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Mirandela em desvantagem na derradeira eliminatória

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Ter, 13/06/2017 - 16:53


Está complicada a tarefa do S.C. Mirandela na segunda eliminatória do play-off de manutenção do Campeonato de Portugal Prio. Os alvinegros perderam o primeiro jogo com o Tourizense por 2-0 e estão obrigados a vencer por 3-0 no segundo jogo no São Sebastião.

Prevenir e tratar a gota

A hiperuricémia pode ser assintomátia ou seja, não dar sintomas, mas geralmente leva a quadros de inflamação aguda ou crónica nas articulações.

A doença é mais frequente no sexo masculino e tem início habitualmente entre os 40 e os 60 anos. A sua prevalência aumenta com a idade sendo que, a partir dos 60 anos, a prevalência no sexo feminino se aproxima da do sexo masculino.

A obesidade, a hipertensão arterial, a hipertrigliceridemia e a insuficiência renal aumentam o risco de surgimento da gota.

NÓS TRASMONTANOS, SEFARDITAS E MARRANOS - Em volta do Congresso Internacional de Cultura judaica

Nesta semana realiza-se em Bragança um Congresso Internacional de Cultura Judaica. Trata-se de um acontecimento de transcendente importância. Sobreleva ainda a qualidade dos intervenientes anunciados, tando os nacionais como os estrangeiros.
Antes de mais, devemos dar os parabéns aos organizadores, particularmente à Câmara Municipal de Bragança. E também à Cátedra de Estudos Sefarditas Alberto Benveniste, da Universidade de Lisboa, responsável pela coordenação técnica científica do congresso.
Mais ainda pelo trabalho que a mesma Cátedra vem desenvolvendo desde os anos 90 do século passado no domínio da investigação e divulgação da problemática marrana e sefardita. Não podiam, pois, os signatários alhear-se de um tal acontecimento, uma vez que, desde há 18 anos se vêm dedicando à publicação de trabalhos sobre a matéria.
Com efeito, em 15.4.1999, no jornal “Terra Quente” abriram uma página com o título: “Caminhos Trasmontanos de Judeus e Marranos”. Ao longo mais de 14 anos, a página manteve-se aberta publicando-se mais de três centenas de textos.
Em simultâneo, em variadas revistas, foram publicando textos de maior fôlego sobre a matéria, bem como uma dezena de livros, referentes a uma grande parte dos municípios do Nordeste trasmontano.
A página do “Terra Quente” fechou-se por alterações provocadas na propriedade e orientação do jornal. Em Junho de 2016, nova página se abriu, agora no semanário “Nordeste” que se publica em Bragança, desta vez com o título: “Nós, Trasmontanos, Sefarditas e marranos”.
Fundamentalmente o trabalho foi e é baseado na leitura, transcrição e estudo de processos da inquisição portuguesa. Mais de um milhar até agora!
É um trabalho para nós aliciante e que consideramos fundamental não só para o estudo da cultura judaica e marrana, mas também da história local e regional. Nenhuma espécie de acontecimentos marcou mais profundamente o evoluir da sociedade trasmontana do que as constantes vagas de prisões, seguidas ou antecedidas de fugas massivas de “gente da nação” com a paralisação dos negócios, a ruína das empresas e a saída de capitais.
Verdadeiros “tsunamis” arrasaram povoações, como aconteceu em Mogadouro onde, num único dia, se passaram mandados de prisão sobre umas 120 pessoas, metade das quais foram arrastadas para as masmorras da inquisição e a outra metade conseguiu fugir.
Ou em Quintela de Lampaças, onde no dia 13.12.1637 foram mandadas prender 19 de entre os 23 apontados como “judeus”, e enviada ao santo ofício uma lista de outros 41 que se anteciparam na fuga.
Em Mirandela, uma lista de decretados a prisão em Maio de 1662, incluía 78 cristãos-novos, entre eles o pai do dr. Francisco da Fonseca Henriques, médico do rei D. João V.
