PUB.

A possível confrontação de blocos

PUB.

A tomada de posse de Trump depois da tremenda vitória que obteve nas eleições, vai-lhe permitir ter uma larguíssima margem de manobra sobre quase tudo o que quiser. Certamente não vão bastar os apelos de Biden no seu discurso final, para incutir uma democracia aceitável nas ideias do novo presidente dos EUA. Se assim fosse, estaríamos todos mais sossegados. A verdade é que com Trump, o que hoje é verdade, amanhã pode não ser. Disse que acabaria com a guerra da Ucrânia em dois dias e agora já veio dizer que demorará algumas semanas ou meses até chegar a um acordo. Claro. Conhecemos bem o show off a que ele nos habituou. A vaidade é um dos seus atributos e não é dos piores, apesar de tudo. O acordo que está em vias de se efetivar entre o Hamas e Israel, devido a um esforço titânico da administração Biden e também de elementos das nova administração, nada tem a ver com o trabalho de Trump, mas não evitou que ele se gabasse e dissesse que se não fosse ele e a sua vitória, isso não seria possível. Biden riu-se da presunção. O que havia de fazer? No entanto, inicialmente o Gabinete de Israel não aprovou o acordo, tal como todos contavam que acontecesse. Viveu-se um impasse cuja culpa foi atribuída a novas exigências do Hamas, mas a verdade é que o governo de Israel não aceitou e nós sabemos que o próprio governo está dividido sobre o assunto. Uns querem a exterminação completa do Hamas e outros acham que já houve demasiados mortos e uma destruição que demorará algumas décadas a reparar. Segundo alguns analistas, a reconstrução de Gaza demorará cerca de um século. Significa isto que tudo foi completamente destruído. Talvez o acordo se mantenha para dar sossego aos palestinianos. Mas voltemos a Trump. Ele já afirmou que se iria reunir com Putin para falar sobre um possível acordo de paz sobre a guerra da Ucrânia. Curiosamente, Putin já informou que ele ainda o não contactou. Típico. Resta saber o que resultará dessa possível reunião entre os dois e as possíveis consequências para a Ucrânia. Por sua livre vontade, Trump não gastaria mais dinheiro na defesa da Ucrânia e abandonaria o país ao seu destino, culpando a União Europeia do que daí possa resultar. Se isso acontecesse, seria mais fácil à Rússia dominar a Ucrânia e depois tentar alargar o seu domínio a outros Estados satélites mais fracos, cujo domínio não teria muitas barreiras. Isto não parece muito irreal, especialmente se nos fixarmos nos objetivos de Putin. Por outro lado, ele está a alargar os seus contactos para a Eurásia, Índia e mais países asiáticos, além do Irão, com quem firmou mais um acordo, com a China e Coreia do Norte. Ao formar estas alianças, inicialmente económicas, mas não só, ele está a enfrentar, de certo modo, a enorme influência que os EUA têm no mundo em quase todas as regiões, formando um bloco enorme de influências. As tontices de Trump em querer “comprar” a Gronelândia, dominar o Canadá e controlar o Canal do Panamá, não são a melhor estratégia para demonstrar o seu poder e pode ser catastrófico. Criticado por todos perante estas ideias surrealistas, pode ver-se sozinho e mesmo abandonado pela Europa que ele tanto critica. O aumento das taxas e impostos específicos que quer impor à China e à Europa também não são benéficos a entendimentos políticos. Restam poucos “amigos” a Trump se continuar a afastar a Europa e a NATO dos seus interesses. É verdade que os EUA estão longe de Moscovo e de Pequim, mas não tão longe que o seu território não possa ser atingido com os novos mísseis e mesmo com uma bomba atómica, se isso passar pela cabeça de Putin, o que não seria despiciendo. Não é difícil ver a construção de dois blocos enormes e a possibilidade de uma confrontação futura se nada for feito, entretanto. As cabeças duras destes líderes têm de ser iluminadas de modo a que a luz lhes indique o caminho do bom senso. A questão da Gronelândia não é nova. A maior ilha do mundo tem imensas riquezas no seu subsolo, tendo só o frio como contratempo. Há uns anos atrás já foi ventilada a ideia da compra pelos EUA. Aliás, sabemos que a América tem lá uma base com cerca de duzentos militares, o que é muito pouco, mas serve os seus interesses imediatos. Também a China tem interesse igual, mas está muito mais longe. No entanto, se acontecesse a ideia de Trump, serviria à China para justificar uma invasão a Taiwan, por exemplo. No fundo, Putin fez o mesmo à Ucrânia! A bola de neve continua a rolar e a ficar enorme. O Canadá já é outra coisa diferente. Claro que está “à mão se semear” dos EUA, mas não é uma ilha fria e quase deserta. Se os EUA compraram o Alasca à Rússia por 20 dólares no século passado, o mesmo seria impossível hoje em dia. Nem a Gronelândia nem o Canadá estão à venda e comprar uma guerra com a Dinamarca ou com o Canadá deve estar fora dos objetivos imediatos de Trump. Imaginemos, contudo, que eles pediam ajuda à Rússia para impedir as loucuras de Trump? Teríamos um confronto enorme entre dois blocos imensos e o EUA não seriam os mais beneficiados certamente. As loucuras pagam-se sempre, mais tarde ou mais cedo.

Luís Ferreira