A liberdade tem servido os principais interesses do homem ao longo de séculos, mas nem por isso ela serviu os interesses de todos. Na realidade, muitos acabaram com a possibilidade de ela existir e usaram a falta dela para esgrimir o seu poder absoluto como se fosse um dom divino. É verdade que muitos foram os que usaram a liberdade para mostrar o seu valor, mas do mesmo modo, salientaram que a sua falta não era condição necessária para sobreviver, como se isso fosse uma lei a que se tinha de obedecer, o que fazia do governante um homem sem escrúpulos e sem sentido. Ao desvalorizar a liberdade teria de dar valor ao seu contrário e isso nunca foi bem aceite por ninguém em nenhuma parte do globo. Hoje questionamo-nos frequentemente sobre a liberdade e até se conseguimos ser efetivamente livres. Será que somos livres? Como se consegue a liberdade? Onde começa e acaba a nossa liberdade? Sobre estas questões exibimos os clichés como a resposta mais sábia e certa, mas será que é assim tão certa? Cada um de nós deveria ter a noção exacta da sua responsabilidade e do significado que a liberdade lhe dá para seu governo e assim saber como agir perante a sociedade. Não basta dizer que a liberdade de cada um acaba onde começa a liberdade do outro. Qual outro? E onde começa a liberdade do outro? É com silogismos desta natureza que os mais inadaptados se desculpam para fugir às suas responsabilidades perante uma liberdade com que não sabem conviver. A verdade é que ao pôr um limite à liberdade de cada um tem perante o outro, está-se a impedir a própria liberdade, ou seja, ela não poderá ser utilizada na sua plenitude, deixando de haver liberdade a partir de um determinado momento. Então como vamos poder saber usar a liberdade? Não é fácil. Perante a pandemia que hoje nos assola, a liberdade é deveras questionada em vários vectores. De facto, as várias manifestações em prol da liberdade de circulação e de reunião e convívio, é disso prova evidente. Não temos liberdade para circular, para visitar a família, para ver os amigos, para nos reunirmos e para conviver. É verdade, mas se queremos fazer tudo isso amanhã, ou seja, se queremos ser livres, temos de nos sujeitar hoje a ficar sem essa liberdade. Parece lógico. Desta forma, a liberdade passa a ser uma peça de um tabuleiro de xadrez que se movimenta no sentido de atingir um objetivo: o xeque-mate. Ganhar o jogo. Mas afinal, somos livres ou não? Se proibimos uns de serem livres, estamos a ter a liberdade de cortarmos a liberdade dos outros. Será que podemos fazer isto? Será que temos a liberdade para o fazer? Concordamos todos certamente, que tudo isto não teria sentido se não fosse a sobreposição de um bem maior que a liberdade, a vida. Sem vida, a liberdade de nada serve. Perante a morte ou a sua proximidade, a liberdade toma um valor muito maior e tem um custo incomensurável só admissível porque se está vivo. Pois é esta realidade, o enfrentamento do Covid19 e a proximidade de com ele desfalecer, que nos faz dar tanto ênfase à liberdade, quer condenando, quer exaltando o seu usufruto. De um modo ou de outro, ela não poderá ser arremessada como uma arma ou um troféu que se ganha ou perde, numa qualquer batalha. Esta batalha pela vida que agora vivemos no país, parece estar no bom caminho, mas não descuremos a responsabilidade em prol de uma liberdade que ponha tudo a perder. É que os excessos são sempre condenáveis. Temos de condenar os que querem ter demasiada liberdade neste momento, impedindo os outros de usufruir a liberdade que lhes dá o direito de se manterem vivos e saudáveis. Esta semana que agora acaba de entrar, será uma prova real para medir tanto a responsabilidade como a liberdade de cada um e de todos nós. A Páscoa, festa de reunião familiar e convívio, não deverá ter o mesmo sentido e o mesmo peso de outros anos, mas se queremos ter o direito de no próximo ano podermos usufruir livremente desse direito, teremos de nos retrair este ano e penso que muitos o terão feito. Talvez por receio, talvez por responsabilidade ou até por liberdade de luta contra um vírus que nos quer roubar a nossa liberdade. A Páscoa passou e com ela os convívios possíveis, mas ficou o receio de ver o resultado que esses convívios deixaram. Esperemos que sejam bons e nos facilitem os dias que aí vêm, para os podermos viver em maior liberdade. Na verdade, não é nada fácil viver em liberdade!