À medida que o tempo passa, aumenta a convicção de que, em vez de se falar de “mundo” faz mais sentido falar-se de “mundos”, mesmo quando nos referimos ao globo terrestre; pois se, por um lado ele é uno, por outro, a diversidade é a caraterística dominante em qualquer das latitudes. Na individualidade, cada um cria o seu mundo que toca o do outro num processo de desenvolvimento pessoal e de construção da personalidade, nem sempre linear mas sempre produtivo.
“Outro mundo” foi a expressão usada à mesa do café para traduzir o que as televisões faziam chegar, desde Borba e numa perspetiva apocalíptica. Em abono da verdade, a expressão foi “— Aquilo parece outro mundo.” “Aquilo” remete para uma situação diferente do habitual, mas ao mesmo tempo para algo distante e que, quanto mais longe estiver, melhor. Às imprecisões dos primeiros minutos sucediam as certezas de que havia vítimas. O resto é o dejá-vu de outras tragédias anunciadas e que não foram evitadas pela incúria de quem tem responsabilidades. Também neste campo, do que se ouviu foi mais do mesmo: a administração central não funcionou, os políticos não agiram e as empresas na mira do lucro omitiram a sua responsabilidade social. A dissonância veio do primeiro-ministro que, à semelhança do caso de Tancos, mais uma vez, veio dizer que nada sabia e do presidente da república ao falar da responsabilidade objetiva e subjetiva.
Este conceito, por si mesmo, já é complexo. Ao adicionar-lhe um qualquer modificador é missão para titãs. No entanto, responsabilidade, independentemente do que a queiram travestir, é Responsabilidade e importa encontrar os responsáveis diretos deste drama e de tantos outros aos quais se perde o fio na busca do que ou quem esteve na sua origem. Em situações idênticas à de Borba onde factores ambientais estão subjacentes, poderá ser fácil encontrar os responsáveis; no entanto, se nos situarmos no campo da ética a responsabilidade poderá ser assacada a todos quanto tinham conhecimento da situação e na ausência de responsabilidade cívica nada fizeram para que a tragédia não ocorresse.
O perigo era visível a olho nu e não eram necessários conhecimentos geológicos para qualquer um se dar conta de que bastaria a alteração num vector para que toda a estrutura desmoronasse. Pode alguém duvidar de que foram realizados um ou mais reconhecimentos antes da Volta 2018 ter passado por aquele lugar? Quem trabalhava nas pedreiras não olhava para o que se via à luz do dia? – Tudo estava à frente dos olhos mas minimizaram-se os riscos e deixou-se estar até a tragédia acontecer.
Esta atitude tão tipicamente nossa é a mesma que conduz ao desleixo pela coisa pública e permite que situações se arrastem até ao limite, embora qualquer cidadão possa, nos dias que correm, alertar, informar e denunciar seja junto das entidades responsáveis, seja pelas redes sociais que cada vez mais se assumem como veículos de disseminação.
Nem tudo se pode evitar. O risco é inerente ao ato de viver. No entanto reduzir os riscos e minimizar consequências é dever de todo e qualquer cidadão e ninguém está livre de responsabilidade.
Assim, e porque este mundo é de todos e todos são deste mundo, antes de apontar o dedo a quem assume funções de governação seja a nível local, regional ou nacional, devemos interrogar-nos sobre qual é a quota parte de responsabilidade que cada um tem no estado a que se deixam chegar as situações seja qual for a área. Em democracia todos somos chamados a participar e se é necessário ter boas lideranças é imprescindível ter melhor povo.