A Feira de Bragança ao longo dos tempos (1) Da Idade Média ao século XIX

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A localização da feira no espaço urbano da cidade foi evoluindo ao longo de séculos, acompanhando o crescimento do aglomerado. Os locais de realização foram decididos por razões de segurança, de salubridade, de centralidade das novas praças face ao desenvolvimento urbano. A feira tinha um papel essencial no abastecimento público e nas relações económicas da região. A localização fronteiriça de Bragança representava em termos geopolíticos um ponto sensível, na defesa da fronteira e da integridade do território, em tempo de paz por ela se fazia o comércio transfronteiriço, se promoviam as relações sociais e culturais entre povos raianos.
O peso político, militar e económico das terras de Bragança, inicialmente através da família dos Bragançãos e posteriormente pela Casa de Bragança, oficialmente designada de Sereníssima Casa de Bragança, família nobre com elevada influência na Europa e no mundo, hão-de ter tido relevância na concessão de privilégios que lhe foram atribuídos, de feira franca, na redução de impostos, na comercialização de bens, na atribuição de condições especiais de despacho e verificação de mercadoria na Alfândega, com o objetivo de fortalecer o comércio com regiões vizinhas contíguas como Castela e Galiza, também com Aragão e Navarra. Durante séculos vendedores dessas regiões terão percorrido os caminhos que conduziam à feira de Bragança.
De seguida faz-se uma breve descrição da evolução da feira e do mercado ao longo dos tempos, autorizações, locais de realização à medida que a cidade cresceu, até chegar à atualidade, já com uma realidade muito distinta, fruto de uma mudança radical, com o essencial da distribuição a ser feita a partir de médias e grandes superfícies comerciais, situação tratada na publicação “ Contrastes e Transformações na Cidade de Bragança, 1974 – 2004”. São várias as referências relativas à feira de Bragança, na obra do Abade de Baçal, de publicação de Virgínia Rau, de Alexandre Rodrigues e de outros autores. Delas se retira  informação relevante, também do Arquivo Municipal.
A 5 de março de 1272, D. Afonso III concedeu carta de feira anual a Bragança, que deveria começar a 16 de julho e durar 15 dias. A vila foi crescendo fora de muralhas, arrastando atividades económicas, ficando casas abandonadas intramuros. Para contrariar essa tendência, D. Pedro I, no ano de 1364, concedeu privilégio a quem quisesse viver na vila intramuros.
No ano de 1383, por carta de 16 de outubro, D. Fernando, concedeu feira franca anual de um mês, feira que deveria ocorrer fora de muros. As guerras com Castela não terão permitido grande desenvolvimento da feira e por isso, a 2 de julho de 1392, D. João I atribuiu nova carta de feira franca anual que deveria durar um mês, a realizar quinze dias antes da festa de Santiago, a 24 de julho, e se prolongaria até quinze dias depois, período em que não prejudicaria as feiras que se faziam ao arredor da comarca.
Em tempo de paz a feira fazia-se dentro de muralhas, já em período de hostilidades militares, o alcaide e as autoridades civis transferiam a feira para o arrabalde, onde se tinham fixado moradores, arrastando o crescimento urbano e a fixação de atividades económicas, o que terá levado alguns moradores a abandonar as suas casas na vila, deixando-as ruir, para morar perto do local onde novas atividades económicas floresciam.
Contra esta situação pretendeu agir o Câmara que solicitou autorização ao Juiz e ao Alcaide, para que deixasse fazer de novo a feira na vila. A competência era do rei, por isso, a Câmara requereu a D. João I autorização para que a feira que se realizava no arrabalde, proibida dentro de muros pelo alcaide, passasse a realizar-se dentro da vila, como sempre se fazia em tempo de paz. A paz tinha sido assinada com Castela no ano de 1411. O Rei D. João I, Mestre de Avis, por despacho de 12 de dezembro de 1413 autorizou que a feira se fizesse “muros adentro segundo o costume antigo”, despacho que foi mais tarde confirmado pelos reis D. João II e D. Manuel I, nos anos de 1486 e 1496.
