Sector da construção a braços com preços altos e escassez de materiais

PUB.

Qua, 10/08/2022 - 17:51


A guerra na Ucrânia fez disparar o preço dos produtos e os materiais de construção não foram excepção.

As empresas de construção vivem numa constante “instabilidade” de subida e descida de custos, que criam “incertezas”, como a antevisão das necessidades a curto prazo.

Alguns materiais chegaram a registar subidas de “100%”. A tonelada de ferro custava 780 euros e, actualmente, chega aos 1580 euros. Segundo o proprietário da empresa “David&Nuno”, em Bragança, que vende materiais para construção civil, o preço do ferro já diminuiu, no entanto, está a valores que “não são, nem de perto, nem de longe, parecidos com os que estavam antes da guerra e muito menos antes da pandemia”.

Os preços de produtos energéticos também subiram consideravelmente. “Temos uma série de materiais que subiram desmesuradamente, tais como as pellets, que é um produto energético, as chapas, que são provenientes do ferro, e coberturas de armazéns e casas”, disse Nuno Rodrigues.

A juntar-se ao aumento de preços está a falta de materiais, como a chapa e materiais de isolamento. “Há muita falta de matéria-prima, porque vêm de transportes marítimos e todas a fábricas que precisam de matéria-prima importada têm dificuldade em ter acesso ao produto”, explicou.

As empresas ao comprarem os materiais a um preço mais alto, são obrigadas a subir o preço ao consumidor final para fazer face aos gastos. E com os salários praticamente inalteráveis, começa a ser difícil ter algumas despesas, como a construção de uma casa. O empresário considera que, em breve, o poder de compra dos clientes vai “diminuir”, porque as pessoas “não recebem o suficiente para poderem aguentar este custo” e os juros podem também ser uma “ameaça”.

E com os bolsos dos clientes mais vazios, Nuno Rodrigues já nota quebras nas vendas. “Temos alguma baixa nas vendas em certos e determinados produtos, como a chapa, porque estamos sempre à espera que desça, há consumidores que estão a ver se desce o preço. Há outros clientes que não têm urgência muito grande da obra e aguardam para ver se melhores dias virão”, afirmou.

Apesar da subida do preço dos materiais e até dos combustíveis, que fizeram aumentar em 10 mil euros a factura mensal, a empresa “David&Nuno” tem mantido os cerca de 30 colaboradores.

 

Prazos demorados e aumento das taxas de juros afastam clientes

 

Na empresa de construção civil Abel, Luís Nogueiro e Irmãos Lda a subida dos custos das matérias-primas é também um dos principais problemas com que têm de lidar diariamente.

A esta dificuldade acrescem os prazos de entrega, por falta de material disponível. “Há determinado tipo de material e de equipamento que precisamos que não existe no mercado. Posso dar-lhe o exemplo, de umas portas para um equipamento social que precisavam de levar um termolaminado, que é um material muito próprio, que foram encomendadas em Fevereiro e chegaram-me há duas semanas”, explica um dos sócios da empresa, Pedro Nogueiro.

A enorme dificuldade de aprovisionamento de diverso material de construção tem a ver com um somatório de diferentes variáveis, entende o empresário, desde “a falta de matéria-prima, de mão-de-obra, ao aumento dos custos energéticos”.

A falta de material já se começou a fazer sentir com a pandemia e o encerramento das fábricas nos sucessivos confinamentos e a situação agravou-se com a guerra na Ucrânia. “Em jeito de desabafo, costumo dizer que nós saímos de uma para entrar noutra, acabámos de passar um período de grande dificuldade que foi a pandemia e a seguir aparece toda esta conjuntura da guerra que nos está a dificultar a actividade”, afirma.

A escassez reflecte-se no preço, que torna agora as obras mais caras, já que, por exemplo, os materiais ferrosos “há cerca de um mês e meio sofreram um pico muito grande de subida de preço, atingiram preços exorbitantes”.

A conjuntura tem muitas vezes como consequência o atraso nos prazos contratualizados e por vezes “o dono da obra não entende muito bem”. A empresa realiza obra pública e privada, mas no caso da obra privada as datas apontadas são algo demoradas, o que “as pessoas não estão propriamente a aceitar”. “Em função da quantidade de trabalho que nós temos, não consigo dar a perspectiva de início de uma obra privada dentro de dois ou três meses. Actualmente é de 7 a 9 meses e pode chegar a um ano”, refere. Alguns potenciais clientes acabam por desistir e nem pedir orçamento perante estes prazos tão dilatados.

Pedro Nogueiro garante que mesmo com a variação de preços que se tem registado, depois de iniciada a obra, a empresa não aumenta o orçamento do cliente. “Não reformulamos os orçamentos em relação a nenhuma das obras privadas, nas públicas há regime de revisão de preços”, mas nas obras privadas “estamos a suportar os custos acrescidos” com que não contavam.

Apesar de considerar ser difícil definir uma tendência da procura no sector da construção, que varia ao longo do ano, admite que nesta altura, com o aumento das taxas de juro, se nota “um arrefecimento na procura”. Desde há um mês “sente-se um abrandamento claro, quando nesta altura do Verão era normal haver um aumento da procura”.

Também no caso das obras públicas se sentem dificuldades para avançar com as empreitadas, já que muitas vezes não há apresentação de propostas e os concursos ficam desertos. “Enquanto o dono da obra pública não se convencerem que tem de ajustar os preços que lança a concurso, em função da conjuntura actual, é natural que isso aconteça, porque as empresas têm de trabalhar e ter o seu lucro, não podem fazer uma obra e ter prejuízo no final”, refere.

Jornalista: 
Olga Telo Cordeiro/ Ângela Pais