Ter, 28/03/2017 - 10:44
Todos os dias nos damos conta de que o funcionamento das instituições está condicionado por interesses que não são assumidos com a necessária frontalidade, para que todos saibamos as linhas que nos cosem o presente e o futuro.
Muitas vezes os cidadãos comuns nem se dão tempo para pensar sobre o caos que lhes vai sendo imposto por determinações legislativas avulsas, desconexas e contraditórias, que se constituem em autênticas ratoeiras para o exercício de uma cidadania responsável.
Caso notório desta trama, quase impossível de desarmar, é a pseudo-reforma administrativa, que retalhou o país à medida do imediatismo sedento de fundos europeus, sem nenhum nexo com a história, muito menos com a identidade cultural profunda das comunidades.
Poderíamos dizer que foi obra de um doutor da mula ruça, arvorado em reformador, em tempo desmascarado e remetido à sua herbácea condição. A pigar as águas chocas de onde emergira, esperar-se-ia que, ido com os cantares da segada, com ele levasse o produto da sua audácia pestilenta.
Mas, não. Afinal, o que nos continua a tolher foi trabalho encomendado, que serve os desígnios de quem, dividindo, espera reinar, tendo como suporte a desistência dos que estão a chegar à exaustão, depois de séculos a ser triturados nas mós do diabólico moinho da politiquice.
As CIM’s (Comunidades Intermunicipais) são o produto de um percurso que, em nome de uma autonomia ilusória, esfarrapou o país e está a alimentar disputas e dissensões, muitas vezes resultantes de vistas curtas, mas também da falta de coragem para opor ao oportunismo malevolente, a coesão que um legado histórico irrecusável deveria ter cimentado. Na realidade, enquanto os distritos ainda sobrevivem, insiste-se em esvaziá-los.
Tem-se desenvolvido, desde o fim do Verão passado, movimentações dos principais partidos, no sentido de garantir lugares no conselho de administração da ULS do Nordeste. Nova legislação, aparentemente bem intencionada, atribui a indicação de um dos vogais à CIM. A boa intenção poderia ser ver assim representados os interesses das populações na administração da saúde. Só que o território de acção da ULS vai além dos municípios que integram a CIM Terras de Trás os Montes, e assim ficarão arredadas dessa eventual representação populações de três municípios do distrito.
Estamos, então, no reino do absurdo e ninguém parece preocupar-se. Provavelmente nem interessa, porque, pelos vistos, o que continua a atrasar a constituição do conselho de administração é uma jogatana espúria, para garantir um lugarzeco que vale uns milhares de euros por mês.
Assim se vai contribuindo para que a manigância se confunda com a actividade política, se vão desperdiçando possibilidades de elevação cívica e, enfim, prepara-se o caminho para que as gentes se disponham a aceitar que o poder vá parar às mãos de quem anuncie uma qualquer redenção, mesmo que se trate de uma certa forma de paraíso que o silêncio, a submissão e a vergonha podem constituir.
Por Teófilo Vaz