Uma invasão a talhe de foice

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A invasão da Ucrânia pelas tropas de Moscovo prossegue com a selvática devastação que os órgãos de comunicação social do mundo livre mostram com chocante realismo. Enquanto nas televisões e jornais russos nem uma só imagem destas barbaridades se vê. A luta heroica da Nação ucraniana pela defesa da sua soberania, independência e desejo de integração no mundo livre e democrático é deveras surpreendente e assinalável. Desvirtuar esse sacrifício ciclópico de uma Nação que está na linha da frente do combate pela liberdade e democracia, diluindo-o em jogos geopolíticos, no comércio de recursos naturais ou em negócios de arma é injusto, desonesto e apenas serve os desígnios sinistros de Vladimir Putin. Importa, por isso, fazer alguns recortes fiéis da História recente, concretamente no que ao colapso da União Soviética diz respeito, que se iniciou em dezembro de 1991 e abriu caminho, de uma assentada, à criação de 15 estados independentes. De facto, foi em 21 de dezembro desse ano que líderes da Federação Russa, da Ucrânia e da Bielorrússia assinaram um documento em que era declarada extinta a União Soviética, criando no seu lugar a Comunidade dos Estados Independentes. Todavia, a Ucrânia já proclamara a sua própria independência a 1 de Dezembro, mediante um plebiscito que registou o voto favorável de 90% da população. De realçar, também, que esse monumental colapso da União Soviética foi provocada pelas próprias populações, confrontadas com a desumanidade, a dramática falência económica e social do regime comunista e não porque tenha sido atacada, ou sequer ameaçada, por tropas da NATO, que havia sido criada 42 anos antes, precisamente para defender os países integrantes da selvática agressividade soviética. Pormenores que o PCP e demais simpatizantes domésticos de Putin, se esquecem de citar nas suas diatribes contra a NATO, a que igualmente se associa o BE. Mas também não será despiciendo relembrar que a União Soviética resultou do sucesso trágico do marxismo na Rússia imperial, convenientemente adulterado por Lenine, primeiro, e Estaline, depois, os fautores dos maiores massacres do mundo moderno, em consonância com o seu comparsa Mao Tsé-Tung, todos na esteira nacional-socialismo de Adolfo Hitler. Muito embora, justiça lhe seja feita, não se deva ignorar o papel relevante que a doutrina de Karl Marx teve na dignificação das classes trabalhadoras um pouco por todo o mundo, ainda que os maiores êxitos nesta matéria tenham e continuem a ser alcançados, democraticamente, nos países em que impera a democracia liberal, contrariamente às autocracias em que o marxismo-leninismo prevalece desfigurado. Convém também aqui relembrar que era desígnio fundamental do Marxismo-Leninismo, cito, “criar o novo homem soviético, que seria um cidadão educado e culto, possuidor de uma consciência de classe proletária orientada para a coesão social necessária ao desenvolvimento de uma sociedade comunista”. Aqui reside o fracasso maior do marxismo-leninismo, como fica bem demonstrado na trágica invasão da Ucrânia, a talhe de foice, ou da gadanha do fantasma comunista. Invasão que é, em última análise, a obra mais recente e funesta do abortado homem novo soviético, exemplificado por Vladimir Putin, escudado nos seus homens de confiança mais conhecidos e na classe social dominante, oligárquica e corrupta, que desmerecem e martirizam o povo russo. Todos eles são produtos acabados da ideologia, educação e formação de quadros da tristemente célebre União Soviética, como se vê. Trata-se de seres amorais, cruéis, cínicos, muito longe cidadão educado e culto, possuidor de uma consciência de classe proletária que era suposto o marxismo-leninismo vir a criar. Menor fracasso do marxismo- -leninismo, porém, que também a invasão da Ucrânia patenteia, não será o ilusório internacionalismo soviético ter dado lugar ao sinistro imperialismo de Vladimir Putin que, mais do que restaurar a defunta União Soviética, pretende reerguer e alargar o império do czar Pedro, o Grande, seu confesso inspirador. Putin sabe que o espectro da União Soviética que astuciosamente manipula, lhe rende significativas simpatias dos remanescentes comunistas e afins, que o mundo livre acolhe democraticamente e que continuam a sonhar com a sua reaparição. As semelhanças entre a situação actual e a vivida no início da II Guerra Mundial são, por demais, assustadoras. Resta-nos a esperança de que a conhecida asserção que diz que a História se repete não seja verdadeira ou que, a sê-la inexoravelmente, se não repita pela última vez. Havemos de concluir que, mais do que nunca, o mundo livre precisa de líderes esclarecidos e corajosos, com a dimensão de Churchill, Eisenhower e De Gaulle, capazes de enfrentar e levar de vencida tão grave ameaça à Humanidade, pacificamente se possível for. E ainda que, mais do que nunca, se justifica a existência da NATO.

Henrique Pedro