Entre dizer ou não, prefira ficar calado

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Falar bem, no sentido de elogiar desmesuradamente, é coisa que não fazemos com frequência. Diz-se uma vez, e pronto. Está dito. Lembre-se quando for preciso. Acho que nem quando estamos a tentar conquistar alguém:"És tão bonita!", "Sou? Sou nada", "És, pois", "Eu não acho", "Pronto, acredita se quiseres".
Agora, falar mal são outros quinhentos! Quando o assunto é "falar mal" nasce logo ali uma árvore de folha persistente, que vai ramificando e crescendo.
Há aquela máxima que afirma que não importa que se fale bem ou mal. O que interessa é que falem. Deduzo que porque significa que não passamos despercebidos ou que não nos esqueceram.
Ora, pior do que o que se diz é o que não se diz. Verdade! Aquilo que fica no meio caminho entre o cérebro, onde são processadas as ideias, e o aparelho fonético, mas acaba remoído no suco gástrico do estômago. Nenhum pensamento sobrevive àquele ambiente hostil, e é mais do que certo que vão todos acabar por morrer nesta batalha, que, aparentemente, tem recurso a armas químicas. É daqui que vêm as dores de barriga, não é das porcarias açucaras que comemos nem das bebidas com gás. Isso não faz mal nenhum comparado com o resto.
E este resto tem repercussões nocivas na convivência social. Faz tão mal ao ponto de criar uma espécie de síndrome de Tourette, só que sem nenhuma explicação clínica ou tão-pouco lógica. Refiro-me àquelas pessoas que, sem que nada o faça antever, nos dirigem comentários mais ou menos insultuosos, que nos querem semear dúvida tal é o tom de ironia, que nem temos oportunidade de saborear. Isto porque, enquanto falam, continuam a caminhar, como se nada fosse com elas, e mastigam as palavras o mais que podem, quais ventríloquos maldicentes. Assim não percebemos se nos disseram "lindas botas" a gozar, se disseram "linhas tortas" aleatoriamente ou "malditas portas" por causa de algum "puxe" ou "empurre" mais traiçoeiro.
O problema é que não temos a oportunidade de nos defender. De responder à altura, ou pelo menos dizer alguma coisa. Quando processamos o que aconteceu, já o autor do comentário desapareceu na rua, Não seríamos capazes de o identificar nas autoridades, nem sequer numa mesa de café. Ficamos a olhar para o vazio, e a magicar respostas inteligentes e do mesmo nível,que nunca teremos oportunidade de usar.
Por vezes nem há palavras envolvidas. Só olhares e sorrisos enviesados que não entendemos. No outro dia, saí de casa de manhã para comprar pão. No caminho, muitos foram os que me olharam dessa forma. Pensei ter algo de diferente nesse dia. Olhei por mim abaixo, não fosse ter eu levado, por lapso, o pijama vestido. Não vi nada de especial. A senhora da padaria olhou para mim da mesma maneira. Mas que raio! Por fim, enquanto me dava os trocos, declarou: "A menina já reparou que tem a camisola vestida ao contrário?". Corei. Afinal não estava extraordinariamente bonita aos primeiros raios de sol. Com uma visão mais atenta lá vi a enorme etiqueta branca, que nunca tiro para saber a que temperatura tenho de lavar a roupa, a baloiçar do lado esquerdo. Não arranjei uma justificação plausível. Só consegui balbuciar: "Olhe, pois tenho!".
Aposto que a senhora da padaria não sofre do estômago.

Tânia Rei