Em Sambade, Carção, Vinhais, Vila Flor… as “entradas” da inquisição fizeram soltar tempestades de medos e ódios que penetraram profundamente no tecido social e o destruíram. Foi como se todas as forças do inferno se abatessem sobre as comunidades de “gente da nação”.
Se perguntarmos qual o dia mais importante na história de Bragança, a generalidade das pessoas não hesitará em dizer que foi o dia 20 de fevereiro de 1464, quando foi elevada à categoria de cidade. Por nós consideramos que foi 4 de maio de 1741, o dia em que o povo de Bragança de mobilizou em uma fantástica manifestação, à frente da qual seguiram centenas de “freiras” dos dois conventos, em protesto contra o monopólio do sabão entregue à tríade familiar mais poderosa da terra, constituída pelo alcaide do castelo, o comissário local da inquisição e o comandante militar.
O monopólio do sabão prejudicava essencialmente “a gente da nação”, fabricantes de sedas. A multidão de povo, pelos hebreus mobilizada, subiu ao castelo e atirou pelas muralhas o sabão do monopólio que ali se encontrava para venda. Onde é que se viu tamanha ousadia em tais tempos? Quem aponta uma tão intensa jornada de mobilização cívica, em tempos do antigo regime? Que episódio da luta de classes poderá comparar-se-lhe? Claro que de seguida, foi um arraso: centenas de homens e mulheres “metidos na inquisição”.
Parecidos “tsunamis” assolaram Vinhais, Miranda do Douro, Vila Flor, Chacim, Torre de Moncorvo… e tantas outras terras Trasmontanas. O atraso e o despovoamento de Trás-os-Montes terá começado exatamente aí, com a decapitação do elemento mais instruído e mais empreendedor da sociedade.
Sim: os processos da inquisição mostram-nos que os lagares de azeite e os moinhos de pão se encontravam predominantemente em mãos da “gente da nação”. Constatámos isso em Mirandela, Torre de Moncorvo e Quintela de Lampaças, nomeadamente.
O mesmo acontecia com a indústria “hoteleira”. Em Bragança, Miranda do Douro, Torre de Moncorvo, Vila Flor… vimos a inquisição prender estalajadeiros e constatámos que as estalagens eram os grandes centros difusores de notícias, locais de contactos empresariais e bolsas de negócios.
As grandes “unidades industriais” foram instaladas por eles. Em Freixo de Numão, por exemplo, assistimos à prisão do proprietário de uma destilaria de aguardente montada no sítio do Vale da Cabra, Alijó, que valia um conto e 200 mil réis, de onde saíam anualmente mais de 50 pipas de aguardente para a exportação.
O sumagre era então um dos produtos que mais pesava na balança comercial portuguesa. Pela barra do Porto anos havia em que saíam para o Norte da Europa mais barcos carregados daquele produto do que de vinho. E a grande região produtora era o Alto Douro. Também essa indústria corria por mãos de hebreus, como o provam as atafonas que encontramos nos inventários de prisioneiros, de Carção a Vila Flor, de Lebução e Vinhais a Foz Côa a Freixo de Espada à Cinta…
Que dizer da produção de linho cânhamo? Em Mirandela, nem a Casa dos Távoras superava o hebreu Dr. Manuel Pereira da Fonseca que, em 1693, produzia 360 pedras de linho. Em Torre de Moncorvo eram “judeus” que faziam andar a real fábrica de cordoaria.
Da indústria das sedas, nem precisamos falar. A Rua Direita de Bragança era verdadeiro complexo industrial sericícola, com cerca de duas dezenas de oficinas, todas pertencentes a hebreus. Chacim, Vila Flor, Lebução, Vinhais, Torre de Moncorvo, Freixo de Espada à Cinta… seguiam progressivas no fabrico de sedas.
Mais nobre ainda e engrandecedora será a galeria de economistas como Francisco Vaz Eminente, cujo nome ficou ligado ao imposto alfandegário aprovado por Filipe IV; advogados como André Nunes ou António Manuel Pissarro; pensadores, como Baltasar Oróbio de Castro; banqueiros como Manuel Cortiços, Rafael Henriques ou António Rodrigues Mogadouro; diplomatas como Manuel Fernandes Vila Real; médicos como o Dr. Mirandela, Jacob de Castro Sarmento ou Efraim Bueno, o Fastio, de alcunha, que mereceu ser retratado por Rembrandt.
