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Sugestões para um Natal mais saudável

Acompanhe as refeições com hortícolas e outros produtos vegetais sempre que possível. Desde as tradicionais couves cozidas aos grelos, cogumelos, purés de lentilhas, de ervilhas, de castanhas, até às mais recentes beringelas ou curgetes são excelentes formas de reduzir a ingestão de calorias, gordura animal e colesterol.
Dê preferência a preparados culinários mais simples, como os estufados (sem refogar os alimentos), cozidos a vapor ou grelhados. Evite fritar. Se assar, retire as partes mais escuras ou queimadas antes de servir.

Nós trasmontanos, sefarditas e marranos: Francisco Rodrigues Brandão (1663-1717)

Cada vaga de prisões da parte do santo ofício era acompanhada de uma vaga de fugas de cristãos-novos, da terra. Foi o que aconteceu em Vila Flor com Francisco Rodrigues Brandão e sua mulher, Isabel Gomes, pelos anos de 1650. Mudaram-se para Viseu, com seus filhos: 2 rapazes e 2 raparigas.
Tratava-se de uma família de rendeiros e grandes mercadores, ligados a outras famílias igualmente ricas e poderosas, como eram os Marcos Ferro, de T. Moncorvo e os Rodrigues Portelo, da Covilhã.
Contudo, a mudança para Viseu não apagou as vivências marranas anteriores e não abafou as denúncias feitas contra eles. Em consequência, em 1667, a inquisição de Coimbra prendeu Isabel Gomes, o filho, Lopo Rodrigues Brandão, a mulher deste, Isabel Rodrigues Portelo, e o genro, Fernão Rodrigues Portelo, viúvo de Ana Rodrigues Brandão.(1)
Isabel contava 70 anos de idade e era já viúva, tendo o marido falecido ano e meio antes. Falecidos eram já também o filho António Lopes Faro, médico, solteiro, com 26 anos e as filhas Branca Gomes, que foi casada com Pedro Marcos Ferro e a citada Ana Rodrigues Brandão. Apesar da idade, Isabel resistiu por 4 anos e meio às agruras do cárcere, saindo penitenciada em penas espirituais em 14.7.1671.
Quando foi presa, contava 4 anos o seu neto Francisco, filho de Lopo Rodrigues Brandão e Isabel Rodrigues Portelo. Por 1691, Lopo Brandão foi para França e Francisco ficou em Viseu a liderar a rede familiar de negócios que, entretanto, apesar das prisões e dos sequestros de bens pela inquisição, cresceria imenso, muito em especial desde que se meteram também no negócio do tabaco, que então florescia e a rede comercial se alargou ao Porto, Algarve, França e Inglaterra. A propósito, veja-se esta nota tirada do inventário dos bens de Francisco Rodrigues Brandão: 
— Disse que seu pai, Lopo Rodrigues Brandão, lhe deixou 350 libras esterlinas, moeda de Londres, que lhe deve o dito Luís de Castro,(2) e não havia satisfeito porque esperava a aprovação do cunhado dele declarante Domingos Pereira,(3) que assiste na cidade de Bayonne,(4) reino de França, também herdeiro do dito seu pai.(5)
Luís Castro, aliás, Nuno Rodrigues Portelo, primo direito de Francisco Brandão, não era apenas depositário daquelas 350 libras, mas também de “250 ducatões de 11 250 réis, cada um deles, (…) e lhe mandou o dito dinheiro para efeito de o ter lá seguro, por recear o prendessem pelo santo ofício”. Era uma boa fortuna: quase 3 contos de réis, um terço do orçamento anual da câmara de Lisboa naquela época. De resto havia largas contas abertas e ligações comerciais estreitas entre os dois primos. Ele próprio contou:
— Que tinha contas com Luís de Castro, morador em Londres, de diversas carregações que lhe mandava de fazenda, à cidade do Porto, por mão de Rodrigo Álvares da Fonseca e à vila de Viana, por mão de João Reimaste, estrangeiro; e das ditas carregações não sabe o que está devendo ao mesmo Luís Castro, com quem tinha a parceria nas ganancias das ditas encomendas (…) e lhe poderia estar devendo quatro mil cruzados…(6)
Eram largas contas, na verdade: 4 mil cruzados, um conto e 600 mil réis. Resulta claro também, que Francisco Rodrigues Brandão se preparava para abandonar Viseu e Portugal, receoso de ser preso. E os esbirros andariam de olho nele, especialmente o padre António Chaves, seu vizinho. Veja-se a seguinte declaração feita por Francisco:
