A via-férrea, na chegada à estação de Bragança, envolveu a cidade por poente/nascente, separando-a da área com melhor aptidão de expansão urbana, a área em direção ao Forte de S. João de Deus. Com o tempo, a linha férrea passou a ser um obstáculo às necessidades de crescimento da cidade. No ano de 1947 a Câmara Municipal passou a dispor do anteplano de urbanização da cidade, elaborado pelo arquiteto Januário Godinho que previa, a expansão da cidade para a encosta do Forte de S. João de Deus, a construção de uma rua aproveitando o traçado da linha ferroviária desde a Praça Cavaleiro de Ferreira até à passagem de nível das Beatas, lugar onde estava previsto que a linha viesse a terminar e aí fosse construída uma nova estação ferroviária, em substituição da existente. A cidade precisava expandir-se, construir novos equipamentos públicos, novas áreas de edificações, novas vias. Em primeiro plano na foto, observa-se a contiguidade da linha com o espaço urbano.
Por proposta do vereador Adriano Augusto Rodrigues, no mandato de 16 de janeiro de 1953 a 25 de novembro de 1954, a Câmara Municipal deliberou, por unanimidade, que a Estação Ferroviária se mantivesse e em alternativa se construísse um desvio da linha, uma vez que seria mais económico e servia melhor a cidade dado que o local onde se encontrava estava próximo do centro cívico onde se encontravam os mais importantes edifícios públicos e onde a lavoura, o comércio e a indústria tinham a sua principal atividade e por ser próximo do campo da feira. Na foto, com vista de nascente, vê-se o percurso da linha e ligação à estação ferroviária, ao fundo o antigo quartel BC3 e caminhos de acesso.
Para concretização da proposta aprovada pela Câmara Municipal, após uma visita a Bragança de um técnico da Direcção Geral de Transportes Terrestres (DGTT), ficou resolvido que seria conveniente a Câmara Municipal elaborar um anteprojeto a fim de ser avaliada a proposta de desvio da linha, o que foi feito e comunicado à DGTT. Adriano Pires tomou posse como Presidente da Câmara Municipal a 26 de novembro de 1954, e por ofício de 22 de dezembro de 1954, dirigido ao Diretor Geral dos Transportes Terrestres referia “... não pode esta cidade ter qualquer desenvolvimento sem o desvio da linha de ferro, porque esta se opõe à abertura dos arruamentos previstos... o desvio da linha de ferro, deve considerar-se, sem favor, a obra de maior valia para o progresso da cidade.”
A 20 de abril de 1955 a DGTT comunicou à Câmara Municipal as exigências técnicas de projeto que deveriam ser seguidas (raios; inclinações; não tocar em qualquer ponto do Aeródromo; que a linha ficasse em trincheira para não prejudicar o tráfego aéreo e construir uma passagem superior ou inferior no cruzamento com a EN 103.
A 8 novembro de 1955, o Diretor Geral da CP, dirigiu-se ao Diretor da DGTT, informando que, analisado o anteprojeto da variante o consideravam tecnicamente realizável, no entanto, a construção dessa variante só poderia aceitar-se como último recurso, face à hipótese de prolongamento da linha até Guadramil para servir os jazigos mineiros conforme previsto no Plano da Rede Ferroviária de 1929. Na mesma data, dirigindo-se ao Diretor Geral dos Serviços de Urbanização, referia que da construção não deveria resultar qualquer encargo financeiro para a Companhia, uma vez que o interesse da variante resultava apenas de uma necessidade de urbanização da cidade de Bragança.
A Câmara Municipal decidiu assumir os encargos da elaboração definitiva do projeto da variante e informou que, quanto ao financiamento da construção dificilmente poderia ir além dos 500 contos fixados por despacho do Ministro das Obras Públicas.
A 18 de novembro de 1955, o Diretor Geral dos Serviços de Urbanização transmitiu ao Diretor Geral dos Transportes Terrestres, que o despacho de autorização de substituição do último troço da linha do Tua por uma variante tinha sido dado pelo Ministro das Comunicações e que a construção seria efectuada sem encargos para a Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses.
Para elaboração do projeto, a Câmara Municipal tentou junto da DGTT, obter a disponibilidade de um engenheiro experiente, sob responsabilidade financeira da Câmara Municipal, não o tendo conseguido, o mesmo tendo ocorrido junto da CP. Adjudicou o projeto no final do ano de 1955, tendo-o entregue a título particular aos engenheiros Francisco Vargas Morgado e Manuel Maria Sampaio, adjuntos da Direção de Estradas do Distrito. O projeto da variante foi enviado a 17 de abril de 1956 ao Ministro das Obras Públicas para aprovação e solicitação de comparticipação do Estado para a sua construção, parecendo-lhe justo que a JAE também viesse a comparticipar os trabalhos uma vez que se previa que a EN 103 viesse a ocupar a plataforma da via-férrea, partindo da Praça Cavaleiro de Ferreira ao Loreto, beneficiando assim de investimentos anteriores e do valor dos terrenos.
Seguiu-se troca de correspondência relacionada com custos previstos, reutilização de materiais da linha a desativar, transbordo de pessoas e mercadorias, nas proximidades da estação, caso esta hipótese fosse adoptada, foram elaborados estudos economicos associadas a esta perspetiva.
