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A noite também é da cidade

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Ter, 01/04/2025 - 09:27


A recente controvérsia entre o Nómada Club e a Câmara Municipal de Bragança, que agora avança para os tribunais, revela um problema maior do que aparenta: a dificuldade de encontrar equilíbrio entre o direito ao descanso e a necessidade manter a vida urbana, especialmente durante a noite.

Vivemos tempos em que muitas cidades do Interior enfrentam o envelhecimento da população, a fuga dos jovens e um crescente despovoamento do comércio e do espaço público fora do horário laboral. Nesse contexto, espaços como o Nómada não são apenas bares: são centros de convívio, dinamizadores económicos e pontos de atração para os jovens e estudantes que ainda escolhem viver e estudar em Bragança.

A vida noturna é, em qualquer cidade universitária, parte do seu pulsar. E não se pode querer o melhor dos dois mundos: usufruir da comodidade de viver num centro urbano, mas esperar o silêncio absoluto de uma aldeia isolada. Cidades vibrantes, que crescem, que acolhem talento e inovação, são também cidades que vivem depois do pôr do sol. A noite, bem regulada, não é sinónimo de caos. É sinal de vitalidade.

O caso do Nómada levanta questões sérias sobre coerência e transparência na atuação municipal. Por que motivo apenas este bar foi sujeito à exigência de uma licença que outros, na mesma rua, aparentemente não têm? Por que razão a resposta enviada pelos proprietários não foi considerada válida? E mais grave ainda: como é possível avançar com uma medida que põe em risco a viabilidade de um negócio sem que haja consenso nem confirmação inequívoca de que o problema existe?

As declarações dos vizinhos, que em grande parte desmentem qualquer incómodo relevante, mostram que o suposto problema pode ser, afinal, ampliado por um número reduzido de queixosos, um padrão infelizmente comum em muitas cidades portuguesas, onde o ruído urbano é, às vezes, confundido com perturbação insuportável.

A cidade de Bragança como outras da região, por exemplo Mirandela que também possui uma escola de ensino superior, precisam urgentemente de pensar o seu futuro. Se querem atrair estudantes, jovens profissionais e turistas, terá de garantir que há vida para além das 22 horas. Terá de promover a coexistência entre descanso e dinamismo. E terá, acima de tudo, de proteger quem aposta no desenvolvimento local com seriedade, legalidade e espírito empreendedor.

É fundamental que as autoridades compreendam que matar a noite é matar uma parte essencial do tecido urbano. Uma cidade sem espaços de encontro, sem música, sem socialização noturna, corre o risco de definhar em silêncio. Mais do que um conflito pontual, este é um sinal de alerta.

Que este caso sirva, no mínimo, para lançar uma discussão séria sobre o que queremos que as nossas cidades sejam. Porque se continuarmos a fechar bares e cafés por pressões minoritárias ou por burocracias pouco claras, em breve não teremos cidades, teremos apenas dormitórios tristes e vazios. E isso, garantidamente, não nos trará nem mais desenvolvimento nem mais sossego.

Cátia Barreira, Diretora de Informação