— Vindo ele declarante para sua casa, a sua criada Isabel lhe dissera que o padre António Chaves, clérigo de epístola, morador em Viseu, duas casas acima dele confitente, viera a sua casa e andara vendo os seus papéis e entrando ele declarante em desconfiança que o dito padre lhe metesse entre os seus papéis alguma coisa que lhe pudesse prejudicar, para efeito de ser preso pelo santo ofício; e lembrando-lhe que entre os mais papéis, tinha o conhecimento dos 250 ducatões, para evitar que soubessem da dita remessa prendendo-o da parte do santo ofício, rasgou em bocadinhos e os lançou da janela abaixo; e depois viu que, por ordem do dito padre, que então estava na loja de António Teixeira Imaginário, viera um rapaz chamado José, filho de Ana de Castilho, e apanhara os bocadinhos de papel e os entregara ao dito padre (…) e este juntara os bocadinhos de papel e formara o conhecimento.(7)
Digno de um moderno filme de espionagem!... Obviamente que, com as suspeitas de fuga evidenciadas pelo conhecimento dos ducatões enviados para Londres, foi logo decretada a prisão de Francisco Rodrigues Brandão e sua mulher Guiomar Rodrigues,(8) em dezembro de 1698.
O processo de Francisco Brandão é verdadeiramente exemplar, a vários níveis. Desde logo no que respeita a ritualidade marrana, jejuns e orações judaicas. Vejam, por exemplo, como se preparavam para o dia grande:
— Lavavam todo o corpo em água quente e depois botavam um cântaro de água fria pelas costas abaixo e vestiam roupa de linho em folha e os melhores vestidos e estando sem trabalhar, rezavam a oração da Formesura de Adonay e outras mais… 
Exemplar também, pelas informações que nos dá acerca dos movimentos de mercadores e mercadorias entre Portugal, a França e a Inglaterra naquele período. Contudo, nós vamos apenas olhar para o inventário dos seus bens, o qual nos permite afirmar que ele era um homem muito rico. Vejamos:
Em dinheiro vivo, em casa, para além do que estava por conta de sua mulher para gastos quotidianos da casa e cuidados dos filhos, tinha 3 contos, 500 e tantos mil réis, o que revela uma extraordinária liquidez financeira.
Em prédios urbanos, para além da casa em que vivia, sita na Rua Nova de Viseu, avaliada em 250 mil réis, era proprietários de mais 5 moradias na mesma rua e uma sexta na Rua da Carvoeira, que todas valeriam 275 mil réis. Em Lisboa possuía metade de uma casa e uma atafona anexa, situada junto à igreja de Santa Engrácia, que valia 750 mil réis.
O serviço de louças de sua casa foi avaliado em 120 300 réis, enquanto os objetos de ouro e prata valiam 235 500, o mobiliário 144 500 e o vestuário dele 103 500 réis.
Em tecidos, chapéus, vasilhas de azeite e odres de vinho, balanças, adereços de espadas, e outros objetos contaria o valor de uns 300 mil réis.
Para se fazer uma ideia do movimento comercial de Francisco Brandão, bastará dizer que numa feira de S. Mateus fazia vendas de tecidos importados de Inglaterra, no valor cerca de 500 mil réis ou que na sua loja tinha 6 dúzias de peles de boi importadas de França. De contrário, vemo-lo a exportar lotes de anil no valor de 250 mil réis e quantidades indefinidas de vinho e aguardente. Vejamos uma das remessas:
— Disse que tinha mandado para a cidade do Porto 35 almudes de aguardente a seu primo Diogo Vaz Faro, para lhe vender na dita cidade e remeter para o Brasil (…) de que vieram em resposta 3 arrobas de pau-cravo, que estavam na dita cidade do Porto, na mão do dito Diogo Vaz Faro, como ele lhe mandou dizer.(9)
No entanto, Francisco não se considerava mercador de profissão, antes se dizia rendeiro. E trazia arrendadas as décimas do bispado de Viseu em Besteiros, Santa Eulália, Figueiredo d´Alva, Tondela… Mas também fora do bispado como era o caso de algumas terras de Pinhel. Em Besteiros, para recolher décimas do vinho, dispunha de “30 tonéis e algumas pipas” e na Sabugosa tinha o alambique instalado a fabricar aguardente.
Resta dizer que Francisco R. Brandão saiu condenado em cárcere e hábito no auto de 18.12.1701 e faleceu em 20.10.1717, sendo enterrado no convento de Santo António dos Capuchos. Esta informação foi-nos dada por seu filho Lopo Rodrigues Brandão, preso em 1724, juntamente com 5 de seus irmãos.