A 7 de março de 1957, o Diretor Geral dos Serviços de Urbanização comunicava ao Presidente da Câmara Municipal que por portaria publicada no Diário do Governo n.º 30, II série de 5 de fevereiro de 1957, a Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses, tinha decidido conceder, a solicitação do Ministro das Comunicações, um subsídio de 500 contos para a construção da variante.
No Diário do Governo II série de 27 de fevereiro de 1957, o Governo da República Portuguesa, pelo Ministro das Obras Públicas concedia à Câmara Municipal de Bragança uma comparticipação de 500 contos pelo Fundo de Desemprego, situação que o jornal Mensageiro de Bragança noticiou na edição de 23 de fevereiro de 1957. A 9 de julho de 1957, a Direção de Urbanização de Bragança, informava a Câmara Municipal que lhe tinha sido concedido um reforço de comparticipação de 50 contos pelo Fundo de Desemprego. Logo de seguida, em reunião de Câmara de 22 de agosto de 1957 foi deliberado assumir o compromisso de contribuir com cento e vinte e cinco mil escudos, para conclusão das obras da variante. Esta foi a reunião em que a Câmara deliberou alterar o feriado municipal para o dia 22 de agosto, data da tradicional festa de Nossa Senhora das Graças.
Pelo Decreto-Lei n.º 41662 de 3 de junho de 1958, foi atribuída à Companhia dos Caminhos de Ferro Portuguese, a incumbência da execução da obra do desvio do troço do caminho-de-ferro da linha do Tua junto à cidade de Bragança, concedendo o prazo de dois anos a partir dessa data, ou seja a conclusão a 3 de junho de 1960. Autorizou a Câmara Municipal a contrair na Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência um empréstimo de 900 contos, destinado à sua comparticipação na referida obra, cujos encargos seriam cobertos pela receita da mais-valia que viesse a ser gerada com os terrenos a urbanizar. Fixou o valor das comparticipações nos seguintes montantes: Junta Autónoma de Estradas 500 contos; Fundo de Desemprego 500 contos; Câmara Municipal 932 contos e Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses 500 contos, valores que a Companhia recebeu logo no início dos trabalhos.
O início das obras atrasou-se, o Jornal Mensageiro de Bragança, edição de 29 de janeiro de 1960 noticiava o seu início. A sete de março de 1962, o Presidente da Câmara Municipal dirigiu-se por ofício ao Ministro das Obras Públicas, solicitando a sua intervenção junto da Companhia, visto o prazo de execução ter mais do que duplicado e os trabalhos estavam parados e às várias insistências da Câmara Municipal, a Companhia nada dizia, causando os atrasos danos incalculáveis à expansão da cidade.
A inauguração da variante decorreu no dia 22 de agosto de 1968, dia de Nossa Senhora das Graças. Exercia as funções de Presidente da Câmara Municipal, o Prof. Alberto Eugénio Vaz Pires, que salientou dever-se esta obra aos seus antecessores, nomeadamente ao Comendador Adriano Augusto Pires. Do seu discurso destaca-se “ … É certo que se trata apenas de um troço de 3 Km, em substituição da linha existente que, atravessando a cidade, constituía fonte de perigos permanentes para a população vizinha, além de entravar, desde há muito, no seu desenvolvimento e expansão, a nossa cidade, que vive anseio de progredir, de caminhar, de igualar, no seu progresso, as cidades portuguesas suas congéneres.
Com a existência das novas automotoras e horários mais frequentes, a circulação na EN 103 era frequentemente interrompida, o mesmo acontecia, próximo da estação, no arruamento de acesso ao Forte de S. João de Deus. … De ora avante, a nossa cidade, livre da cintura que dificultava, e até impedia, em grande parte, o seu desenvolvimento, qual colete de forças que a oprimia e manietava, poderá entrar num período de expansão que a dignifique, que a eleve, que a engrandeça até ao nível da sua categoria de capital de distrito … é que esta cidade, geograficamente situada no extremo nordeste do país, é uma cidade desconhecida, pouco visitada, cidade de destino e não de passagem obrigatória, que sofre os resultados desse abandono e o consequente desconhecimento.
Desde o tempo do comboio único, que saia às 8 horas da manhã, para regressar às 8 horas da noite, desde o período da guerra, que por circunstâncias variadíssimas, os comboios não tinham horário de chegada, porque os atrasos eram de 5, 10 a às vezes 24 horas, até aos dias de hoje, até se chegar às comunicações ferroviárias frequentes, rápidas, com horários próprios”.
Nos discursos voltou a estar presente a antiga e persistente reivindicação de ligação a Espanha, pensando no escoamento do minério de Guadramil.
Assistiram à inauguração várias entidades, população e a Companhia Portuguesa de Caminhos de Ferro fez-se representar por uma delegação de responsáveis, representando o Conselho de Administração o Eng.º Brito e Cunha. Foi dito que o custo das obras da variante foi de cerca de 2500 contos.
Aos dezassete dias do mês de julho de 1969, em Auto de Vistoria geral, os trabalhos eram dados por concluídos pela Comissão constituída para o efeito. O Auto foi assinado pelo Eng.º Joaquim Duarte Carrilho, Diretor de Urbanização de Bragança e pelo Dr. Abílio Machado Leonardo, Presidente da Câmara Municipal de Bragança.
Parte IV - A construção da variante ferroviária à cidade de Bragança (Anos de 1953 a 1968)
Jorge Nunes