Porém, a coisa mais importante que em Trás-os-Montes a gente marrana deixou de herança encontrar-se-á no mundo da genética, das tradições, da etnologia e da gastronomia.
Se a história de Trás-os-Montes precisa ser reescrita, contando-se as grandezas e misérias do elemento hebreu da sociedade, ela mesma deverá, por outro lado, ser tida em conta na promoção do progresso e do futuro, nomeadamente nas áreas do turismo e da cultura. Foi esse o objetivo que nos levou a abrir as ditas páginas dos jornais “Terra Quente” e “Nordeste” – o de traçar uma Rota dos Judeus em Trás-os-Montes.
Um dos primeiros livros que publicámos foi em 2008, com o título de “Carção Capital do Marranismo”. Nele ficou evidenciada a noção de “marranismo” (diferente de judaísmo) e descrita a Rota local que, graças ao esforço da gente de Carção (permitam que cite o nome do Prof. Paulo Lopes) foi engrandecida com a inauguração do “Museu Marrano”, a primeira obra do género em Trás-os-Montes!
Obviamente que os turistas se não deslocam de Inglaterra ou França para visitar uma aldeia e um pequeno museu. Nem tão pouco de Lisboa ou Porto. Mas sempre pensámos que atrás de Carção, outros museus e centros de documentação iriam abrir-se, numa Rota dos Judeus em Trás-os-Montes. Sim, Trás-os-Montes possui um fantástico património judaico e marrano para mostrar ao mundo.
Passou há 2 anos o 3º centenário do nascimento de Jacob Rodrigues Pereira, o grande mestre da alfabetização dos surdos-mudos, possivelmente o Trasmontano e Sefardita mais conhecido no mundo. Talvez mais conhecido lá fora do que em Trás-os-Montes, terra de suas origens. E nós nem sequer um lápide conseguimos descerrar, comemorando a efeméride!
Hoje a sua descendência em França representa mais de 400 membros, segundo informação do nosso amigo e estudioso, Dr. António Cravo, “distribuídos pelo mundo dos negócios, em bancos, companhias de seguros e empresas imobiliárias”. Será que algum dia, a algum deles chegou algum apelo da terra Trasmontana? A nós cumpre a responsabilidade de pedir perdão pelos malefícios da inquisição e fazer o convite aos descendentes dos perseguidos para que venham conhecer a nossa casa comum.
E os descendentes de milhares de homens e mulheres que deixaram Trás-os-Montes por causa da inquisição e foram dar vida a chãos estranhos?
Diz-se que muitos deles levaram a chave de casa, com ideias de um dia voltar. Pois, daqui lançamos o apelo a que voltem. A Casa Trasmontana espera por eles.
Muito do nosso trabalho de investigação foi feito por solicitação de um conhecido arquiteto canadiano cujo pai morreu sob os céus de Varsóvia quando o seu avião foi abatido pelos nazis na segunda grande guerra. Tal investigação teve (e continua a ter) por objetivo a descoberta e conhecimento de seus ascendentes, em terras Americanas e Europeias, no âmbito de um “Genome Project”. Não imaginam a sua emoção quando, em visita de estudo e romagem, chegou a Miranda do Douro, à Rua da Costanilha. No próprio dia nos enviou um e-mail dizendo o seguinte:
- Cerca de 366 anos depois, às 7 horas e 33 minutos do dia 7 de Junho de 2011, cheguei ao lugar de onde partiu o meu primeiro ascendente de nome Henriques, que chegou à Jamaica.
Nos últimos anos algumas iniciativas são de assinalar no domínio da investigação das nossas raízes judaicas e cultura marrana, assinalando-se a realização de Jornadas em Vimioso, Alfândega da Fé, Torre de Moncorvo… e agora um Congresso Internacional em Bragança, acompanhado da abertura de dois espaços museológicos e de interpretação da cultura judaica. Esperamos que seja um grande passo na construção de uma grande Rota dos Judeus em Trás-os-Montes.

