice-reitor da Universidade de Salamanca, uma das mais antigas do país, há uma “má notícia” que, “desgraçadamente”, é preciso dar aos alunos que forma: “Castela e Leão está intimamente ligada ao sector primário”, o que se traduz na produção de alimentos, que atravessa “problemas muito graves”. José María Díaz assegurou que já nem os forma para ali ficarem mas sim para que ganhem “bagagem” para que possam fazer o que queiram de futuro.

Zamora: a terra que mais perdeu

No começo do milénio, a província de Zamora contava com mais de 201 mil habitantes. Hoje, volvidos 20 anos, o número caiu e contam-se menos de 173 mil, incluindo a capital, onde há quatro mil pessoas a menos que então. 232 municípios de Zamora, 93% do total, estão abaixo dos mil habitantes, número que a Federação Espanhola de Municípios e Províncias usa como limite para falar sobre locais em “perigo de extinção”. A província é a que mais gente perdeu no século passado, quase 15%, segundo Teresa Ribera, protagonista de uma das frases mais marcantes do encontro, que decorreu na sede do Conselho Consultivo de Castela e Leão, na quarta-feira: “Ninguém tem que ficar se não quiser mas ninguém deve ir embora se a sua vontade for ficar”.

Jornalista: 
Carina Alves