 

Notas:
1 - Inq. Coimbra, pº 2642, de Isabel Gomes; pº 6581, de Isabel Rodrigues Portelo; pº 10466, de Fernão Rodrigues Portelo. Não conseguimos encontrar o processo de Lopo Rodrigues Brandão.
2 - Inq. Coimbra, pº 9938, de Francisco Brandão.
3 - Luís Castro foi nome adotado por Nuno Rodrigues Portelo, quando chegou a Londres, para não comprometer os seus correspondentes comerciais em Portugal. 
4 - Domingos Pereira era natural de Tavira, boticário em Viseu onde casou com Isabel Gomes Brandão, filha de Lopo Brandão e sua segunda mulher, Maria Gomes, fugindo depois para a França.
5 - Inq. Coimbra, pº 8867, de Francisco Rodrigues Brandão.
6 - Idem.
7 - Ibidem.
8 - Idem, pº 7621, de Guiomar Rodrigues, filha de Fernão Rodrigues Portelo, da Covilhã e de sua segunda mulher, Leonor Mendes, de Trancoso. A esse tempo, Leonor era já viúva e ausente em França. Quando foi presa, Guiomar ia grávida e na prisão teve um filho, que foi batizado com o nome de Matias.
9 - Idem, pº 8867.

Deitaram o Pai Natal no presépio no lugar do Menino Jesus

Arrancaram o Menino do regaço da Virgem Maria, Sua mãe
subtraíram-No ao abraço de São José, Seu pai
e puseram a criança nua
a dormir ao relento
numa noite fria 
no meio da rua

        Quem?
        Os donos do mundo, quem haveria de ser?
        e todos nós também que estamos a promover
        tão desalmado acontecimento
        embora sem o saber

Arregimentaram depois um machucho velho
barbudo, imundo, anafado
que apelidaram de Pai Natal à margem do Evangelho
converteram-no em mito comercial
e deitaram-no na manjedoura vazia
para vender a palha do berço sagrado
e o esterco do curral da apostasia

        Que Deus nos valha!

O vento da guerra perpassa agora por toda a Terra
e a Paz jaz sepultada em túmulos de dor
lado a lado com o Amor

Na Europa governada por pilatos devassos
relapsos, cobardes, coniventes
já livremente acometem os ogres de Herodes
e demais facínoras dementes
que escarnecem da Virgem Maria
tratam São José com aleivosia
vilipendiam Cristo e a Cruz
e assassinam santos inocentes
tentando matar à nascença a Divina Criança
o pequenino Jesus

        É tempo de choro e de ranger de dentes
        de clamor e indignação
        para quantos em cujo coração
        ainda pulsam o Amor e a Liberdade

Já esmorece a luz da Esperança 
já enfraquece a força da Verdade 
já a democracia dá sinais de derrota
impera a corrupção

        De novo chora a Nação
        tarda a revolta da Razão

Ó povo! É a hora!

