Rota da Terra Fria reconhecida pelo Turismo de Portugal como uma das nove redes colaborativas com maior sucesso a funcionar em Portugal, beneficia de apoios da União Europeia ao longo de quase duas décadas para estruturação do projeto Viagem à Natureza. Trata.se de um investimento público de 34,2 milhões de euros e apoio comunitário de 24,7 milhões de euros á volta de um percurso de 455 Km desenhado em cinco municípios, agregador de investimento público, visando a valorização da economia local, a coesão e a competitividade, alicerçadas na valorização de recursos endógenos e na biodiversidade dos Parques Naturais de Montesinho e Internacional das Arribas do Douro e de outras áreas classificadas que em conjunto integram a classificação de Reserva Biosfera atribuída pela UNESCO. É oportuno lembrar a importância do apoio da União Europeia, refletir sobre o que foi feito e próximos desafios na perspetiva do desenvolvimento e sustentabilidade do investimento realizado.
No ano de 1999, a Associação de Municípios da Terra Fria Transmontana, á qual presidia, deu início à reflexão e estudos visando a criação de um projeto integrado de desenvolvimento sustentável do turismo de natureza nos municípios da Terra Fria Transmontana: Bragança, Vinhais, Vimioso e Miranda do Douro, concebendo uma rota de turismo de natureza, apostando na excelência do património natural e paisagístico dos dois parque naturais.
Foi idealizada uma viagem à natureza através de uma rota integrada, com 400Km de extensão, percorrendo os principais pontos de interesse turístico dos quatro concelhos. O objetivo foi o de promover a microeconomia das localidades rurais, potenciada pela biodiversidade do território, pelo património histórico e cultural, pela gastronomia, elementos diferenciadores de um território com identidade e razão de ser próprias.
Foram muitas as reuniões técnicas, políticas e com agentes económicos e institucionais, no sentido de assegurar que o projeto se baseava num objetivo bem definido, focado no médio longo prazo, de forma coerente e partilhada e que teria condições para mobilizar a atenção de decisores tendo em vista o financiamento do plano de ação do projeto, o que veio a ser incluído no Pacto para o Desenvolvimento da Terra Fria Transmontana, assinado a 26 de abril de 2001, em cerimónia pública envolvendo a Associação de Municípios da Terra Fria e os ministérios do Planeamento e do Ordenamento e Conservação da Natureza, representados pelos Secretários de Estado, Ricardo Magalhães e Silva Pereira.
O projeto com um investimento inicial de 15 milhões de euros foi financiado no âmbito do III QCA, 2000-2006, com um cofinanciamento de 75%, para a construção de infraestruturas de viabilização física da Rota, ligando alguns dos locais mais emblemáticos dos 4 concelhos, nas dimensões paisagística, patrimonial, cultural e gastronómica, envolvendo ligações entre aldeias, a sua reabilitação, investimentos em alguns projetos âncora na perspetiva da valorização do conceito de base e estimulo ao investimento privado, complementar do investimento público, tendo presente que a estruturação dos recursos em termos de oferta turística teria numa fase inicial que se basear no investimento público, para criar condições mais favoráveis ao investimento privado e assim, aumentar a economia e o emprego.
Foram 120 os projetos concretizados nesta primeira fase. Dos muitos que poderiam ser destacados vale a pena salientar, o Parque Biológico de Vinhais, na altura um dos que nos pareceu de maior risco em termos de viabilidade de desenvolvimento. Carlos Taveira, o Presidente da Câmara de Vinhais apostou de forma convicta neste projeto. Em Bragança destaca-se a requalificação de Rio de Onor e os estudos do Parque da Traginha.
No mês de junho de 2007, em sessão pública realizada na aldeia de Rio de Onor, presidida pelo Presidente da CCDR – N, Carlos Lage, foi apresentada oficialmente a Rota da Terra Fria. Concluída a primeira fase infraestrutural de viabilização da Rota de Turismo de Natureza, iniciava-se a fase seguinte de dinamização comercial e promocional da Rota. Neste período de tempo, o setor privado investiu no aumento e na estruturação da oferta no âmbito da restauração e da hotelaria, tanto no espaço rural como no urbano, fazendo-o com bastante qualidade física e de serviço.
No Quadro Comunitário de Apoio para o período de 2007 a 2013, lançou-se uma segunda fase do projeto com um novo programa de investimentos, visando a atratividade comercial da Rota, a sua evolução para um produto turístico da Terra Fria Transmontana, dinamizando a vertente comercial e promocional, envolvendo novos investimentos públicos, candidatados ao programa de fundos comunitários PROVERE, estratégia de valorização económica de base territorial dirigido especificamente para espaços de baixa densidade, com o objetivo de fomentar a sua competitividade através da dinamização de atividades de base económica inovadoras e alicerçadas na valorização de recursos endógenos, tendencialmente inimitáveis do território.
Nesta fase, o concelho de Mogadouro aderiu à Associação de Municípios da Terra Fria Transmontana e a Rota foi ampliada a esse concelho, passando de 400 para 455KM. Novos projetos foram desenvolvidos, salientado a construção das cinco Portas da Rota, espaços de apresentação e promoção do território e dos seus produtos de referência; a construção do parque Ibérico de Natureza e Aventura de Vimioso; o Centro de Interpretação do Porco e do Fumeiro em Vinhais; o Recinto de valorização das Raças Autóctones e Espaço da Feira em Bragança; o Parque de Natureza do Juncal em Mogadouro; a requalificação do Parque de Campismo de Miranda do Douro, o que conjuntamente com outros projetos, envolveu um programa de investimentos de 12 milhões de euros, cofinanciados a 85% por fundos comunitários. Atualmente a principal Porta de entrada na Rota está encerrada, localizada num dos edifícios requalificados do antigo forte de S. João de Deus em Bragança, situação que prejudica o conceito de promoção e divulgação da Rota.
