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Portugalambando

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Bons dias, boa gente! Espero que estas palavras vos encontrem bem, a desfruir dos coloridos ares primaveris. Não sou muito de escrever sobre as mundanices, que facilmente degeneram em imundices, uma vez que Portugal tem gente de sobra nessa crítica função. Estar no conforto da bancada a disperder os que estão nas quatro linhas é desporto-rei nacional. Portugal definido numa foto é aquela dos engenheiros e capatazes a opinar em redor e um desgraçado no meio a fazer por cumprir o que lhe mandam de modo a justificar o salário miserável que lhe dão. Contudo, sabe bem ser um mirone a micar o caso que abalou os monotodias da nação e cujo nome do actor principal da telenovela rima com caramba, muamba ou bailar la bamba. Para mim, o mais incrível não é a criativa mesquinhez do roteiro, a realidade a ultrapassar a CMTV, os governantes e os serviços secretos a serem genuinamente mais inabilitados que um pastor alemão como o canino Inspetor Max. O mais incrível foi algo que se calhar até passou despercebido e mostra bem a charanga que é Portugal: houve uma comissão de inquérito que estava marcada para começar às 14h e só começou depois das 14:30. Uma comissão parlamentar com parlamentares que trabalham no parlamento, pessoas que se supõem serem minimamente distintas das demais em termos de valores e competências, que se atrasam meia hora para uma reunião (que inclui ministros) e que está a ser televisionada em direto para todo o país. Trinta minutos atrasada. O que seria absolutamente chocante e inadmissível em qualquer parte do mundo onde haja respeito e consideração, é apenas “depois do almoço” em Portugal. Isto não é gozar com quem trabalha, isto é dizer a quem trabalha que pode gozar à vontade, como, onde e em cima de quem quiser. Depois de começada a pontual reunião, lestamente se introduziu uma imperativa pausa para um injuntivo cigarrinho. Tudo isto existe, tudo isto é indescritivelmente parvo. Quem abra a porta de Portugal e veja as autoridades governamentais a fazer estas figuras, bem pode imaginar o resto. É como abrir a porta de um tasco do Cais do Sodré nos anos 80. Entrar e dar com a dona no balcão a espapaçar os seios fartos na cara de um qualquer marinheiro da marinha mercante. É que vale mesmo tudo. Esta semana estava a folhear um livro que dizia que o engenheiro que idealizou a ponte de Brooklyn, em Nova Iorque, era tão metódico que não se reunia com ninguém que se atrasasse mais de cinco minutos, mesmo que viesse de longe. No século XIX os norte-americanos já não toleravam atrasos de cinco minutos, em 2023 a nata desnatada de Portugal continua a fazer questão de atrasar o relógio do país meia hora por dia. Talvez até seja justo, afinal, como diz o ditado, o país governa-se em modo “para quem é bacalhau basta”. No meio deste bacalhau com todos, o que me faz confusão neste enredo é haver portugueses que consideram que por trocar o senhor que está lá no topo das governanças as coisas possam mudar significativamente. Querer mandar abaixo alguém por acreditar que tirando o rosa e pondo o laranja, vermelho, azul ou versa-vice, as coisas possam de facto mudar é um dos cúmulos de se ser português. O grande problema, o grande elefante na sala, é que qualquer um desses coloridos amigos será também ele invariavelmente português. E enquanto formos governados por portugueses será difícil. A batida continua a mesma com maior ou menor retoque ou com maior ou menor subida do salário mínimo. Se os portugueses saem do país às carradas e se, de forma geral, são reconhecidos fora de portas pela sua capacidade de adaptação e bom desempenho profissional então alguma coisa não bate muito certo. Os portugueses trabalham bem lá fora, os jovens que emigram desde a última grande crise económica cumprem com sucesso o que lhes é requerido. Enquanto isso, dentro de portas, é uma sucessão de botas e perdigotas. Para mim, que acabei de beber uma mini, a solução é simples: é colocarmos um grupo de estrangeiros a governar-nos, deixarmo-nos governar de uma vez por todas. Não desfazendo das outras nacionalidades, mas era arranjarmos 20 ou 30 nacionais do centro/norte da Europa para nos pôr nos eixos. Colocá-los nos principais ministérios e nas principais empresas, dar-lhes ampla liberdade de gestão e de criação de postos de trabalho. Há tempos falava com um dinamarquês que me dizia que no país dele se fomenta a cultura de arriscar e de desenvolver um espírito de criar negócios e grandes empresas. Enfim, fantasias de quem não anda sempre à rasquinha a contar os dias até ao fim do mês e no máximo consegue montar umas startups ou uns pequenos e médios negócios. Podiam ser alemães, suíços, noruegueses, etc. Talvez suecos, já empregam cá muita gente e estamos habituados a seguir as instruções deles. Se só com livrinhos cheios de bonecos a representar parafusos e pedaços de madeira conseguem fazer-nos sentir especialistas em construção imobiliária, imaginem o que seriam capaz de fazer se lhes déssemos o país para a mãos. Simples, fazíamos como nos bancos, dávamos-lhes a parte má (a governação) e continuávamos a usufruir da parte boa (o sol, a praia, os ovos mexidos com alheira). A caravana portuguesa poderia continuar a ladrar da bancada, mas teríamos de nos adaptar à forma deles fazerem as coisas. Os salários e a qualidade de vida iriam subir, talvez começássemos a ter a sensação de que os elevados impostos que pagamos serviriam realmente para alguma coisa. Ah, mas isso é inviável, não pode ser, um país independente, uma nação com 900 anos de chicória. Ora, como se não fossem os papás União Europeia que andassem a bancar tudo a este Portugal adulto jovem que continua a viver na casa dos pais. A questão está na antecipação, é só antecipar. Psicanalisando o nosso passado perceberemos que num futuro não muito longínquo nos encontraremos novamente de joelhos a clamar por ajuda externa. Basicamente foi a série do FMI - já perdi a conta às temporadas, não sei se a próxima será a quarta ou a quinta - e os ingleses, sem a ajuda dos quais, em diferentes ocasiões, hoje seríamos somente mais uma comunidade autónoma de Espanha. E que triste depender dos emborcadores dos ingleses, um povo que tem tanto daquilo que nos falta para nos sabermos governar, mas que nem sequer tem engenho para criar uma comida que se apresente. Reparem, já cá temos os turistas que são não sei quanto por centro do nosso probruto, temos os nómadas genitais, temos os cães polícias a farejar e a esburacar sem pedir licença como se a quintarola fosse deles, e inclusive os reformados que vêm de fora e de entre os quais, com jeitinho, ainda se arranjava uma turminha não só para jogar à petanca ou ao rami, mas para tomar conta disto como deve ser. No fundo, qual seria o mal de termos também estrangeiros a administrar- -nos? Além disso, nós gostamos de estrangeiros, até mais do que gostamos dos outros portugueses, eu diria. Estrangeiros com dinheiro no bolso, bem entendido, a esses desdobramo-nos em vénias. Somos trezentas vezes mais simpáticos para qualquer um deles do que para um nosso conterrado. Então porquê recorrermos aos estrangeiros somente quando estamos a bater no fundo do poço e não antecipar essa fatalidade? Prevenir em vez de remendar. Tomem, peguem, façam como na vossa casa, é todo vosso, força, ajudem-nos, imploramo-vos, vá lá, por favor, temos filhos pequenos para criar, please, merci, god morgon, willkommen, beware of pickpockets.

Manuel João Pires