Quando era pequena odiava sair de casa. Não era sair para o quintal, ou sair para ir comer um gelado ao café, ou brincar com os amigos. Não. “Sair” no sentido de “dormir fora de casa”. No início, parecia sempre uma boa ideia. Dormir fora, noutra cama ou até no chão, num local improvisado. Algo diferente, num ambiente diferente. Ah! Que coisa maravilhosa.
Mas depois, chegava a parte de vestir o pijama e arranjar-me para dormir, efectivamente. E aí, meus amigos, caía na dura realidade - não estava na minha cama, no meu quarto, na minha casa. Pasmem-se, eu já sabia de antemão que era isso que ia acontecer. Mas só naquele momento parecia real. Só ali se concretizava. E descobria, afinal, que tudo o que eu queria era estar em casa. Quando toda a euforia de estar num sítio diferente do habitual e sem os meus mais próximos se esvaía, só queria voltar ao aconchego diário.
Há um clássico familiar, quando eu tinha uns 5 anos. Não sei bem, mas ainda era pequena. E fui passar uns dias a casa dos meus padrinhos. No início, pareceu-me uma óptima ideia. Ia, consequentemente, passar uns dias por lá. A minha mãe arranjou-me a mala. Provavelmente foi assim que aconteceu. Se escolhi alguma coisa, foram os brinquedos. O que me lembro, e que se conta como uma espécie de lenda, é que ainda nem a viagem tinha 5 minutos quando eu, já ensonada, disse “se estivesse em casa, a minha mãe já me tinha feito a cama”. Naquele momento, já não me devia parecer boa ideia ter deixado o meu lar, e assaltavam-me pensamentos em que os meus pais estavam tristes, à janela, a aguardar de forma impaciente o meu regresso. Em que estavam abalados com o facto de não terem a criança para ir deitar. Se calhar, nem era assim que se processava e até era um alívio uns dias de descanso de mim, mas o que é certo é que eram estas as imagens projectadas pelo meu cérebro.
A conclusão é que é bom viver aventuras, ver coisas novas e criar novas memórias, mas poder regressar a casa rapidamente. Hoje conservo esta dificuldade em deixar a casa para ir para outros locais, ainda que saiba que é temporário. Sempre, ou quase sempre, por períodos curtos. Muitas vezes ainda nem parti e já estou a sonhar com o momento do regresso. Quando passa o frenesim de empacotar os pertences, averiguar o que é preciso, ver se nenhuma torneira ficou a correr ou se não deixei o ferro de passar ligado à tomada, ir já não me parece uma ideia tão promissora como parecia antes, durante o planeamento, em que tudo eram expectativas.
O ideal é ir ver coisas novas e voltar logo. Voltar para o aconchego, onde sei onde estão as coisas e onde está tudo o que preciso. Na minha cabeça, este é o ideal. Nem sempre é possível assim, até que finalmente alguém invente o raio do tele-transporte. Como é que ninguém está a investir nisso? Não sei. Se eu fosse cientista ou de uma dessas novas engenharias, era o que queria inventar - o tele-transporte. Se eu tivesse 5 anos, num banco de trás do carro dos meus padrinhos, era o que me parecia bem. Ficar no meu ninho, onde eu conheço e me sinto bem. Onde está tudo o que preciso. Na minha casa. De preferência, na minha casa de quando tinha 5 anos, com a minha família para me aconchegar nos lençóis.