A tragédia nos lares e a confiança dos cidadãos

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Ter, 06/10/2020 - 23:03


O que se tem passado, desde Março, nos lares de idosos, um pouco por todo o país, não contribuiu para consolidar a confiança nas instituições, entendidas como esteios fundamentais da sociedade organizada e democrática.
Sabia-se das dificuldades para lidar com situações potencialmente explosivas, de muito alto risco e com efeitos trágicos nos grupos etários mais avançados, mas também nas comunidades envolventes, porque um número significativo da população activa de muitas localidades do interior trabalha nas estruturas de apoio a idosos e outras valências das santas casas ou doutras IPSS.
No entanto, a situação a que se chegou, na capital de distrito, impõe a necessidade de transparência das autoridades governamentais e locais, assim como dos responsáveis da instituição, para que se compreendam as condições em que foi possível aqui chegar.
Há quinze dias correu a notícia de uma funcionária infectada na Santa Casa de Bragança. A situação foi dada como controlada e objecto das necessárias medidas de contenção. Nesse mesmo dia foi comunicado a familiares de utentes que as visitas voltavam a estar suspensas, uma medida dita de prevenção. Dez dias depois foi o que se viu. Resta saber o que ainda se verá.
Até agora ninguém esclareceu as razões do que está a acontecer, embora o presidente do município tenha deixado críticas aos serviços de saúde, nomeadamente no que respeita à celeridade dos testes que se impunha logo na semana em que ocorreu o primeiro caso.
Na semana seguinte os infectados ultrapassaram a centena e mais testes vão trazer, certamente, novas angústias, ao mesmo tempo que se vão notando efeitos colaterais nas escolas da cidade, nas actividades económicas e na insegurança crescente que se vive no dia a dia.
A confiança nos serviços de saúde conquista-se com respostas em tempo e clareza na informação. Doutro modo só se  contribui para distorcer a percepção e instalar a desconfiança, que não é a melhor amiga da democracia. A insegurança e a dúvida são o jardim das delícias de todos os populistas, que espreitam às esquinas de um labirinto cada vez mais inquietante.
A celeridade da resposta ao que se passou no Conselho de Estado devia ser referência para todo o país. Claro que estamos a falar de um órgão importante do nosso sistema político, com pessoas de alto risco, cujos eventuais impedimentos podem trazer consequências graves para o país. Os testes foram realizados de imediato mas, estranhamente ou não, pela fundação Champalimaud. As amostras foram recolhidas em casa das pessoas e, em três ou quatro horas, soube-se o resultado da maior parte. Muito bem, é assim mesmo que se trabalha, para que o país não mergulhe no desespero e na insanidade.
No entanto, ficou um sinal que ajuda pouco a cimentar a confiança das populações. Não foi o Serviço Nacional de Saúde que se encarregou da operação. Foi uma instituição privada, com reconhecidos méritos na investigação médica fundamental, que se constituiu com parte da fortuna acumulada por um português, capitalista, mal amado antes depois do 25 de Abril.
Reconhecer o mérito da Fundação é natural. Mas esperava-se do Estado outra capacidade para intervir com eficácia, demonstrando que o combate à pandemia é uma operação vital em que todos devemos estar empenhados sem hesitações.

Teófilo Vaz