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Não chamem nomes à democracia

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Há muitos governos que se apelidam de democráticos e exercem um poder nada condizente com a democracia a que recorrem para arvorar uma bandeira que não lhes pertence, mas que fica bem aos olhos da comunidade internacional. Mas esta não é lorpa. Não sei se os dedos das mãos chegam para contar os países que não sendo democráticos, se identificam como tal. No entanto, muitos deles foram eleitos a coberto da democracia e só por isso mereceram os votos dos eleitores, embora estes se arrependessem mais tarde. Exemplos temos muitos. A Venezuela diz-se democrática e no entanto é liderada por um ditador que não admite oposição organizada e que ameaça quem se opuser ao seu governo e à suas leis. Todos condenam o regime, mas para Maduro ele é o mais democrático que existe. Nunca ninguém ouviu dizer que a China não é democrática e o seu líder faz disso bandeira de regime. É comunista ou socialista como dizem, mas isto é democrático! Como se pode ser democrático se o governo não é eleito através do voto? Claro que há uma diferença enorme entre ser comunista e ser socialista. O primeiro é extremista e ditatorial, o segundo até pode ser democrático se não cair no extremismo e na tentação do poder absoluto. É o que aconteceu a alguns governos. Aqui situam-se, por exemplo, a Turquia e a Rússia. Dois países que desempenham na atual conjuntura política um papel primordial. Um porque vai ter de enfrentar eleições e outro porque não as quer perder custe o que custar. Pois é verdade. Erdogan vai enfrentar sessenta e oito milhões de eleitores e terá de os convencer que vale a pena continuar a governar a Turquia. É um trabalho duro, especialmente quando dez mil eleitores são curdos e estão contra ele. Erdogan foi eleito prometendo muita democracia, muitas reformas e melhor economia para o país. Enfrentou logo a seguir um povo enfurecido pelas reformas que não eram as esperadas e uma guerrilha fronteiriça que em nada o favoreceu politicamente. Reforçou o seu poder político e hoje é quase um ditador. Ultimamente tem tentado tirar alguns dividendos ao esforçar-se por mediar o conflito entre a Ucrânia e a Rússia. Os acordos da exportação de cereais ucranianos e russos deram-lhe alguns pontos, mas poderão não ser os suficientes. A situação interna do país não é a melhor. Os turcos querem muito mais e melhor. A Rússia de Putin é outro caso. Putin ao assumir o governo, não deixando de ser socialista como disse, prometeu ser mais democrático e liberal. Isto deu-lhe um certo campo de manobra que ele soube aproveitar a seu favor. Já correu os cargos mais importantes sendo ora presidente, ora primeiro-ministro e presidente novamente. Foi trocando pelo simples facto de não poder ocupar o mesmo cargo mais tempo do que a lei permite. Mas isto não poderia ser um impedimento, pois Putin logo decretou alterações que lhe permitem fazer o que quiser. Isto é, aos seus olhos, o mais democrático possível. Mas não houve eleições democráticas! Para quê? A Duma decidiu, está decidido. Ele manda na Duma democraticamente. Já Lenine e Estaline assim faziam. Ou seja, Putin nada mais é do que um ditador que se assume como democrático e critica as democracias ocidentais que acusa de o serem. Não lhe interessa! Aliás, invadir um país estrangeiro e fazer guerra sem razão aparente contra ele, é o mais democrático que existe aos olhos de Putin. Por que será? Porque é um ditador democrático! Simplesmente. Para não enfrentar uma oposição concertada em eleições próximas, Putin mandou encarcerar Navalni, o seu mais acérrimo opositor e possivelmente o ganhador das eleições, se fossem democráticas. Acusado sem razões plausíveis, foi preso para enfrentar alguns anos de cárcere, os suficientes para não ser opositor a Putin. Como isso pode alterar com o tempo e a conjuntura, não será de excluir mais um envenenamento na prisão. Sempre pode justificar a sua morte com uma doença súbita. Claro que isto é tudo muito democrático! Enfim. Se Erdogan não ganhar as eleições, as relações entre a Rússia e a Turquia podem alterar e muito e quem vai acabar por apanhar os destroços são os países ocidentais, já que a guerra da Ucrânia vai tomar outro rumo certamente. Não podemos esquecer a força dos Curdos dentro da Turquia e fora dela. Terão sempre uma palavra a dizer. Não sei se a democracia passará muito por aí, mas não é uma carta fora do baralho. A ver vamos. Cá por casa, a democracia anda um pouco esquecida. As maiorias levam a alguma prepotência governativa e a meter a democracia na gaveta quando interessa. Felizmente a separação de poderes funciona e isso impede a tentação da exacerbação dos mesmos. Mas não digam que é democrático o conjunto de asneiras e desonestidades que se têm praticado ultimamente neste governo. Terá outro nome certamente!

Luís Ferreira