Boas Festas
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

A prenda

Por razões culturais, mais do que religiosas, dezembro continua a cheirar a afetos. Em tempos onde os valores se misturam, emergem radicalismos com os quais nunca pensaríamos voltar a ter de ser confrontados. A cada alvorada somos surpreendidos por mais uma novidade que vai desvirtuando o sistema de valores que alicerçam a dignidade do homem e interpela sobre este existir.
Neste momento, sobressalta-me a forma como os dados pessoais de cada indivíduo estão a ser monitorizados e a celeridade com que diversas plataformas da administração pública cruzam informação. A título de exemplo, e depois de outros, está o governo a testar uma aplicação direcionada para a administração escolar que também irá recolher dados do ministério da saúde, possibilitando aos serviços administrativos conhecer, entre outros dados, o tipo sanguíneo de um aluno. Esta visão da realidade que se vai construindo silenciosamente, afigura-se-me como atentatória das liberdades e garantias conquistadas nas últimas décadas. Não admira pois que se queira tapar o “sol com a peneira” quando se propala a proteção de dados, se pedem autorizações para as pequenas coisas e se escancaram as portas para o essencial da vida.
Este afã da devassa da vida de qualquer um, não é só bandeira das televisões, mas o próprio estado passa a intrometer-se nos pormenores do quotidiano, repercutindo-se na vida de cada um, e condicionando a dinâmica social, sendo que, quanto mais reduzida for a comunidade, mais impacto tem o factor condicionante.
Nesta era de cruzamento de dados, lembrou-se a governação de alterar o Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social mediante o Decreto-lei n.º2/2018 de 9 de janeiro. Em termos gerais, altera as taxas contributivas dos trabalhadores independentes mas também procede a alterações no que respeita à acumulação da atividade independente com a atividade por conta de outrem. Em linguagem corrente, pretende-se que quem trabalha por conta de outros mas, em vez de ir para o sofá depois das horas dadas ao patrão, considera que faz sentido fazer algo de útil e, ao mesmo tempo, daí tirar algum rendimento, passe a pagar mais uma contribuição.
Tendo uma perspetiva nacional, pode ter-se uma leitura não coincidente com a que se faz quando a análise se foca numa dimensão regional. Sem grande margem de erro, na realidade transmontana, mais de noventa por cento dos contribuintes que se encontram nesta situação são-no porque, ou por herança ou por amor à terra, são proprietários de pequenas parcelas. Das mesmas podem retirar um rendimento que, na maior parte dos casos, nem dará para pagar os custos de produção. Mas, o certo é que se o rendimento mensal médio for igual ou superior a quatro vezes o valor do indexante dos apoios sociais, fica o trabalhador sujeito ao pagamento de contribuições.
Em termos concretos os efeitos já se fazem sentir: recebida a informação da segurança social em julho, já há quem no mês seguinte tenha ido alterar a sua situação nas finanças. Agora que a entrada em vigor do diploma se aproxima quer parecer-me que muitos mais irão fazer isso. 
Se com esta prenda, é que o governo pretende dinamizar as terras do interior e combater o seu abandono, garantidamente errou a estratégia. Mais uma vez a discriminação positiva ou a atenção especial para com os territórios de baixa densidade não passam de figuras de retórica. Também não me parece que venha a ser criado um regime de exceção para quem trabalha a terra e ao mesmo tempo seja trabalhador dependente – não só não há dimensão, como quem nos representa não colocará esta questão na sua agenda.
Se as terras ficam a monte multam por não estarem cultivadas, se estão cultivadas pagam porque tiram proveitos. É caso para dizer: com prendas destas, o melhor é dedicarmo-nos à pesca.