Cumpriu-se a trilogia de Bragança

Foram três longos anos a pensar Bragança, as suas gentes, os seus costumes, a sua história, passeando nostalgicamente por uma Bragança antiga, com ruas e becos que já não existem, ou se modernizaram.
Em maio de 2015 saiu o meu primeiro romance intitulado: “O Milagre de Bragança” é uma história de judeus antigos, cristãos novos que contribuíram para o desenvolvimento de Bragança e para o milagre da sede que trouxe riqueza e fama a uma pequena cidade perdida entre montes e o devir da História. É um romance em que se revisitam os hábitos, costumes, crenças e preconceitos duma cidade antiquíssima, o colégio dos jesuítas e as memórias do velho Liceu Nacional de Bragança, com a sua academia e as suas imortais comemorações do 1º de dezembro. “Coimbra em miniatura”.
Em maio de 2016 saiu o contraponto a este primeiro romance: “Quando as mães saíram à rua” que desvela um outro lado de Bragança, mais sombrio, onde se evidencia a longa noite bragançana e se revisita o tão falado caso das “Mães de Bragança”, ou melhor dizendo, o caso de algumas, poucas, esposas de Bragança a quem a revista Time deu voz excessiva e universal.
E finalmente em maio de 2017 e por sugestão do presidente da Câmara de Bragança, Hernâni Dias saiu o romance: “Pão Centeio”. O autarca bragançano sugeriu que depois de dois livros onde a narrativa perpassa pela cidade de Bragança, seria interessante um último romance, fechando a trilogia, sobre a problemática do meio rural do nordeste. E assim foi. O título “Pão Centeio” é justificado por uma personagem do livro: “Ao escritor do futuro exorto que o livro se intitule “Pão centeio”, em memória do pão, cozido no forno de lenha e que matou a fome a tanta gente que procurou a taberna no fim da caminhada. Em memória do pão centeio que ajudou a criar tantos transmontanos, tão valentes, sábios, santos e honrados.”
A narrativa deste romance assenta em três personagens principais. Um pedinte que percorreu todas as aldeias de Bragança, conhecedor do mundo e da vida. Carregava consigo uma estranha loucura e uma lucidez quase profética que assustava, visionando a desumanização e a desertificação das aldeias transmontanas, para logo acrescentar: “O Nordeste tem futuro, por favor não desistam. Não deixem morrer as aldeias tão bonitas da nossa terra. Lembrem-se sempre da Fénix que renasce das cinzas”. Este pedinte misterioso tinha fama de ter sido capitão-de-fragata que enlouqueceu depois dum trágico naufrágio em alto mar, com centenas de mortos. Fez-se ao mundo como pedinte nómada.
Uma outra personagem é um sargento aposentado que regressou à aldeia depois de ter feito a guerra da Índia, de Angola, de Moçambique e da Guiné. Convive com o capitão, entre memórias, mortos de guerra e o princípio da desertificação do nordeste. Dois homens estranhos que carregavam consigo medos antiquíssimos de guerras infindas. Os militares morriam na guerra. E a emigração despovoava as aldeias. Aconteceu o 25 de abril, vieram os “retornados”. O país mudou mas a desertificação das aldeias transmontanas continua e o Poder Central “a assobiar para o lado” como se este drama da morte anunciada do meio rural não existisse. Mas o capitão, todos os dias, ao alvorecer, manda ao sargento formar a 1ª Companhia dos sonhos para que o sonho ainda seja possível.
A terceira personagem é um engenheiro civil que regressa de Angola depois da independência. Filho do taberneiro da aldeia e que se cruza com o capitão e o sargento e vai recolhendo para memória futura o devir da aldeia ao longo do ano: “Capitão, agora não pode ir, tem que me contar todas as memórias da taberna, o que se comia, quem chegava, o que as pessoas faziam à roda do ano! Tem que me contar tudo, Capitão! Já comecei a escrever o nosso livro.”
E assim se fecha um longo trabalho de três anos. A humílima trilogia de Bragança que eu fui capaz de escrever, aqui fica para que os vindouros não se esqueçam. Foram muitos dias, muitas noites pensando Bragança e as suas gentes. Mas valeu a pena. O Nordeste vale a pena.
fnrcalado@gmail.com

