Tancos e o Baile dos Bombeiros

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Foram roubadas armas de guerra dos paióis militares de Tancos. O caso foi entregue ao Ministério Público e foram para o terreno as duas polícias de investigação: a Polícia judiciária e a Polícia Judiciária Militar. O putativo gatuno surpreendido com a rapidez da descoberta, que não lhe deu tempo de colocar as armas no mercado, vendo-se com “o menino nas mãos” ensaiou um acordo com os militares sob o olhar atento da PJM. Assim: devolvia as armas e em troco não seria incomodado pelo furto. Os militares aceitaram e fez-se a devolução das armas de forma algo rocambolesca e logo com um azar. A quantidade de armas devolvidas era superior às do furto. (a lógica elementar diz-nos não ter sido este o único furto). A polémica estalou quando se soube do encobrimento que os militares tinham dado ao autor de um ilícito criminal, isto é, a Polícia Judiciária Militar investigava o furto ignorando por completo o autor do mesmo. Já foram constituídos arguidos vários militares e já foram demitidos de funções o Ministro da Defesa e o Chefe do Estado Maior do Exercito.

Estes acontecimentos de

Tancos fizeram-me lembrar

um filme que vi, penso que nos anos 70, do realizador Milos Forman, pela analogia entre ambos. Este realizador, conhecido sobretudo pelos filmes “Amadeus” ou “Voando sobre um ninho de cucos” fez, quando ainda vivia na Checoslováquia, um filme chamado “O baile dos bombeiros”. Este filme pretendia ser um retrato da sociedade checoslovaca daquela época e a amostra escolhida, para estudo/exposição, foi o conjunto dos participantes num baile de uma associação de bombeiros. O baile, em tudo semelhante aos bailes do Club ou da Associação, tinha como atracção suplementar uma quermesse em que o prémio maior era um leitão assado. No decorrer da festa, o comandante dos bombeiros, homem com todo o aspecto de ser um cidadão cumpridor, daqueles que fazem estes serviços cívicos com espirito de missão, é surpreendido pela falta do leitão. Ficou apoplético, insultou toda a gente, berrou, mas vendo que a estratégia era errada alterou o procedimento. Então falou baixinho e pediu por favor que entregassem o leitão e que não receassem fazê-lo que ele garantia absoluto sigilo. Para garantir esse sigilo desligariam as luzes de iluminação e assim ninguém saberia quem estava a restituir o leitão, logo quem o tinha roubado. Desligaram as luzes, uma vez, duas vezes mas o estratagema não surtiu efeito. Entretanto o chefe dos bombeiros que ia percorrendo a sala de cimo a baixo, da esquerda para a direita na esperança de descobrir o leitão apercebeu-se subitamente que quem tinha roubado o leitão tinha sido a sua mulher e a sua filha. O homem ficou para morrer e tentou, com a argumentação possível, demover as mulheres da sua atitude. Mas estas não estavam pelos ajustes e retorquiam “és um burro, só tu é que trabalhas, os outros estão de palanque e ainda hão-de ser eles a comer o leitão?! Era o que faltava!” No meio desta discussão, debaixo de uma mesa e numa altura em que as luzes estavam desligadas, o comandante agarrou no leitão de supetão e correu pela sala às escuras para colocar o leitão na travessa. Quando ia a meio da sala as luzes acenderam-se. O comandante parou surpreendido e viu todos os olhos postos no leitão que levava nas mãos. E aquela figura de leitão ao colo, autenticamente grotesca, caiu no chão, desmaiado, vítima do choque que o opróbrio e a ignomínia adivinhados logo provocaram.

O filme acaba aqui. Para saber mais temos que esperar pelos desenvolvimentos que o caso de Tancos terá. Porque Tancos é o baile dos bombeiros revisitado. Também em Tancos os militares foram apanhados com o “leitão” nas mãos e ao que parece até era maior que o roubado.

 

Manuel Vaz Pires