No atual Quadro Comunitário de Apoio de 2014 a 2020, o projeto da Rota da Terra Fria contempla um projeto específico de qualificação, profissionalização e de internacionalização e outros 6 projetos âncora, com financiamento no âmbito do PROVERE, com investimento total de 7,2 milhões de euros, apoiados com 3,24 milhões de euros de fundos comunitários. Dos projetos âncora é retomado o Parque da Traginha na cidade de Bragança, a construção dos Centros de Valorização das Raças Autóctones em Miranda do Douro e Mogadouro; a valorização das Termas de Vimioso e um Centro Interpretativo em Vinhais.
Passadas duas décadas sobre o início do projeto, pode afirmar-se como positivo o balanço do investimento público e dos apoios da União Europeia mobilizados na construção e estruturação desta Rota de promoção do turismo de natureza, como produto turístico da Terra Fria, pelo menos pelas seguintes razões: i) – aumento muito significativo da oferta turística no território, em quantidade e qualidade pela via do investimento privado. Alguns reconhecimentos recentes são bem expressivos da evolução positiva do setor; ii) – aumento significativo da procura turística associada ao turismo de natureza à cultura e à gastronomia; iii) – investimento público realizado em projetos âncora de promoção e valorização dos recursos endógenos de maior representatividade e qualidade; iv) - intervenção no espaço público e em equipamentos que contribuem para a coesão territorial e atratividade urbana; v) - A Rota da Terra Fria foi reconhecida pelo Turismo de Portugal como uma das nove redes colaborativas com maior sucesso a funcionar em Portugal.
Este projeto de Rota da Natureza, á semelhança de outras Rotas que na região Norte se vão estruturando no sentido de promover de forma integrada o território e os seus recursos na perspetiva de valorização patrimonial e económica pela via do turismo, como: a Rota do Românico; a Rota das Catedrais; a Rota dos Mosteiros; a Rota dos Castelos e Fortalezas; os Caminhos de Santiago e de Fátima, representa um objetivo de organização e de cooperação de atores do território para em conjunto vencer dificuldades de desenvolvimento, fazendo opções de investimento e de otimização de resultados em benefício da comunidade. O projeto da Rota com duas décadas de execução representa um investimento público direto de 34,2 milhões de euros, cofinanciados pela União Europeia ao longo de três Quadros Comunitários com 24,7 milhões de euros.
Nesta 3.ª fase do projeto parece-me existirem três desafios: i) – o da qualificação e profissionalização da oferta privada no sentido de venderem a Rota da Natureza como produto turístico, pela via do desenvolvimento de empresas locais que assegurem a ligação entre a oferta turística a oferta local e a procura externa, através de parcerias com empresas turísticas globais, por forma a mobilizar de modo organizado maiores fluxos turísticos, assegurando melhores taxas de ocupação, estadias mais prolongadas e aumento dos resultados líquidos das empresas e assim conferir maior rentabilidade e sustentabilidade ao investimento privado que tem vindo a ser realizado, contribuindo para o crescimento da economia e do emprego.
ii) – O investimento dos municípios na Rota da Terra Fria, concluídas as fases de investimento infraestrutural, é menos exigente e deve apontar para o investimento imaterial, visto a Rota dispor já de uma oferta transversal estruturada, centrada na elevada qualidade ambiental, cultural, patrimonial e gastronómica, incidir na gestão promocional profissionalizada e continuada, agregando esforço partilhado e contribuição financeira de operadores privados, mantendo um plano estratégico e de ação para o turismo na região, atualizado e com resultados mensuráveis e escrutináveis para que o contributo deste setor para a economia esteja á altura do investimento realizado, da expetativa futura e potencial do território.
iii) – Concentrando-se acima de 90% das dormidas turísticas no litoral, o Governo Central não pode ignorar a necessidade de promover o turismo no Interior, promover investimentos necessários para criar novas portas de entrada de fluxos turísticos no Interior, no caso concreto do Nordeste Transmontano, investindo no setor dos transportes e da mobilidade como a finalização do IP2 entre Bragança e a fronteira a Norte, com ligação à estação de TGV em construção, na Puebla de Sanábria, a pouco mais de 30 Km de Bragança, terminar o IC5 e algumas ligações concelhias, caso de Vimioso e de Vinhais.
Investir na rede secundária aeroportuária regional, designadamente no Aeroporto Regional de Bragança, para garantir intermodalidade de meios de transporte, e aos operadores turísticos a possibilidade de mobilizarem outros recursos mais competitivos, permitindo aos turistas chegar e partir de Bragança por transporte aéreo. Quem chega ao Aeroporto Francisco Sá Carneiro deverá poder visitar o litoral, subir o Douro e concluir a sua estadia na Terra Fria, o seu ponto de regresso a casa, podendo ocorrer o inverso. A mesma perspetiva pode ser desenvolvida relativamente a quem chega a Madrid ou Valladolid e se desloca de TGV até Puebla de Sanábria, podendo ter o seu ponto de regresso no aeroporto de Bragança.
A conjugação e resolução dos três desafios permitirão dar um novo e decisivo impulso ao turismo em Trás-os-Montes, conferindo maior oportunidade e rentabilidade ao investimento público e privado, o crescimento da economia e do emprego, caso contrário, o território estará cada vez mais condenado a um futuro de incerteza e de abandono face à intensidade do despovoamento e do envelhecimento populacional. Apostar no futuro é acreditar e ter uma ação transformadora e de esperança, é o que os residentes tem vindo a fazer, esperando que o poder central execute políticas públicas de solidariedade devida.
Setembro de 2019