O pior dos populismos

No entendimento comum a palavra “sentimento”, embora possuindo mais ampla significância, é associada sobretudo a estados de tristeza, enquanto a palavra “afecto” é mais voltada para amor e amizade.

Marcelo Rebelo de Sousa é mais político de afecto que de sentimento.

Quando se julgava não haver mais escândalos envolvendo figuras públicas graúdas, o Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) acaba de acrescentar mais um à lista que é, pelos vistos, interminável, ao noticiar que António Mexia, presidente executivo da EDP, e outros administradores, estão indiciados por crimes de corrupção no estabelecimento das compensações que esta empresa negociou com o governo de José Sócrates, em 2007.

Estes magnos eventos de corrupção, que apenas são noticiados quando caiem na alçada da Justiça, muitos mais haverá, não merecem o afecto dos portugueses. Bem pelo contrário. Provocam, sim, audíveis sentimentos de revolta, sobretudo porque afectam gravosamente as economias das famílias e das empresas e as contas públicas, como no caso vertente, em que consumidores e contribuintes são visivelmente explorados.

Sentimentos de revolta e tristeza face à vergonhosa situação em que caiu a governança da Nação. Revolta que tem sido, felizmente, pacífica, mas que acaba por se reflectir no elevado índice de abstenção eleitoral e no desprezo generalizado da classe política e dos partidos, justa ou injustamente.

Idêntico sentimento de revolta não é demonstrado, porém, pelo senhor presidente da República, pelo senhor primeiro-ministro e demais machuchos do Regime, no poder ou na oposição, que parecem ignorar estes magnos problemas nacionais como se nada tivessem a ver com eles.

Isto ilustra uma clara subordinação do poder político ao poder económico, contrária à Constituição, para não falar de promiscuidade, ou muitos dos arguidos não tomassem assento, ora nas cadeiras governamentais, ora nas chorudas administrações privadas.

Vai sendo tempo dos nossos políticos perceberem que os portugueses, faz tempo, esperam com impaciência, sobretudo do presidente da República, dentro da dinâmica que o elegeu, mas também do primeiro-ministro e da oposição, discursos e atitudes mais transparentes e reformistas e menos populistas.

O povo não precisa de políticos que explorem as suas alegrias. Precisa de governantes que, com sinceridade, vibrem e comunguem dos seus anseios, sacrifícios e revoltas.

Por isso a reforma das instituições políticas tendente a repor a verdade na representação democrática, o debate ideológico e a moralizar a vida pública, minorando o despesismo do Estado e todos os vícios do regime, designadamente a corrupção, o compadrio e o clientelismo, é cada vez mais instante e crucial.

 Urge, por isso, que os partidos políticos deixem de se assumir como guardas prisionais da democracia, sendo a Assembleia da República a sua prisão.

O populismo de Estado, o populismo do poder, é o pior dos populismos porque abafa as justas reivindicações populares e abre portas a todas as aventuras malignas.

Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

O MANSO E O GUERREIRO I - OS BUFOS

Com a aproximação do período eleitoral são muitas a solicitações e é grande o próprio impulso para nos pronunciarmos sobre alguns dos muitos candidatos que se perfilam para solicitarem a confiança dos eleitores, seja para lhes elogiar as qualidades, seja para lhes apontar as faltas e as incongruências. Em vez disso resolvi dedicar-me a dar voz a dois anciãos nordestinos de seus nomes Júlio Manso e Tomé Guerreiro. Todas as tardes o Júlio e o Tomé, descem parcimoniosamente a Canelha do Campo para se sentarem em bancos de madeira feitos de troncos secos de sobreiro que um incêndio secou, em frente de uma vetusta mesa de pedra para partilharem uma generosa fatia de pão centeio apeguilhado com um naco de queijo de ovelha, curado e apimentado. Molham a palavra num palheto encorpado que trazem, à vez, em generosa cabaça de litro, rolhada a preceito com um toco de madeira aparado com mestria. Discutem a atualidade, julgam o presente, criticam o que está mal, elogiam o que se faz bem, determinam o futuro, salvam a humanidade e reforçam os laços de amizade que há décadas os identificam e irmanam.

 

– Deus nos dê boas tarde, ti Júlio

– Venha com Deus, amigo Tomé.

– Que me diz vossemecê a essa coisa que anda toda a gente a falar?

– E que coisa é essa que eu não sei?

– Não se fala noutra coisa lá por Lisboa. Parece que vamos ter de novo os bufos a darem cartas.

– Pode lá ser? Isso é coisa do antigamente. Agora vivemos em democracia e essa ocupação já não tem cabimento.

– Não tinha, mas parece que voltou a ter. Então não é que querem copiar o que se passa no Brasil e agora querem absolver a bandidagem... desde que denunciem os comparsas.

– Não pode ser.

– Eu também acho que não, mas já vi tanta coisa.

– Quer dizer que quem comete um crime pode vir a safar-se se der com a língua nos dentes?

– Nem mais. Dizem que é a única forma de combater eficazmente a corrupção.

– Essa é boa. Então a corrupção vai ser combatida com a colaboração dos corruptos? Não encontram ninguém mais credível?

– A modos que quem incriminar o parceiro, livra-se.

– E se a denúncia for mútua?

– Está bem visto! Se calhar o prémio fica para quem chegar primeiro.

– É que vai ser uma corrida! Logo que se conste de alguma investigação vai ser um ver se te avias a correr para o Ministério Público, para ganhar vez.

– E se a denúncia for simultânea?

– Então sim, fica tudo muito mais cumplicado. Vai, não vai, ainda acabam todos ilibados!  

– Pois olhe, se for assim, vamos ficar ricos.

– Era bom, era, mas não vejo como.

– Muito fácil:  assaltamos um banco.

– Ó homem você ficou maluco? Não íamos longe. Éramos logo apanhados e presos.

– Nada disso. Assaltamos um banco, de manhã, em Alfândega, distribuímos o dinheiro ao meio-dia e à tarde, exatamente à mesma hora, vossemecê vai a Vila Flor denunciar-me à GNR e eu apresento-me  no posto da Guarda em Moncorvo a incriminá-lo. Aplicam-nos a lei de forma igual e justa, como compete. Os de Vila Flor premeiam-no a si e os de Moncorvo ilibam-me a mim.

–  Não é mal pensado. Mas olhe, como isso ainda vai dar muito que falar, sente-se aqui e beba mais  uma pinga.

– Não mo diga duas vezes. À sua!

A Arquitectura e a Arte* - A partir da Obra de Nadir Afonso

Na sequência de uma visita recente ao novo edifício do Museu Nadir Afonso, em Chaves, com projecto de arquitectura da autoria de Álvaro Siza, foi motivo de reflexão o percurso profissional de Nadir Afonso, permanentemente dividido entre a sua verdadeira vocação e paixão profissional, a Pintura, e a Arquitectura, ofício no qual se licenciou em 1948, na Escola de Belas Artes do Porto[1] e que exerceu com notável sensibilidade e especial cuidado e atenção, até se distanciar por completo na segunda metade da década de sessenta do século passado, passando a dedicar-se exclusivamente à Pintura.

