São conhecidos os mortos no Aeroporto de Zaventem. E os feridos também. Naqueles fatídicos e dramáticos momentos, foram eles as maiores vítimas. Logo de seguida os familiares e demais entes queridos de todos. É um sofrimento terrível ver a vida dos que nos são caros, ceifada ou dramaticamente afetada, num ápice. Um sofrimento grande que se prolonga para lá do deflagrar assustador da carga explosiva. Mas não se fica por aqui o grupo dos que sofreram, sofrem e irão sofrer com as consequências.
Zaventem, para quem chega, pouco mudou. As mesmas lojas, os mesmos corredores, as mesmas esteiras rolantes intermináveis. Menos gente. Muito menos gente. Fica sombrio, apesar das luzes. Fica sinistro. Sente-se um arrepio sem saber porquê. Por nada. Por quase nada. Um jovem com uma mochila às costas. Um susto. Momentâneo – não é árabe. Sim, todos os árabes são vítimas deste atentado! Não podem andar com mochilas às costas!
Apesar do nervosismo, os funcionários esforçam-se ao máximo para nos dar a aparência de completa normalidade. E de eficiência e segurança. O que não é fácil. A saída faz-se de forma apressada sob o olhar condescendente dos guardas, mas… À minha frente uma passageira tenta empurrar o carrinho repleto de malas mas não sai com a ligeireza pretendida. É interrompida pelos guardas que a levam para o balcão da revista de bagagem. Claro, com a tez escura e um véu a cobrir-lhe a cabeça… Cá fora é tudo igual. Quase. Muito menos carros (os veículos particulares não são permitidos nas imediações e os táxis chegam um a um, a pedido dos controladores) mais polícias e muitos soldados fortemente armados.
Partir de Zaventem é muito mais complicado. Os carros particulares ficam a centenas de metros do desembarque habitual. Os táxis largam os passageiros num dos parques de estacionamento e é necessário circular pelas rampas de acesso até chegar junto do primeiro posto de controlo, numa tenda de campanha donde só se pode aproximar quem tem bilhete de viagem e onde tudo é revistado e radiografado. Quem tem malas de porão entra numa fila interminável. Quem tem bagagem de cabine entra na tradicional sala de revista e radiografia depois de galgar vários lances de escadas provisórias.
O conhecido Zaventem, de novo. Tudo igual. Menos gente é certo. Os funcionários das lojas quase desertas atarefam-se a mudar produtos entre as prateleiras para dar uma ideia de movimento e normalidade. Mas não. Eles também são vítimas do atentado. A milhares de quilómetros dali o endurecimento do tratamento com os refugiados faz muitas e novas vítimas. Os muçulmanos não são terroristas, mesmo sendo certo que todos os terroristas eram muçulmanos. Temos de ter isto bem presente e não deixar que os movimentos radicais de direita confundam e misturem estas duas realidades. No dia em que o permitirmos, ficaremos encurralados entre dois braços de uma e mesma tenaz extremista e radical. Nessa altura as vítimas serão imensamente mais. Seremos nós, todos os outros!
Por José Mário Leite