Francisco Alves

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Apreciação Crítica da Velada Raiana de Puebla de Sanabria

ARIONOR orgulha-se de ter realizado no passado dia 12 de dezembro na Puebla de Sanabria mais uma jornada verdadeiramente transfronteiriça, que congregou cerca de quatro dezenas de raianos e de autoridades que os representam. Estiveram todos de acordo na urgência de criação de infraestruturas que potenciem a mobilidade dos cidadãos entre um e o outro lado da fronteira como a única forma de aprofundar a cooperação transfronteiriça e tornar estas regiões prósperas e de oportunidades. Foram mesmo tocantes alguns testemunhos de cidadãos presentes que falaram emocionados da verdadeira fraternidade que desde sempre uniu os raianos. Contudo, apesar dos avanços da parte portuguesa e do entusiasmo dos representantes da região Leonesa, ficou muito claro para todos que o projeto da ligação Bragança Puebla, como tantos outros, esbarra na indiferença de Castilla e enquanto esta não compreender a necessidade e a urgência de avançar com estas infraestruturas, estas jamais se concretizarão. O Governo Português, através da Secretária de Estado da Valorização do Interior, Isabel Ferreira, apresentou com grande firmeza e entusiasmo o apoio de 16 milhões de euros do Programa de Recuperação e Resiliência para a ligação rodoviária Bragança Puebla de Sanabria que foi acordada na Cimeira Ibérica em detrimento de muitos outros projetos. Contudo, na Velada da Puebla deu para compreender também que o Governo Português não tem interlocutor válido do lado de Espanha, na medida em que as competências pela construção de estas infraestruturas do lado espanhol são da responsabilidade de um Governo autónomo e não do Governo de Espanha, o que torna ainda mais problemática a sua efetivação. Todos os que participámos nesta Velada e escutámos o debate democrático em que houve acusações de parte a parte entre os políticos da região leonesa e o representante da Junta de Castilla e León, pudemos compreender a profundidade do problema. Concretamente a Junta de Castilla y León foi acusada de desviar para outras regiões fundos europeus que se destinavam às zonas transfronteiriças, acusação idêntica feita noutros encontros anteriores da RIONOR à CCDR-Norte por ter desviado para o Grande Porto montantes destinados aos territórios raianos de Trás-os-Montes. O debate deu também para compreender as divergências entre León e Castilla, na medida em que é nas províncias leonesas de Zamora e Salamanca que se situa o problema transfronteiriço que nos mobilizou para esta jornada. Talvez por esse facto a Junta de Castilla y León, mas sem León, não tenha a sensibilidade para compreender a importância do problema. Falam alguns hoje em Portugal na regionalização e a todos nos seduz essa ideia de combate aos castradores e tradicionais centralismos das capitais. Mas regionalizar para centralizar em Valladolid ou no Porto o problema ainda se torna mais grave e como se costuma dizer: “É pior a emenda que o soneto”. Desde a sua criação que a RIONOR tem tido como preocupação envolver os cidadãos na discussão dos problemas que afetam os nossos territórios, convocando-os a participar em encontros que designámos de Conselhos Raianos, trabalho que foi reconhecido e sublinhado pelas autoridades de um e do outro lado da fronteira presentes nesta Velada. Contudo, nessas jornadas foram aprovadas resoluções que se tivessem sido concretizadas pelo poder político hoje estas regiões seriam efetivamente regiões de oportunidades e com um desenvolvimento económico notável. A título de exemplo, lembramos aqui as resoluções dos Conselhos de 2017 sobre a acessibilidade como as conexões rodoviárias Quintanilha Zamora, Bragança Puebla, à reposição das antigas vias férreas e a ligação às linhas de Espanha, as redes digitais transfronteiriças de comunicação de dados e o aeroporto regional de Bragança. Dos Conselhos de 2018 sobre a Educação, são ainda mais perturban - tes algumas dessas resoluções, na medida em que foram propostas pelos Diretores Regionais de Educação da Junta de Castilla y León, Angel Miguel Vega SANTOS e María del Pilar González, que tinham como Consejero de Educación Fernando Rey e que propunham precisamente a criação de “Centros de Formação de Professores e Inovação Educacional: Ciudad Rodrigo e Alcañices. (…) Abertura e flexibilidade de critérios para a permeabilização de experiências em ambos os lados da fronteira. (…) Centro europeu Hispano-Luso. (…) e Novos espaços educativos de formação, inovação e investigação de professores do norte de Portugal e de Castela e Leão”. Será que temos de eternizar a nossa discussão em busca de soluções que o poder político se dá ao luxo de ignorar? Pensávamos que a hegemonia de Castela era questão do passado, mas de acordo com a discussão da Velada da Puebla deu para compreender que em muitos aspetos infelizmente se mantém e continua a legitimar slogans como “León sin Castilla, funciona de maravilla!” ou velhos anseios populares que a canção de José Afonso eternizou: “Senhora do Almurtão / Ó minha linda Raiana, / Virai Costas a Castela, / Não queirais ser Castelhana”, A RIONOR já mostrou que é uma corredora de fundo e enquanto os seus grandes objetivos não forem atingidos jamais deixará de incomodar as consciências com as suas atividades. Assim, teremos de repensar que estratégia para fazer compreender aos poderes públicos que terão de mudar as suas políticas e dar atenção às regiões verdadeiramente necessitadas de apoios para que possam inverter a tendência da perda de população e para que os fundos que são financiados pela UE para estas regiões não continuem a ser desviados para outras zonas que não são fronteiriças e deprimidas. Perdidos nesta encruzilhada, para revigorar o nosso fôlego, teremos de ser criativos e como a reivindicação da autodeterminação do antigo Reino de León e Trás-os- -Montes é mesmo uma coisa do passado, talvez nos reste a possibilidade de realizar Conselhos Raianos em Valladolid e no Porto, precisamente para propor a transferência da sede da Junta de Castilla y León para Rihonor ou Alcañices e para trasladar a CCDR-Norte para Bragança ou Vimioso.