 Um dos aspectos mais intrigantes neste percurso, verdadeiramente original, é a justificação ou explicação que Nadir Afonso dá para distinguir claramente a prática das duas disciplinas e que o levou a abandonar definitivamente a Arquitectura. Para si, ao responder a uma determinada função, o exercício da Arquitectura fica limitado enquanto expressão criativa e artística. "A Arquitectura é regida por leis (...) de perfeição. O arquitecto deve basear-se na perfeição (que reside na) qualidade do objecto cuja função responde à nossa necessidade"[2], ao contrário das obras de arte que, segundo Nadir Afonso, resultam das leis da harmonia, livres de um utilitarismo a que a Arte não se submete.

No entanto, apesar desse conflito interior, Nadir Afonso exerceu a actividade de arquitecto durante alguns anos. E fê-lo de forma notável, quer como colaborador de alguns dos nomes incontornáveis da Arquitectura do século XX, no atelier ATBAT de Le Corbusier, em Paris e no atelier de Oscar Niemeyer em São Paulo e Rio de Janeiro, quer em nome próprio, com uma série de projectos desenvolvidos em Portugal, a partir do seu escritório em Chaves e Coimbra. De entre os projectos desenvolvidos em nome próprio, gostaríamos de aqui destacar o da Capela de Nossa Senhora de Fátima, em Alimonde, uma pequena aldeia do concelho de Bragança. Localizada no alto de uma elevação natural, designada na aldeia por "cabeço do lombo", a simplicidade do seu desenho evidencia não só a capacidade do arquitecto em dar resposta à devoção e anseios da população da aldeia e do casal que fez a encomenda mas, sobretudo, a importância do lugar, que a forma pura e os materias da capelinha enaltecem, não por mimetismo mas por contraste. Funciona, desse modo, como verdadeiro remate no cimo da colina e local privilegiado para a introspecção.

O facto de se localizar no local mais remoto e improvável que se possa imaginar, adensa a modernidade do gesto de Nadir Afonso. Porque a pequena Capela de Nossa Senhora de Fátima, na sua despojada materialidade e espacialidade, nos convoca para uma conversa íntima. Não se trata de estabelecer relações com a realidade pré-existente. Pelo contrário, a capela separa-se intencionalmente do povoado e dos terrenos lavrados. Como que evocando um tempo antigo, das ocupações castrejas, que ocupavam o alto dos montes em posição de defesa dos perigos terrenos, o silêncio do seu desenho permite a fruição da belíssima paisagem envolvente e o recolhimento necessário para as coisas da alma.

Curiosamente, o pároco local, responsável pela escolha do arquitecto para elaboração do projecto, chegou a sugerir a Nadir Afonso que se “inspirasse” nalgumas capelas e igrejas locais, de cariz marcadamente rural ou tradicionalista, para a obra que então estavam a começar. Mas Nadir Afonso sabia que, mais do que um resultado da circunstância envolvente, a Arquitectura cria ela própria circunstância e não pode fazê-lo de uma forma acrítica ou indiferente. Seria, porventura, esse o interesse de projectar um edifício como esta capelinha. O de, numa linha curva que se abre em caracol, convocar esse passado remoto da ocupação humana no território e a luta pela contemporaneidade (do orgulho de viver a nossa época) e, simultaneamente, incorporar no edifício projectado e desenhado, as contradições da sua própria circunstância enquanto arquitecto e pintor.

          O que mais fascina neste projecto de Nadir Afonso é a inteligência, sensibilidade e firmeza do desenho. Partindo de uma encomenda relativamente banal, o arquitecto estabeleceu não apenas um compromisso com a inevitabilidade do programa e com os seus clientes, mas também com a modernidade que, afinal, passou por Alimonde. E depois, há os materiais e acabamentos. A forma como o chão de pedra se faz parede, branca, sem rodapé ou qualquer tipo de truques e esta, se dilui e confunde com o tecto, também branco, sem chegarmos a perceber verdadeiramente onde começa um e acaba o outro. Por fim, o controlo da luz no espaço interior. O modo como o desfasamento da parede permite que o altar seja inundado de luz. Nesse diálogo com o lugar, o edifício afirma toda a sua transcendência.

