Para além de Manuel Santiago, de cuja descendência já falámos, Jacinto Ferreira teve dois irmãos que foram ourives da prata. Os dois viveram em Miranda do Douro e ambos tiveram contas com o santo ofício, juntamente com as respetivas consortes. Um deles foi António da Costa, casado com Maria dos Santos, sua sobrinha, filha do citado Manuel Santiago. O outro chamou-se Francisco Pimentel e era ourives da prata, casado com Catarina da Costa, filha de Francisco de Albuquerque e Maria Serrão, família de quem falaremos em próximo texto. E teve também uma irmã, batizada em Bragança com o nome de Ana Pimentel, que passou a ser geralmente conhecida por Ana Gomes, por ser casada com Francisco Gomes, escrivão e rendeiro, homem de influência e prestígio na cidade de Bragança. Em Março de 1661, Ana Pimentel (Gomes) era já viúva, conforme testemunhou sua tia Ana Pimentel, perante o inquisidor Manuel Pimentel de Sousa: - Haverá 11 anos, em sua casa, se achou com a dita sua mãe, Francisca Henriques e com Agostinha Pereira, mulher de Francisco da Costa Pimentel, e com Ana Gomes, sobrinha segunda, por ambas as vias, dela confitente e Ana Gomes é viúva de Francisco Gomes, escrevente e rendeiro. Depois que ficou viúva, Ana Gomes deixou Bragança e foi-se para a cidade de Múrcia, em Castela, onde o seu conterrâneo António de Sória trazia arrendada a cobrança dos “milhones” naquela região. Aliás, ela própria pertencia à família dos Sória, originária de Bragança. Ana e Francisco tiveram 4 filhos e uma filha. Um dos filhos chamou-se António Gomes e residiu em Bragança onde exercia o ofício de ourives do ouro, alcançando a categoria de “mestre”, o que lhe permitia dar “formação profissional”. A propósito, temos o testemunho de um dos seus formandos, o aprendiz de ourives, Ambrósio Saldanha Sória que, em 23.1.1693, na inquisição de Lerena disse: - Haverá 20 anos, tendo (o seu mestre) de fazer uma jornada da cidade de Bragança para Múrcia para ver sua mãe que lhe parece se chamava Ana Gomes e presume ter sido presa pela inquisição daquela cidade, o dito seu Mestre lhe disse, encomendando este a Álvaro Vaz, prateiro… Será que Ana Pimentel Gomes regressou com o filho a Bragança, terra onde veio a falecer, conforme informação de seu sobrinho Fernando Fonseca Chaves? Deixemos Ana e voltemos ao filho, António Gomes que era casado com Brites da Costa. Francisco Gomes, um dos seus filhos, estudou medicina em Coimbra, ausentando-se para a “Corte de Roma”. Outro, Manuel da Costa, foi ourives da prata e também deixou o reino. De um terceiro, também ourives da prata, temos conhecimento por algumas denúncias feitas contra ele, por parentes seus, como foi o caso de Francisco Pimentel e seu irmão Manuel Santiago que, em 13.5.1716, confessou, perante o inquisidor Francisco Carneiro de Figueiroa: - Haverá 8 anos, em Bragança, em casa de seu tio José Gomes, ourives da prata, solteiro, filho de António Gomes, do mesmo ofício, e Brites da Costa, ausentes, o doutrinou na lei de Moisés. António Gomes e Brites Costa tiveram também uma filha, que batizaram em Bragança com o nome de Leonor da Costa, a qual casou com Salvador Mesquita, torcedor e mercador de seda. O casal vivia no Porto e trabalhava em rede com a família, nomeadamente Lopo de Mesquita, irmão de Salvador, vendendo as peças de seda que lhe remetiam de Bragança onde eram tecidas. Veja-se, a propósito o testemunho do Moncorvense Manuel Lopes na audiência de 12.1.1704: - E também não sabe o apelido de um Salvador que diziam ser irmão de Lopo de Mesquita e que vivia no Porto (…) E o dito Lopo seu irmão lhe remetia as telas que