Três histórias de resistência ao vírus

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Ter, 21/07/2020 - 10:47


Fomos conhecer três casos de pessoas infectadas com Covid-19 que estão curados. No concelho de Mogadouro, Susana Monteiro, de 58 anos, soube que estava infectada dois dias depois da Páscoa. Foi a única da família a testar positivo para o novo coronavírus. Ernesto Corredeira já não teve a mesma sorte e mais três familiares também ficaram doentes. Tem 70 anos e esteve mais de um mês com a doença activa. Já Acúrcio Pereira é a prova de que a idade não é um factor determinante. Histórias diferentes de quem sofreu do mesmo mal.

Ernesto Corredeira foi das primeiras pessoas a testar positivo para a COVID-19, no concelho de Bragança, em Março, quando a pandemia tinha chegado há poucos dias a Portugal. Começou por sentir dores fortes de cabeça e náuseas, tal como a esposa, a cunhada e o cunhado. Foi- -lhe diagnosticada uma infecção urinária mas, mais tarde, começou a ter febre e acabou por dirigir-se, novamente, ao hospital de Bragança, onde fez o teste. “Logo que tive os primeiros sintomas não saí mais de casa e, a partir do momento que soubemos que o meu cunhado estava infectado, vimos logo que devíamos estar todos”, começou por contar Ernesto Corredeira. A sua esposa, apesar de também ter ficado infectada, não manifestou qualquer sintoma, o que facilitou e ajudou na recuperação de Ernesto. “Eu confesso, se estivesse sozinho teria sido um problema grande, porque houve uma altura em que deixei de comer e, então, a companhia foi o melhor que me pôde acontecer”, admitiu. Teve sintomas durante dez dias, mas ao oitavo dia viu- -se obrigado a pedir “auxílio” ao hospital, devido à forte dificuldade em respirar e febre alta. “Cada vez que respirava pela boca tinha tosse e tinha dores mesmo violentas no tórax e não tinha força nenhuma”, contou, admitindo que nos momentos mais difíceis pensou que poderia “não resistir”. Mas, com o paracetamol e exercícios respiratórios conseguiu aliviar os sintomas e não precisou de ser internado. 15 dias depois de já não ter qualquer sintoma voltou a fazer o teste, mas continuava a dar positivo. Só um mês e meio depois de saber que estava infectado ficou a pertencer ao grupo das pessoas recuperadas. Durante o tempo que esteve isolado, os amigos foram quem lhe valeu e à companheira. “Deixavam-me à porta a fruta, o pão e medicamentos. Nunca tivemos contacto”. Susana Monteiro vive em Vila de Ala, no concelho de Mogadouro, e também testou positivo para a Covid-19. Havia alguns dias que já estava a ser medicada, mas os sintomas não melhoravam. No dia de Páscoa, dirigiu-se ao centro de saúde da vila e de lá foi reencaminhada para o hospital de Bragança, onde esteve internada durante 12 dias. “Um médico disse-me que o meu caso foi muito grave, porque afectou os pulmões, o fígado, os rins e tinha ainda uma anemia”, afirmou. Depois do internamento no hospital, ficou isolada em casa de um familiar durante 24 dias. “O meu marido ligava-me e perguntava-me do que precisava e depois punha- -me as coisas à porta. Mas havia dias que eu não tinha coragem de fazer comida ou estar de pé”, contou. Susana Monteiro disse que foi “difícil” suportar os sintomas e estar sozinha fechada dentro de casa, mas estar longe da família também. “Metida naquela casa sozinha, sem ter com quem falar foi muito difícil. Nem sequer televisão tinha no início”, relatou. Da porta da casa onde estava isolada, via os netos que estavam à janela da sua própria casa. “Dizíamos olá e mandávamos um beijinho de longe e era assim que matávamos as saudades”. O medo não foi o seu companheiro durante o tempo que esteve infectada, mas a solidão. “Eu só pensava recuperar”, disse, acrescentando que o presidente da junta de Vila de Ala foi um dos seus apoios nesta fase. Acúrcio Pereira vai fazer 80 anos no final do ano e pode dizer-se que é o rosto da esperança. Desde o início da pandemia que foi determinado, pela Direcção Geral de Saúde, que pessoas com idade superior a 65 anos fazem parte do grupo de risco. Mas, enganam-se aqueles que pensam que a idade determina o fim de uma história. Acúrcio Pereira esteve também internado no hospital de Bragança, por apenas 10 dias. Contou ter feito vários tratamentos e nunca perdeu a mobilidade. “Eu movimentava-me bem e andava”, referiu. Quando regressou a casa disse já se sentir bem e não tomou qualquer medicamento. “Disseram-me para não sair de casa durante 15 dias e respeitei a decisão, mas já me sentia à vontade e capaz de andar na rua”. 15 dias depois foi fazer o teste e o resultado foi negativo. Sempre acreditou que não era “nada de preocupante” e foi isso que o fez “resistir facilmente à situação”. A maior dificuldade foi estar longe da família e dos amigos. Todos os dias de manhã tinha encontro marcado com os amigos num café da cidade de Bragança, mas o vírus quebrou-lhe a rotina. “Eu recebia telefonemas dos meus amigos mais próximos para saberem como estavam as coisas a evoluir. Não se esqueceram de mim. Mas é diferente receber um telefonema ou estar com eles”, salientou, acrescentando que os amigos e a família são “fundamentais” nestes momentos. Desconfia que terá apanhado o vírus numa visita familiar a Vila Nova de Gaia e a Matosinhos, visto que uma semana depois começou a ter febre. Foi o único da família a ficar infectado.

Jornalista: 
Ângela Pais