DOS DRONES, DOS BASBAQUES E DO FUTURO

Um dia destes fui surpreendido com uma notícia em que o repórter, de queixo no ar e boca escancarada de espanto, deu a boa nova:
A Santa Casa da Misericórdia de já não sei onde, recorrendo às salvíficas novas tecnologias, mandou construir um drone para levar o almoço ao único morador que ainda habita uma dessas perdidas aldeias do Portugal profundo, evitando assim a grande maçada de enviar todos os dias alguém num jipe com a comidinha.
Não informou o dito repórter quanto custou a engenhosa caranguejola, mas a avaliar pelo preço que anda associado às novas tecnologias, a verba não teria sido de menosprezar. No entanto, o que mais me espantou, foi o aplauso acrítico, amorfo e provinciano, de gente que tem o dever de informar, olhando os factos de todos os ângulos possíveis, bem como a passividade de todos quantos escutaram tão grande maravilha. Ou será que já não há cidadãos em Portugal?
Tão triste e chocado me deixou a notícia que só agora consigo reagir e escrever estas linhas sem sentido.
Se é verdade que o homem é um animal social, e quando abandonado numa ilha, ou se torna um deus ou uma besta, no dizer do velho Aristóteles, não nos resta senão ver por antecipação o filme.
Os irmãos da Santa Casa de não sei onde, deram um duro golpe no solitário cidadão, retirando-lhe o único momento do dia em que podia ver e falar com gente. E com que ansiedade esperaria por esses breves momentos dos seus longos dias!
Consumada a obra, agora o que se segue? O caminho não poderá ser outro que o da bestialização, da morte de solidão e de tristeza, como os psicólogos já mostraram à saciedade.
    Vá irmãos da Santa Casa de não sei onde, não hesitem, levem até às últimas consequências a vossa inspirada congeminação: mandem instalar uma câmara no dito drone para registar passo a passo o fim a que condenaram o infeliz cidadão! E já agora, para rentabilizar o investimento, ponham à venda as imagens desse fascinante reality show que as televisões depressa vo-las comprarão.
Não sei o que será o futuro, mas se o futuro é como o desse infeliz, não o quero. E para poder escapar legalmente a uma morte como essa, vil e inumana, caríssimos parlamentares, por favor  apressem-se a legalizar em Portugal a eutanásia.
Sobre a inqualificável façanha Não vos consigo dizer mais nada. No entanto, deixem-me perguntar ainda a quem de direito, se com essas verbas não teria sido possível construir nessa aldeia uma instância de férias, uma  casa para famílias de refugiados, um hotel da juventude, uma empresa de apicultura, ou uma outra qualquer atividade económica que vá no sentido do repovoamento do Portugal rural que tão urgente se afigura ?