Ter, 27/11/2018 - 09:33
Em tempos idos, quando nas escolas se faziam as contas à mão, para verificar se o resultado estava correcto, os alunos dispunham de dois processos: a prova dos nove e a prova real. A prova dos nove podia esconder o erro. Por isso, se chamava real à prova realizada pelo método da operação inversa.
A vida das comunidades não se reduz, certamente, a procedimentos aritméticos, mas a memória dos primeiros anos na escola permite enquadrar reflexões sobre a vida, ontem, hoje ou amanhã.
A condição a que chegámos nesta terra é o resultado de factores que, na maior parte dos casos, são alheios à vontade dos nordestinos, mas se revelaram determinantes da falta de confiança, impondo a solução desesperada do horizonte da diáspora, que não dá mostras de ter fim.
Na realidade, por mais originais, inovadores ou produtivos que tenham sido empreendimentos que por cá surgiram, esbarraram sistematicamente com a propensão das cliques da capital para abanar árvores das patacas onde as houvesse, crentes que o mundo estava cheio de boas surpresas para recompensar a preguiça, alimentar a gula e festejar a cupidez.
Podíamos voltar ao tempo da prosperidade que a indústria da seda trouxe a Bragança e a outras vila e aldeias no século XVI, inviabilizada pela repressão inquisitorial, que levou ao encerramento de muitas oficinas de tecelagem, parcialmente recuperadas no século XVIII, quando as dinâmicas da economia mundial já consolidavam a liderança inglesa na industrialização e o país aprofundava a sua dependência tecnológica e financeira.
Desde então, passaram quase dois séculos de estagnação na economia regional. A situação era tal que, pelo fim do século XIX, Abílio Beça se viu empurrado para uma luta desesperada pelo caminho de ferro, que chegou pífio e dolente, quando a rede de comboios já tinha mais de meio século no resto do país.
Mesmo assim, nem todos debandaram. Houve gente que arriscou apostar nas potencialidades da terra e que dedicou a vida inteira a grandes projectos para o nordeste, apesar dos condicionalismos que os desaconselhavam. A memória maior é a de Camilo de Mendonça e do “seu” complexo do Cachão, a meio do século XX.
Nos dias de hoje não é diferente. A auto-estrada também só chegou quando os motores da economia regional estavam em vias de gripar e ainda lhe falta ligação vital à rede em território espanhol, que não será para já.
Por isso, grande aplauso para os bragançanos que viram reconhecido o seu mérito na actividade gastronómica, com a atribuição de uma Estrela Michelin aos irmãos “Geadas”, que pontificam no restaurante “G”, na Pousada de S. Bartolomeu e a referência “Bib Gourmand” para Luís Portugal e a sua tasca, no castelo de Bragança. São exemplos de criatividade, coragem e muito trabalho, com efeitos positivos no prestígio da região.
Eles conseguiram atingir tais patamares apesar dos caminhos erráticos de fuga às responsabilidades dos poderes instalados na capital. Imaginemos o que já teríamos visto e vivido se as políticas tivessem sido outras. Estas são provas reais da força que nos permite resistir.
Teófilo Vaz