O laço azul é o símbolo que alerta para a necessidade de proteger os Direitos das Crianças. Durante o mês de abril são várias as entidades que se associam a esta campanha, que teve início em 1989 nos Estados Unidos da América, quando uma avó colocou uma fita azul na antena do seu carro para chamar a atenção das pessoas para a questão dos maus-tratos. Os seus netos eram vítimas de maus-tratos e esta foi a forma encontrada por esta avó americana para chamar a atenção da comunidade para esta problemática. Escolheu o azul por se assemelhar às marcas deixadas pela violência no corpo das crianças.
Hoje os maus-tratos em crianças e jovens são entendidos como um problema de saúde pública a nível mundial. No Olho Clínico, este tema é abordado por Ana Sofia Coelho, enfermeira da Unidade Local de Saúde (ULS) do Nordeste no Núcleo de Apoio a Crianças e Jovens em Risco (NACJR), Anabela Martins, enfermeira da ULS Nordeste e representante do Ministério da Saúde na Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) de Bragança e Iveta Vilares, coordenadora do projeto Pontes de Inclusão do Programa Escolhas.
Proteger é um dever
Refletir sobre os Direitos das Crianças é o primeiro passo para identificar os diferentes tipos de maus-tratos. A enfermeira Ana Sofia Coelho recorda que só no século XX é que surge uma lei específica de proteção e de promoção dos direitos da criança. Destaca-se assim a Convenção dos Direitos da Criança da UNICEF, ratificada por vários países, inclusive Portugal, em 1989. Este documento contém 54 artigos que especificam os diferentes direitos da criança, os quais podem ser classificados em quatro grandes categorias:
• Sobrevivência: direito à alimentação, água, abrigo e cuidados de saúde
• Proteção: direito a ser protegida contra a exploração, negligência e abuso
• Desenvolvimento: direito à educação, direito a brincar e a participar em atividades culturais
• Participação: direito a expressar as suas ideias e opiniões, à informação e à participação em processos de decisão em assuntos que a afetam
Para além dos direitos, a enfermeira sublinha que também devem ser tidas em conta as necessidades das crianças, nomeadamente fisiológicas, cognitivas e emocionais.
Os maus-tratos em crianças e jovens dizem respeito a qualquer ação ou omissão não acidental, perpetrada pelos pais, cuidadores ou outra pessoa, que ameace a segurança, dignidade e desenvolvimento psicossocial e afetivo da vítima. Entre os diferentes tipos de maus-tratos destacam-se a negligência, maus-tratos físicos, abusos sexuais, bem como maus-tratos psicológicos.
Sinalizar para reabilitar
A sinalização precoce é essencial para uma intervenção a tempo de evitar danos significativos no desenvolvimento da criança, que segundo a lei é considerada entre os 0 e os 18 anos. Essa sinalização pode e deve ser feita por qualquer pessoa que tenha conhecimento de situações de maus-tratos e pelas entidades com competência em matéria de infância e juventude, nomeadamente as escolas, unidades de saúde, ou qualquer instituição que lide com crianças.
O alerta pode dado a diversas instituições, desde a escola, às unidades de saúde, ao NACJR, à CPCJ, Linha SOS Criança, ao Núcleo de Apoio à Vítima da ASMAB, à PSP ou à GNR.
“Sinalizar não é acusar, não é para culpar, não é para incriminar ninguém, mas é para as instituições que devem acompanhar identificarem quais são as situações de risco para aquela criança e quais são os fatores de proteção para que ela se desenvolva de forma global, salvaguardando todos os seus direitos”, realça a enfermeira Anabela Martins.
A profissional de saúde sublinha que o papel das instituições é ajudar, criando condições para que seja a família a criar as suas regras, o seu percurso e o seu projeto de vida. Exemplo disso é o trabalho desenvolvido pelas unidades de saúde ao nível da preparação para a parentalidade, ou o projeto “Escola de Pais”, através do qual a escola promove formação para os progenitores aprenderem a lidar com as próprias crianças.
Sempre que é sinalizada uma criança por suspeita de maus-tratos, o NACJR constitui uma resposta de primeiro nível, desenvolvendo a sua ação no âmbito da promoção dos direitos das crianças/jovens, em articulação com as equipas de saúde familiar e respostas comunitárias, acompanhando as famílias sinalizadas, com o seu consentimento, e procurando promover competências, minimizando fatores de risco e potenciando fatores protetores.
Quando de se trata de situações de maior gravidade é acionada a resposta de segundo nível, assegurada pelas CPCJ.
Projetos de inclusão
Estas instituições trabalham em articulação com outros projetos, como é o caso do “Pontes de Inclusão”, no âmbito do Programa Escolhas, que surgiu em Bragança em 2010, através de uma candidatura da Casa do Trabalho, acompanhando as crianças, quer em contexto escolar, quer em contexto de comunidade. “O que o projeto tenta fazer é perceber qual a origem do problema e procurar solucioná-lo. A mediação escolar é uma das tarefas que fazemos, porque há uma desadequação do horário laboral das famílias com a escola. Então fazemos o acompanhamento da criança e orientamos a família”, explica a coordenadora do projeto, Iveta Vilares.
O problema dos maus-tratos é transversal a várias classes sociais e muitas vezes resulta do desconhecimento que as próprias famílias têm dos Direitos das Crianças e da dificuldade em solucionarem os problemas parentais com que se deparam no dia-a-dia. Daí a importância da sensibilização para esta temática.
Defenda os direitos das crianças!
No mês dedicado à prevenção dos maus-tratos na infância é fundamental alertar a comunidade para a importância de estar atenta e sinalizar situações suspeitas de maus-tratos. E porque “a melhor forma de tratar o problema é impedir que aconteça”, o Olho Clínico desta semana promove a reflexão sobre os Direitos da Criança.