A nordeste uma luz ao fundo do túnel

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Era um tempo em que se vivia sem pressa. O meu avô despedia-se da família e demorava um mês a ir ao Porto e regressar a Bragança, com quatro machos puxando um “carromato”. A longa caminhada era uma aventura com bizarros episódios de ladrões que espreitavam no descampado dos montes, ou se acoitavam na estreita passagem dos pontões dos rios. Tempos de fomes e servidão.
O meu pai comprou uma furgoneta de caixa aberta e pacientemente ia ao Porto em 7 ou 8 horas. Saía ao anoitecer de Bragança, parava nos bares do Adolfo do Romeu e do Neca de Vila Real que estavam toda a noite abertos servindo os camionistas e ao amanhecer estava no Porto, depois de vencer, estoicamente, as infindas e penosas curvas do Marão.
Em 2009 o ministro Mário Lino inaugurava a ponte internacional de Quintanilha, dando-se assim por concluído o IP4 que demorou quase 30 anos a ser construído.
“O Itinerário Principal nº 4, projetado para ligar Matosinhos, no Porto, à fronteira, em Bragança, foi das primeiras obras do Plano Rodoviário Nacional a ser iniciada, mas das últimas a ser concluída”, lê-se no jornal de Negócios de 24 de julho de 2009.
E durante estes 30 anos o Marão continuou a ser um pesadelo, com a morte anunciada em cada curva, com o luto permanentemente a assombrar o país. No IP4, em 20 anos, foi contabilizada a morte de 136 pessoas e 1273 acidentes. Uma autêntica guerra que ninguém travava.
Em 2009 arranca a construção da autoestrada nº 4 (A4) com a emblemática frase de José Sócrates: “Esta é a autoestrada da justiça” e ainda, esta autoestrada “vai acabar com a ideia de que haverá pessoas para cá do Marão ou para lá do Marão"
Mais uma vez a A4 avançava com a lentidão tradicional das obras transmontanas onde a pressa política não marca a agenda.
Finalmente esta importante obra de “Santa Engrácia” é dada por concluída com a abertura do maior túnel da Península Ibérica, com 5,6 quilómetros. Finalmente venceu-se o Marão e espera-se que cada vez mais para cá do Marão mandem os que cá estão com a colaboração solidária do governo central que muitas vezes se esquece que há mulheres, e homens a nordeste.
Que esta última obra na A4 que demorou sete anos a ser concluída, seja a luz ao fundo do túnel da nossa esperança e que de uma vez por todas o interior se aproxime do litoral e da Europa ao nível da igualdade de oportunidades e do desenvolvimento.
Pelo meu avô, pelo meu pai, quero fazer esta viagem até ao Porto acreditando que a única riqueza que temos é o tempo e tudo aquilo que de bom e justo possamos fazer com o tempo que nos resta.

Fernando Calado