Ter, 13/09/2016 - 09:34
No nosso hemisfério o mês de Setembro ainda é tempo de festa, de fartura de frutos que perfumam os ares e nos concedem instantes de eternidade, quando lhes mordemos a polpa e de promessas de vinho novo, esse néctar que as olímpicas criaturas nos revelaram, valorizando a liberdade e autonomia, que nos permite optar entre as migalhas de felicidade e a miséria da degradação.
Está a chegar o equinócio, porta para a luz menor, que nos chamará a descansar das euforias, a sentir arrepios no corpo e na alma, sempre fundamentais para a consistência da nossa passagem pelo mundo.
Setembro, dizemos nós, também é tempo de arderem os montes e secarem as fontes, o que, por vezes, sentimos como provocação infernal, instalando a dor e o desespero, que as primeiras águas suavizam.
Desde há quinze anos Setembro é ainda o paradigma da tragédia improvável, mas avassaladora, o sopro do titã imundo, que anuncia a morte pela morte, a orgia do sangue e o definitivo deserto de cinzas. É Setembro sempre que a besta quiser, em qualquer dia e em qualquer lugar, fechando todos os horizontes.
Já era tempo de recuperar este nono mês, o sétimo na Roma de há dois mil anos, para a sua condição de festa do futuro, em vez de nos deixarmos tolher pela resignação a um novo calvário, carpindo um destino que só depende de nós mudar.
Para isso precisamos de coragem em vez de tibieza, de união em vez de insidiosas querelas, sem razão que não seja o oportunismo dos protagonistas da política imediata, neste mundo que já nem parece o resultado de uma História milenar, com exemplos memoráveis de grandeza.
Sempre houve e haverá os bons combates pela humanidade e a civilização também se fez com o fio da espada, porque matar e morrer também são condição trágica do nosso percurso. Algumas vezes resultam da sanha assassina do homem animal, outras vezes impõem-se para que se possam consolidar a liberdade e tranquilidade a que temos direito.
Não podemos continuar a permitir que os valores da vida, da dignidade, da honra e da misericórdia sejam postos em causa por camarilhas de boçais alucinados, que não merecem que contemporizemos uma e outra vez com a sua ignara ousadia.
Apesar de vermos o Setembro deles a tomar conta de cada dia dos nossos anos, de todos os crimes vis e sanguinolentos que nos têm perturbado, ainda temos que ouvir discursos cobardes, argumentos falaciosos para justificar omissões, insinuações escarninhas, embora cheias de tremeliques, querendo apontar bodes expiatórios, como se assim se pudesse garantir o fim da agressão, que tem sido refinada, para nos torcer até à submissão atoleimada, como se se sentissem capazes de nos esbofetear para sempre.
Poderão vir a fazê-lo se não formos suficientemente decididos a esmagar a cabeça da besta. Servem-se das tecnologias que lhes fornecemos, das armas que lhes vendem alguns escroques, da perícia de traidores que alimentámos às nossas mesas e instruímos nas nossas escolas. Continuam a consumar quotidianamente o aviltamento das mulheres, com a complacência hipócrita de organizações mundiais que dizem defender os direitos humanos, mas também de partidos ditos democráticos e progressistas que, por cá denunciam os preconceitos, mas, por lá, defendem o relativismo e outras balelas, enquanto milhares de mulheres são apedrejadas, abatidas a tiro, violadas, desfiguradas, tapadas e espancadas com livro de instruções.
É necessário romper com este Setembro mórbido, que se tornou um instrumento de desgaste do mundo civilizado desde 2001, para retomar a sucessão normal dos dias das nossas vidas, porque o mundo pode mesmo ser a terra da promissão. A estultícia e o fanatismo não estão condenados a vencer. Aliás, Setembro, no hemisfério sul, não é o fim do Verão, é o início da Primavera.
Por Teófilo Vaz