Tanto com tão pouco. Tanto para tão pouco

No encerramento do Conselho Raiano, dedicado ao Ensino e ao Futuro dos Territórios Raianos levado a cabo pela Rionor, a Presidente da Câmara de Mirandela, Júlia Rodrigues, enquanto anfitriã da última jornada, ao agradecer a presenças das entidades presentes (o Ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues e o Consejero de Educación de la Junta de Castilla León, Fernando Rey, entre outras individualidades dos lados de cá e de lá da raia nordestina) reconheceu e elogiou o muito que a Rionor faz, com os poucos meios que tem. Não sendo grande novidade para todos os que, de alguma forma, acompanham as actividades da Associação com sede em Rio de Onor, não deixa de ser relevante e é, de alguma forma, reconfortante ver reconhecido o esforço, empenho e resultado que a equipa liderada por Francisco Alves está a levar a cabo de ambos os lados da fronteira que o nordeste partilha com Castilla León. E é bom acrescentar que muitas das actividades que a este nível são concretizadas implicam um trabalho imenso de bastidores que sendo invisível para o público em geral, raramente é conhecido e, logicamente, ainda menos reconhecido. Curiosamente, num dos intervalos das jornadas rionorenses comentava exactamente este tema com o Norberto Veiga, a propósito do trabalho intelectual que implica, para a maioria de nós, muito suor, esforço e dedicação. Por coincidência, nesse mesmo fim de semana, remexendo em papéis velhos encontrei, por acaso, vários textos meus, com mais de trinta anos. Manuscritos, obviamente, e muito rasurados com leitura difícil a que, quando tiver tempo, me hei-de dedicar. Contudo saltou-me à vista e reconheci, de imediato, o primeiro esboço de uma descrição em que comecei a trabalhar no princípio dos anos oitenta e que apenas foi publicada integrada no meu romance, A Morte de Germano Trancoso, com mais de três dezenas de anos passados. Teve, obviamente, incontáveis versões, sendo que de muitas delas, por causa da facilidade de escrever, modificar e copiar, em computador, não ficou qualquer registo. Não se perdeu nada! 
Disto o que é importante relevar é que ao constatar que com poucos recursos se fez muito, é bom não esquecer que é necessário acrescentar ao visível a imensidão do que fica escondido e, muitas vezes perdido, para que se consiga algum valor ao produto final.
Das jornadas em si, a douta comissão designada para tal, trará a público as respectivas conclusões. Sem me querer antecipar não ignorando a qualidade dos respectivos membros não quero deixar de trazer aqui uma pequena provocação que a escassez de tempo impediu de levantar na altura. Um dos temas mais falados e defendidos por todos os intervenientes foi o da cooperação. É uma realidade inelutável. Cada vez mais o que se faz de bem feito e com valor, resulta de trabalho cooperativo e coordenado. É assim no trabalho mas também na investigação e inovação, onde residem, cada vez mais, as mais-valias importantes para o desenvolvimento futuro. Sendo assim, porque é que os exames continuam a ser individuais e não se valorizam adequadamente os trabalhos de grupo? Já agora, numa altura em que os diplomas deixaram de ser a garantia de uma ocupação futura, porque é que o ensino continua virado e focado na obtenção do certificado final de aprovação?
BOAS FESTAS!

