Primeira apanha da cereja “pouco animadora” com quebras que podem ser superiores a 50%

PUB.

Ter, 30/04/2024 - 12:18


Agricultores dizem que “muita chuva” e “pouco frio” não ajudaram no vingamento das primeiras variedades e por isso há pouca cereja para Maio

A poucas semanas de se começar a colher cereja, os produtores não estão com muitas esperanças relativamente à primeira apanha. Estima-se que, nas primeiras variedades, as quebras sejam de 50% ou até mais. A chuva excessiva em plena floração, como aconteceu em Março, e o “pouco” frio serão duas das causas para estas quebras. Ricardo Fonseca, da Vivalley Fruit, tem dois pomares, um de sete hectares, em Alfândega da Fé, e outro de quatro hectares, no Vale da Vilariça. Não tem perspectivas “muito animadoras” em relação às variedades do cedo, uma vez que prevê uma quebra “significativa”, de “50% ou mais”. O empresário considera que as temperaturas em Janeiro não foram baixas o suficiente para que esta primeira cereja vingasse. “Janeiro muito ameno, com pouco frio. O mês de Janeiro costuma ser o mês em que elas acumulam mais horas de frio, que é muito importante para elas passarem à fase reprodutiva e quando o frio não é suficiente, a produção ressente-se e eu acho que teve a ver com isso”, apontou. A Cooperativa Agrícola de Alfândega da Fé também não idealiza um cenário feliz. As quebras podem ir dos “20 aos 40%”, nas dezenas de hectares de cerejal que possui. “Na altura da floração tivemos chuvas e a flor não foi polinizada e além disso na altura do vingamento o fruto não conseguiu vingar”, explicou o presidente, Luís Jerónimo. Mais a Norte, no concelho de Macedo de Cavaleiros, a localidade de Lamas é também conhecida pela sua produção de cereja. Este ano, as primeiras ainda nãoserão em grandes quantidades. “As variedades mais temporãs não vão apresentar grandes quantidades, portanto, numa fase inicial o mercado não terá grandes quantidades de cereja disponíveis”, adiantou o representante da Associação de Produtores de Cereja de Lamas, que abrange 30 agricultores, com plantações que podem ir dos 150 aos 200 hectares. A apanha da cereja, nesta aldeia, começará dentro de duas a três semanas, mas Paulo Pires prevê quebras de “50%” nas variedades temporãs. António Vila Franca é um dos produtores de Lamas que se queixa da “irregularidade” do tempo. Os seus 14 hectares de cerejal já chegaram a produzir 90 toneladas de cereja, mas isso foi há mais de uma década. Agora com as condições meteorológicas, produz cerca de 40, ou seja, metade. Este ano não espera que seja diferente. A chuva em plena floração impediu que se formasse o fruto. Inicialmente previa algumas quebras, mas depois de ter estado no cerejal, na semana passada, e de ter visto que muitas cerejas nem sequer cresceram, percebeu que as quebras vão ser significativas. Ainda assim, o agricultor diz que ainda muita coisa pode acontecer até Maio e esta semana será “ponto fulcral” para ditar uma boa campanha.

Esperança na cereja tardia

Apesar de se prever pouca cereja para fim de Maio, início de Junho, os agricultores acreditam que no que toca às variedades mais tardias, o cenário será diferente. Ricardo Fonseca adiantou que para estas variedades a perda será residual, mas tudo depende das próximas semanas, visto que o fruto está numa fase de vigamento e se o tempo os atraiçoar, está tudo perdido. Não convém vir “calor excessivo”, nem frio, visto que é prejudicial ao crescimento. “Se as temperaturas se mantiverem amenas, se não houver muita chuva, se tivermos dias ensolarados, é isso que é preciso para que elas continuem a crescer bem”, explicou. A correr bem, poderá produzir entre 12 a 15 toneladas por hectare, este ano. Ainda assim, o empresário salientou que mais do que produzir em grandes quantidades, é preciso ter fruto de qualidade. Mas quanto a isso, considera que não faltará boa cereja, com bom calibre, porque tem feito um “esforço” para que isso aconteça. Também a associação de Lamas espera que as variedades mais tardias tenham grande produção. Além disso, apesar de a chuva ter sido prejudicial para as temporãs, ajudou no calibre do fruto. “Os calibres serão maiores, porque tivemos um Inverno bastante chuvoso, os solos continuam com bastante humidade, o que faz com que as plantas consigam alimentar devidamente o fruto e conseguir fazer com que cresça mais. O facto de estas temperaturas também estarem amenas e não tão elevadas, também faz com que se desenvolva em termos de calibre um pouco mais, porque não amadurece tão rápido e faz com que ele fique mais tempo na fase de crescimento”, explicou Paulo Pires. Na freguesia de Lamas a produção de cereja, o ano passado, rondou as 400 toneladas. Uma vez que se avizinha uma boa produção das cerejas mais tardias, a associação acredita que, este ano, “talvez a produção Na altura da floração tivemos chuvas, a flor não foi polinizada e além disso na altura do vingamento o fruto não conseguiu vingar” Luís Jerónimo fique um pouco acima”. António Vila Franca defende até que chuva neste momento pode ajudar, visto que “engrossa” a cereja. Na altura da apanha é que já não é favorável, uma vez que racha o fruto e, consequentemente, impede que seja vendido a fresco.

Preço da cereja é “comido pelo servido”

Segundo a associação de Lamas, há uma “discrepância entre aquilo que são os preços pagos ao produtor e o que são os reais valores de mercado”. Paulo Pires afirma mesmo que o vendedor final tem margens de lucro “muitíssimo superiores” às do agricultor, que é quem tem “todo o investimento e risco”. O também produtor considera que há uma “instalação no mercado de um sistema quase monopolista, que pode influenciar negativamente os preços”. É por isso que António Vila Franca “não quer conversas” com as grandes superfícies. Vende o fruto para o mercado abastecedor do Porto, com preços melhores. O agricultor diz que, actualmente, o custo da cereja fica quase a um euro, no entanto, é paga a “1,5 euros ou a 1,7 euros” aos agricultores e depois vendida a “4 ou 5 euros”. “Isto é o comido pelo servido”, afirmou o empresário, acrescentando que trabalha para “cobrir as despesas”. O produtor considera que o preço justo seria entre os “2 euros e os 2,3 euros”, seria “muito bom”. Mas para isso, entende que os agricultores da região se deviam unir, o que não acontece. António Vila Franco diz que é preciso “associativismo” e até criar uma “marca”, para que o fruto seja valorizado. Espera-se assim que dentro de duas a três semanas, a produção de cereja dinamize a economia local, embora com preços que ficam aquém do que alguns produtores consideram justos. A primeira apanha também trará prejuízo, já que as quebras podem ser mais de metade.

Jornalista: 
Ângela Pais