se teciam para que as vendesse e encaminhasse para ele a diferentes partes, e ele confitente viu em Bragança em casa de Lopo de Mesquita algumas vezes que foi por seda e levar-lhe as telas ao dito Salvador Mesquita… Acerca da família de Lopo (“um homem muito rico”) e Salvador de Mesquita, o já citado António, aliás, Jacob de Morais, fez a seguinte confissão, em 18.1.1718: - Há 2 anos em Bayonne se achou com (…) Lopo de Mesquita, cristão-novo, torcedor de seda, casado e hoje se chama Abraham de Mesquita, tendeiro, natural de Bragança e com Salvador Mesquita, filho deste, tratante de chocolate, casado com uma filha de Mécia de Morais, e hoje em Bayonne se chama Isaac de Morais, e estando os 3 com mais família desta casa, que consta de filhos e filhas e com as mulheres dos mesmos, se declararam e com os mesmos ia à sinagoga. Martinho Gomes, torcedor de seda, era outro filho de Ana Pimentel e Francisco Gomes. Estava casado com Maria de Medina, quando foi preso pela inquisição de Coimbra, ao início de Setembro de 1683, saindo penitenciado em cárcere a arbítrio dos inquisidores em 4.2.1685. Em 1696 a inquisição de Lerena enviou para a de Coimbra um treslado de culpas contra ele, pedindo a sua prisão. Martinho teria já fugido, pois que do processo consta apenas o mandado de prisão e o treslado das culpas. Não sabemos se foi nessa altura que outro seu irmão, Francisco Gomes da Costa, deixou Bragança e se foi para Múrcia onde casou com uma castelhana, chamada Constança Maria. Em Múrcia lhe nasceram dois filhos e duas filhas e, em Múrcia foram ambos pela inquisição ele e a mulher. Recuperada a liberdade, rumaram a Portugal com os filhos, ainda pequenos. Constança Maria faleceu pouco depois, em Bragança e Francisco e os filhos mudaram- -se para Aldeia Galega, hoje Montijo, dali transitando para Lisboa. André Francisco da Costa e Álvaro Francisco da Costa se chamavam os dois filhos de Francisco e Constança, ambos fabricantes de meias. André tinha 29 anos e Álvaro 25, quando foram presos pela inquisição, em 15.4.1713. Saíram penitenciados em cárcere a arbítrio dos inquisidores e penitências espirituais, no auto de 9.7.1713. Os seus processos são simples e normais, se é que alguma normalidade existia nos tribunais do santo ofício. André confessou que fora doutrinado na lei judaica, em Lisboa, pelo seu tio Fernando da Fonseca Chaves e Álvaro responsabilizou a mãe pelo mesmo ensino, em Bragança, para onde viera ainda pequeno. Notas de mais interesse em ambos os processos respeitam aos contactos com outros membros da nação hebreia de Bragança que assistiam na região de Lisboa, terras do Alentejo e Algarve, como era o caso de Rafael de Sá, que tinha loja de mercador em Lisboa ou José Cardoso da Paz, nascido em Ayamonte, Castela, filho de António Cardoso da Paz, que assistia em Faro e Ayamonte, de que falaremos em próximo texto. Por agora voltemos aos filhos de Ana Pimentel e Francisco Gomes para referir a filha Leonor da Costa que casou com António de Albuquerque, ourives da prata, um dos 30 e tantos brigantinos que, nos anos de 1661/1662 se foram apresentar a Coimbra. A esse tempo António era solteiro e morador em Bragança. Depois de casados, António e Leonor viveram algum tempo em Bragança, mudando- -se para a vila de Torrão, no Alentejo. De entre os seus filhos, referência para Filipa da Costa, nascida ainda em Bragança e que foi presa em 1706, quando morava em Lisboa, casada com o seu parente Dionísio Pimentel, rendeiro, filho de Eliseu Pimentel, um dos mais conceituados homens da “nação de Bragança” assistentes em Lisboa, de quem haveremos de falar.