Água mole – Ponto de vista dois

Falei do que me parecem ser os benefícios dos fenómenos migratórios. Mas convém tentar ver outras coisas. Mesmo que existisse uma política global, séria, sistemática de recrutamento e integração de imigrantes, isso não isentaria de obstáculos. Repito o que disse noutra altura: viver nestas sociedades ditas ocidentais, não é pera-doce. É certo que vistas de fora elas reluzem e atraem. Mas o relativo desafogo material de que desfrutamos leva-nos couro e cabelo, pagamos com língua de palmo o relativo bem-estar, a ordem, a segurança. Noutras partes do mundo a existência, embora menos segura, é mais relaxada.
Não podendo acolher todos os que de alguma forma se sentem insatisfeitos nas suas terras, porque são muitos, a europa pode integrar uns quantos milhões. Mas duvido que aqueles que a procuram para refazer as suas vidas no aspeto material tenham consciência daquela realidade. E quanto a saberem que ela é apenas a parte visível de uma história de dois mil e quinhentos anos, nem se fala. Além do mais, para os corajosos o panorama não é cor-de-rosa. Esperam-nos pelo menos duas ou três gerações de sacrifício, com dificuldades maiores ou menores em assimilar a língua, a cultura, a mentalidade dos residentes, enquanto vão cortando o cordão umbilical com as de origem, processo penoso que pode não correr bem, e por vezes não corre. Durante esse período, o mais provável é que a grande maioria dos recém-chegados ocupe posições sociais de pouco prestígio e baixos rendimentos. Sobretudo as segundas gerações, já cidadãos de pleno direito mas ainda com hesitações quanto à identidade, podem ter tendência a sentir-se desenraizados, injustiçados, revoltados. Um caldo de cultura propício ao germinar de marginalidades, delinquências ou até crime, como mostram os milhares que se juntaram ao daesh. Ou seja, mesmo uma situação ideal já implica transtornos que bastem. Tudo se complica, obviamente, no caso das deslocações selvagens em massa como as que estão a acontecer, dado o seu potencial desestabilizador.
Uma parte dos intelectuais europeus interiorizou os abusos da exploração colonial, que são factos inegáveis (com a escravatura em plano de destaque), em forma de má-consciência, sentimento reforçado pela noção das regalias de que nesta parte do mundo hoje desfrutamos e que contrastam com as condições menos favoráveis em que vive parte significativa da humanidade. Ora, como é sabido, toda a culpa redunda em desejos de expiação, sendo compreensível que, para muitos, esses complexos latentes sejam despoletados ao depararem-se com aqueles botes a abarrotar de pessoas ameaçando ir ao fundo no meio do mediterrâneo. São cenas que impressionam quem quer que tenha alguma sensibilidade. A este propósito penso nos documentários do início do século passado que mostram imigrantes de toda a europa a chegar à ilha nova-iorquina de ellis. Mesmo à distância não há frieza que resista perante o retrato vivo da pobreza, da fragilidade, da humildade humana. Porém, essa visão romântica contrasta vivamente com a que mostram muitos migrantes de hoje.
Não é o caso de pôr em dúvida a sua qualidade de vítimas, particularmente de redes de tráfico que os exploram e enganam. No entanto, para além de tomarem decisões voluntárias, há em muitos deles uma série de sinais que intrigam e retiram seriedade àquilo que nos é apresentado como problema humanitário. A começar pelo facto de se tratar de gente com muito bom aspeto, que domina as últimas novidades tecnológicas, se exibe em festa para as câmaras mal acaba de saltar a rede em mellila com a ligeireza de quem acaba de ganhar uma competição e, enquanto executa os mesmos trejeitos mímicos de quem está num reality show, deixa imediatamente clara a exigência de um país preferido: germany! england! 
E há outras estranhezas. Conhecemos bem a máxima “quem não tem vergonha, todo o mundo é seu”. Ora, quanto a isso, fico com a incómoda impressão de que a globalização deu a muita gente a sobranceira ideia de que “é tudo nosso”. Afeta-me um pouco que cheguem repletos de direitos, exigindo, manifestando-se, lamentando as fracas condições que encontram pelo facto de terem pago não se sabe a quem uma certa quantia em dinheiro. Coisas que não podem ser encaradas à la légère. E ao exprimir os seus receios perante elas, o cidadão europeu comum não precisa de ser xenófobo ou racista.

Tradição e originalidade nos presépios

Qua, 26/12/2018 - 09:54


Olá, como estão os leitores da nossa página?
Estamos a viver o Natal de 2018 e, para mim, o 29.º no seio da Família do Tio João. Na sexta-feira passada fiquei muito sensibilizado com a atitude de uma pessoa que ao ver um invisual que queria passar a estrada na passadeira da Av. Sá Carneiro, junto à entrada para o túnel sem que os automobilistas parassem, foi mandar parar os carros e ajudou-o a atravessar em segurança.
São estes gestos que nos sensibilizam para o espírito de Natal, que deveria ser todos os dias do ano e não só nesta quadra.

Nunca mais é Natal!?

Seg, 24/12/2018 - 11:56


Calha este ano que a edição próxima do solstício de Dezembro sai no próprio dia de Natal, adaptação cristã de celebrações que, pelo menos desde o Paleolítico Superior, são observáveis entre os humanos, na sua relação com o pulsar da natureza, resultante da percepção que lhes era possível dos ritm