A serpente emplumada

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O famoso romancista D.H. Lawrence é autor de um romance «esotérico» com este título cuja figura primacial é uma mulher irlandesa de visita ao México onde encarna o Mito da serpente emplumada. Ora, esta serpente temida e adorada pelos crentes nessa Mitologia transladando-a para o nosso tempo, em Portugal, vendo nela o descarrilamento mental de elementos das forças de segurança cujas bolsos e bolsas contêm o letal curare extraído de plantas naquelas paragens. A descrição das malfeitorias daqueles sete militares revelam perversidade repelente digna dos torcionários nazis e comunistas. O nosso conterrâneo Padre Alípio Freitas, o Padre Alípio da canção de Zeca Afonso, contou-me o modo como foi torturado no Brasil após o golpe de 1964, os militares humilharam-no e torturaram-no barbaramente, da mesma forma que os migrantes vindos da Ásia sofreram no quartel de Odemira. A serpente emplumada mortífera e sádica mostrou-se na vila alentejana, todos nós cidadãos esperamos a justa punição dos criminosos fardados, no entanto, a lentidão da justiça qual jibóia acabada de deglutir um vitelo mamão, vai demorar uma eternidade a julgar os malfeitores, pois todos sabemos quão pachorrenta é, quão insólitas são algumas decisões tomadas aqui e acolá, divulgadas através da quebra sistemático do segredo de justiça, da estrídula exigência de milhões de euros a figuras salientes da sociedade portuguesa, do ostensivo corporativismo das magistraturas, da preguiça do poder político em analisar seriamente esse universo estruturante do Estado de direito. Há décadas vi por duas vezes no cinema da Póvoa de Varzim o filme O Homem na Pele de Serpente, nessa fita Marlon Brando serpenteava numa loja do sul da Améria entres mulheres em plena pujança física de eclatante beleza. As mulheres sucumbiram como se tivessem sido atingidas por uma flecha embebida no fatal curare, a terrível poção dos indígenas da selva sul-americana. Ora, instituições estatais não podem acolher no seu seio áspides (reza a lenda ter Cleópatra cometeu suicídio através de uma mordedura de uma áspide) capazes de obterem escalofriantes sensações de poder sobre seres humanos indefesos aturdidos e longe dos seus, das suas origens. As serpentes do mal levaram o genial Ingmar Bergman a filmar o Ovo da Serpente alegoria sobre o choco do nacional-socialismo, agora, no século XXI vão desfilando ante os nossos olhos acções a poderem ser enquadradas nessa pestífera ideologia, os homens na referida pele de serpente o demonstram a justiça lusitana simboliza a serpente emplumada, sinuosa e muitas vezes de difícil entendimento, noutras cristalina quanto é a água das coutadas transmontanas. A pergunta impõe-se: qual a razão desta dualidade? O factor humano? Responda quem souber, não sou jurista, porém causa-me náuseas o facto de homens de excepcional inteligência serem autores de leis mais que cruéis e extravagantes a sustentarem decisões a que a filósofa Hannah Arendt cunhou ser a banalidade do mal. Esta banalidade do mal suporta as atrocidades dos militares da GNR (da canhota dizia-se no salazarismo) estacionados na bonita vila alentejana. Uma nódoa para todo o sempre!

Armando Fernandes