Empurrar com a barriga

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A expressão título desta crónica estival ganhou espaço instalando-se nos miméticos vocabulários ditos chiques dos comentaristas bebedores de piadas servidas nas televisões estrangeiras. Sem qualquer sombra de recato, quanto mais de pecado, os nossos representantes nas Assembleias da República e Municipais enchem a boca de barrigas a empurrarem tudo e mais alguma coisa, a concederem razão ao antigo professor universitário Monarca Pinheiro, o qual escreveu um livro a glosar as barrigonas dos alentejanos.
O sociólogo é estrénuo contador de histórias tendo como pano (prato) fundo petiscos e vinhos das terras além Tejo, num enrolamento de demorados cantares e episódios burlescos em suspicaz mistura.
Ora, em Bragança também existiam barrigas rotundas, uma seria esférica, não por acaso o seu detentor carregava a alcunha de Bolinhas (Sr. Machado, funcionário do Governo Civil), mas não consta transformá-la em alavanca ou travessa empurradora, tal qual às usadas no metro de Tóquio no afã de empacotar as pessoas nas carruagens do Metro. Apesar de estarmos na estação maluca coíbo-me de descrever exercício de empurra nipónico porque podia ofender as pessoas sensíveis.
A expressão cimeira de grosso modo significará – varrer o lixo para debaixo do tapete – daí ao ouvir as bazófias de Maria de Luís Albuquerque, dado a presunçosa não exibir protuberante barriga, prefiro imaginá-la agarrada à vassoura a esconder o caso BANIF, a inaptidão na regulação da Caixa, sem esquecer o BES, entre o soalho e a carpete do seu outrora gabinete. O PSD vai perder uma carreta de votos em consequência das asneiras de Luís.
A rapaziada dos anos sessenta do século ido lembra-se, tal como os mais velhos, de um contínuo (chefe) do Liceu proprietário de imponente pança a qual ficou nos anais das extravagâncias comilonas porque numa clara demonstração de superioridade relativamente à do Senhor Augusto (também contínuo) alojou sem problemas uma carreta de batatas assadas no forno e apurada canhona.
No capítulo de barrigas quase rivais da de Gargântua, o meu prezado amigo Zé Monteiro (historiador José Monteiro) é testemunha e às vezes parceiro das proezas de Arquivista à força, dotado de invulgar apetite, certamente, inspirado no formidável Padre-Boi (Doutor José Antunes) são lendárias as suas mastigações de horas e horas. O Zé participou num exercício desses na casa de um sacerdote amigo, que os convidou a almoçarem com ele no dia de exaltação do orago. Foram, o padre ainda estava a presidir às cerimónias religiosas quando chegaram, mal franquearam a sala das refeições viram um leitão e um cabrito assados, luzidios, cheirosos, a fazer salivar bocas ressequidas.
Atiraram-se aos deleitosos assados, quando o amigo pároco voltou só viu ossos, exclamou, exclamou, referiu outros convidados, lastimou a gula dos manducantes. O amigo do Zé Monteiro, buliçoso, respondeu-lhe galhofeiro: olha que tivemos de empurrar a carniça com muito pãozinho…
As deputadas esquálidas aludirem a barrigas soa-me a blasfémia, ainda se fosso o deputado Carlos Abreu Amorim vá lá, o honorável revela volumosa volumetria ventresca, imita perfeitamente o deputado salazarista Pinto Barriga (exactamente) destro na palavra e no manejo de faca e garfo entre outros no já desaparecido Restaurante Paris onde podíamos apreciar esfusiante comida galega.
Ainda vi jogar o guarda-redes Barrigana, empurrava as bolas a soco, chamavam-lhe o mãos de ferro, às vezes as suas manápulas mereciam o epíteto de mãos de caca, o facto de a sazão ser doida uma palavra escatológica não borra a escrita, tal como aludir ao doutor Nalguinhas caso em vez da barriga fosse o sim-senhor a empurrar os desastres da governação de todos quantos nos vêm governando.
A elite política está a banhos (sem sabão-macaco) nas salsas ondas descansando das ingentes tarefas de memorização de graçolas e epítetos ingredientes considerados necessários aos despiques no Parlamento, rádios e televisões, seria grave intromissão eu sugerir-lhe leituras conducentes a elevar a qualidade dos ditos e contraditos. Eles não têm tempo, nem vontade para tal.
Já os leitores devem lardear o lazer lendo, muito, os múltiplos lucros grudam-se na mente sem a avolumarem qual Sancho Pança (o Dom Quixote vela releituras) depois de ter ingerido um pote de caldo manchego. As leituras concedem-nos a possibilidade de levarmos o nosso sentido crítico à eficiência dos bisturis no lancetar as disformidades pançudas de vitoriosos vendedores de ilusões porque gostamos de nos iludir ilustrando o mote: temos grandes desilusões devido a…isso mesmo.
Encher a barriga de leituras impede sermos empurrados. Percebem!

Armando Fernandes