É já no próximo Setembro que os portugueses, nos quais, até ver, se incluem os transmontanos, serão chamados a votar, pela décima quarta vez, em mais umas eleições autárquicas. Em causa estará a eleição de 308 presidentes de câmaras municipais, os respectivos vereadores e assembleias municipais, bem como 3 091 assembleias de freguesia, das quais, de acordo com a lei, sairão os executivos das juntas de freguesia. A sub-região das Terras de Trás-os-Montes em particular, na qual centramos a presente análise, também poderíamos fazê-lo na sub-região do Alto Tâmega e Barroso, com resultados similares, comporta 9 municípios e 175 freguesias, animadas por uma população de 107.293, de acordo com os censos de 2021. Ou seja, apenas 2,9 % dos presidentes de câmara e 5,6 % das freguesias pertencem à transmontana sub-região das Terras de Trás-os-Montes e, o que mais desolador ainda é, apenas 1% da população nacional aqui toma assento. Todavia, espaço e requisitos naturais não faltam a Trás-os-Montes que potencialmente poderá ser mesmo considerado um verdadeiro céu, tomando em conta os melhores padrões de bem viver. As almas, incluindo os anjinhos autarcas e deputados, é que são poucas e resignadas, enquanto os diabos da política central, são maus e demais. Diabos que moldaram a seu favor o Regime político vigente que persistem em não reformar porque, entre outras maldades, a lei eleitoral, a lei autárquica, o ordenamento administrativo do território e a hegemonia partidária, muito os favorece a eles e às viciosas organizações partidárias que representam, em detrimento sistemático das terras do interior. Só assim se compreende o desprezo a que as Terras de Trás-os-Montes e as suas gen- tes têm sido votadas, causa primeira do êxodo transmontano, com reflexo no dramático ermamento do território, ainda que não na sua desertificação, porque a natureza transmontana, felizmente, continua pujante. Desprezo que se evidencia na ausência de projectos e investimentos com a dimensão adequada, devidamente coordenados e interligados e que efectivamente valorizem os recursos naturais da região, com respeito absoluto pela natureza, cultura e tradições. Vem a propósito lembrar o abortado Plano de Mobilidade do Tua que, dizem, terá a intenção de trazer turistas à região, mas que continua à espera e dependente, ninguém sabe de quem ou de quê, muito menos os responsáveis locais que, se o sabem, não o dizem. Insucesso clamoroso que desprestigia, sobretudo, os autarcas directamente envolvidos. Esperemos que os pro- jectos de que agora se fala não tenham a mesma sorte e que os transmontanos não continuem a ver comboios passar e rios a correr para os cofres da EDP, negócio que, esse sim, vá-se lá saber porquê, não teve entraves, nem atrasos. Tenha-se em conta, em qualquer caso, que o desenvolvimento das Terras de Trás-os-Montes em nenhuma circunstância deve equacionar, sequer, uma réplica do modelo que sucessivos governos implementaram ou permitiram que fosse selvaticamente materializado na Área Metropolitana de Lisboa, onde no espaço de 3 001 km2 coabitam 2 870 208 pessoas, a que corresponde uma densidade populacional é 956,4 habitantes por km², que é 50 vezes maior que a verificada na sub-região transmontana em apreço. Perigo que, embora ainda latente, já dá sinais preocupantes nalgumas cidades transmontanas. Com a agravante de que au- tarcas e deputados regionais sistematicamente se alheiam da sua missão essencial, que é a defesa das terras e das gentes que teoricamente representam e se curvam, servilmente, aos ditames dos partidos que os arregimentam. Tenha-se na devida conta que o fracasso da Área Metropolitana de Lisboa, assenta principalmente nos bairros periféricos para onde foram sendo despejadas milhares de pessoas sem que tenham sido acauteladas condições de vida dignas e seguras, daí resultando os conflitos sociais, culturais e a criminalidade a que agora se assiste. Fenómeno social que pode repercutir-se, à devida escala, em qualquer grande cidade transmontana e quando me- nos se espera. De salientar que tão pernicioso processo se desenvolveu quando apenas dois partidos, ironicamente um diz-se socialista e outro social democrata, alternadamente dominavam a vida política central e autárquica, como continuam. Desejável será, portanto, que forças políticas, sociais ou cívicas, independentes, ganhem expressão regional, afrontem os esgotados partidos do poder e imprimam maior dinâmica ao processo autárquico democrático. Importa ganhar consciência de que Trás-os-Montes é a pátria dos transmontanos pelo que, sem regionalismos exacerbados ou quaisquer laivos de chauvinismo ou xenofobia, é a todos os títulos desejável que a identidade transmontana se afirme em todas as suas nobres facetas. Com isso ganhará Portugal, Trás-os-Montes e a Democracia.