Um disperso de Pascoaes

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No VI volume das Obras Completas de Teixeira de Pascoaes. Poesia, editadas por Jacinto do Prado Coelho (Amadora, Livraria Bertrand, s. d.), a escolha final de Dispersos assenta nos que «pareceram mais significativos da arte de Pascoaes e de algumas suas preocupações de circunstância, como as provocadas pela guerra de 1914-18» (p. 169). Ora, sobre a Primeira Guerra só vemos quatro, de 1915 e 1916; porque não representar o ano de 1917, quando a nossa presença é diariamente noticiada, por causa de, ou interpostos, vultos da escrita, combatendo no centro da Europa? Um desses nomes fora celebrado por Pascoaes no “Inquérito literário” de Boavida Portugal (1912), de cuja reprodução em livro cito: «Nem quero mesmo referir-me aos dois maiores poetas europeus – Guerra Junqueiro e Gomes Leal. // Basta-me falar de António Correia de Oliveira, Jaime Cortesão, Afonso Lopes Vieira, Mário Beirão, Augusto Casimiro, Afonso Duarte, e, depois destes, dos novíssimos poetas, Carlos de Oliveira, Augusto Santa Rita, Afonso Mota Guedes. Eis uma vasta seara espiritual dadivosa e prometedora dos mais belos frutos. Estes poetas criaram em Portugal uma poesia profundamente portuguesa e original. Eles bebem a sua inspiração no mais intimo veio religioso da alma lusitana, criadora da Saudade, a Virgem do Desejo e da Lembrança, nascida do casamento do Paganismo com o Cristianismo.» (1915: 30-31) Descobre o leitor quem, assinalado como poeta, é, em tempo de guerra, dedicatário de um inédito de Pascoaes, que devera ter entrado nos Dispersos? Em 25 de Abril de 1917, o ‘diário republicano da noite’ A Capital dava, a meio da primeira página, “Canção heroica”, que, a não entrar além, pudera comparecer em reedição de Terra Prometida, onde constam as mais variadas canções: Canção crepuscular, Canção triste, Canção da minha sombra, etc., num total de 16 canções. “Canção heroica” é dedicada «(A Augusto Casimiro – Ao Poeta e ao Soldado)», um tenente das relações, também, do militar Raul Brandão, citado em O Pão não Cai do Céu, de Miguéis, e nome a redescobrir. Transcrevo oitava e décima dentro de quadra-refrão: «Já por milagre de Deus, /Aurea canção repentina / A negra noite ilumina / E os negros céus! // E o vulto da nossa imagem / Das penumbras da paisagem / Ergue-se, emfim, com firmeza / Revivendo, / Avultando em alegria, / Sendo elle, combatendo / Contra o medo, a cobardia, / A vil tristeza! // Eil-o a santa Heroicidade! / Esta divina vontade, / Suprema força de ser! / Este desejo infinito / De em bronze eterno e granito, / Além da morte, viver! / Esta offerta sublimada / Da nossa vida exaltada / A outra vida mais perfeita: / A Patria eleita!... // Já por milagre de Deus, / Aurea canção repentina / A negra noite ilumina / E os negros céus!»

Ernesto Rodrigues