A Assembleia da República dos Animais

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Não é, sequer, o exemplo mais significativo: entre 1987, data das primeiras eleições europeias e 2019, ano das mais recentes, a abstenção saltou de 28% para 70%, o que indicia um claro e continuado fracasso do Regime político vigente. Por este andar apenas os militantes partidários e demais arregimentados, irão votar.

Trata-se de um sapo que os políticos continuam a engolir sem pestanejar, que lhes retira autoridade para representar quem quer que seja e governar seja lá o que for, mas não os demove da vidinha alegre e airada que a política lhes proporciona. A maioria sente-se como peixe na água pelo que, a coberto da mítica estabilidade política, se devota a garantir que tudo continue como está. Marcelo Rebelo de Sousa é um deles.

Enquanto Presidente da República incitou, sem êxito, os portugueses a ir às urnas, mas no rescaldo de mais este estrondoso desaire da democracia apenas se declarou preocupado com a hipotética crise da Direita. O que nos leva a pensar que para Marcelo de Sousa os abstencionistas são de Direita e que as demais desgraças do Regime, assim como o descalabro da generalidade dos serviços públicos, não merecem a atenção do Presidente da República. Ficamos sem saber se é o analista político que opina se o estadista que se demite.

Como se isto não bastasse Marcelo de Sousa reduz a Direita ao PSD, este sim claramente em queda, e ao CDS que está como sempre esteve, mas esquece que o PS, cuja vitória, nas próximas eleições legislativas inoportunamente augurou, também é de direita desde que Mário Soares meteu o socialismo na gaveta, pese embora António Costa, em desespero de causa, se ter concertado com Catarina Martins e Jerónimo de Sousa, que por sua vez atiraram os pruridos ideológicos às urtigas, para juntos pedalarem furiosamente pelas autoestradas do capitalismo, montados na Geringonça.

No decorrer desta patriótica refrega Rui Rio veio a terreiro discordar do analista Marcelo de Sousa argumentando que a crise é do Regime. Não deixa de ter razão ainda que as aflições do PSD nada tenham a ver com as maleitas da democracia.

Pena é que o inefável líder do PSD não tenha tido tino para apresentar publicamente, aos eleitores e aos competidores, um pacote completo de reformas contemplando, por exemplo, as candidaturas independentes à Assembleia da República, já que a constituição de novos partidos apenas parece servir aos trânsfugas dos partidos tradicionais. Lamentavelmente, ficou-se pela ideia peregrina, avulsa, de reservar cadeiras vazias no Parlamento. Caiu no ridículo pois então.

 Imagine-se uma Assembleia em que os deputados debatem com cadeiras desocupadas, poiso de fantasmas, que não são de esquerda ou de direita, nem votam a favor ou contra. Melhor avisado teria andado Rui Rio se nas cadeiras vazias sentasse animais, antes que o PAN se apodere da iniciativa.

Teríamos assim uma Assembleia da República surrealista, maioritariamente composta por animais políticos, digníssimos cães, gatos e jumentos, entre outros, devidamente amestrados para ornear delicadamente, levantar a patinha e votar.

Perante tanta tontaria só apetece mesmo sair à rua e gritar: candidaturas independes à Assembleia da República. Já!

 

Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

Henrique Pedro