Guerras, guerras …

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A nossa impotência, sempre ela. Mina-nos por dentro e faz-nos sofrer. De Sarajevo a Alep, sempre o mesmo sentimento de que nada pode concretamente depender de nós. Não temos qualquer domínio sobre nada, e ainda, apenas, os nossos sentimentos, o grau de horror que suscitam todos estes acontecimentos que nos vão mostrando através de pequenos fragmentos televisivos. A nossa indignação é abafada nas entranhas, a nossa raiva tem muito pouco peso na batalha bem instalada que travam os humanos entre eles. 
Na ONU, como sempre, a regra do veto das grandes potências convém antes de mais aos assassinos, aos corruptos, aos malfeitores. Qual será o Conselho de segurança que vai reunir um dia para mostrar com firmeza os responsáveis nomeadamente designados, pelas atrocidades que desesperam a humanidade? Quem poderá dizer que uma época capaz de gerar um Assad apoiado num Putine é um momento sinistro onde o cinismo em tudo tenta sair vencedor e o consegue quase sempre?
O que podemos nós fazer, na atroz guerra da Síria, em relação ao ditador que, lá longe, sangra o seu povo e tortura as elites. Cerca de 300 000 mortos já, em cinco anos, mas quantos mutilados, humilhados, paralíticos para a vida e vidas ceifadas mal vislumbraram a luz do dia?
Hoje nada podemos fazer, exceto depositar toda a confiança no nosso recém- eleito Secretário-geral, nos eleitos do povo que possam em conjunto adotar uma posição clara e firme neste conflito. Contudo, quando pensamos nos políticos não podemos deixar de sonhar na famosa passadeira vermelha desenrolada aos pés de Bachar Al Assad por Nicolas Sarkozy, novamente candidato à presidência em França. Explica agora com grandes recortes de retórica onde estava o interesse da França e a pedir para travar a marcha dos refugiados para o seu país, onde honravam ainda há pouco tempo o seu carrasco, reviravoltas vergonhosas em relação à ideia que nós temos da França no mundo. Um dia acolhedor dos poderosos assassinos, no dia seguinte fechado às inocências massacradas. Venham falar-nos de “valores” depois de tudo isso.
E venham, uns e outros, falar-nos de Putine e da admiração apenas velada de alguns por este potentado sinistro que está nos bastidores de tantos golpes contra as liberdades e a dignidade humana. Cinismo puro de alguns politicalhos que exibem o temperamento, o carácter, a força dum Putine, um destes homens seria bem preciso para endireitar as coisas, dizem alguns e algumas. A sabedoria calculadora e exportadora da ausência de escrúpulos morais de alguns comentadores de salão são repugnantes quando tentam vender esse modelo de governo e de força que é preciso admirar. Efetivamente não temos nenhum Putine na Europa, e ainda bem, mas temos pequenos marqueses que sonhariam parecer-se com ele, sabendo a priori que não passam de anões ao lado desse gigante da crueldade e da criminalidade.
Tudo isso é excessivo ? À primeira vista sim, mas o que é mais excessivo, entre o dirigente que envia os seus bombardeiros último grito martirizar uma cidade estrangeira, testar novas bombas, destruir caravanas de alimentos e medicamentos conduzidos pela Cruz-Vermelha e um pobre cidadão impotente que tenta fazer uma crónica, batendo no teclado, unicamente com palavras para combater? O excesso é proporcional ao poder que se tem. Contra as bombas e as vossas amizades, Senhores cínicos, dilúvios de palavras não têm qualquer peso. Daí tanta raiva e indignação.

Adriano Valadar