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Azares de verão

Qua, 17/08/2005 - 16:20


O meu estimado Brodsky devido a detestar o calor, fica fulvo de raiva porque: “As manadas de gente em calções, especialmente as que relincham em alemão, também têm o dom de me bulir com os nervos…”.

Por isso mesmo nunca iria a Veneza no Verão,”nem à lei da bala”. Como o entendo, apesar de já ter ido à cidade dos Doges em infernal Agosto, tendo recebido as boas-vindas de uma legião de mosquitos, famintos e ávidos de sangue. Valeu-me na circunstância um hoteleiro amigo de comidas e vinhos de Portugal, o qual além de ter providenciado de modo a dormir num quarto protegido, ainda me proporcionou umas boas incursões gastronómicas e não só! A partir dessa tremenda experiência, viajar no mês de todas as festas só por razões ponderosas ou profissionais. Prefiro uns banhos salgados acompanhados do lavar de olhos nos bronzes expostos na praia do Baleal, a mais bela de Portugal, Ramalho Ortigão dixit, peixes preparados pelo operativo Diamantino, natural de Campo de Víboras e, proprietário de um bom restaurante em Peniche, leituras muitas de jornais, releituras e reflexões provindas dos autores de sempre, desde o explosivo Stirner a Gracq, passando pelo admirável Nabokov. Nos intervalos umas saltadas a Lisboa e ao interior a fim de preparar trabalho e o infernal Estio vai sendo dominado. Mas não há bela sem senão. È verdade. Se alguma coisa há de aborrecido na quietude dos dias é vê-la quebrada pelo esparramar de notícias onde entram conhecidos ou acontecimentos marcados pelo insólito, mesmo em tempos de estação maluca. Estou a referir-me em concreto às figuras do dia 12 de Agosto, o deputado Adão e Silva e três patuscos governadores civis. O primeiro é acusado de beber a água, a maior parte da água, de Grandais, os segundos vieram à televisão, ufanos e contentes, afirmar, garantir a mais perfeita das calmas nos seus distritos em matéria de incêndios. O deputado terá enchido a piscina da sua casa no mês de Maio, regando os jardins utilizando água de uma sua propriedade. O Público concede-lhe caixa alta e foto, o Diário de Notícias é mais comedido. O primeiro vá lá, cita este jornal, o segundo fica-se nas encolhas. Uma casa rodeada de jardins e piscina suscita queixumes, ciúmes e invejas. Em tempo de carestia de água uma piscina repleta a propiciar banhos refrescantes coloca o mais e menos pintado afobado pela caloraça a rosnar pragas e a soltar imprecações porque uns têm e outros não. Já acusação de usurpar a maioria da água à velha aldeia do homem dos ais causa-me perplexidade, isto porque em tempo de caça ao político não vislumbro o deputado a cometer a infantilidade de ser apanhado com a boca na fonte. Enfim, está em tempo de dolente azar de verão. Os governadores afirmaram peremptoriamente não subsistirem problemas de maior nos seus distritos, Guarda, Leiria e Vila Real, por causa da calamidade, na deles não existe a dita calamidade, sendo absolutamente hilariantes as declarações do Dr. Miguel Medeiros de Leiria. Não há pior cego, do que aquele que não quer ver, dizem os velhos alfarrábios. Na semana passada andei pelo centro do País, estive no concelho de Pombal. Não faço comentários ante o observado, os leitores também viram o que viram. As coisas são como são, dizia o sempre lembrado Victor Cunha Rego. Os senhores governadores apanharam o problema pelo lado errado, todos quantos os ouviram e sofreram na carne os terríveis efeitos dos fogos não se vão olvidar tão cedo das palavras daqueles governantes. Assim se começa a tecer uma derrota nas eleições. Ou já se esqueceram do efeito Figueiredo Lopes? O azar deles reside no facto de as pessoas terem memória e, nunca por nunca, colocarem na cova das coisas inúteis as palavras de soberba, dos magnificamente instalados e sem problemas. Fossem queimadas propriedades e casas deles e, talvez tivessem outro semblante na ocasião de aparecerem ante as câmaras. Nesse ponto, a senhora governadora civil da Guarda foi mais precavida e contida. O político Adão e Silva anda nestas coisas há muitos anos, ele bem pode pregar e atestar a sua inocência, bem pode afirmar do seu direito em possuir uma moradia de acordo com o seu gosto e as suas posses, mas esqueceu-se dos ensinamentos dos clássicos por ele lidos no antecedente, esqueceu-se também do provérbio:” nunca o invejoso medrou, nem quem ao pé de morou”. Resta-lhe aguardar pela vinda das chuvas outonais. Até lá, permito-me sugerir-lhe como leitura de férias o romance de Louis Bromfield, intitulado: “As Chuvas Vieram”.