Não é a primeira vez que abordo este tema das candidaturas eleitorais independentes e bem poderá não ser a última, porquanto ainda faltam três ou quatro meses para as próximas eleições autárquicas, que estão agendadas lá para Setembro ou mesmo Outubro.
Convém, por isso, começar por lembrar que desde a revisão da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais, operada em 2001, através da Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto, grupos de cidadãos podem apresentar listas de candidatos à eleição dos membros dos órgãos das autarquias locais (assembleias municipais, câmaras municipais e assembleias de freguesia), sem a obrigatoriedade de terem filiação partidária. Alteração que, comprovadamente, tem produzido efeitos muito positivos, muito embora o número de listas independentes até hoje apresentadas e os eleitos delas originários ainda estejam muito abaixo do previsível e do que será de desejar, pelas razões que se conhecem.
Desde logo porque, o que poderá ser entendida como uma manobra mal-intencionada, premeditada, dos partidos, que nesse sentido legislaram, as listas independentes estão em manifesta desvantagem com as listas partidárias, no que toca à facilidade de todo processo burocrático e, sobretudo, no que ao financiamento das campanhas eleitorais diz respeito.
Certo é que os partidos continuam com larga vantagem relativamente aos independentes, por duas razões fundamentais: não têm que recolher assinaturas e são subvencionados pelo Estado.
Acresce que este processo é particularmente desfavorável às candidaturas independentes nas autarquias ditas do interior, caracterizadas, como se sabe, por densidades populacionais mais baixas e em que a abstenção eleitoral é maior.
Para lá de tudo o mais que tem a ver com as tão faladas reformas, que tardam, do ordenamento da administração local e da organização do território, que implicam a revisão dos limites geográficos das autarquias, a redistribuição de competências e a promoção de uma mais eficiente gestão do território.
Certo é que sucessivos governos têm desleixado, ainda que estas ideias sejam sistematicamente objeto de discursos políticos, o fortalecimento da participação dos cidadãos na vida local, a promoção da transparência e a responsabilização dos órgãos autárquicos, garantindo uma gestão mais próxima dos cidadãos.
A verdade é que as candidaturas independentes aos órgãos autárquicos, trate-se de assembleias municipais, de câmaras municipais ou de assembleias de freguesia conforme a lei prescreve, se traduzem, por si sós, numa maior democraticidade e, de uma forma geral, na introdução de maior competência e transparência na gestão dos organismos em causa.
Sobretudo numa mais empenhada defesa dos interesses das populações e na consequente maior dinamização económica, social e cultural das localidades porquanto, os autarcas independentes, por norma, são movidos por uma mais positiva vontade de bem servir, não estando amarrados por obscuras peias partidárias.
Contrariamente à generalidade dos filiados partidariamente que partem constrangidos por outros interesses e ambições, desde logo pela prossecução de uma carreira político partidária que eventualmente os possa alcandorar à Assembleia da República, enquanto deputados, ou mesmo ao Governo da Nação, enquanto secretários de estado ou mesmo ministros.
O que, não raras vezes, se tem traduzido em espetáculos pouco dignificantes, com os candidatos partidários que já são titulares de cargos políticos a saltarem de cadeira em cadeira, em pleno mandato, com desprezo pela melhor gestão e dignidade dos organismos autárquicos, que deveriam assegurar, em qualquer caso e antes que mais.
Este é um domínio em que a quebra da hegemonia partidária, ainda que diminuta, se tem revelado francamente positiva pelo que desejável será que se aprofunde e se alargue aos próprios actos eleitorais para a Assembleia da República, se a tanto chegar a generosidade democrática dos partidos dominantes.
Havemos de concluir, por tudo isso, que as candidaturas de grupos de cidadãos sem filiação partidária devem ser incentivadas, para bem da Nação e da Democracia, na certeza de que, tudo o leva a crer, merecerão especial atenção dos eleitores, por mais que desagrade aos partidos dominantes.
As candidaturas eleitorais independentes constituem, sem dúvida alguma, uma forte e desejável alavanca democrática, sobretudo nas actuais circunstâncias de descrédito dos partidos.
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico. Vale de Salgueiro 26 de junho de 2025