Ter, 11/04/2023 - 10:14
Em Vimioso, um concelho, como praticamente todos os do Interior, marcado pela falta de gente e pela carência de actividades culturais, de espaços e programação como nos grandes centros, falta, muitas vezes com o que preencher os dias. Não foi bem por isto que, há 25 anos, surgiu a Banda Filarmónica da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Vimioso, mas a verdade é que esta tem sido algo que a muitos foi e vai despertando curiosidade e vontade de integrar, não só porque não há muito por onde escolher, mas sobretudo porque oferece, a quem a integra, uma família fora de casa. Patrícia Carvalho, de 33 anos, pertence à banda desde os sete. Esta é uma casa de gerações, que tem a particularidade de unir pessoas de várias idades, tal como acontece com este membro e com a filha, que ainda nem três anos tem, que frequentam a banda juntas. “Além de ser uma aprendizagem musical, é uma aprendizagem a nível pessoal. Entramos muito pequenos e apreendem-se horários e responsabilidades”, referiu Patrícia Carvalho, que aplaude o “convívio com as várias faixas etárias”. O tempo e a disponibilidade não são os mesmos, mas faz questão de continuar na banda. E, agora, trazendo a filha, a pequena Raquel, é mais fácil. “Temos poucas actividades em Vimioso e gosto que ela aqui ande. Esta é uma actividade em que não brincam apenas. Começam a ter responsabilidade. A maestrina diz, por exemplo, que eles têm de estar calados e eles obedecem”, explicou. Patrícia Carvalho toca clarinete, sendo que apoia ainda a maestrina nas aulas de música, em aulas individuais. Vera Trigo, de 30 anos, integrando a banda há 20, ao contrário de Patrícia Carvalho, ainda não tem o filho, propriamente, naquela casa, mas não tarda. Está grávida e vê-lo seguir as suas pisadas é um dos seus grandes objectivos. “Vou tentar, tal como o meu pai fez, incutir o gosto pela música”, referiu. Na altura que entrou havia, não havia a escolinha de música, que hoje em dia há para os mais pequeninos. Havia solfejo, que é a arte de saber ler as notas que estão numa pauta, depois havia aulas instrumentais, sendo que aí acabou por escolher a flauta para ali fazer caminho. Mas também diz que não é só música que se aprende. “Aprendemos a gostar de música, mas aprendemos também a conviver, saber o que é empatia, a olhar para os outros e não só para nós, percebendo as suas necessidades”, referiu, dizendo que os mais velhos ensinam e ajudam os pais pequenos, por exemplo, saber comer, já quem casa estão mais relaxados e na rua, com uma farda, representam alguém e, por isso, é necessário saber estar de outra forma. Martim Moscoso é mais jovem. Tem 12 anos e integra a banda desde os três. Começou por integrar a escolinha de música, que é dedicada os mais pequeninos e, depois, quando atingiu o patamar necessário, entrou para a banda. Toca trompete e também diz que isto é muito mais do que música. “Isto é muito importante. O convívio faz com que a nossa comunicação com as pessoas que não conhecemos se torne melhor. Também é bom para a nossa mente”, explicou, dizendo que a “entreajuda” que ali se vai aprendendo também é essencial para compreender as necessidades dos outros. Dizendo que a ideia é ficar na banda “para sempre”, assume que gostava de ser músico. Quem já seguiu esse caminho, por causa da banda, foi Inês Neves, de 20 anos, que estuda Ciências Musicais na Universidade do Minho. “Desde pequena que comecei a tocar em festivais, com a coordenação da maestrina da banda, e depois ingressei na Esproarte, em Mirandela, em fagote e percursão. Integra a banda desde os oito anos. A irmã, quando começou, já frequentava a casa. “É algo que aqui nos junta muito. Aprendemos desde a comer com talheres, a respeitar os mais velhos, a perceber a cultura de outras regiões que visitamos e convimos”, vincou, dizendo que, apesar de estar fora do distrito, tenta ir a Vimioso quase todos os fins-de-semana por causa da banda porque “desistir não é uma opção”.
“Amizade, união e espírito de sacrifício”
Ana Cavaleiro integra a banda há 25 anos. É a maestrina há 15. Neste momento, segundo contou, olhando para a escolinha de música, com crianças dos três aos seis anos, a escola de música, com os jovens a partir dos sete, e a banda, a casa é composta por cerca de 100 pessoas. A escolinha de música tem a missão de ensinar os mais pequenos a estar em palco e aprender tudo aquilo que compõe este mundo. A escola de música tem depois o objectivo de ensinar o que é a teoria e o instrumento, de mostrar com se toca. Quando se atinge um determinado patamar as pessoas deixam a escola e passam então para a banda, que neste momento tem perto de 50 pessoas. A banda, que tem um “conceito um pouco peculiar”, ensina, segundo também garante a maestrina, mais do que música. “O nosso lema, que já nos deixou o nosso antigo mestre, é ‘amizade, união e espírito de sacrifício’. São todos estes valores que passamos. Aprende-se música e aprendem-se valores. Isto é uma casa, uma segunda casa, uma família”, esclareceu Ana Cavaleiro. É o espírito de união que leva a que as pessoas procurem a banda. “Isto vai passando de geração em geração. Temos a Patrícia que tem cá a filha. Também temos um senhor que anda cá ele e os netos. Isto é uma união muito grande e um acompanhar de gerações”, referiu. A banda apresentou-se novamente à comunidade, no sábado, no habitual concerto de Páscoa. É um concerto que existe há 23 anos e é um dos pontos mais altos para esta família, que, além dele, faz ainda apresentações pontuais em feiras e romarias e também nas comemorações do 25 de Abril. A banda celebra 25 anos da sua reactivação, sendo que já existiu nos anos 30. Por causa da emigração para o Brasil extinguiu-se, mas está, há 25 anos, bem viva. Desde que foi reactivada já viu por ali passar mais de 150 pessoas. Muito mais do que uma escola de música, apresenta-se como uma escola de valores e de formação pessoal.