Ter, 13/08/2019 - 02:08
O direito à greve é conquista recente das sociedades democráticas, apesar de haver registo de fenómenos similares desde tempos recuados na história europeia.
Na segunda metade do século XIX ainda era arriscado fazer greve, porque o poder político dependia de grupos sócio-económicos que impunham os seus interesses e não hesitavam em reprimir, até ao banho de sangue, quaisquer reivindicações dos que para eles trabalhavam, com horários que chegavam às 16 horas diárias, a quem pagavam salários indignos, verdadeira carne para o canhão que lhes garantia a prosperidade rotunda e desavergonhada.
Apesar de tudo, a humanização das relações de trabalho foi fazendo caminho, com movimentos sociais e políticos a contribuírem para fazer valer o respeito pelo próximo, esse velho valor cristão. Aliás, a doutrina social da igreja continua a ter como referência a encíclica Rerum Novarum, inspiradora da acção de partidos do espectro da democracia cristã, que tiveram papel decisivo na construção do estado social, com algum fulgor na segunda metade do século XX, numa partilha com a social democracia, herdeira do socialismo utópico, mas também da teoria marxista sobre as dinâmicas económicas e sociais.
Ninguém esquecerá que, neste país, as coisas correram de forma substancialmente diferente. Depois de algum radicalismo, durante a primeira república, os portugueses não tiveram direito à greve durante quase meio século, no regime corporativo, que se proclamava da harmonia, mas se ficou pela miséria imposta e consentida, para bem da casa portuguesa, com certeza.
Entretanto as greves, instrumentos de legítima defesa dos explorados e ofendidos contra patrões sem escrúpulos, foram utilizadas por grupos ditos revolucionários, sem ligação às motivações dos principais interessados, para provocar instabilidade e atingir mudanças de regime que se pretendiam irreversíveis. Na maior parte dos casos, o resultado foi a instalação de regimes totalitários, onde o direito à greve foi imediatamente banido, conduzindo a situações de exploração desenfreada, em nome de ideologias salvíficas, que deixaram rastos de tragédia inominável.
Quando as sociedades procuram garantir direitos fundamentais e desenvolvem políticas que os concretizam para o bem estar geral, a segurança da comunidade e a liberdade de movimentos, estabelecem regras de funcionalidade especializada, competente, eficaz, para o exercício de algumas profissões, com vantagem para todos.
O problema é que determinados profissionais podem tentar aproveitar-se da posição para impôr os seus interesses. Assim foi neste país, durante anos, com os pilotos da TAP, os maquinistas da CP ou os trabalhadores da construção naval.
Não podemos, por isso, estranhar que um sindicato, conduzido por um novíssimo populista, tenha reduzido o país à condição de refém, perante a desorientação dos responsáveis políticos, que não souberam impôr condições para que fossem respeitados os direitos dos que trabalham em situações de risco, nem o direito que cada um de nós tem de viver dias tranquilos a participar na construção de um futuro respeitável para o país.