          Quando comecei este texto, pensei escrever sobre o Museu Nadir Afonso, em Chaves, e o modo como o génio de Álvaro Siza nos propõe uma conversa íntima com a obra de Nadir Afonso, nas margens do Tâmega. Sobre a forma como Siza, que sonhou ser escultor antes de ser arquitecto, se aproximou de Nadir Afonso e da complexidade do seu pensamento. Mas a Capela em Alimonde, tomou conta do texto e, por mais adulterada que se apresente na actualidade, sobrepôs-se pela simplicidade e pureza da forma. Afinal, Nadir tinha recebido os “ensinamentos” de um dos mestres do Movimento Moderno, em primeira mão.

          Anthony Vidler, num capítulo do livro “Warped Space”, reflecte sobre a forma como a maioria das pessoas se movimenta no espaço urbano, sem aparentar compreendê-lo ou, sequer, vê-lo. E o modo como as cidades são invisíveis para nós, que nos habituámos a percorrer os seus espaços e os seus monumentos, de forma intuitiva. Walter Benjamin explica esse fenómeno no seu ensaio “The work of Art in the Age of Mechanical Reproduction”, afirmando que a Arquitectura sempre representou um protótipo de uma obra de arte cuja recepção é feita pela colectividade num estado de distracção[3].    Poderemos dizer que o projecto desenvolvido por Nadir Afonso em Alimonde, não só se adaptou às condições do local onde se inseriu, e atingiu as leis de perfeição que regem a Arquitectura, como, ao se libertar de certo modo desse principal constrangimento funcional, sobretudo pela qualidade do desenho, se aproximou vertiginosamente das leis da harmonia que regem a Arte. Como um operador de escalas, que incorpora o procedimento artístico e provoca emoções estéticas[4]. Habituámo-nos a vê-la lá, no alto do seu cabeço e, provavelmente, teremos andado muito distraídos ao longo deste tempo para perceber isso.

Em jeito de conclusão, referir que este artigo vem também a propósito da intenção de demolição do edifício da PanReal, em Vila Real, da autoria de Nadir Afonso, motivo de petição pública “Vamos salvar o edifício da PanReal - projecto de NADIR AFONSO - em Vila Real”, e da consequente necessidade de salvaguarda do património arquitectónico como bem que é de todos e inclui o extraordinário conjunto de arquitectura moderna que se fez em Bragança e de que a capela de Alimonde é um belo exemplar.

 

* Este artigo foi escrito originalmente para o Wall Street International Magazine, com o qual o autor colabora regularmente e pode ser consultado em:

http://wsimag.com/pt/arquitetura-e-design/24850-a-arquitectura-e-a-arte.

É dedicado à memória de Manuel Francisco Afonso (Nunes), Gracinda Virgínia Vaz Rijo, que patrocinaram a construção da capela; e de Francisco dos Anjos Fernandes do Vale, primo do casal e pároco responsável pela escolha de Nadir Afonso para elaboração do projecto da capela.



[1] O C.O.D.A. que Nadir Afonso apresentou intitulava-se "A Arquitectura não é uma Arte".

[2] João Cepeda, Nadir Afonso Arquitecto (2013), p.88.

[3] Anthony Vidler, Warped Space - art, achitecture, and anxiety in modern culture (2000), p. 79.

[4] Paulo Varela Gomes, Tomar partido, in Jornal dos Arquitectos 138/139 (1994), p. 21.

 

Directamente da teta da vaca

Ter, 13/06/2017 - 14:56


Olá familiazinha. Decorreram mais um ano as trezenas de Santo António, em Bragança, na igreja de Santa Clara, onde é tradição no dia 12, à noite, no fim da trezena ser distribuído um pão biju por pessoa . Quando eu era criança apercebia-me que as famílias numerosas e pobres da cidade marcavam a sua presença levando assim alimento para a família. Hoje em dia há pessoas que guardam o pão de um ano para o outro, para que nunca falte o pão em casa e com a particularidade deste não criar bolor. Há muitas igrejas no nosso distrito que têm a imagem de Santo António.