No ano de 1439, parecendo ao Concelho ser útil poder retomar a autorização de feira franca concedida por D. João I, no ano de 1392, solicitou a D. Afonso V que autorizasse Bragança a usar autorização que lhe tinha sido concedida por D. João I. Esta nova feira, concedida no ano de 1439, não deve ter beneficiado muito a vila, porque a 15 de julho de 1455, D Afonso V, a pedido de D. Fernando II, Duque de Bragança, que pretendia dar um novo impulso à vila, que estava despovoada e danificada, o que não permitia que fosse bem guardada, autorizou que se fizesse uma feira franca anual, de dezasseis dias, de 25 de janeiro a 9 de fevereiro, concedendo-lhe a regalia de cobrança de metade da sisa e de outros privilégios. Segundo Virgínia Rau, este diploma, cujo original estava arquivado no Museu Municipal, terá evoluído muito ao nível das medidas de carácter fiscal e comercial, o que constituiria um regime fiscal quase completo, muito avançado face à legislação que em séculos anteriores se fazia sobre estes assuntos.
No ano de 1514, o alcaide levou a Câmara a acordar que as mercadorias só pudessem ser vendidas na praça dentro da vila. Os moradores do arrabalde protestaram, alegavam que dentro de muros já havia dois dias de mercado por semana e que no arrabalde, na praça de S. João, sempre houve mercado desde a fundação da cidade, Carta de Foro de cidade dada por D. Afonso V, no ano de 1464. 
O Duque, D. Jaime, por sentença de 4 de outubro de 1514, resolveu o conflito de interesses, concordando com a Câmara para que as mercadorias grossas – pão, palha, azeite, sardinha e pescado – fossem vendidas na praça da vila e que ficasse livre a venda das mercadorias miúdas.
No ano de 1530, a cidade de Bragança contava com 2000 habitantes. No ano de 1539, iniciou-se a construção do Convento de Santa Clara, junto às Eiras do Arcebispo, atual Praça Camões, local na altura na periferia da cidade, Convento que no ano de 1562 foi entregue à Companhia de Jesus, altura em que na vizinhança já se construíam outras construções, pela polaridade que este empreendimento representava. Assim, a Praça de S. Vicente foi ganhando lugar central em termos urbanos, na ligação entre o castelo e o núcleo habitacional emergente, retirando importância à Praça de São João como centro cívico e local de realização de feiras. A Casa da Alfandega, que na primeira metade do século XVIII se localizava nas imediações da Praça de São João, no ano de 1871 passou para a Praça de S. Vicente.
Já no princípio do séc. XVII, a feira do gado realizava-se na Praça da Sé e nas Eiras do Arcebispo. No ano de 1618, a Câmara decidiu proibir a venda de bois na praça do Colégio e nas Eiras do Arcebispo, impondo a venda em zona não urbanizada, por cima do Mosteiro das Freiras de Santa Clara, num amplo campo que veio a designar-se de Santo António, após a construção da capela com esse nome, no ano de 1708. Significa que, meio século após a instalação dos Jesuitas, a área envolvente do Colégio tinha evoluído como espaço urbanizado.
Postura municipal de 1619, referindo-se à venda de peixe, obrigava à sua venda na Praça do Colégio, na de S. Vicente e nos dias de feira na Praça da vila. Já no ano de 1685, parte do terreiro público da Praça de São João tinha sido entregue ao Convento de São Bento, o que evidencia a perda de relevância deste espaço como terrado de feira.
Por resolução de 31 de agosto de 1728, D. João V concedeu, a pedido da Câmara, que além da feira mensal, fosse autorizado que às terças-feiras se realizasse feira dos mesmos géneros, uma vez que a população tinha aumentado, havia quatro conventos, dois hospitais, além da guarnição militar com cerca de mil homens. Nesta época, no ano de 1732, a cidade tinha 869 fogos e 2077 pessoas.
Um século depois, no ano de 1829, a Câmara terá decidido transferir a feira que se realizava dia 21 de cada mês na Praça da Sé, onde já não se comercializava gado, para a Praça das Eiras, e posteriormente para o Toural, local para onde dois séculos antes tinha sido mudada a feira do gado.

Jorge Nunes